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A CRIAÇÃO DE DEUS
Volume I
A CRIAÇÃO DE DEUS — 3 volumes
Recebido pela Voz Interna por Jacob Lorber
Traduzido por Yolanda Linau
Revisado por Paulo G. Juergensen
Direitos de tradução reservados
CopyrightbyYolanda Linau
UNIÃO NEOTEOSÓFICA
Edição 2022
ÍNDICE
S
eria ilógico admitirmos que a Bíblia fosse a cristalização de todas as Revelações. Só os que se apegam à letra e desconhecem as Suas Promessas alimentam tal compreensão. Não é Ele
sempre o Mesmo? “E a Palavra do Senhor veio a mim”, dizia o profeta. Hoje, o Senhor diz: “Quem quiser falar Comigo, que venha a Mim, e Eu lhe darei, no seu coração, a resposta.”
Qual traço luminoso, projeta-se o conhecimento da Voz Interna, e a revelação mais importante foi transmitida no idioma alemão durante os anos de 1840 a 1864 a um homem simples chamado Jacob Lorber. A Obra Principal, a coroação de todas as demais, é “O Grande Evangelho de João” em 11 volumes. São narrativas profundas de todas as Palavras de Jesus, os segredos de Sua Pessoa e sua Doutrina de Amor e de Fé! A Criação surge diante dos nossos olhos como um acontecimento relevante e metas de Evolução. Perguntas com relação à vida são esclarecidas neste Verbo Divino, de maneira clara e compreensível. Ao lado da Bíblia o mundo jamais conheceu Obra Semelhante, sendo na Alemanha considerada “Obra Cultural”.
ObrasdaNova Revelação
O Grande Evangelho de João – 11 volumes A Criação de Deus – 3 volumes
A Infância de Jesus
O Menino Jesus no Templo
O Decálogo (Os Dez Mandamentos de Deus) Bispo Martim
Roberto Blum – 2 volumes A Terra e a Lua
A Mosca
Sexta-Feira da Paixão e A Caminho de Emaús Os Sete Sacramentos e Prédicas de Advertência Correspondência entre Jesus e Abgarus Explicações de Textos da Escritura Sagrada Palavras do Verbo
(incluindo: A Redenção e Epístola de Paulo à Comunidade em Laodiceia)
Mensagens do Pai
As Sete Palavras de Jesus na Cruz (incluindo: O Ressurrecto e Judas Iscariotes) Prédicas do Senhor
Cenas Admiráveis da Vida de Jesus – 2 volumes
O Sol Natural
Quem escreveu esta Obra procurou algo com seriedade e en- controu o que desejava. Pediu e lhe foi dado. E, como tivesse batido na porta certa, ela lhe foi aberta e, através dela, para todos os de bom coração e boa vontade. Àqueles, porém, que não procuram com o coração, mas com seu pretenso intelecto puro, analisando e criticando em vez de bater em Nome do Eterno Doador de tudo que é bom, apenas o fazendo na casca dura e morta da matéria — não lhes será dado conhecimento, nem aberta a porta. O Espírito do Senhor jamais Se revela através do intelecto, mas apenas pela simplicidade do coração dos que são tomados por tolos. Todavia, o intelecto dos sábios do mundo será aniquilado diante da simplici- dade dos tolos.
Quem ler a presente Obra com o coração humilde, grato e cren- te, receberá várias graças e bem-aventuranças, e não negará o Seu verdadeiro Autor. À casta intelectual não interessa se estiver lendo Daniel, Sir Walter Scott, Rousseau ou Hegel, pois aceita tudo no sentido mundano e considera uma mensagem do Alto simples fan- tasia de pessoas incultas que procuram ser algo por meio de mistifi- cação, porque não conseguem alcançar aquilo de que carecem.
Que ninguém se perturbe por isso! Quanto já se duvidou dos Quatro Evangelhos! Porventura valem eles menos nos corações dos verdadeiros confessores de Deus? Quantas vezes fui Eu — o Senhor e Doador da Vida e de tudo de bom que Dela provém — declarado simples homem, magnetizador, falsificador e personagem inventa- do, como até hoje milhões o fazem! Ainda assim, isto não perturba outros tantos milhões. Como são obreiros e não somente ouvintes de Meu Verbo, perceberam pela simplicidade de seu coração que JESUS DE NAZARETH é algo mais do que o mundo O considera. Convém, portanto, que o leitor desta Obra não dê atenção para o critério do mundo, que enaltece somente o que lhe diz respeito, mas dê apenas ouvido à voz do coração. Assim fazendo, terá um critério justo diante dos Olhos do bom Doador. E feliz será se não soçobrar!
O intelecto mundano, por sua vez, terá motivos de sobra para se escandalizar.
Quem ler esta Obra e considerá-la de origem espiritual, todavia não estiver certo se provém de um espírito de baixa ou alta categoria, ainda estará fortemente atacado de cegueira e a coberta do intelecto mundano encobre bastante a visão de seu coração.
Quem acreditar em Mim, vivamente, não duvidará de Meu Po- der, Bondade e Sabedoria plena, e reconhecerá que Eu possuo Força e Sabedoria de sobra, capazes de expulsar para sempre o inimigo que se infiltrar no campo por Mim preparado. Eu e Satanás jamais con- duzimos o arado no mesmo sulco. Segundo o intelecto do mundo egoísta, infelizmente assim se julga; pois sendo ele próprio ignoran- te, só consegue perceber ignorância em toda parte. Aos olhos dos que são ensinados e educados pelo Pai, tudo tem outro aspecto, pois aos verdadeiros puros e iluminados, tudo é puro e claro.
Aos que afirmam que esta Obra carece de simplicidade, cal- ma e prudência, e certa profundeza na concepção do mundo, digo apenas: analisem rigorosamente seu coração a fim de constatarem aquilo que sentem faltar nesta Obra. Aliás, julgaram como os sá- bios europeus, sem terem penetrado na profundeza da mesma. Para tanto, é evidentemente necessário mais que a simples leitura de um trecho.
Que entendem tais leitores por “simplicidade”? Julgo que uma obra — não obstante sua abundância e profundeza misteriosa neces- sárias para a alma limitada, e de tal modo elaborada que até mesmo crianças alfabetizadas a poderiam ler, caso pudessem pensar além da tabuada — não deveria carecer de simplicidade. Quadros e lin- guagem não condicionam a simplicidade de uma obra, mas, sim, o fácil entendimento de um coração simples e a orientação em tal obra. Uma linguagem antiquada e quadros simbólicos de milhares de anos atrás é tão pouco simplicidade quanto o intelecto munda- no dos sábios. Calma, prudência e profundeza se encontram nesta Obra, apesar de o raciocínio pretender negá-las. Aquilo que acalma o coração deve possuir calma em abundância. Ao intelecto não pode
dar calma, por não ser ele capaz de assimilar calma, não a podendo encontrar nesta Obra, assim como qualquer rio não a encontraria antes de ter atingido a profundeza do mar. Se o intelecto dos sábios fosse capaz de se humilhar e descer da altura em que se julga ao sim- ples recôndito da vida do coração, poderia encontrar a calma nesta Obra. Mas, enquanto o intelecto, qual cata-vento em cima da torre de sua sapiência terrena, for lançado em todas as direções em virtude das dúvidas, não poderá encontrar sua calma, tampouco a prudência habitual que aprecia em suas alturas levianas.
Alguém sentindo falta de certa profundeza no que se refere à concepção do mundo, fique avisado de que tal não fora a intenção do Doador, e, sim, despertar um sentimento de fidelidade e grati- dão, emanando daí uma fé viva e o justo amor para com Deus e o próximo, vivificando-o para sempre.
Além disto, os que lerem a obra com o justo sentimento, atin- girão bastante profundeza na concepção do mundo sem ajuda dos intelectuais, que no caminho de suas análises tolas jamais chegarão ao conhecimento do Universo, que somente neste livro pode ser levado ao leitor — sem considerarmos outras obras nas quais o Sol e todos os sistemas planetários, solares e sóis centrais serão revelados material e espiritualmente.
Se em uma obra é exposta a evolução de todas as coisas desde sua origem, quer dizer, através de uma sequência eterna tanto ma- terial, quanto espiritualmente — e alguém ainda encontra falta de profundeza na pretensa carência do Universo, realmente, nem em todos os Céus poderá existir um unguento oftálmico que ajude tal míope a se livrar de sua falta de visão.
Os justos leitores desta obra poderiam afirmar: Nós, amantes de Deus, simples e fracos de intelecto, que além da Universidade Divina em nosso coração nunca frequentamos outra, não queremos a sapiência mundana; pois nossa constante visão nas profundezas das imensas criações de nosso Santo Pai é preferível que vossa per- manente pesquisa com visão tapada. Podemos estudar nos compên- dios até onde atingem vossos telescópios e cálculos matemáticos,
pois vossos caminhos não nos são estranhos. Mas, seria difícil para o telescópio e a matemática penetrarem onde chega a visão clara de nosso coração repousante em Deus!
Quem quiser ler esta obra com verdadeiro proveito para sua alma, que o faça na simplicidade de seu coração dedicado a Deus, não se fazendo de censor dentro do mundo, mas apenas um bom mordomo de seu coração, para encontrar nela em plenitude o que alguns intelectuais, infelizmente, não encontraram.
Toda Bênção e Graça aos leitores justos, de coração puro e boa vontade! Amém.
Volume I
ADVERTÊNCIADOPAICELESTEPARAOSSEUS FILHOS
Assim falou o Senhor através de mim, para mim e para todos; e isto é verdadeiro, fiel e certo:
Quem quiser falar Comigo, que venha a Mim, e Eu lhe darei a resposta em seu coração. Somente os puros, porém, cujos corações são cheios de humildade, deverão ouvir o som de Minha Voz. E quem Me preferir diante de todo mundo, quem Me amar como uma noiva dedicada ama seu noivo, com este Eu caminharei de bra- ços dados; poderá Me ver como um irmão vê seu outro irmão e como Eu o vi de eternidades, antes que ele existisse!
Aos enfermos, porém, dize: Não devem entristecer-se em vir- tude de sua moléstia, mas dirigir-se diretamente a Mim e confiar em Mim. Eu os consolarei, e uma torrente do melhor bálsamo se projetará em seu coração e a eterna fonte da vida será revelada ne- les; hão de sarar e serão aliviados como a erva após uma chuva de tempestade.
Aos que Me procuram, dize: Estou em toda parte e em par- te alguma. Estou lá onde sou amado e onde se cumprem os Meus Mandamentos, mas, em parte alguma onde se fazem preces e onde sou apenas venerado. Porventura não vale mais o amor que a prece, e o cumprimento dos Mandamentos não tem maior valor que a ado- ração? Em verdade te digo: Quem Me ama, Me adora em espírito
e quem cumpre Meus Mandamentos Me venera em verdade! Meus Mandamentos só podem ser cumpridos por quem Me ama; mas, quem Me ama não terá outro Mandamento senão que Me ame, a Mim e ao Meu Verbo vivo, que é a Vida verdadeira e eterna.
Aos fracos, transmite: Sou um Deus forte. Devem dirigir-se a Mim; Eu os tornarei perfeitos. De um caçador de moscas farei um domador de leões; os temerosos devem destruir o mundo, e os fortes serão espalhados qual palha seca.
Aos dançarinos e dançarinas, dize, sem susto, que todos eles estão nas mãos de Satanás. Ele os pega pelos pés e os faz girar para que fiquem tontos, a fim de não poderem permanecer de pé ou sentados, nem andar, dormir, descansar, ver, ouvir, sentir ou perce- ber; são quais mortos, razão por que não se lhes pode aconselhar, nem ajudar. E, caso quisessem voltar-se para Mim, passariam pelo mesmo que alguém sendo agarrado pelos pés que o fizesse girar em torno de si; ainda que olhasse para o Céu, não veria o Sol, mas ape- nas um risco luminoso que o cegaria, a fim de que fechasse os olhos e nada mais visse.
Quem é fisicamente cego ainda possui a visão do espírito; mas, quem é espiritualmente cego, sê-lo-á para sempre.
Aos jogadores, dize que perderão primeiro sua vida e em se- guida tudo aquilo que lhes fora dado para viver; pois o jogo é um poço de imundície venenosa, enquanto os jogadores acreditam ser uma fonte oculta de dinheiro. Por isto a remexem diariamente, ab- sorvem o bafo pestilento e se envenenam completamente; e, ao invés do suposto ouro, descobrem a morte eterna do espírito.
Aos que possuem o Verbo, mas não o leem, dize que se as- semelham aos sedentos à beira do poço de água limpa, mas que não querem beber, ou por hidrofobia espiritual, quais cães raivosos que, ao invés de meterem o focinho na água para se curarem, pre- ferem morder nas pedras mais duras a fim de saciarem sua sede; ou por preguiça mental, preferindo que servos ociosos lhes ofereçam na próxima poça d’água lodo malcheiroso que deve saciar-lhes a sede, fazendo com que pereçam.
Às inclinadas ao luxo e à moda excessiva dize que estarão nuas diante de seu Juiz. Sua opulência dissipar-se-á qual espuma; sua tendência para o domínio e o luxo será transformada na mais ínfima escravidão, vendo-se obrigadas a se envergonhar de sua tolice. Não seria tolo quem pretendesse dourar um montão de lixo e mandasse incrustar pedras preciosas em detritos, ao invés de fazê-lo no ouro? Quantos loucos existem atualmente no mundo! A luz é para eles treva, e a treva, luz!
Desde já, surge a Leste uma estrela que abrirá caminho para o Orion, e o fogo do grande Cão os dizimará a todos. Atirarei do Céu grande quantidade de estrelas para a Terra, a fim de que pereçam todos os maldosos e Minha Luz venha a iluminar por toda parte.
Eu, Jehovah, Deus de Eternidade, o Verdadeiro e Fiel, faço Minha última advertência. Amém.
Para ti, que acabas de escrever tão mal, serve isto em pri- meiro lugar, e em seguida para os demais. Isto diz o Primeiro e o Último. Amém.
OMANDAMENTODO SENHOR
Assim falou o Senhor através de mim, para mim e para todos; e isto é verdadeiro, fiel e certo:
És o Lot de Sodoma. Cuida, porém, que não sufoques na depravação e que a herança da prostituta não venha a ser parte tua. Nunca houve outro igual a ti, e nunca haverá. Como homem, vives na carne e em seu prazer, enquanto teu espírito é livre e tens olhos e ouvidos abertos. Enquanto maculas teu corpo com imundícies, tor- rentes de luz estão sendo espargidas sobre o teu espírito; enquanto te alimentas em companhia de animais, teu espírito é rodeado por milhares de anjos. Preenches teu coração terreno com toda sorte de impurezas; no entanto, Eu erigi no coração de teu espírito uma mo- rada para Mim. Palestras com prostitutas, enquanto Eu te falo como um irmão fala para outro irmão. Exalas um odor pestilento, e teu espírito aspira os perfumes dos mais elevados Céus. És um monstro,
e tua visão vislumbra os sóis. Por isto, purifica tua carne e une-te a Mim, para que possa tornar-Me Uno contigo!
Dize às mães receosas: Não devem educar suas filhas com pavor dos homens e do mundo, pois ao que se teme se obedece cegamente na tentação, e a vitória será fácil aos temidos. É preferí- vel educá-las no temor e amor a Mim, para que Eu seja vencedor, podendo elas desprezar o mundo, pois convém trazê-las para Mim, e Eu te asseguro que nenhuma passará sem bênção e alegria; pois Eu sou um Deus Rico que dispõe de superabundância infinita, po- dendo dar tudo e querendo tudo dar sem medida.
Os pobres não devem mendigar às portas dos ricos, onde sofreriam a sorte dos cães famintos e seu coração se transformaria em tristeza e amargura. Devem vir a Mim com fé firme, que a todos saciarei. Alimentarei o faminto, darei de beber ao sedento, vestirei o desnudo e curarei o enfermo; o aleijado há de saltar qual veado, o leproso será purificado, o cego se tornará vidente, o surdo há de ouvir e ao fraco farei mais forte que um leão; o medroso será mais corajoso que um corcel e o ancião encontrará paz. O pobre é Meu próximo, pelo qual cuidarei; por isto, não se deve deixar profanar pelos cães, pois os ricos do mundo são irmãos de Satanás e filhos do demônio.
Aos Meus amigos e amigas dize: Não devem amar Meus servos acima de Mim! Não devem depositar sua salvação em suas mãos, mas nas Minhas, confiando plenamente em Mim. O servo tem que agir estritamente dentro do mandamento, caso não queira ser considerado indigno; mas o Legislador está acima da lei, poden- do elevar acima dela a quem quiser. Enquanto estiverem debaixo do jugo, serão julgados; mas, quem vier a Mim poderá ser isento do julgamento.
Minha Igreja na Terra é um banho purificador. Quem se ti- ver lavado, que venha a Mim para que o enxugue com o calor do Meu Amor e o conserve Comigo. Quem apenas sentir prazer no deslizar e no remexer da água, fará o mesmo que as rodas do moinho de água, que nunca saem dela.
Quem tiver praticado as obras da verdadeira penitência, ve- nha a Mim, para que o aceite qual filho perdido e o conserve em Mi- nha Força. O servo poderá aconselhar, mas Eu posso agir; o criado poderá ensinar, no entanto a salvação é unicamente Minha Obra; o servo poderá orar, mas apenas Eu posso abençoar. Meu criado tem que julgar com justiça; o direito da Graça é do Senhor, apenas. Por isto, não devem esquecer-se do Senhor!
Dize-lhes isto, palavra por palavra, sem receio algum; não deves temer o mundo, caso queiras amar-Me, pois Eu sou mais que o mundo inteiro. Dentro do mundo sou um pequeno herói, pelo qual nada se dá. Os sábios mal me olham por cima do ombro e mal Me deixam o nome de um homem honesto. Alguns, entretanto, já Me despediram completamente, pois não mais existo para eles. Outros admitem algum traço divino, mas apenas por pouco tempo; em seguida, preferem algo diferente junto aos sábios do mundo. Imediatamente sou cassado com infâmia e valho, quando muito, como um antigo deus para velhas. Para alguns pretensos servos e criados Eu sirvo apenas como carimbo público e adorno externo de semelhança divina de sua tolice e imensa confusão grosseira. Al- guns Me deixam em Minha Divindade; em compensação, tenho que permitir que façam de Mim o que querem, para suas vantagens terrenas, e o que é pior: sou obrigado a ser um verdadeiro disparate! Amor e Misericórdia só posso aplicar enquanto isto lhes apraz; em seguida, tenho que ser mais inclemente que uma pedra, transfor- mando-Me no pior tirano! Tenho que saltar de um tribunal para ou- tro e pronunciar uma condenação após outra. Meu Amor terá que ser, portanto, temporário, mas Minha tirania e a magistratura rigo- rosa que a ela se prende devem durar eternamente! Minha ilimitada Paciência, Meiguice, Humildade e Amor eterno para com Minhas criaturas não servem para suas conveniências egoísticas; mas, dentro em breve, suas contas serão liquidadas! Elas se encontram diante de Mim e a medida de suas ações completou-se, e o prêmio as aguarda.
Quem não sabe como Sou e Quem Sou, seria preferível que
nada soubesse de Mim, pois Eu ainda poderia vivificá-lo no reino
dos espíritos; mas, deste modo tornam impossível Minha Ajuda, pois matam a vida, porquanto Me destroem dentro de si e se tornam vides separadas da videira.
Agora, afirmo: Sou o Deus Único e Eterno em Minha trí- plice Natureza, como Pai — segundo Minha Divindade; como Fi- lho — dentro de Minha Perfeita Humanização; e como Espírito
— dentro de toda Vida, Ação e Conhecimento. Sou, desde Eterni- dades, o Amor e a Própria Sabedoria. Jamais recebi algo de alguém. Tudo que existe é Meu, e quem algo tiver, tê-lo-á de Mim. Como poderia ser um tirano e condenador? Tolos que sois! Eu vos amo, vós Me desprezais. Sou vosso Pai e fazeis de Mim um verdugo. Onde Eu abençoo, condenais; onde Eu construo, destruís; onde Eu ergo, derrubais; onde Eu semeio, arrancais. Em tudo sois contra Mim. Se Eu fosse o que dizeis, a Terra de há muito não mais existiria; sim, nem teria sido construída. Sendo Eu como Sou, tudo existe como foi e será eternamente; também sereis como quiserdes, sem Meu Veredicto, pois sereis aquilo que fizerdes de vós. Aos que Me aceitam como Sou e Me amam como Eu os amo, farei o que quiserem, para que sua liberdade e alegria sejam completas para sempre.
A Meus servos e criados, dize: Meus empregos não são ban- cos de juros e agiotagem! Quem Me serve pelo dinheiro, não o faz por amor; quem não Me servir por amor torna estranho para Mim o seu ofício, assim como Eu tenho de lhe ser inteiramente desconhe- cido; com este terei saldado Minha Conta. Como poderia ser servo fiel quem vendesse os tesouros do Senhor, sem autorização, qual ladrão, por preço vil? Iscariotes Me vendeu por trinta dinheiros, sem prever o que iria acontecer Comigo, pois estava cego e se perdeu. — Martirizado e morto após derrota infame, ressuscito a cada minu- to. Ladrões infames e assassinos, com quem vos poderia comparar? Filhos do dragão, víboras e serpentes! Deste modo Me servis, assim deveria Eu vos encontrar? Por intermédio de Meu querido Paulo transmiti que quem servisse ao altar deveria viver do altar, mas ape- nas pelas obras do amor, que só faz o bem. Vós não tendes obras de amor — por isto sois salteadores, ladrões e assassinos do Evangelho
e de toda a Verdade. Sabei: o prêmio será segundo o trabalho! Amor não se compra por dinheiro, mas com o próprio amor. Eu sou o Próprio Amor e só posso ser conquistado pelo preço do amor. Eu vos comprei por amor, por isto exijo amor de todos. Quem quiser servir-Me, que o faça no amor, pelo qual Eu morri na cruz; e quem quiser vir a Mim, que venha no amor que sangrou na cruz por ele.
Aos funcionários e senhores do mundo dize, sem susto e com fidelidade, que seus empregos não estão acima dos empregos do Meu Reino. Cada ofício que for contrário ao Meu Ofício será destruído dentro em breve. Ai de seus servos! Sou o Altíssimo! Mi- nha Lei é eterna como Eu sou Eterno, e será para sempre como Eu. As traças que pretendem roer Minha Lei e fazer outras leis de seus detritos, a fim de exterminar Meu Mandamento, serão dizimadas por Ela, como se nunca tivessem existido. Todos que pecarem contra Meus Mandamentos poderão ser perdoados caso se confessem, se arrependam de seus erros e se regenerem, voltando-se em seguida para Mim e Eu para eles. Mas, quem pretender soterrar Minha Lei, será sufocado por Ela, para sempre. Todas as leis terrenas minam Meu Mandamento quando não forem dadas por homens educados pelo Meu Espírito. Ai dos tiranos, ai dos déspotas que dominam em virtude do trono e do poder e conceito; para o seu tempo não falta senão a contagem de Um, para sentirem o poder dos fracos! O solo é Meu e o campo é Meu. Isto diz o Verdadeiro, o Deus Eterno do Amor e da Sabedoria, e o transmite a um tolo dentro do mundo. Amém. Eu, Jehovah, Amém.
OSENHOR,COMOPAIDESEUS FILHOS
Assim falou o Senhor através de mim, para mim e para todos, e isto é verdadeiro, fiel e certo:
Eu sou Bom Hospedeiro, pois nem uma migalha se perde. Quem empregar seu capital Comigo, lucrará juros elevados e será registrado em Meu Coração, e os juros crescerão para toda a eterni- dade. Ergue o teu olhar, tolo, e fita o Céu estelar! Quem teria conta-
do os sóis, cujo número não tem fim, e os planetas que aos milhares giram em torno deles? Afirmo-te que sou Verdadeiro, Fiel em cada palavra. Por um ceitil dou uma terra e por um copo de água fresca, um sol. Em verdade te digo: o menor serviço de amor ao próximo será recompensado indizivelmente!
Perguntas se em toda parte vivem criaturas como aqui na Terra, e Eu te digo: Sim, em toda parte existem criaturas que sur- gem de Minhas entranhas e Me reconhecem dentro da qualidade de entranhas; e as que surgem de Minhas Mãos e Me reconhecem em Minhas Mãos; as que surgem de Meus Pés e Me reconhecem em Meus Pés; e as criaturas que surgem de Minha Cabeça e Me reconhecem em Minha Cabeça; e as que surgem de Meus Cabelos e Me reconhecem em Meus Cabelos; e as que surgem do Meu Seio reconhecer-Me-ão segundo Meu Seio. Enfim, os que emanam de todas as partes isoladas de Minha Natureza Física, Me reconhecerão. Sua vida e felicidade correspondem àquela parte de que surgiram e são Minhas criaturas e Eu as amo. Pois Eu sou todo amor e o Próprio Amor.
Mas, as criaturas desta Terra foram projetadas do centro de Meu Coração e as criei perfeitas, segundo a Minha Imagem, e elas não devem ser apenas Minhas criaturas, mas Meus filhos queridos, que Me devem reconhecer não somente como Deus e Criador, se- não como Bom Pai que as trará junto de Si, após curto espaço de provação, a fim de terem tudo que Ele Mesmo tem, morando com Ele para sempre, reinando e julgando sobre tudo. Acontece que as Minhas criaturas Me amam como Seu Criador, felizes pela sua exis- tência. Meus filhos, porém, não querem aceitar o Seu Pai e despre- zam o Seu Amor!
Fico triste quando vejo milhares e milhares fenecerem e mor- rerem a cada hora! Se ao menos os pudesse ajudar! Porventura não é de entristecer quando o Onipotente não consegue socorrer?
Perguntas como é isto possível? Muito facilmente! Todas as Minhas criaturas dependem de Minha Onipotência, mas Meus fi- lhos dependem de Meu Amor! Meu Poder ordena e tudo acontece.
Meu Amor deseja e ordena com Meiguice aos filhos livres que ta- pam seus ouvidos e tampouco querem ver a Face de seu Pai. Por serem livres como Eu, não os posso ajudar quando não o desejam. Minha Onipotência rege tudo, mas Minha Vontade é submissa aos Meus filhos. Por isto, todos deveriam gravar bem: Sou vosso Pai, mas também sou vosso Deus, e além de Mim não existe outro. Que- reis-Me como Pai — ou como Deus? Vossas ações Me darão a res- posta decisiva.
Prestai atenção: o Amor habita somente no Pai e se chama o Filho. Quem O desprezar cairá no julgamento da Divindade Oni- potente e ficará sem liberdade para sempre e a morte será seu qui- nhão; pois a Divindade habita também no inferno, mas o Pai, so- mente no Céu. Deus julga tudo segundo seu Poder; a Graça e a Vida eterna residem somente no Pai e se chamam o Filho. A Divindade tudo mata, mas o Filho ou o Amor dentro de Mim possui a Vida, dá a vida e vivifica.
Tudo isto transmite o bom Mordomo e o econômico Pai a todos os Seus filhos, a fim de que se regenerem e possam rece- ber a herança que Eu lhes preparei desde eternidades e a conservei fielmente.
A teus amigos e irmãos dize com todo amor: Eu, o Amantís- simo Pai, já estendi os Meus Braços para poder estreitá-los no Meu Coração. Não mais se devem afastar de Mim, mas fitar constante- mente o Meu Semblante, e o Meu Olhar lhes dirá em voz alta o quanto os amo e como Sou sincero com eles.
Transmite-lhes: Apaguei de Meus Olhos os seus pecados e os lavei tão brancos como a neve; não mais existe empecilho. Não quero mais ser um Pai invisível; devem ver-Me a toda hora e brincar e gracejar Comigo e se alegrar; que depositem as suas preocupações em Meus Ombros.
Com que imensa alegria irei cuidar deles no futuro! Que representam todas as felicidades e bem-aventuranças de Meus Céus para Mim, o Pai, comparadas às de ser amado como Pai Único e Verdadeiro pelos Meus queridos filhos!
Darei todas as bem-aventuranças em troca desta única que reservei exclusivamente para Mim. Por isto, devem os Meus filhos chamar somente a Mim, unicamente a Mim, de Pai. Eu o Sou com todos os direitos, e não há quem Me tire os mesmos, pois Sou o Único e Exclusivo, não havendo outro fora de Mim.
Quero nomeá-los (os teus amigos e irmãos) com as seguintes letras (vide apêndice): I, P, R, I, T, E, A, D, S, M. Todos devem receber a Minha Saudação Paternal, e ainda hoje, caso o queiram, as portas dos Céus lhes serão abertas, ou seja, os olhos de seus espíritos, e ainda hoje poderei morar em seus corações. Somente uma coisa devem fazer com constância, isto é, purificar sua carne com a água pura do poço e tomar um bastão preto e branco; devem parti-lo pela metade, atiran- do a parte preta aos pés do mundo e guardando a parte branca como prova de que romperam com o mundo e sua carne, para sempre.
Isto quer dizer que devem meditar com rigor e se reconhe- cer, e em seguida expor-Me, no coração, os defeitos encontrados. Hei de exterminar as impurezas de seu coração e preenchê-lo com o fogo de Meu Amor divino e paternal. Deste modo purificado, de- vem apresentar-se ao sacerdote através da confissão; em seguida, Eu Me apresentarei para tomar com eles a ceia festiva, no altar.
Dize-lhes que não se devem escandalizar com a igreja, pois todo alimento por Mim recomendado é purificado por Mim para quem deseja saboreá-lo dentro da Verdade, podendo fazê-lo sem preocupações. O que por Mim é dado aos filhos, é puro e não será profanado pela forma externa para os que devem recebê-lo. Abenço- arei o templo, e o local onde se encontram será santificado, pois Eu, seu Santo Pai, estarei entre eles onde quer que estiverem, e nenhum cabelo lhes será tirado.
Dize-lhes com segurança e certeza: Meu Amor os aguarda e Meus Braços não se fecharão antes que todos Neles repousem, onde poderão ver o Pai Amoroso e Santo, face a face, e suas alegrias não terão fim! Amém.
A todos que Me procuram, dize que estou sempre em casa, nunca Me afasto, e que não determino certas horas ou épocas em
que possam vir a Mim, como acontece com os reis e os grandes do mundo. Não somente num sábado ou feriado, mas a todo instante, um coração amoroso Me é agradável, e até mesmo durante a noite nunca tranquei a porta para alguém. Basta bater, que direi: Entra!
Deves e podes dizer abertamente se Eu te obriguei a alguma coisa em uma certa hora e se não deixei à tua vontade de te dirigires a Mim para qualquer pergunta e se Eu algum dia te deixei sem res- posta! Quando Me perguntavas algo a respeito do inferno, Eu te res- pondia e quando te encontravas na Terra ou no Céu, Eu te respon- dia. Dia e noite Meu Ouvido está pronto para te ouvir. O que neste momento escreves, o fazes dentro de teu tempo e possibilidade, e Eu Me conformo com o quanto e como queres escrever. Por isto, trans- mite-lhes que basta alguém Me procurar, que será aceito e ouvido!
Dize aos pequeninos que não devem brincar Comigo, mas tomar-Me a sério. Não sou palhaço, tampouco entendo brincadei- ras. Meu rigor é para todos, adultos e crianças, jovens e velhos, ho- mens e mulheres. Não faço exceções!
Vê, Minhas criaturasimprestáveis são imediatamente des- truídas; mas para Meus filhosreservo castigos em quantidade e pu- nirei os desobedientes até a última gota de seu sangue e eles hão de reconhecer que sou Senhor da casa, se não Me quiserem aceitar como Pai Amoroso e Santo.
Ai dos que desprezam Minhas punições e as interpretam mal! Repito: Ai deles! Serão expulsos pelo Pai e terão que se haver com a Divindade inclemente! Isto Eu te digo, pois és um servo mau e preguiçoso. Amém. Eu, Jehovah. Amém.
AVERDADEIRA IGREJA
Assim falou o Senhor através de mim, para mim e para todos, e isto é verdadeiro, certo e fiel:
Minha Graça é um tesouro; quem A receber não sofrerá ne- cessidade temporal ou eterna. Por isto, devem todos tratar de con- quistá-La imediatamente, pois A faculto a quem A quiser.
Se quiserdes o perdão de vossos pecados, eles serão perdoados quando fizerdes verdadeira penitência por Jesus, Meu Verbo Vivo e o Amor em Mim, e as portas dos Céus estarão abertas, podendo entrar quando quiserdes e ver o Semblante de vosso Santo Pai, que sou o Eterno Deus Jehovah.
Isto podeis fazer em virtude do Verbo Vivo, ou seja Jesus Cristo, ou o Amor Eterno e a Sabedoria dentro de Mim, de onde emanam todo o Bem e a Verdade. O Amor vos foi dado desde o início, pois é ele a própria vida dentro de vós, assim como o Poder dentro de Minhas criaturas que, embora surgissem também de Meu Amor, não são propriamente o amor, pois nelas não existe liberdade, mas apenas o efeitodoamor, que em si é sem vida — razão por que tudo que surge do Poder é em si matéria morta, cuja vida é aparente; em verdade, porém, é a morte.
Se, portanto, alguém prender seu amor ao mundo material, será sufocado pelo poder da morte e a consequência será o destino da matéria, ou a morte.
Mas, quem dirigir o seu amor para Mim, unirá o seu amor com o Próprio Amor, ou com a Vida de toda a vida. Assim, será inteiramente vivo.
Mas, vê, o amor em si é cego e ignorante e, por isto, li- vre e independente; mas, também, em grande perigo de se perder e sucumbir.
Por isto, faculto a todo amor para Comigo na medida de sua capacidade, uma parte justa de luz, uma dádiva que se chama Graça; com ela Eu penetro em todos, segundo o grau de seu amor.
Se alguém tiver amor por ter vivificado a Minha Lei, que é o máximo Amor, receberá torrentes de luz e sua visão penetrará a Terra, vislumbrando as profundezas do Céu.
Dize às crianças, dize a todos, seja sua religião qual for: ca- tólica, protestante, judaica, maometana, brâmane ou pagã, enfim a todos seja dito: Na Terra só existe uma verdadeira Igreja que se chama o Amor para Comigo, em Meu Filho, que é o Espírito San- to em vós e se transmite através do Meu Verbo Vivo. Este Verbo é
o Filho, e o Filho é o Meu Amor e está em Mim e Eu O penetro inteiramente, pois somos Unos. Deste modo estou em vós, e vossa alma, cujo coração é Minha Morada, é a única Igreja verdadeira na Terra. Somente nela existe a Vida eterna e somente ela faculta a bem-aventurança.
Eu sou o Senhor de tudo que existe! Eu sou Deus, o Eterno e Poderoso e, como Tal, também sou vosso Pai, o Santo e Amoroso. E tudo isto existe no Verbo; o Verbo está no Filho, e o Filho está no Amor, e o Amor está na Lei que vos foi dada. Se a respeitardes e agirdes conforme manda, tê-la-eis aceito; ela então se tornará viva dentro de vós e vos elevará, tornando-vos livres. Não mais estareis debaixo da lei, mas acima da mesma, na Graça e na Luz que repre- sentam Minha Sabedoria.
Eis a bem-aventurança ou o Reino de Deus em vós, ou seja a Igreja bem-aventurada na Terra, pois em nenhuma outra existe a vida eterna, senão nela.
Porventura julgais que Eu habito entre paredes ou em ceri- mônias, orações e adorações? Jamais, pois nisto tudo Eu não estou, mas apenas onde se encontra o amor; Eu sou o Amor e a Própria Vida. Eu vos dou Amor e Vida e Me uno somente ao Amor e à Vida, mas nunca à matéria ou à morte.
Por isto, venci e submeti a Divindade a Mim, a fim de que tenha todo o Poder sobre tudo que existe e Meu Amor reine eterna- mente, vivificando tudo que Lhe é submisso.
Pensais que Eu vos aguardo na morte, enquanto sou a Pró- pria Vida? Ide primeiro à verdadeira Igreja onde existe Vida — em seguida entra na morta, para que se torne viva por vós!
OSEGREDODA CRIAÇÃO
Quem tiver ouvidos, que ouça; e quem tiver olhos, que veja; pois Eu vos revelarei um grande segredo para que saibais de que ma- neira vosso Santo Pai vos proporciona a Visão, face a face, qual Irmão. Os filhos têm que ser iniciados na grande Criação de seu Pai Eterno.
A Divindade foi desde eternidades a Força penetrante e foi, é e será a Própria Eternidade. No centro de Sua Profundeza Eu fui o Amor, desde sempre, e a própria Vida dentro Dela; todavia, Eu era cego qual embrião no ventre materno! A Divindade agradou-Se no Amor e Se sentiu impulsionada para Ele. E o Amor percebeu o crescente calor em Seu centro, e colossais massas da Divindade para lá se projetaram e todos os poderes e forças se atiraram sobre Ele.
Deu-se, então, um enorme rugir, bramir e clamar e vê, o amor se sentiu amedrontado e pressionado por todos os lados, a ponto de estremecer no seu âmago! O Amor o percebeu, e o rugir tornou-se um som, e o som se transformou no Amor em palavras, dizendo: “Que se faça Luz!” Eis que se incendiou no seu coração a chama do amor inflamado e a Luz se fez em todos os espaços do Infinito!
E Deus viu em Si a imensa Glória de Seu Amor, e o Amor foi fortificado com a Força da Divindade e, assim, uniu-se a Divindade com o Amor para sempre, e a Luz surgiu do calor.
E o Amor viu todas as maravilhas, cujo número não tem fim, dentro da Divindade, e a Divindade viu como tudo isto passava do Amor para Ela, e o Amor percebeu na Divindade os Seus Pensamen- tos e muito Se agradou por isto. Eis que o Amor incendiou-Se de novo e as Forças da Divindade o envolveram e, vede, os Pensamen- tos do Amor eram o Próprio Amor e não tinham número.
Eis que a Divindade viu Sua Glória e o Amor sentiu o Seu Poder. Então, falou o Amor dentro da Divindade: “Concentremos os Pensamentos da Glória e deixemos que surjam, para que se tor- nem livres, podendo nos ver e sentir, assim como Nós os sentimos e vemos, e os vimos antes que a luz iluminasse suas formas!”
E a palavra passou para a Divindade, que se tornou inteira- mente Amor. E pela primeira vez a Divindade falou: “Assim seja!” E eis que se libertou uma falange de espíritos de Deus, cujo número não tem fim, e o Amor se viu multiplicado até o infinito e viu a perfeição de sua beleza.
Mas, todos esses seres ainda não eram vivos, não sentiam, nem viam, pois ainda eram formas fixadas pela Divindade, fora do Amor.
E o Amor compadeceu-Se e o sentimento subiu para a Divin- dade e Ela entregou Seus prisioneiros ao Amor, e o Amor penetrou tudo. E eis que as formas se tornaram vivas e sentindo-se admiradas entre si, aquecendo-se nas torrentes chamejantes do Amor Divino e com isto receberam movimentação independente e ativa. Todavia, não se conheciam a si próprias.
De novo o Amor falou: “Façamos com que se conheçam e, deste modo, também a Mim e, por Mim, também a Ti!”
E a palavra da Divindade Se fez ouvir, e a palavra se tornou Lei, e a Lei era o Amor e Se espargia sobre todos.
E eis que foram criados trêse deles surgiram sete! E os três eram idênticos ao Amor, à Luz e a Divindade. E os sete eram semelhantes aos sete Espíritos de Deus e se chamaram e sempre se chamarão:
13. 1 – Amai o Amor; 2 – Temei a Divindade que mata, a fim de não serdes aniquilados; 3 – O amor dentro de vós é santo, por isto, respeitai-vos mutuamente, assim como vos respeita o Amor na Divindade e se alegra convosco; 4 – Cada um é sua própria proprie- dade e a propriedade do Amor de Deus. Por isto, ninguém se deve tornar vítima de assalto do próximo; 5 – Que ninguém oculte sua face diante do outro para que não venha a saber como é o amor, e sim que sejais como o Amor que vos criou; 6 – Vosso íntimo seja igual ao exterior, para que não surja um sentimento falso em vós, fazendo-vos sucumbir; 7 – Vosso exterior seja o fiel reflexo de vosso espelho interno, no qual o Amor da Divindade Se fita; do contrário, se quebrará o espelho interno e vossa figura será horrenda.
Em seguida, a Divindade trovejou aos infratores um tre- mendo julgamento pelos espaços infinitos, e a adoração da Di- vindade, no máximo temor, foi ordenada e foi-lhes obrigado o Amor do Amor. E assim foram externados na máxima liberdade, podendo fazer o que quisessem, nada havendo que os impedisse, até o momento em que se reconhecessem em sua liberdade e hu- mildade, para que a Lei fosse sua propriedade e os tornasse intei- ramente livres.
Uma vez a sós, eles se reconheceram em seu imenso po- der, glória irradiante e majestade, e o chefe dos três, semelhante à luz da Divindade, inflamou-se em seu desejo, querendo apossar-se inteiramente da Divindade. Com ele inflamou-se grande parte dos espíritos por ele criados; e por eles incendiou-Se também a Divinda- de em Sua Ira junto aos dois espíritos inferiores dos três e atirou os maldosos na profundeza das profundezas de Sua Ira.
E os dois e os que deles surgiram, e os sete, cujo número era justo, eram fiéis em sua humildade e foram aceitos nos Âmbitos do Poder de Deus; e o Amor viu que estavam puros e Se alegrou em sua perfeição. E vê, o Poder da Divindade no Amor Se manifestou, e a Divindade Se movimentou, e os seres criados perceberam o movi- mento da Divindade. Ela Se dirigiu para o Seu Amor, e os olhos dos seres foram abertos, podendo ver pela primeira vez o Amor Eterno.
Eis que os exércitos das numerosas falanges se extasiaram e houve grande júbilo e imensa alegria entre eles, pois viram o Poder de Deus no Amor e viram dentro de si o Amor e também o Poder que os criou, reconheceram a si mesmos, o Amor e a Deus.
Agora, a Divindade Se movimentou e os seres A temeram, e o Amor viu seu temor, percebendo que era justo; o temor se trans- formou em obediência, a obediência era a humildade, a humildade era o seu amor, e o amor era sua lei, e a lei sua eterna liberdade, e a liberdade era sua vida e a vida sua felicidade eterna.
Eis que o Amor lhes dirigiu a palavra e eles a entenderam! E suas línguas se soltaram e pronunciaram a primeira palavra: Amor. E a Divindade sentiu agrado com o seu pronunciamento. E tocada pelo Amor, este sentimento se desenvolveu nos seres criados, e a forma transformou-se num som e o som foi a segunda palavra, ou seja, Deus.
Só então os seres estavam perfeitos. E o Amor lhes falou: “O primeiro entre vós se perdeu, por isto assumirei o seu lugar e estarei entre vós para sempre!”
Neste instante, suas línguas se soltaram de novo, seus joe- lhos se curvaram e eles adoraram o Amor.
Vê, em seguida, tudo que fez o Amor e Deus no Amor, e o Amor em Deus! O Amor compadeceu-Se dos perdidos, mas a Divindade estremeceu em Sua Ira, e um imenso trovão se fez ouvir em todos os espaços do Infinito de Deus. E o trovão penetrou até o âmago do Amor eterno e somente o Amor entendeu o trovão da Divindade, e o trovão se transformou nestas palavras: “Todo Poder será entregue a Ti; age segundo o Teu agrado; pronuncia: — ‘Que assim seja!’ — e assim será!”
O Amor comoveu-Se até o íntimo e a primeira lágrima jor- rou do Amor Eterno, e esta lágrima veio do Coração da Divindade e se chamou e sempre se chamará Misericórdia.
Esta lágrima se transformou em imensas águas que se atira- ram pelos espaços do Infinito e também nas profundezas da Ira de Deus e amainaram o fogo da Ira Divina.
E vê, o Espírito de Deus, em Sua Força, soprava suavemente sobre as águas da Misericórdia, e as águas se dividiram. E Deus falou através de Seu Amor, e Seu Amor transformou-se em palavra, que se dirigiu às profundezas e pairava sobre as águas que foram separadas como gotas de orvalho e divididas em pequenas e grandes, segundo o número dos que se perderam — que não tem fim — em todos os espaços do Infinito.
A última gota que sobrou foi o mais íntimo e o intrínseco da Misericórdia. Esta não foi dividida e ficou onde estava e foi desig- nada para centro e palco das maiores ações do Amor Eterno.
Esta Última gota foi transformada na Terra que tu e teus irmãos habitais! As demais gotas foram transformadas em sóis, pla- netas e luas de toda espécie, cujo número não tem fim. Deste modo surgiram o Céu com suas estrelas, o Sol, a Lua e a Terra com seus mares e continentes.
Agora ergue teus olhos, que verás os milagres do Amor Eter- no! Vês sempre o brilho do Sol, a luz da Lua, o cintilar e resplandecer das estrelas em suas várias constelações; vês também as mais variadas formas nos três reinos da Natureza da Terra. No entanto, até hoje ninguém descobriu e entendeu o que seja e qual a origem do brilho
do Sol e como o recebeu, a luminosidade da lua e o cintilar das es- trelas, suas posições e todas as criaturas da Terra.
Meus filhos devem ser iniciados em tudo aquilo que o seu Pai Santo e Amantíssimo, criou para presenteá-los, quando O co- nhecem e amam acima de tudo e, entre si, por amor a este Pai.
Bem, quando todos os sóis com seus planetas foram criados pelo Poder do Amor Misericórdia do Deus Infinito e Eterno, eles ainda não tinham brilho e luminosidade pois era noite densa em todos os sóis, planetas e luas. O Amor Eterno, porém, deitou uma pequena fagulha de Sua Graça no centro dos sóis e ela iluminou as massas trevosas mais rapidamente que um raio, que começaram a brilhar como até hoje e o farão enquanto esta fagulha da Graça não lhes for tirada.
Então brilharam também as terras e luas, e foram distri- buídas entre os sóis, e o Amor os bafejou pelo Poder e Força da Divindade, e a luz irradiava nos sóis, os mares dos planetas enca- pelaram-se e os ventos flutuavam e sopravam sobre as terras, assim como o Espírito de Deus sobre as águas da Misericórdia. E as luas se ergueram poderosamente sobre seus planetas, aos quais tinham sido dadas qual fruto à árvore, e começaram a girar em torno deles em vastas órbitas como constantes acompanhantes de sua criação. E onde havia muitos eram juntados em círculos compactos para prova do amor dos filhos que devem fitar constantemente o Semblante de seu Pai, como as luas fitam suas terras, para que, devido à sua constituição frágil, não venham a ser atiradas fora de suas órbitas e destruídas. As luas não são muito consistentes, mas fofas, semelhan- tes à espuma do mar quando se torna um pouco mais sólida e são escalvadas e sem água. O ar da Terra é igual à água das luas, e o ar, semelhante ao éter entre sóis e planetas. As luas se destinam a aco- lher os egoístas e captar os espíritos da matéria, analisá-los em sua consistência e treiná-los para poderem receber a Graça.
A Misericórdia amainou parte da Ira Divina, que se trans- formou na porção sólida dos planetas, prendendo com laços fortes os espíritos dos perdidos até o tempo determinado de sua libertação
inconsciente, onde passarão para uma matéria mais delicada, con- quanto fixa para eles e, isto, isoladamente, de onde só poderão ser despertados e surgir através do Amor Eterno. Os mares e as águas estão repletos deles a fim de que sejam humilhados, e o ar está reple- to para sua purificação. E o Amor Eterno é a forma em tudo, mas a Ira da Divindade é abrandada somente nesta Terra, contudo não eliminada.
Guarda bem! No centro do Sol repousa a centelha da Graça que fornece, através do fogo da Ira Divina, a luz ao mundo. No centro da Terra, porém, se encontra uma fagulha da Ira Divinal qual dragão de fogo que contém as más hordas quais pedras que somente podem ser amolecidas pela água da Misericórdia, caso algum espíri- to deva ser libertado para uma segunda prova para a liberdade e vida eterna. Compreende, pois, o segredo de tua natureza e deslumbra-te com o grande Amor do Poder Eterno. Quantas vezes Ele te deixou nascer de novo para te conquistar, pois estavas perdido para a Vida Eterna, para a liberdade, para a Lei, o Amor e a Luz e para a visão de Seu Semblante. Tudo isto Eu te dou a conhecer e, por ti, a muitos outros, para que finalmente possas compreender quão infinitamen- te bom é o Amor que ainda sofre por fazer, incansavelmente, tanta coisa grandiosa e milagrosa para vós, desobedientes!
Assim, foi dado às terras o movimento em redor de seus sóis e em torno de seu eixo pelo sopro da Misericórdia do Amor, para prova de que os filhos devem organizar suas ações como o movi- mento das terras em redor dos sóis, e as luas em torno das terras. Os fracos devem ser quais luas, e os fortes como a Terra, e os renascidos como o Sol. Os fracos devem sentir a força do Amor que nunca os deixou cair enquanto se dirigiram constantemente para o Semblante do Amor, rodeando-O por todos os lados, em pequenas órbitas, mas que devido à força Dele também são atraídos à grande órbita. Os fortes devem ser qual Terra, movimentando-se independentemen- te para se prontificarem a receber da Luz e do calor da Graça do Amor que ilumina e aquece pela força dela, a fim de produzir frutos do Amor de toda espécie nos quais se possam saciar os fracos e se
confortarem os encarnados e renascidos. Os renascidos das águas do Amor Misericordioso, nas quais a Graça é perfeita, devem ser semelhantes ao Sol e sua luz deve iluminar por toda parte e seu calor aquecer os fracos e frutificar os fortes para alimento daqueles, para que haja uma comunidade entre os filhos de um só Pai.
E deves lançar mais profundamente o teu olhar a fim de saberes como e por que Eu tudo fiz e preparei deste modo! Vê, a lua possui manchas e muitos pontos escuros, e a Terra tem polos firmes e frios, montanhas altas e vales, fontes, riachos, rios, lagos e mares, grandes e pequenos. Tudo isto representa os efeitos do Amor e da Graça, ou seja, do correspondente calor e da luz, o eterno Amor e a Onipotência de Deus agindo por Ele. Observa, portanto, os fracos e a lua como se assemelham e compreenderás a natureza dela. Observa os fortes em suas atitudes e diante de teus olhos se desvendará a Terra. E de um polo para outro tem que existir a calma rígida do espírito no Amor para com o Amor, a fim de que tudo que circunda o espírito se possa movimentar numa constante ordem e agir deste modo para a finalidade conjunta da eterna conservação. Da calma tudo depen- de. Sem ela nada pode ser alcançado, e quem não for como os polos da Terra não penetra o seu íntimo, assim como faz a Linha entre os polos, atingindo o centro da mesma. E vosso amor tem que ser frio qual gelo dos polos para que sejais capazes de receber todo o calor do Amor Divino. Aquilo que é quente não se presta para a aceitação do calor. Mas, o que for frio em sua calma, está em condições de aceitar o calor em sua plenitude e fazer com que se irradie para todas as par- tes da vida. Quem recolhe o calor, ou seja, o Amor de Deus e o con- serva com firmeza, sem deixá-lo irradiar, é avarento e será dissolvido como gelo ao lado do fogo. Mas, quem o receber como os polos e o passar para todos que o rodeiam, terá o Amor Divino em sua justa posição e corresponderá à Vontade do Grande e Santo Doador.
Tal amor trará muitos frutos e se elevará para a luz da Graça,
podendo fitar constantemente as imensas profundezas das Criações do Amor de Deus, recebendo de olhos abertos os raios suaves do Infinito de Espaços incontáveis nos quais inúmeros seres da Mise-
ricórdia giram cada qual segundo sua espécie, e poderá incendiar-
-se diante de tamanho êxtase e alegria em seu amor para com o Amor, tornando-se qual sol de luz própria e semelhante à luz dos polos da Terra.
Quem, portanto, persistir no centro do Amor do conheci- mento, que é a Graça, fará com que seu íntimo se ilumine do amor de Deus qual equador terrestre e seus olhos brilhem pelo conheci- mento quais polos, e seus braços se movam como os rios, córregos e fontes, e suas ações fluirão para os Mares das Misericórdias Divinas, salgadas com a Graça e os conhecimentos do Amor e da Vida Eter- nos. Eis a chave para abrirdes e vislumbrardes a Terra que vos acolhe.
INTERPRETAÇÃODOS ASTROS
Agora ergue o teu olhar para o Sol, quadro fiel dos renasci- dos! Se observares atentamente, perceberás em breve se destacarem às vezes certas manchas em seu centro. Segundo vosso entendimen- to, trata-se de erupções internas, quais vulcões da Terra, e correspon- dem a rompantes da Ira da Divindade e pequenos vestígios de Seu Poder destruidor, que se manifesta dentro da Natureza por pequenas e grandes tempestades, de acordo com o tamanho das manchas. No entanto, o Amor estará sempre mais ativo em tais ocasiões, tudo amainando com a água da Misericórdia, e no próprio Sol agirá com grandes torrentes de água do mar ilimitado de Sua Graça Misericor- diosa. Deste modo, tudo é levado à máxima ordem, e, fora desta or- dem, na qual Eu sou o Próprio Amor Eterno desde eternidades, e da qual e pela qual tudo surgiu, nada poderá subsistir e se manifestar. Quem se afastar desta ordem pelo livre arbítrio agirá contra o Amor e a Vida, sucumbindo eternamente.
Viste, portanto, o Sol e compreendeste sua natureza simples, simplicidade essa necessária para que possa exercer sua finalidade dentro da ordem do Amor.
Volta, pois, o teu olhar para o renascimento do espírito, para o povo de Deus, para a lei do Amor, para a vida da liberdade na luz
da Graça surgida das águas da Misericórdia e, deste modo, o Sol flutuará revelado diante de teus olhos, sem ocultar qualquer fenda.
Mas, também o Sol tem seus polos, de onde sua luz e calor se projetam, partindo do centro da calma da Graça por toda sua exten- são. E se não tivesse sua calma polar, também não teria luz. A calma é indispensável à aceitação de luz e calor e tem que ser semelhante à calma do amor em Deus. Somente da calma vem a receptividade para a vida e luz.
Vossos desejos são quais ventos a vos rodearem com toda sorte de preocupações que impedem a infiltração da luz da Graça, quais nuvens impelidas, evitando que os raios do Sol venham a cair sobre a Terra.
Por isto não vos deveis preocupar, mas passar para Mim to- dos os vossos desejos e consequentes preocupações, para que tenhais paz e Eu possa influenciar-vos constantemente.
Assim como a Terra gira em torno de seu eixo polar, dentro de Minha Ordem provocada pelo Poder de Meu Amor, a fim de que todos os lados sejam iluminados, também as vossas ações devem partir de Meu Amor, que está dentro de vós desde vossa origem e segundo vossa capacidade, através do Verbo do Amor Eterno, na lei da Graça e da Misericórdia. Da mesma forma que a noite refresca a Terra, o Amor vos beneficiará e sereis iluminados qual dia terrestre pela luz do Sol da Graça.
Deveis ser semelhantes ao inverno, frio em sua calma, por isto mesmo mais capacitado à aceitação do calor até as mais profun- das regiões da Terra. E aquele que tiver atingido o inverno poderá aguardar a primavera, semelhante à primeira manifestação do amor dentro de vós; e o verão exuberante surgirá da vida do Amor que se tornou forte pela Graça; e em seguida se apresentará o outono se- reno com os frutos do Amor e da Graça, quando ingressareis como recém-nascidos na vida do Sol, a fim de vislumbrardes o Semblante de vosso Santo Pai, para iluminardes com ele todo o mundo pela imensa força da Graça, do Amor e da Misericórdia de um Pai suma- mente Bondoso e Santo.
Quem não for semelhante à Lua e não se tornar idêntico à Terra, não poderá ser um Sol, pois será qual cometa sem solidez e sua natureza será roubada das insuflações da Graça dos sóis, e sua trajetória será desordenada como os caminhos de ladrões e saltea- dores, e impelido pelo temor da luz, de uma profundeza cósmica a outra, sem jamais encontrar um pouso em toda a eternidade; e a luz o perseguirá em todos os seus caminhos iluminando suas torpezas.
Finalmente, suceder-lhe-á o mesmo que às estrelas cadentes expulsas da Graça em virtude de sua nulidade e sendo tragadas atra- vés do roubo da Graça; pois a luz roubada as destruirá eternamente, perdendo sua existência como os frutos que brotam prematuramen- te, antes de a luz os ter amadurecido, e não tendo solidez por causa da fraca união com o amor, enfraquecem paulatinamente, caem da árvore e são pisados e aniquilados.
Deste modo tens diante de ti sóis, planetas, luas, cometas e estrelas cadentes em sua natureza e importância, e cada partícula, do maior ao menor.
O espírito do Amor e da Graça está em vós em toda sabe- doria. Quem o ouvir penetrará em tudo e em todas as profundezas; perscrutará os mortos e eles lhe responderão; analisará os vivos e seu amor os confortará e sua luz os deleitará; encostará seu ouvido à terra e a erva lhe contará os segredos do amor; o solo lhe desvendará suas profundezas, as montanhas ouvirão sua voz e o som de suas palavras penetrará o âmago da Terra; olhando o mar, os raios de seus olhos iluminarão suas gotas e penetrarão em cada grão de areia; os espíri- tos ainda em julgamento afluirão à luz de seus olhos como fazem os peixes e os vermes do mar e das águas, quando à noite rodeiam uma tocha mantida na superfície; e se deixarão prender para salvação dos cárceres da noite eterna e reconhecerão o amor, podendo saciar sua sede nas águas da Misericórdia, surgindo da fraqueza para a força e para o poder do Amor do Pai e do Verbo, ou seja, o Próprio Amor do Pai e do Espírito Santo, a força em ambos.
Tudo isto e muita coisa mais o Meu Espírito vos ensinará se ouvirdes Sua Voz! A Voz Dele não é forte, mas muito suave e,
justamente por isto, tudo penetra, assim como o calor do Amor, a Luz da Graça e a Força do Amor Misericordioso de vosso Santo Pai.
PRIMÓRDIOS DE TERRA E LUA. CRIAÇÃO DE ADÃO E EVA
Quero demonstrar-vos a Criação orgânica, do primeiro ao último, do menor ao maior, como surgiu de Meu Amor e Sabe- doria e da Ordem eterna de ambos, ou seja, o Verbo do eterno Poder e Força na Profundeza da Divindade. Nada existe em todos os espaços do Infinito, seja grande ou pequeno, que não fosse fei- to por Ele.
Assim, apareceram a Terra, a Lua, o Sol e as estrelas, mas a Terra era vazia e sua superfície semelhante à do mar. Sobre as águas se achavam nuvens pesadas que penetravam profundamente nos es- paços mortos dos mundos, e a luz do Sol não podia iluminar a gota da Misericórdia. A Lua estava coberta pelo vapor da gota e neste vapor nasceu inteiramente a Terra, e a Lua foi por ele alimentada. E o Sol pousava por cima de ambas com os raios de sua luz, surgida do calor do Amor em Deus, amadurecendo a Terra e separando a Lua do seio materno.
Eis que as nuvens pesadas foram para o seu repouso nos polos e o equador ficou livre; o Sol se viu dentro das águas e a Terra refletia com gratidão a luz recebida do vasto regaço do Sol e viu, de olhos abertos, a Lua se banhar nos raios da Graça do eterno Amor do Sol.
E a Terra sentiu um indefinido bem-estar, pois foi preenchi- da com o Amor da Misericórdia e viu sua amada — a Lua — giran- do alegremente em torno de si. E o Amor encheu seu vasto seio com o bafejo da Misericórdia, como se quisesse mais uma vez oferecer à criança seu seio repleto de leite misericordioso. Todavia, o leite coa- lhou em virtude do calor do Amor Misericordioso e tornou-se con- tinente firme a erguer-se por cima dos mares. E esses recuaram para as profundezas e se tornaram semelhantes à água que se separa do
leite coalhado a fim de amainar a ira que nele existe, através do sal da Graça e da Misericórdia do Amor de Deus, em todo Poder e Força.
Com isto apresentou-se a calma sobre a Terra e em todos os espaços do Infinito de Deus, e o Amor se inclinou pela primeira vez, totalmente, para a Terra e soprou sobre a superfície. Este sopro continha uma infinidade de pensamentos em formas vivas de toda espécie para a futura salvação dos perdidos.
Eis que brotaram na parte sólida da Terra ervas, arbustos e árvores variadas. E os mares, lagos, torrentes, rios, cascatas e fontes estavam cheios de vermes, peixes e animais de toda espécie. E o ar foi vivificado por diversas aves. E o número de cada espécie, tanto nas águas quanto nos continentes e no ar, correspondia ao número do homem extraído deste número, idêntico ao número da Graça do Amor e semelhante ao número da futura salvação e do renascimento dali surgido.
Vê e assimila o que até hoje ninguém viu e compreendeu: o Amor eterno tomou o número de Si Mesmo, correspondente à Or- dem e à Lei eterna dentro Dele e da qual Ele Mesmo sempre existiu e existirá em todo Poder e Força da Santidade de Deus. E Ele tomou do barro, semelhante à nata do leite coalhado, e modelou com o Poder e Força de Sua Mão, segundo o número de Sua Ordem, o primeiro homem e soprou-lhe o hálito vivo pelas narinas. Este hálito transformou-se nele em alma viva que preencheu todo o homem, feito segundo o número da Ordem pela qual foram criados os espí- ritos, os mundos nos espaços e a Terra com tudo que nela existe, e a Lua e o Sol.
Este primeiro homem na Terra, surgido das Mãos do Poder e da Força do Amor eterno, foi cognominado pela boca da Graça Misericordiosa de “Adão” ou “Filho da Misericórdia e da Graça”.
Este Adão tomou o lugar do primeiro espírito caído; não lhe foi dado saber quem fora e, como nada encontrasse semelhante a ele, começou a enfadar-se.
E vê, o Amor eterno bafejou invisivelmente os olhos ainda cegos da alma e ele adormeceu pela primeira vez no encanto do
Amor Misericordioso. E o encanto deste Amor Misericordioso for- mou no coração de Adão, como num agradável sonho, uma figura semelhante, de grande encanto e igual beleza.
E o Amor eterno percebeu que Adão sentiu grande satis- fação pela percepção interna de seu segundo “eu”. Eis que o Amor Misericórdia o tocou do lado em que lhe fora dado um coração, semelhante ao Coração da Divindade, para a aceitação do amor e da vida do Amor em Deus e, com isto, tirou-lhe o amor-próprio a fim de preparar para Si Mesmo uma morada, pela futura lei da Graça Misericordiosa. Colocou o amor-próprio, no qual ele achou grande agrado, fora de seu corpo, chamando-o “Caiva” ou, conforme estais habituados a dizer, Eva, isto é, a salvação preparatória do egoísmo e o subsequente renascimento.
Neste instante o Amor Misericórdia o tocou para despertá-
-lo a fim de conhecer seu amor-próprio externado, e percebeu sua satisfação na visão de seu amor. E o seu amor externado, que se chamava Eva, regozijou-se com Adão, inclinou-se para ele, seguindo todos os seus movimentos.
E pela primeira vez o Amor eterno falou: “Adão!” E ele fa- lou, também pela primeira vez: “Aqui estou, Senhor da Glória, do Poder e da Força!”
E novamente o Amor eterno disse: “Vê tua serva!” E Eva respondeu: “Vê, Senhor, a serva obediente aos pés de Teu filho, aguardando as suas ordens!”
O Amor Misericordioso achou grande prazer nas obras de Seu Poder e Força, através da Graça da Sua Misericórdia, e ensinou-
-lhes tudo e todas as coisas, sua denominação e uso. Após terem compreendido e empregado tudo, o Amor Misericórdia lhes disse: “Aprendestes tudo, podendo tudo usar, com exceção de uma coisa que vos ensinarei: a capacidade para a procriação. Dela podereis fa- zer uso somente quando Eu voltar. Até lá ficareis com a veste da obe- diência, humildade, fidelidade e justa inocência. Ai de vós, caso vos encontre desnudos! Sereis expulsos, e a morte será a consequência!”
E o Amor eterno ocultou Sua Face e Se afastou, segundo o número da Ordem, por tempo determinado; e Se tornou cego por piedade, não querendo, nem podendo saber o que fariam os recém-criados, no julgamento da Divindade, como prova de sua li- berdade, pelo curto espaço de sua existência na Terra, através do Amor da Misericórdia. E o local que lhes fora dado para moradia no continente era um vale, um jardim que recebeu o nome de Paraíso. Tratava-se do país que posteriormente transbordaria de leite e mel, e o ponto que se chamou nos grandes tempos dos tempos das ações do Amor eterno, “Bethlehem”, e assim se chamará para sempre, lá onde pela primeira vez o Verbo Eterno Encarnado viu a Luz de Sua Graça iluminar a gota de Misericórdia, do Sol, da Lua e de todas as estrelas.
O desejo deles cresceu no julgamento da Divindade tentado- ra em Sua Ira. Havia uma árvore no jardim, carregada de belíssimas maçãs. Sentindo desejo de saboreá-las, Eva disse para Adão: “Tenho vontade de experimentar este fruto! Se quiseres, colherei um para prová-lo e oferecer-te como primeira dádiva de minha mão!”
Adão silenciou, meditando sobre as palavras de Eva. E uma voz interna, que era santa, pois vinha da Divindade dentro dele, disse: “Se comerdes do fruto dessa árvore morrereis!” E Adão tanto se assustou com isto, não podendo dar resposta à querida Eva.
Mas o desejo cresceu em Eva, levando-a junto da árvore para colher uma maçã. Adão percebeu que Eva se tornou infiel ao seu coração; por isto, entristeceu-se e disse: “Eva, Eva, que fazes? Ainda não fomos abençoados pelo Senhor do Poder, da Força e da Vida! Tens o fruto da morte em tuas mãos; atira-o longe para não morrer- mos na nudez, diante do Senhor da Justiça!”
Em virtude do rigor de Adão, Eva se assustou, deixando cair por terra o fruto da morte. O desejo a abandonou e ela ficou livre e Adão se alegrou da libertação das algemas da tendência mortí- fera de Eva.
Mas o desejo expulso do coração de Eva se encontrava no solo e transformou-se em uma grande serpente em virtude do Poder da Ira julgadora da Divindade. Tomando o fruto da morte em sua boca, ela rastejou em direção à árvore, envolvendo galhos e ramos, desde o tronco até a copa, dirigindo olhares fixos para Eva. Ela o percebeu e olhou para a serpente. Adão sentiu algo, sem, todavia, ver a serpente.
Eis que Eva se aproximou da mesma, fitando com grande prazer as curvas tentadoras em redor da árvore e as cores cintilantes de sua couraça escamosa e fria.
A serpente, porém, movimentou-se e deitou a maçã no colo de Eva, que se achava sentada. Em seguida, ergueu a cabeça e diri- giu-lhe as seguintes palavras: “Vê tua filha, expulsa por ti, a envolver a árvore do teu desejo! Não desprezes a simples prenda que coloquei em teu colo, mas saboreia sem susto o fruto de teu amor. Não mor- rerás, mas hás de te saciar para o conhecimento de toda vida, acima de Deus a quem temes, apesar de mais fraco que tu.” Neste instan- te, dividiu-se a língua da serpente e se tornou mais pontuda que uma flecha; e a serpente inclinou a cabeça no peito de Eva, como se quisesse beijá-lo com ingenuidade. Em seguida, arremessou flechas venenosas nos seios de Eva, que viu sua própria figura na serpente.
Nesta altura, Adão percebeu o que se passava debaixo da ár- vore e muito lhe agradou a segunda Eva, sem notar que era apenas uma serpente. Também ele se incendiou no desejo para a segunda Eva; tirou o fruto de seu colo, tornou-se infiel ao seu amor e sabo- reou o fruto proibido com ardente volúpia. Sentiu, porém, ser ele o primeiro anjo a se perder pela grande vaidade de seu egoísmo cego, no Reino da Luz do Amor eterno, caindo no mar da Ira da Divin- dade inclemente.
Quando sentiu a realidade, imenso arrependimento surgiu no fundo de seu coração e Eva envergonhou-se da sua nudez e da dele, e, atônita, cobriu-se com folhas de figueira. Também Adão pegou aquelas folhas para se cobrir e escondeu-se numa caverna, chorando lágrimas de dor. Eva ocultou-se atrás de um espinheiro e afligiu-se de sua culpa tentadora.
Eis que o Amor eterno tirou, pelo Poder e a Força de Sua Misericórdia, a venda de Seus Olhos da Graça, que tudo ilumina, penetrando na caverna onde Adão chorava, e atrás do espinheiro onde Eva se lastimava.
E as lágrimas de Adão foram guardadas no solo da Terra e se chamaram e ainda se chamam “Thumim” ou pedras, nas quais a Luz dos sete espíritos de Deus brilha figuradamente, tornando-se compactas pela Luz da Graça do calor do Amor, semelhante ao seu arrependimento justo, como recordação da Sabedoria luminosa. Fo- ram espalhadas por sobre todo o planeta, como prova confortadora do futuro renascimento, que deve ser idêntico a essas lágrimas de Adão, capazes de acolher a belíssima Luz do mar da Graça, do Amor eterno, devendo resistir a qualquer dureza da tentação do mundo.
E as lágrimas da tristonha Eva foram guardadas dentro da terra, atrás do espinheiro, rubras de vergonha pelo abuso do amor santificado de Adão.
O Amor eterno percebeu que cada lágrima de Eva era justa diante de Adão, filho do Amor Misericórdia, de sorte que o calor do Amor eterno transformou tais lágrimas em pedrinhas, cujo nome era “Urim”, prova simbólica da tristeza justa de Eva. Uma lágrima da inocência perdida caiu sobre o arbusto protetor e tingiu a sua branca flor. Conquanto as criaturas conheçam toda a flora da Terra, desco- nhecem sua verdadeira importância, em espírito e verdade, não o conseguindo até o renascimento espiritual, ou seja, a Misericórdia do Amor eterno através da Graça da salvação.
Ouve mais um segredo, que deve ser compreendido por cau- sa do orgulho ultrajante dos filhos do mundo: Duas flores do arbus- to foram fecundadas por meio da lágrima justa da inocência de Eva e conservaram sua bênção através de todas as tempestades, durante as grandes Guerras de Jehovah com os povos da Terra, e vivificaram a mulher de Abraão na época da libertação da Graça do Alto para exemplo da grande Obra do Amor Misericordioso, e também vivi-
ficaram a mulher de Zacharias para a verdadeira realização da maior de todas as ações do Amor de Deus.
Agora volta teu olhar para Adão e Eva, visitando-os Comi- go e vê como Eu, o Eterno Amor, os encontrei desnudos, abando- nados, chorosos e tristonhos de arrependimento e vergonha justos, chamando-os para junto de Mim.
Mas eles não se atreveram a olhar o Semblante de seu Pai, pois estavam apavorados diante do trovão do julgamento mortal, do fundo da Ira de Deus.
E as chamas da Ira Divina, do Deus Infinito, se atiravam pelos espaços infinitos à Terra, onde o grande Amor Se encontrava junto de Seus filhos caídos e arrependidos, criados por Sua imensa Graça.
Por causa do arrependimento e tristeza dos filhos, travou-se uma luta renhida entre o Amor Misericordioso e a Divindade, que tudo queria destruir para resgate de Sua Santidade incorrupta.
As chamas da Ira da Divindade se precipitaram mais veloz- mente que os raios para a Terra, penetraram em seu centro, incen- diando-a em todos os pontos. E as labaredas destruidoras atingiram a Lua e o Sol; sim, alcançaram todas as estrelas! O Infinito imen- surável tornou-se um mar de fogo e trovões terríveis retumbavam pelos espaços, e a Terra chorou e o mar bramiu, a Lua clamou e o Sol lamentou-se e as estrelas gritaram mais fortemente que os trovões, diante da expectativa de sua eterna destruição. E suas vozes ecoaram das profundezas infindas da Ira Divina, clamando: “Grande e Subli- me Deus, aplaca Tua Ira, apaga as chamas aniquiladoras da Tua justa fúria e poupa os inocentes, em Tua Santidade. Pois o fogo de Tua Ira destruirá os justos e aniquilará o eterno Amor em Ti e algemará a Ti Mesmo, em Teu Poder imenso e na Tua Força de Majestade!”
Vê e ouve, de olhos e ouvidos abertos, o que falou a Divin- dade irada. Suas Palavras eram somente entendidas pelo Amor Eter- no, que durante a explosão da Ira Divina protegia o casal arrepen- dido e repelia a chama destruidora na Terra, para que não atingisse o local de remorso de Adão e o ponto de tristeza de Eva, através do Poder e Força de Sua Misericórdia.
Ouve as palavras de horror saídas da profundeza da Ira Di- vina: “De que Me adiantam o choro e o desespero da Terra, o clamor da Lua, o lamento do Sol e os gritos das estrelas? Fui abandonado por Meu Amor que Se tornou infiel e Se afastou de Mim para a dupla escória da Terra! Que farei sem Ele? Por isto, quero destruir as Suas Obras, desde o fundamento, para que nada possa desviar e afastar o Meu Amor de Mim, por todas as eternidades! Quero ser Deus Único, para todos os tempos, como fui desde eternidades. E tu, edificação corrupta da Criação de Meu Amor enfraquecido, deves ser destruída para que Eu possa reencontrar o Meu Amor e fazê-Lo forte pelo Poder e Força de eterna Santidade. Amém!”
Neste instante, os laços das criações se desataram nos es- paços do Universo Divino, e os destroços despencaram sob imenso fragor para dentro das profundezas, ou seja, a própria Terra, que repousava destroçada no seio do Amor Misericordioso.
Os neocriados tremiam de pavor diante dessa cena terrível, cuja extensão jamais um espírito criado poderá conceber em sua plenitude, pois era infinita.
Presta atenção ao que disse e fez o Amor; fita as grandes ações de Sua Misericórdia e ouve as Suas Palavras: “Grande e Onipo- tente Deus de todo Poder, Força e Santidade! Retira a Tua Ira, apaga o fogo de Tua fúria destruidora e ouve com a calma de Tua Santi- dade as palavras de Teu eterno Amor, que é Tua Única Vida em Ti, eterno como Tu, Poderoso e Forte como Tu, por Ele e Ele por Ti, e não queiras destruir a vida Nele e, através Dele, a Ti Mesmo, e aplica a Graça em vez da Justiça e aceita a satisfação dada pelo Amor. Exige penitência pela ofensa e ultraje à Santidade ofendida e ultrajada, e não haverá sacrifício grande demais que possas exigir para tal fim!”
Ouve o que sucedeu em seguida e o que retrucou a Divin- dade, pois o fogo abrandou e dos espaços começou a soprar uma brisa suave, mesclada de trovões ainda fortes, produzidos pelos destroços do mundo que estremeciam pela combustão quais raios enormes. E o Amor entendeu o trovão de Deus, que dizia com impetuosidade:
“Porei a culpa em Ti, assim como depositei os destroços sobre a Terra e hás de apagar o ultraje de Minha Santidade, a eterna união entre Mim e Ti! Amaldiçoo a Terra a fim de que não haja uma mácula a vilipendiar a Minha Santidade e Eu não Me torne como Tu, um Deus sem Santidade. Esta maldição será debitada à Tua cul- pa, que terás de aceitar para pagar por Minha Santidade e lavar da Terra, com Teu Sangue, a vergonha e o pecado de Adão!”
E eis a resposta do Meu Amor: “Grande e Santo Deus de todo Poder e Força! Que se faça segundo Tuas Palavras!” Naquele momento apagou-se subitamente o fogo sobre a Terra e nos espa- ços da Criação. E os destroços dos sóis, mundos e luas foram de novo reunidos pelo Poder e Força do Amor atendido por Deus e se reorganizaram como eram desde o início. Todavia, conservaram para todos os tempos os vestígios de sua destruição, semelhantes aos estigmas do Amor Eterno que, posteriormente, sangrou para todos, na grande era das eras.
E também caíram destroços de outros mundos nas planí- cies e nos mares da Terra, como prova do Poder e Força de Deus e igualmente como testemunhas expressivas das ações do Amor Mi- sericordioso.
Ouve o que sucedeu em seguida: Quando o Amor Eterno aceitou as exigências e, com isto, deu satisfação antecipada à Santi- dade de Deus, a Divindade externou, em sussurros apenas audíveis ao Amor, Sua Santa Vontade, dizendo:
“Tua imensa Misericórdia chegou aos Meus Olhos, que tudo veem, e percebi, na calma de Minha Santidade, Tua Sinceri- dade e Fidelidade eternas e contei as lágrimas de remorso de Adão e as lágrimas de tristeza de Eva, e Me compadeci por Tua grande Misericórdia.
Por isto, retirarei agora os Meus julgamentos, espargindo Graça em plenitude em vez de Justiça e hei de reparar o dano que eles provocaram. Além de Mim, não há quem possa reparar algo, porque não há quem seja bom, senão Eu, o Santo Pai. Pois este será o Meu Nome para o futuro, eternamente. E Tu, Meu Amor, és o
Meu Filho. E a Santidade — como união ativa da Força entre Nós e tudo que surgiu de Nós — é o Espírito Santo que deve preencher os espaços e universos, para todas as eternidades. Amém. Isto diz o Bom e Santo Pai. Amém.
E agora, Meu amado Filho, dize ao casal arrependido e en- tristecido — grava-lhe isto profundamente nos corações — que de- vem manter os mandamentos do Amor e da Misericórdia até o fim da vida. Eu lhe darei um Mediador para determinada época, a fim de eliminar a culpa e diminuir o enorme peso de sua desobediência.
Até lá devem esperar com paciência e humildade, e o pão, que atualmente proporciono apenas parcamente, devem saborear, gratos, no suor de seu rosto, não podendo saciar-se até a época do Mediador, que despertarei de seu meio, perfeito e bom, assim como Nós somos Perfeitos, Bons e Santos eternamente.
Acrescenta que sustei os Meus Julgamentos apenas para aqueles que cumprirem rigorosamente Meus severos Mandamentos. Os infratores serão ameaçados para sempre com o rigor da Santa e Eterna Verdade, cujo cumprimento se dará na menor infração!
Isto diz o Santo e Bom Pai, através de Seu Filho — o eterno Amor dentro Dele — e por meio do Espírito Santo, como Graça eficaz de Nós Ambos, para o futuro perdão do pecado que agora há de castigar o seu físico e futuramente provocará a morte temporária para a conquista da Vida, após o desprendimento do corpo, quando tiver aparecido o Mediador. Isto diz o Pai, Santo e Bom. Amém, Amém, Amém.”
CONCILIAÇÃODO SENHOR
Presta atenção e compreende o que disse e fez o Amor eter- no. Quando o Bom e Santo Pai terminou Seu Pronunciamento, anunciando Graça por Justiça e determinando o julgamento para infratores da lei, e morte para o pecador, o eterno Amor Se comoveu até o âmago de Seu Coração Misericordioso e, pela segunda vez, derramou lágrimas de piedade, de imensa alegria e êxtase sublime,
diante da Graça do Santo Pai, dizendo em Sua grande emoção para Adão e Eva:
“Adão, acabaste de presenciar os terríveis julgamentos de Deus, e Eva os sentiu por teu intermédio. Mas, agora, abrirei os olhos e ouvidos dela, que — como todos que dela surgirem, segun- do o número das estrelas no Céu, das ervas na Terra e dos grãos de areia no mar, que é infinito — há de ver e ouvir, de olhos e ouvidos abertos o que fez a Divindade em Sua Ira julgadora e a ação do Amor eterno em Sua Misericórdia Infinita.
Gravei a Lei em teu coração, assim como a deves gravar no coração de Eva. E, como prova de advertência para vós e todos que vos seguirem, dos julgamentos de Deus em virtude de vosso pecado, farei aparecer, cá e acolá, montanhas que hão de queimar alterna- damente até o Fim dos Tempos, e deixarei o raio que vos fará lem- brar a antiga destruição e o subsequente trovão a vos transmitir com violência o Nome do Grande e Poderoso Deus, se puderdes um dia esquecê-Lo.
E as lágrimas da piedade e da alegria do Santo Pai, Eu colo- quei, como prova eterna, ao redor do imenso Espaço do Céu, que deverão iluminar todas as noites da Terra, confortando-vos no alvo- recer e transmitindo a chegada do dia vindouro.
Ergue o olhar para o Céu: elas brilham em ordem e esplendor variados — as de luz vermelha como sinal de Minha Piedade, e as de luz branca como prova de alegria pela Graça do Santo e Bom Pai. E a tira larga, esbranquiçada, sobre as estrelas da Piedade e da Alegria, compostas de estrelas primitivas e surgidas da lágrima do Amor Mi- sericordioso que Se apiedou, já naquele tempo, dos espíritos caídos, tira esta que passa pelo Universo, vos sirva como prova da União eterna e santa entre o Amor Eterno que vos criou e a tudo que existe, e a Divindade que tudo julga, segundo Sua Santidade.
Dirige o teu olhar, Adão, e também tu, Eva, para o Meu Olho esquerdo sobre o Meu Coração que, radiante, se projeta suavemente para o vosso olho direito, e vede mais uma lágrima presa à pálpebra. Esta lágrima é maior que todas que deste Olho foram vertidas.
Lá, onde a grande tira na abóbada celeste parece dividida, de- veis olhar com frequência, gratos e profundamente comovidos, pois aquele ponto vos servirá, bem como a toda a Criação, como prova eterna de vossa traição Comigo e de Minha violação com a Santida- de Divina, por Misericórdia convosco. A tira deve, no ponto em que parece de novo atada, recordar-vos da mediação do Amor Eterno, que Sou de eternidades, entre a inviolável Santidade de Deus e vós, que pecastes diante de Seu Semblante. De lá se origina esta lágrima.
Esta lágrima surgirá para vós e vossos descendentes como bela estrela matutina que iluminará todos os povos da Terra a vos se- guirem nas pegadas arrependidas e entristecidas. Antes disso, lavará a Terra do lodo pestilento do pecado e purificará vossas lágrimas do remorso e tristeza, da imundície da serpente.
Deixarei esta lágrima cair numa flor branca desse arbusto, entre as duas flores já fecundadas de Eva, e dela deverá nascer, no futuro, uma mulher pura que terá de pisar a cabeça da serpente. Esta a morderá no calcanhar, mas o veneno não há de prejudicá-la. Dela surgirá o que ora está diante de vós, isto é, uma bela estrela matutina para todos os povos de boa vontade, e o julgamento eterno para todos os filhos renitentes da serpente.
E os espíritos do Seio da Santidade do Pai descerão fisica- mente para a Terra e transmitirão para os vossos filhos a época gran- diosa e a maneira pela qual se dará a Chegada Daquele que ora está diante de vós. Por ora ainda O ouvis e vedes; mas, no futuro, assim não será até a Chegada prometida do Santo Pai, promessa feita por Mim, Seu Eterno Amor.
Acabastes de ouvir o que necessitáveis para receberdes a Minha Bênção! Sede abençoados pela Mão do Poder e da Força do Eterno Amor do Santo Pai e da Força do Espírito, que é Santo por Nós Dois. Multiplicai-vos e preenchei a Terra com o fruto vivo desta Bênção!
Sempre que vos unirdes em virtude desta Bênção, ofertai-
-Me antes vossos corações! Se assim não fizerdes, a serpente que ain- da vive e viverá eternamente na Ira de Deus corromperá o fruto em
vós, e tu, Eva, e todas as de teu gênero, tereis um fruto corrupto ao invés de abençoado. Haverá de aniquilar os filhos da Bênção e da Luz, em grande número, não havendo fim para sua fúria e devas- tação. Deste modo, passareis o pecado como herança para todos e vossa culpa se tornará evidente até a grande Era das eras, e também depois dela.
O sacrifício de vossos corações para receber a Bênção deve ser um ofício santificado, e sois obrigados a fazer por Mim sempre que vos aproximardes para recebê-lo. Este novo e fácil Mandamento que acabais de ouvir de Minha Boca será a primeira Igreja fundada por Mim, em Minha memória, recordando-vos das ações do Amor Eterno, para reconduzir-vos ao santo temor de Deus.
Hei de enviar-vos um espírito sem pecado, do Alto, com uma espada flamejante na mão, que vos guiará e mostrará a Terra toda, de um ponto a outro. Orientar-vos-á acerca dos desvios do mundo, mas também vos castigará se vos desviardes de Meus Cami- nhos. Isto tudo diz o Eterno Amor, em Nome do Santo Pai. Amém.”
NASCIMENTODECAIME ABEL
E eis que desapareceu o Amor diante dos olhos das criaturas, voltando para o Santo Seio do Pai. — Ouve, servo preguiçoso e ain- da surdo: sou obrigado a ditar-te cada palavra separadamente sem que Me compreendas, perguntando-Me uma, duas, cinco e até dez vezes, levando-Me a repetir o que fora dito. Sê mais atento, para que o progresso seja mais rápido, pois em breve o mundo necessitará da conclusão desta Obra de Minha Graça!
Prossegue, pois. Quando o casal se achava sozinho na Terra vasta, apareceu o anjo prometido com a espada flamejante na destra. Ao defrontá-lo, ambos se assustaram de tal modo que fugiram de seus olhos, tremendo profundamente.
O temor precipitou o tempo de Eva que, com dores, deu à luz o fruto proibido que a serpente nela havia depositado pela ce- gueira de Adão. Vendo o rebento desnudo, parecido com ele, sentiu
grande alegria. E Eva, notando a satisfação de Adão, apertou contra o seio o fruto de seu amor.
No mesmo instante ela sentiu uma pontada no peito, seme- lhante à da serpente, e depositou-o na terra, apavorada, crente de ter novamente pecado. Eis que surgiu o grande anjo, de feição suave, que disse com voz firme:
“Não temais o servo de Jehovah que veio do Alto para mos- trar-vos a Terra e esclarecer-vos os desvios do mundo — mas tam- bém castigar-vos e a vossos descendentes se vos arredardes dos Ca- minhos do Amor Eterno e da Infinita Santidade de Deus.
Este fruto não mais representa pecado para vós. Todavia, é a consequência da tríplice desobediência a Deus, e é a morte de vosso corpo, criado em vossa carne, pelo desejo egoístico. Não podeis ati- rar para longe este fruto, mas deveis conservá-lo para testemunho e humilhação de vós mesmos a fim de que saibais que por vós veio o pecado, e pelo pecado a morte ao mundo. O fruto deve ser chamado ‘Caim’, ou ‘portador da morte’.”
Acalmada pelas palavras do anjo, Eva apanhou o filho em suas mãos ainda trêmulas e ofereceu, a mando de Adão e através do anjo, o seio, para ele absorver, por ela, a vida da Terra.
E o anjo postou-se à esquerda de Adão, e Eva, com o filho no braço direito, postou-se ao lado direito de Adão, a fim de que seu coração ficasse livre de qualquer peso e voltado para ele em qualquer circunstância.
Assim, eles caminharam exemplarmente por toda a Terra, para ver os lugares e construir habitações para os futuros descenden- tes e semear-lhes o pão, através do Poder e da Força dada pelo Amor, e a Graça da Misericórdia.
A terra e tudo que comportava era submissa à vontade de Adão, e o mar e todas as águas obedeciam ao seu mais leve aceno, desde a superfície até as profundezas, oferecendo sua superfície aos pés de seu senhor, podendo ele caminhar à vontade sobre ela. Os ventos lhe eram submissos e os animais das águas, da terra e do ar lhe obedeciam.
Adão estranhava o poder dentro de si, reconhecendo o quanto o Amor Eterno lhe havia facultado, de sorte que se alegrou sobremaneira, dizendo para Eva: “O Senhor do Poder e da Força nos abençoou. Vamos ofertar-lhe nossos corações para que Sua Bênção prospere sobre a Terra, segundo Sua Promessa, e por ti possa vir a Luz da Graça, como novo habitante desta paragem!”
Cheia de humildade e alegria, Eva respondeu: “Adão, vê tua serva a teus pés, aguardando o aceno de seu senhor da Terra. Estou pronta a obedecer à tua vontade. Aceita o meu coração culpado e oferece-o ao Senhor!” E Adão agiu, segundo a Ordem do Senhor, com toda devoção Nele. Não demorou a tornar-se visível a Bênção em Eva, e ambos muito se alegraram. Ouve o que o anjo de Jehovah disse ao feliz casal, porquanto suas palavras formais provinham do próprio Amor que falava pela boca do anjo, dizendo:
“Adão, acabaste de conhecer muita coisa na longa viagem sobre a Terra. Viste os continentes e mares, tudo que comportam; o mamute e todos os animais, até o menor verme; o tubarão e todos os seres aquáticos até os pequenos habitantes da gota d’água; as aves, da águia ao rouxinol, e deste ao menor inseto; experimentaste suas forças e utilidades, deduzindo daí quão regiamente o Eterno Amor cuidou de ti e de Eva.
Dirigias-te às montanhas, e elas te respondiam; perguntavas ao mar, e ele te respondia; voltavas tua voz para a profundeza da Terra, e não ficavas sem resposta. Dirigias o som de tua voz à flora, e as ervas e arbustos te diziam o nome e sua utilidade para vosso livre uso. Do mesmo modo respondiam os animais, cada qual segundo sua espécie, demonstrando até que ponto se destinavam a teu servi- ço, obedecendo cegamente tua vontade. E os ventos te ensinavam como usá-los, e tudo isto Eva também aprendeu.
Vê, Adão, e também tu, Eva; isto tudo não vos foi dado como a vida por parte do Amor Eterno, pois foi Sua imensa Graça que vos presenteou; tu, Adão, terás tal dádiva enquanto dela fizeres bom uso, segundo a Vontade do Santo Pai. Todavia, se afastará do âmbito de teu poder se não mantiveres tua alma pura diante da Face
de Jehovah. Sê, portanto, sábio, assim como o é o Santo Pai acima de todas as criações e nas profundezas das mesmas!
Deste modo, mantendo-te dentro da Vontade de Deus com tua própria vontade, deverão ser teus descendentes e os de Eva, con- forme ora é sob os teus olhos.
Se alguém for como és e deves ser futuramente, conservará a dádiva por certo tempo. Caso contrário, o prêmio da Graça lhe será tirado. E os próprios descendentes de Eva se elevarão, tornando-se infiéis até a medula, seguindo os cães e se alimentando dos detritos das serpentes e seus filhos se nutrirão nos seios das cobras. Teus des- cendentes serão envenenados, morrendo amargamente, e espiritual- mente sucumbirão em eterna vergonha e opróbrio torturante.
Por enquanto ainda estais no Paraíso, onde o Amor Eterno vos colocou antes de vosso pecado e antes da destruição. Se, porven- tura, não acatardes fielmente as Leis do Amor e os Mandamentos da Sabedoria do Santo Pai, sereis expulsos deste maravilhoso jardim por esta espada flamejante, não podendo reingressar durante vos- sa existência, tampouco um de vossos descendentes, até a época da Promessa, mas somente após serão admitidos os filhos da salvação e das consequentes novas criações do Amor Eterno.
Gravai bem! O fruto que surgir de ti, Eva, será chamado por Adão, de Abel, e deve ser sacrificado ao Senhor, para sempre, pois seu nome representa ‘filho da bênção’ e primeiro exemplo Daquele que, no grande Tempo dos tempos, virá de cima, do Seio do Poder e Força da Santidade de Deus.
Após vos ter guiado, mostrado e dito tudo segundo a Von- tade do Amor Eterno, cumpri minha missão e sou obrigado a vos deixar visivelmente. Invisivelmente vos acompanharei, passo por passo, contando-os conforme a Vontade imutável de Jehovah.
Serei visto por vós sempre que sacrificardes vossos cora- ções ao Senhor da Glória. Colherei vosso sacrifício em uma taça e a levarei para junto de Deus e despejá-la-ei diante do Semblan- te do Filho, havendo grande regozijo por parte do Santo Pai em vossas obras.
Mas também havereis de me ver se vos afastardes da Lei do Amor e do Santo Pai, conforme me vedes com a espada flamejante na mão direita, para vos expulsar do jardim. Tirarei de ti, Adão, grande parte das dádivas do Amor Eterno a fim de te deixar fraco e temeroso diante do menor ruído de uma erva.”
Vê, cego escritor desta Minha Palavra nova e viva, que se acha em ti como em vós todos, e observa como Adão era perfeito no Paraíso, com exceção de uma coisa, e como era perfeito senhor da Terra. Todas as suas perfeições eram apenas uma dádiva Minha que ele conservou até que uma só vez se esqueceu de Mim, depois que o anjo se tornou invisível.
Tudo aquilo que pertencia a Adão Eu vos darei como dádi- va constante, e muita coisa mais e infinitamente maior, ou seja Eu Mesmo, e tudo que é Meu será vosso, caso vós Me ameis e nada mais do que a Mim.
Mas, onde está o vosso amor, adquirido por Mim com tan- to sacrifício e que desejo considerar eternamente Meu? Esse amor não existe mais sobre a Terra. Ele é tão suave e meigo, e não o que- reis, nem o procurais, preferindo desprezar o seu grande valor!
PROMESSADO SENHOR
Ó filhos de Adão, por que não preferis vos tornar Meus fi- lhos? Quanto esforço e trabalho vos custa conseguir o pão de Adão, coberto do suor de vossas mãos e manchado da baba das serpentes e saturado do veneno dos ofídios, para que a morte temporal e eterna vos alcance pela intemperança!
O MeuPão é untado com o mel do Meu Amor e saturado com o leite da Minha Vida eternamente livre, que podereis sabore- ar em plenitude, jamais vos podendo prejudicar, pois somente vos fortificaria e dotaria de todo Poder e Força provindos de Mim, caso o quisésseis aceitar. Logo após Minha maior Ação, ou seja, a grande Obra de Salvação para vós, este Meu Pão ainda tinha preço muito elevado e as criaturas só podiam adquiri-lo através de seu sangue sa-
crificado para Mim, e sua vida e seu sabor naquele tempo era amar- go na boca dos compradores e não estava untado com o mel do Amor e saturado com o leite da vida liberta, pois isto era dado por acréscimo aos compradores entristecidos somente no mundo dos espíritos. Ainda assim, havia grande número de interessados!
Agora, porém, que quero dá-lo a todos que o desejarem, com leite e mel, apenas pelo pequeno preço do vosso amor, é ele despre- zado e seu Doador desdenhado!
Gravai bem: Mandei abrir agora as portas dos Meus Céus. Que venha imediatamente quem quiser, pois chegou o grande mo- mento da Graça e a Nova Jerusalém desceu para junto de vós à Terra. Todos os que Me amam poderão tomar morada e se saciarem com pão e mel, e beber em grandes haustos a água pura da Vida, que pode ser colhida no eterno poço de Jacó.
Embora a descida dessa Minha grande Cidade seja uma Gra- ça imensurável para todos os Meus filhos, ela há de soterrar com seus fortes muros todos os cegos e esmagar todos os surdos, pois sua extensão ocupará toda a superfície da Terra! Quem não a vir descer e não ouvir o seu rugir através dos ares puros do planeta, jamais en- contrará um lugar para se ocultar e se desviar de seu peso.
O peso de seus palácios dizimará as montanhas, igualando-as às planícies e porei as moradias em cima das poças e brejos. Todos os animais que rastejam no interior serão esmagados no solo pelos alicerces das moradias da grande Cidade de Deus, vosso Santo Pai no Céu e na Terra.
O verdadeiro Pastor chamará Suas ovelhas, que ouvirão e re- conhecerão Sua Voz em todos os pontos da Terra e se deleitarão nos extensos pastos do Pai, ou seja, nos jardins da nova e santa Cidade do Grande Rei de todos os povos que existiram, existem e ainda existirão.
Tais jardins representarão o Paraíso perdido por Adão, por Mim encontrado e fielmente guardado para morada eterna. Por este motivo vos mostrei minuciosamente a Minha Criação, desde eterni- dades, explicando-a desde o início até o fim, mostrando o primeiro
homem em sua origem e o mostrarei até a morte. Apontar-vos-ei a grande prostituta e a Babilônia destruída e em seguida vos levarei à Minha grande Cidade, para dar-vos uma morada eterna, se Me amardes como vos amo.
Vede o Céu e a Terra! Hão de desaparecer fisicamente para existirem apenas em espírito. Mas, toda palavra dirigida a vós, atra- vés de Minha Boca, subsistirá material e espiritualmente com todo Poder e Força da Santidade. Amém.
EXPULSÃODO PARAÍSO
Voltemos a Adão e Eva para vermos sua vida e a dos seus descendentes diante dos Olhos de Jehovah. Durante mais ou menos trinta anos o casal viveu em meio de seus descendentes abençoados, cujo número era idêntico ao dos anos, com exceção de Caim, que não fora abençoado.
Quando, num dia do Senhor — ordenado em seu coração pelo próprio Amor Eterno, e repetidas vezes recordado pelo anjo para memória dos grandes feitos do Amor Misericordioso e venera- ção da imensurável Santidade Divina — Adão passeava sozinho num certo trecho da Terra a fim de apreciar a beleza da zona, tal foi seu prazer com o mundo, que seus pensamentos se afastaram de Deus.
Deste modo distraído, ele chegou às margens de um grande rio chamado “Eheura”, ou seja, “lembra-te do tempo de Jehovah”, pois assim falava o rio rumorejante; mas, Adão, absorvido pelos pen- samentos do mundo, não entendia a fala do rio.
Prosseguindo pela margem, seu pé esquerdo subitamente emaranhou-se numa planta que rastejava sobre o solo e se enroscava em uma grande árvore, e ele sofreu uma queda, sentindo dor pene- trante, sensação inteiramente nova para ele. Revoltado com a planta, ele a fitou com raiva, perguntando-lhe se desconhecia o seu senhor.
A planta respondeu: “Não, não te conheço!” Analisando-a de perto, ele também constatou que não a conhecia, por isto indagou: “Como te chamas e qual é tua utilidade?”
Um vento agitou as folhas e o rumor lhe disse: “Colhe os bagos de meus galhos, espreme o sumo e sorve-o, que meu nome e utilidade te serão revelados!”
Cego pelos pensamentos mundanos, Adão fez o que lhe aconselhara a planta e, em seu esquecimento do Dia do Senhor, tomou alguns bagos e achou-os muito doces. Satisfeito com o novo conhecimento, intimamente reclamava do anjo por não lhe ter apontado planta tão saborosa.
Colheu muitos frutos e levou-os para casa, onde chegou ao pôr do Sol. Eva e Caim vieram ao encontro dele, os únicos preocu- pados com sua ausência, pois os outros sabiam onde se encontrava e não se preocupavam com ele no Dia do Senhor. Como filhos aben- çoados, seus pensamentos eram absorvidos por Deus e Seu Amor Eterno, e assim aliviaram o transporte dos frutos. Contou como fez a nova descoberta e Eva muito se alegrou, ajudando-o a extrair o suco dos bagos.
Em seguida, Adão tomou o suco e disse: “Vamos experimen- tar seu efeito!” Bebeu em grandes goles o suco e o passou para Eva, Caim e a todos os outros, com exceção de Abel, ausente, porquanto o fogo ainda ardia no altar por ele construído.
Assim se embriagaram Adão, Eva e todos os que sorveram o suco e, nesta embriaguez, foram possuídos pela volúpia, caindo na pior luxúria e impudicícia, enquanto Abel orava no Altar de Jehovah.
Quando terminou tal ato ignominioso, apareceu o anjo com a espada flamejante e disse, amável, para Abel: “Jehovah sentiu grande agrado com o teu sacrifício, de sorte que te designou para salvador de teus pais e irmãos, pois, sem isto, teriam perecido no Dia do Senhor, em que O esqueceram e inclinaram suas almas para o solo, não podendo participar da Bênção que neste dia é sempre espargida do Alto para todos os espaços do Universo!
Por isto, vim visivelmente, primeiro, para colher o teu sa- crifício nesta taça da Graça Misericordiosa, que é o Filho Eterno no Pai, e levá-lo diante de Seu Semblante Santo. Antes, porém, tenho de castigar os infratores da Lei do Amor e do Mandamento da Graça
e tirar-lhes grande parte das dádivas, castigá-los com a cegueira e expulsá-los do Paraíso.
Abandona o teu altar de sacrifício e posta-te à minha es- querda a fim de que fique livre a direita para punir os infratores, e segue-me para a morada do pecado. Após eu ter despertado os pecadores adormecidos no delírio da impudicícia e eles, tomados de pavor, fugirem diante da espada da justiça, deves segui-los como fu- gitivo levando para teus pais uma pequena parte da dádiva perdida, entregando-a para fortalecê-los no local em que tombarem exaustos, num país não distante, chamado Ehuehil, ou País do Abrigo. Lá erigirás um altar que há de arder também debaixo das águas que virão sobre todo o planeta. Tornar-se-á uma montanha invencível para qualquer ser humano, até a grande época das épocas, em que ela curvará seu cume para a planície que se chamará Bethlehem, ou a pequena cidade do grande Rei, que um dia será a maior da Ter- ra, pois sua luz brilhará mais que todos os sóis. Naquele novo altar ofertarás um sacrifício ao Senhor de todos os países da Terra, para que se torne saboroso para os pecadores, fortifique os arrependidos e console os tristes!”
Após ter dirigido estas palavras a Abel, o anjo e ele se diri- giram à morada de Adão, perto da caverna do arrependimento e do arbusto da tristeza, com duas entradas, uma para o Norte e a outra para o Sul e que consistia de cedros muito altos, cuja forma se asse- melhava ao templo de Salomão.
Precisamente à meia-noite, pois não podia ser antes por cau- sa do Dia do Senhor, o anjo chegou ao limiar Sul e Abel começou a chorar em virtude da grande desgraça que havia de atingir os seus.
Com meiguice, o anjo lhe disse: “Não chores, filho pleno da Graça, e faze o que te mandei por Ordem do Amor Eterno e não te assustes com as palavras que, quais trovões, atingirão os pecadores adormecidos.”
Ambos se aproximaram e o anjo pronunciou palavras de terror, dizendo: “Adão, levanta-te, considera tua culpa e foge, pois não podes permanecer aqui! Perdeste o Paraíso para ti e os teus des-
cendentes até a grande época de todas as épocas, e também perdeste grande parte das dádivas por esqueceres o Dia do Senhor, embria- gando-te com o suco de uma planta, verdadeira obra de arte da ser- pente para tolher tua liberdade, enroscar os teus pés e perturbar os teus sentidos, levando-te a esquecer Deus e fazendo-te adormecer no vil pecado.
Foge para onde quiseres do Semblante do Amor! E para onde quer que fugires haverás de encontrar a Ira justa de Deus, en- quanto a parte do Amor te será dada com parcimônia.”
Eis que Adão se levanta com Eva e todos os que dormiam em virtude do aturdimento produzido pela planta da serpente, per- dendo tudo, com exceção de Abel, que considerara o Dia do Senhor. Assim também vós deveis, como filhos verdadeiros do Santo Pai, considerar constantemente a abençoada paz do Sábado como Dia do Senhor, cumprindo o Seu Mandamento.
Quando Adão notou a presença do anjo, assustou-se sobre- maneira e todos sentiram o mesmo pavor, de sorte que não conse- guia proferir uma palavra para desculpar-se, pois começava a perce- ber o que ele e os seus haviam praticado diante da Face de Jehovah.
Atirando-se ao solo diante do anjo do Senhor, ele chorou e clamou por Misericórdia, pois a espada flamejante lhe abrira os olhos e ele via, nesta luz da justiça punidora, o peso e a exten- são da desgraça na qual ele havia caído e atirado os seus, pela sua leviandade.
Mas, o anjo estava de olhos e ouvidos tapados, conforme ordenara o Amor Eterno, e falava mais alto que todos os trovões: “Na justiça não há Graça e no julgamento não existe liberdade. Foge, portanto, impelido pela Justiça punidora a fim de que não te atinjam os Julgamentos de Jehovah! O castigo é o prêmio da Justi- ça. Quem aceitá-lo conforme o merece, pode contar com a Mise- ricórdia. Mas, quem reagir contra a Justiça e suas consequências, é traidor da intangível Santidade de Deus e cairá no Julgamento da Ira Divina. Foge, chora e clama até onde teus pés te hão de levar à exaustão, para que não sucumbas com Eva e todos os teus!”
Eis que Adão se ergueu querendo fugir conforme a Ordem de Deus, mas os seus pés estavam paralisados. Trêmulo de pavor, ele se recordou do Julgamento de Deus, e se atirou ao solo, chorando e clamando: “Senhor, Deus Poderoso de Toda Glória, não feches o Coração de Teu Infinito Amor e Misericórdia diante de mim, que sou fraco, e dá-me força para fugir de Teus Julgamentos, segundo Tua Vontade à qual estão submissas todas as criaturas. Senhor, aten- de minha súplica!”
Então, o Amor Eterno falou a Abel pela boca do anjo: “Vê o pai de teu físico. Ajuda-o a se levantar! E vê sua companheira Eva, tua genitora, gemendo no solo. Ergue ambos para que eles e todos os demais sejam fortalecidos para a fuga, e o Pai possa alegrar-Se contigo por demonstrares amor para com todos, sejam ou não aben- çoados. Tua força os confortará e a plenitude da bênção em ti os animará! Com a mão do amor e da fidelidade fraternal os conduzirás até o local em que tombarem exaustos.
Deixa-os repousar e concentra-te em Mim para poder dar-te as forças necessárias, na medida de sua receptividade, para pais e ir- mãos. Faze o que te disse, por amor a eles e obediência para Comigo!”
Compenetrado de imensa piedade e profundamente como- vido, Abel ajoelhou-se, agradeceu a Deus e tomou as mãos dos pais. Sensibilizado, Adão disse: “Meu filho, que vieste em nosso socorro, aceita minha bênção pelo que fizeste por nós. Agradece ao Senhor por seres digno do Amor Dele, pois não somos merecedores de pro- nunciar o Seu Santo Nome! Vamos fugir em Nome do Senhor!”
Eis que o anjo vibrou a espada da Justiça e todos fugiram, velozes, dia e noite, sem descanso. Ao chegarem ao referido país, o Sol se encontrava no zênite, ardendo com intensidade. E não havia erva, arbusto ou árvore até longa distância. Exaustos, todos caíram no pó escaldante e fecharam os olhos, dormindo, quase inconscien- tes, nos braços da fraqueza e da desgraça.
O anjo, então, dirigiu-se a Abel, dizendo: “De todos os sa- crifícios que ofereceste ao Senhor da Santidade, na pureza de tua alma, não houve um maior e mais agradável para Ele. Aceita, pela
Vontade do Alto, esta espada da Justiça da mão de teu irmão — por- quanto somos filhos de um só Pai — e age pelo Poder da Sabedoria e a Força do Amor em benefício dos teus. Incendeia o amor para com o Amor do Pai e estimula a chama do justo temor de Deus em seus corações. Não te abandonarei, mas me tornarei invisível e, se quise- res, postar-me-ei visivelmente ao teu lado, pronto para ajudar-te em Nome do Senhor.
29. A entrega da espada significa tua plena liberdade, igual à minha, de sorte que a Vontade do Senhor se tornou a tua, sobrepon- do-te à lei, e os Mandamentos são tua posse. És igual a mim, um filho imortal do Amor do Pai, no Reino puro da Luz dos espíritos livres! Age, portanto, segundo o teu amor e sabedoria, com teus pais e irmãos.”
CONSCIÊNCIAEARREPENDIMENTODE ADÃO
Com imensa alegria, Abel ajoelhou-se, dizendo: “Ó Santo e Bondoso Pai, vê teu pequeno servo no pó, certo de sua indignidade, dirigindo-se a Ti, Onipotente, e ouve minha súplica de condescen- dência para com os meus e permite que minha força se irradie sobre eles, para remissão do pecado e reconquista da Vida em Ti!
Transforma esta zona segundo o Teu Agrado, para que se torne fértil, oferecendo alimento fortificador para o físico e uma fonte fresca para saciarem sua sede, e apareçam animais úteis para servi-los.”
Mal Abel terminara sua súplica, uma brisa suave começou a soprar sobre o deserto e claras nuvens cobriram a abóbada celeste. Não tardou a chover e, junto com a chuva, caíam sementes várias nos sulcos feitos por Jehovah. Instantaneamente todo o deserto se cobriu de verde, de uma flora abundante e vicejante. No ponto em que Abel se ajoelhara, surgiu uma árvore enorme, cujos galhos esta- vam carregados de fruta-pão, recebendo o nome de “Bahahania”, ou seja, “fortalecimento e conforto para os fracos”.
E das nuvens abençoadas uma voz suave dizia: “Abel, vibra a espada com a mão esquerda por sobre os adormecidos para des-
pertá-los ao arrependimento e regeneração futura, e sê um exemplo Daquele que virá na grande época das épocas e dize-lhes que até lá ninguém será livre da lei. Os Mandamentos hão de aprisionar a to- dos e, mais além, os que não participarem do Renascimento através do Filho, que será o Caminho, a Luz, a Verdade e a Vida eterna, como único Vencedor da morte.
Tu, porém, és livre qual anjo de luz e serás acolhido após ter sido realizada dentro em breve a Imagem Dele, que há de vir. Terás que te capacitar para tanto através da humildade, amor e devoção crescentes, não obstante as perseguições e maus tratos que passarás por parte dos irmãos, para glorificação de Meu Nome.”
No mesmo instante, Abel ergueu-se do solo e flutuou no ar como prova de verdadeira liberdade sobre a Terra, e fez conforme o anjo lhe havia dito. E novas forças eram transmitidas aos adorme- cidos que se erguiam, atônitos diante da transformação do deserto, querendo entoar cânticos de louvor.
Adão, porém, disse: “Filhos, não vos regozijeis antecipada- mente, mas chorai comigo e Eva por causa de nosso grande pecado, considerando o que perdemos. Não tem o menor valor o Paraíso terrestre e todos os seus bens. Conforme observamos, o Senhor, em Sua Infinita Misericórdia, nos devolveu tantas Graças que podería- mos esquecer aquilo que era nosso. Observai os animais e a flora e perguntai-lhes se são capazes de nos responder.
Eu assim fiz ao despertar e me convenci de que tudo emu- deceu, não entendendo o sentido de minhas palavras. Se bem que o chilrear dos pássaros, o rugir dos animais e o sussurro desta fonte e todas as manifestações da flora chegassem aos meus ouvidos, não conseguia entender o seu sentido. Não foi o susto da perda desse entendimento, mas a imensa perda da Graça do Pai, em todas as criaturas e seres.
Tudo aquilo que perdi também perdestes por minha causa, pois pecastes por mim, com exceção de um, que não sou digno de chamar de filho, que permanece na Graça e Bênção, puro e justo diante dos Olhos do Pai, de Seu Amor e de Seu Espírito.
Ele também nos foi tirado, pois meus olhos não mais con- seguem vê-lo, a fim de sentirmos o que representa termos caído da Graça do Amor na Justiça rigorosa do Senhor, em virtude de nossa desobediência.
Considerai se falei a verdade, se devemos chorar de remor- so ou se podemos encontrar algo que nos alegre. Há apenas uma alegria como Dádiva do Pai, e esta é a grande Graça do arrependi- mento e da tristeza. Vamos, por isto, agradecer-Lhe do fundo de nosso coração.
Prosternemo-nos na convicção de nossa iniquidade e cho- remos até secarem nossas lágrimas e teremos devolvido ao Senhor o que é Dele e que não merecemos. Assim, Ele poderá agir conosco segundo Sua Santa Justiça!”
Em seguida, Adão e todos os seus se prosternaram, chora- ram e se lastimaram, com exceção de Caim. Apesar de se atirar ao solo, seus olhos continuavam secos e aborreceu-se por não poder chorar como os outros; por isto, levantou-se e se pôs a caminho. An- dando distraidamente, percebeu uma cobra rastejar-se sobre a terra. Irado, ele a apanhou, a despedaçou e a ingeriu.
CONFISSÃODE CAIM
Nisto, surgiu Abel e lhe disse: “Irmão, por que comeste a car- ne da serpente quando existe grande quantidade de frutos capazes de saciar tua fome? Adão, nosso pai, bebeu o suco daquela planta, astuciosamente preparado por ela, caindo em pecado, e todos vós por intermédio dele. Arquei com o peso da culpa diante de Deus e tive de abandonar o Paraíso convosco, aceitando vosso encargo físico e espiritual. Agora acabas de comer a carne e beber o sangue da serpente! Por que fizeste isto?”
Refeito de sua ira, Caim respondeu: “Fiz isto por vingança, a fim de aniquilar a serpente e a mim mesmo, que fui considerado indigno da Bênção do Senhor. Não tenho culpa de ser como sou, mas a culpa é de meus pais, que me criaram em pecado.
Por que deveria eu pagar a culpa, pela qual nada fiz, por- quanto sou apenas o fruto e não a causa do pecado, sendo privado da Bênção que todos vós recebestes em plenitude, ao passo que eu me arrasto, carregando a imerecida maldição de Jehovah?
Esta é a causa de minha ação, pois a serpente me disse: Sa- cia-te com a minha carne e com o meu sangue, que te tornarás um senhor da Terra e todos os teus descendentes regerão sobre ela, sendo seu poder e força mais fortes que dos abençoados. Não é um manda- mento, mas te dou o poder de dominar e a força para tudo subjugar!
E acrescentou: Minha carne te livrará da culpa injusta diante de Deus e meu sangue te dará uma nova natureza sem culpa e do- tada de poder e força. — Terminou deste modo e eu a estraçalhei e comi, conforme acabaste de ver.”
Neste instante, Abel vibrou a espada da Justiça com a mão direita sobre a cabeça de Caim, ao qual se abriram os olhos, e ele percebeu sua imensa injustiça contra Deus e os genitores. Compre- endeu a sua culpa e viu os caminhos insondáveis do Amor Eterno, e como ele mesmo era a própria serpente tentadora. Através da in- finita Misericórdia Divina, ela se tornou um ser humano, a fim de, por uma provação maior em sua temporária fraqueza sem bênção, se compenetrar de sua situação, voltar-se finalmente para o Senhor, de onde lhe viriam a Bênção e aceitação na imensa Graça de Deus.
Ele percebeu claramente ser a própria serpente e que, através de sua raiva, a havia feito retornar à sua natureza, e que as palavras da serpente eram as suas, baseadas em sua índole original, antes da Criação do mundo material. Com isto, havia reabsorvido a serpente, ou seja, havia se positivado no mal e subsequente erro, caindo na própria morte.
Profundamente arrependido, atirou-se ao solo, clamando: “Senhor Todo Poderoso e Onipotente, somente agora reconheço minha imensa culpa e fraqueza diante de Ti, Tua Justiça e Infinito Amor! Não mereço essa existência, por isto aniquila minha natureza original, para que seja extinta minha grande culpa para os futuros descendentes abençoados de Adão e Eva.”
Eis que Abel vibrou novamente a espada com a mão esquer- da por sobre o peito de Caim, fazendo com que o abandonasse a ânsia da morte e surgisse a fome pela vida. Como nada encontrasse que satisfizesse sua ânsia, virou-se para Abel, dizendo: “Irmão, sinto fome de alimento de vida e não mortal como a carne e o sangue da serpente. Agora que percebo a causa do meu ser, como fui e como sou neste instante, sinto grande remorso, fome e sede ardente de Amor Divino e de Sua grande Misericórdia. Choro e o arrependi- mento não provoca lágrimas em mim. Sacia-me com a voz do Amor e lágrimas de remorso.
Eu, que fui o maior, tornei-me menor que o pó; eu, o mais forte, fiquei mais fraco que um inseto; eu, o mais luminoso, tornei-
-me mais negro que o ponto central da Terra!
Assim me encontro diante de ti, que surgiu de mim qual espírito pequeno, e agora é maior do que eu naquele tempo, quando ainda não existia o mundo, e acabo de perder minha força, tornan- do-me o mais fraco entre todos. Os que tinham muito, perderam muito, e os que tinham pouco, perderam pouco; e eu, que tive tudo, perdi tudo por minha culpa e os outros por minha causa. Meu ir- mão, não hesites em oferecer-me alimento de vida para poder dar vazão ao meu choro, e dá-me de beber a fim de que não pereça no remorso sem lágrimas!”
Voltando a pisar o solo, Abel aproximou-se de Caim, di- zendo: “Vou reconduzir-te aos teus pais e irmãos, onde encontrarás aquilo de que careces. Mas, quando fores saciado, lembra-te do Se- nhor, em Seu Amor e Misericórdia, e considera que o primeiro é o último, e o último o primeiro. Segue-me com paciência e meiguice, pois devem ser teu poder e força no futuro, que hás de encontrar Graça diante Daquele cujo Amor é Infinito para sempre.”
Quando ambos se aproximaram da grande árvore, entre o Sul e o Este, onde todos ainda se achavam prostrados, em virtude de sua tristeza, Abel disse a Caim: “Eis os frutos do arrependimento e da tristeza. Curva-te junto deles e sacia tua fome e sede.”
Mal Caim obedecera à vontade do irmão, começou a chorar e lágrimas de remorso brotaram de seus olhos. E a tristeza e o remor- so agradaram ao Amor Eterno, que falou através do anjo para Abel, que também se desfazia em lágrimas de piedade: “Filho abençoado do Amor, ergue Adão e Eva, teus pais carnais, e mostra-lhes a árvore da vida, que foi abençoada por Mim, para vosso sustento e fortale- cimento físico.
Dize a Adão que, uma vez fortalecido, deve dar o pão da ár- vore da vida aos seus filhos, para sustento e fortalecimento de corpo e alma. Eva deve erguer Caim e levá-lo a Adão. Este deve, com a mão esquerda, tomar a direita dele, apondo sua direita na cabeça de Caim, soprá-lo três vezes e suspendê-lo sete. Assim, Caim ficará capacitado, segundo sua fé, para a aceitação de Minha Bênção.
Tu, Abel, toma a espada em tua mão direita e segue-me para longe daqui, na direção Sul, a uma grande montanha, num vasto deserto. Lá encontrarás uma fenda, na qual enfiarás a espada com o cabo para dentro, de sorte que a ponta fique virada para o Céu, com uma face da lâmina virada para o Sul e a outra para o Norte.
Em seguida, ajoelha-te, agradece a Deus até que a chama da espada se tiver apagado, pois ela se transformará numa sarça com ba- gos vermelhos e brancos. Colhe três brancos e sete vermelhos, e volta para junto de teus familiares. Após quarenta dias, erigirás um altar de sacrifício conforme fizeste no Paraíso, espontaneamente. Nele de- positarás espigas e frutos, e atearás fogo com a chama do Amor que enviarei do Alto, através de um forte raio.
Isto feito, apanha um pouco de barro, amassa-o e forma um recipiente de boca larga e fundo estreito, semelhante ao teu cora- ção. Enche esse recipiente com água limpa e deposita-o no Altar de
Jehovah, à chama de sacrifício do Amor. Quando a água começar a ferver, atira primeiro os bagos brancos; passado um tempo, junta os sete vermelhos. Ao perceberes que estão macios, tira o recipiente do fogo e apanha os bagos na mesma ordem em que foram de- positados lá dentro, passa-os com a mão direita para a esquerda, deixa-os esfriarem e mastiga-os segundo sua ordem. A água deve ser despejada no Altar de Jehovah, e o recipiente vazio entregarás ao teu pai carnal.
Os bagos aumentarão tua sabedoria e teu amor, e a água amainará o fogo do Amor. O recipiente será um exemplo justo para Adão e todos os seus descendentes de como devem ser os seus co- rações: Cozidos com a água da Misericórdia, na qual amoleceram os frutos da justiça, através do fogo do Amor, para alimento dos filhos do amor abençoado, libertando-se para a aceitação do Espí- rito Santo.
Vai e cumpre fielmente o que Eu, o Amor Eterno, ordenei. Isto feito, tornarei a falar-te e aos teus, pela boca do Meu anjo, um querubim, ou seja, a Boca da Sabedoria e do Amor do Santo Pai. Vai e age!”
Assim, Abel executou as ordens dadas pelo Alto e afastou-se dos seus, após ter dado ao seu pai carnal a Bênção, atitude esta que lhe fora transmitida por Minha Vontade em seu coração.
Adão abraçou-o chorando, Eva apertou-o com tristeza ao coração, e os irmãos se despediram, inclusive Caim, que lhe esten- deu a direita e se curvou até o solo. Assim, Abel partiu, rico em bênçãos e acompanhado do anjo do Senhor.
NOVAORDEMDOCULTOADEUSEDA VIDA
Depois de executar a Palavra de Deus e voltar para os seus, onde ofertara o sacrifício, segundo a ordem do Amor Eterno, e en- tregar a Adão o recipiente, o Amor Eterno falou a Abel pela boca do anjo: “Filho fiel de Meu Amor Misericordioso, acabo de nomear-te sacerdote e professor de teus irmãos e consolador de teus pais. Em
cada sábado, antes de surgir o Sol, farás a oferenda dos melhores e mais puros frutos que ainda hei de designar mais tarde; e à noite, ao pôr do sol, deverás acendê-los com o fogo do Amor que mostrarei oculto dentro da pedra, de onde sempre poderá ser extraído. Não cobrirás tua cabeça de uma meia-noite até a próxima, para que pos- sas aceitar a Minha grande Graça. Teus irmãos devem descobrir a ca- beça somente de manhã e cobri-la à noite. Tuas irmãs devem cobrir rosto e cabeça durante todo o sábado; somente Eva poderá olhar três vezes para o Altar de Deus, por volta de meio-dia.
Adão, por sua vez, jamais deverá cobrir sua cabeça, para pro- var que é vosso pai, ao qual devereis demonstrar respeito e amor. Ai daquele que se opuser a seu pai no que quer que seja! Hei de fitá-lo com ira; pois a cabeça do genitor é igual à Santidade de Deus. Qual- quer um poderá ser atendido, caso sinta remorso no coração. Mas, quem tocar o menor vestígio de Minha Santidade será atingido e consumido pelo fogo que jamais se apaga, devorando toda lágrima de remorso!
E quem tocar sua genitora, de coração maldoso, reagindo contra o seu amor, jamais será olhado por Mim, em toda sua misé- ria. Pois ela é igual ao Amor em Mim e quem o desprezar tropeçará com dificuldades nos caminhos duros de Jehovah.
Do mesmo modo perderá Minha Graça e Misericórdia quem for contra seu irmão; e quem desprezar sua irmã encontrará o Meu Coração trancado. Vossos irmãos são também irmãos de Meu Amor, e vossas irmãs, o deleite do Meu Amor.
Por isso, honrai vosso pai e amai vossa mãe, e sede mutu- amente submissos com todo o amor a fim de que possais temer o meu Nome Jehovah e amar o Meu Amor. Assim, vos deixareis guiar três vezes pela grande Santidade de Meu Espírito, no dia de Minha Santificação, para aquisição da sabedoria, e sete vezes para os seis dias do Amor, agindo com justiça perante Meus Olhos.
Além disso, deves tu, Abel, ensinar teus irmãos vários ofícios, um diferente do outro, para que possam servir-se mutuamente com amor e conselhos em vários conhecimentos.
Às tuas irmãs ensinarás o preparo de fibras, que devem ser trançadas em tiras largas para confecção de vestes para os irmãos e, em seguida, para si mesmas, a fim de que a ordem seja mantida.
Adão, Eva e também tu, recebereis vestes do Alto, dadas por Mim; para ele, branca, para Eva, vermelha, e tu, azul com remates amarelos. Tais cores não devem ser aproveitadas por outrem, por- quanto as roupas restantes devem ser multicores, sem mancha nem rasgo; a não ser que alguém tenha pecado. Em tal caso, deve-se ras- gar a veste com remorso, cobri-la com carvão e sua cabeça deve ser polvilhada com cinza, para prova de seu estado pecaminoso diante de Mim e ter rasgado a veste da Graça porque se maculou com a cor da desobediência, advindo a morte sobre ele.
Caim deve escolher a irmã mais bonita, de nome Ahar, ou seja, a beleza de Eva, e seguir com ela para os campos, onde terá que fazer sulcos no solo com ferramentas que há de encontrar no local. Em seguida, deve deitar sementes nos sulcos que lá existem em quantidade e chamar o produto alcançado de trigo. Quando estiver maduro e as hastes escuras, deve colher os grãos e triturá-los entre pedras, e a farinha convém molhar com bastante água, para formar uma massa. Esta deve ser posta em cima de uma pedra lisa e quente pelo Sol, onde deverá ficar a terça parte do dia, e o resultado se cha- mará ‘pão’. Ele partirá o pão, agradecerá a Deus, saboreando-o com sua mulher Ahar. E cada vez que fizer uma colheita em seus campos deve oferecer-Me as dez primeiras espigas.
Caso continuar fiel a Mim, aceitarei de bom grado seu sa- crifício na terra; mas, se esquecer-se de Mim, seu sacrifício não será aceito, nem subirá para o Céu, mas ficará junto de seus pés.
Assim viverá, aumentando sua família; todavia, deve sem- pre oferecer-Me três vezes seu coração, e o de Ahar sete vezes. Se assim não agir, evidenciar-se-á sua infidelidade, tornando-se mau. A serpente viverá por ele e posteriormente em suas filhas, que se tornarão belas exteriormente, porém, feias no íntimo, aniquilando os filhos dele e contagiando com seu veneno os filhos de Meu Amor, afastando-os de Mim. Assim sendo, extinguirei toda sua raça de so-
bre a Terra! Transmite-lhe isto e lembra-lhe o Meu Santo Nome de Jehovah e o Meu Dia Santificado!
12. A ti, Meu bom Abel, mostrarei uma manada de animais mansos que deves apascentar, e o nome que lhes deres será justo, pois ao chamá-los reconhecer-te-ão como pastor e te seguirão.
Futuramente não Me ofertarás frutos, como fizeste pela vol- ta do Monte de Jehovah, e sim os primeiros animais de teu rebanho, que serão os frutos mais belos e puros dos quais já te fiz menção. Antes do sacrifício, deitarás lenha seca sobre o altar e em seguida o animal, para depois Me agradecer e atar fogo, que encontrarás den- tro da pedra, como te aconselhei.
Como prova que teu sacrifício é do Meu Agrado, a fumaça subirá ligeira para o Céu, como se tivesse grande pressa. Deixarás a cinza coberta com uma pedra três dias no altar, e quando fores reti- rar a pedra, um belo pássaro de plumagem luminosa se erguerá da cinza e voará em direção ao Céu. Em seguida, virá um vento forte que levará a cinza a todas as direções da Terra para a futura ressur- reição da carne, ou seja, as obras do verdadeiro amor, através da Sa- bedoria do Espírito Santo que será dado aos filhos, na grande época das épocas, e a todos os estranhos que tiverem vontade para tanto.
Deveis alimentar-vos de manhã, ao meio-dia e à noite, mas sempre moderadamente e com grande temor a Deus, depois de Lhe terdes agradecido antes e após, a fim de que o alimento seja abenço- ado, tirando-lhe o efeito mortífero.
Quem isto não fizer, sofrerá as consequências nocivas. Quem esquecê-lo por três vezes, será por Mim punido com sono prolongado. Quem o omitir por preguiça, há de engordar qual suíno e se tornará tolo qual burro, sendo motivo de gargalhadas por parte das crianças. Caso pretenda voltar a ser igual aos obedientes, terá que jejuar muito e comer pão seco.
Mas, quem o omitir por desobediência e menosprezo ao Meu leve Mandamento, por amor a vós, será acometido da ten- dência da impudicícia e lascívia, caindo facilmente em pecado. En- frentará grande luta para vencer a forte serpente da tentação de
Eva, e Eu não o fitarei antes que tenha vencido sua carne, com grande remorso.
De manhã deveis alimentar-vos de frutos; ao meio-dia, da árvore da vida, e à noite, deveis tomar leite e mel de abelhas, estas chamadas de ‘Celie’, que significa ‘o cuidado do Céu’. No terceiro dia antes do sábado deveis matar um carneiro, limpá-lo do sangue, assá-lo durante o dia e comê-lo à noite.
Caim e sua mulher deverão participar dessa refeição. Fora disto, convém ficarem no campo para se alimentarem de pão e fru- tos. Sabeis, portanto, o que necessitais. No inverno, mandarei do Alto vestes de pele para Adão, para Eva e para ti. As peles dos car- neiros abatidos devem ser recolhidas por teus irmãos e servirão para suas roupas.
Quando estiverem secas devem ser lavadas por sete vezes, o que as tornará macias e limpas para o uso.”
OSSACRIFÍCIOSDEABELE CAIM
Em seguida, o anjo beijou a fronte de Abel e recomendou a todos, principalmente a Caim, o rigoroso cumprimento da obediên- cia para a futura conquista da liberdade plena e subsequente força e poder derivados da Graça da Misericórdia, a fim de transformarem a serpente dentro de si em amor, produzindo frutos da bênção ao invés de frutos da Ira Divina.
Todos se entregaram à tarefa, vivendo em boa ordem duran- te dez circunvoluções da Terra em redor do Sol. Certo dia muito quente, o Sol queimava com maior intensidade e Caim se irritou, amaldiçoando o Sol. Os seus filhos eram pacientes e se lavaram na fonte fresca, cuja água também bebiam. Assim saciados, louvaram a Deus por lhes ter deixado tal manancial nos tempos de prova do Seu Amor Eterno.
Não distante da cabana de Caim, erigida por ele com galhos e coberta com palha, corria um vasto rio que fiz surgir das profunde- zas das montanhas, idênticas às da Lua, que se localizam no centro
do grande continente Ahalas, ou seja, o berço dos filhos dos fracos descendentes de Adão, que chamais de África.
Mas, Caim não quis fazer uso da água, tornando-se preguiço- so devido ao grande calor, não sabendo o que fazer, não se dirigindo para Mim e muito menos para seu irmão Abel.
Eis que veio o dia do Senhor e, com ele, a época do sacrifício. Caim então tomou dez espigas sem grãos, por preguiça de carregar as cheias e, além disto, penalizou-se de os grãos serem queimados em vão, porquanto lhe proporcionariam farinha para três pães. Assim, pegou a palha seca, deitou-a no altar e ateou fogo; mas, a fumaça não subiu, e sim, caiu por terra, o que provocou nele maior irritação.
Ao mesmo tempo, Abel acendia seu sacrifício diante dos Olhos do Senhor, dizendo, profundamente comovido: “Santo e Bom Pai, que me olhas, que sou fraco, pelo grande olho de Teu Sol, com todo o Poder de Teu Amor! Ainda que Teu Amor me queime a pele, meu coração palpita com grande calor por Ti. Houve tempo em que Tua Ira queimava a Terra, Jehovah; agora, arde o Teu Amor, Santo Pai!
É uma escola preparatória que me capacitará à aceitação fu- tura da Vida pura em Ti! Quão imensamente Bom és Tu, por nos deixares nesta Terra sentir a inconcebível Graça de Teu Amor. Aceita este meu pequeno sacrifício, para todos, como pequena prenda de nosso amor e conserva-nos o Teu Amor Eterno. Teus são todo Poder e Força sobre tudo que existe na Terra; somente Tu mereces Honra e Louvor de Teus filhos abençoados.”
CAIMMATASEU IRMÃO
Os dois altares estavam a uns setenta passos distantes um do outro, sendo que o de Abel, em direção ao Sul, e o de Caim, ao Norte. Quando Caim percebeu que a fumaça de Abel subia ao Céu enquanto a sua caía no solo, o ódio invadiu seu coração. Mas, sua fisionomia não traduziu seu sentimento, ao passo que Abel orava por ele, pois percebera sua maldade.
O Senhor ouviu a súplica de Abel e, segundo o desejo deste, fez com que Caim ouvisse Sua Voz tonitruante, dizendo: “Caim, por que te tornaste infiel a Mim, permitindo que teu coração se enchesse de rancor, e por que disfarças teu sentimento e mentes com os olhos? Alimentas algo de tenebroso contra Abel! Nega-o, se fores capaz!
Ouvi quando amaldiçoavas Meu Sol e vi as espigas vazias com as quais procuravas contentar-Me em tua preguiça e cobiça, e além disto vi praticares impudicícia e quase sempre omitiste cum- prir aquilo que te ordenei antes de te aproximares de tua mulher. Não é assim?
Observei-te com paciência e não deixei que Minha Destra punidora caísse sobre tua cabeça e não Me irei em Minha Santidade! Pesa Minhas Palavras, amolda o teu coração e Me serás agradável e teu sacrifício será aceito. Caso insistas na maldade oculta de teu coração, o pecado ter-se-á estabelecido diante de tua porta, domi- nando-te, e tu e teus descendentes serão escravos e servos do mesmo, e a morte virá sobre vós. Não permitas, pois, que te domine, mas rompe com ela violentamente, sujeitando-a à tua vontade, que serás livre, senhor de tua vontade, cuja origem é maldosa, pois veio de ti e não de Mim!”
Eis que Caim se inclinou para o solo, como querendo arrepender-se. No mesmo instante viu a seus pés uma serpen- te. Sumamente assustado, levantou-se e quis fugir para junto de Abel; mas, a serpente enroscou-se nos pés dele, de sorte que não pôde mover-se.
Erguendo sua cabeça, a serpente abriu a boca, movimentou sua língua bifurcada e disse: “Por que queres fugir de mim? Que te- ria feito eu a ti? Sou um ser igual a ti e tenho que rastejar nesta figura miserável. Liberta-me, que serei como tu e mais bela que tua mulher Ahar, e serás forte como Deus, sobre tudo que existe na Terra!”
Retrucou Caim: “Estás mentindo, pois quando te encontrei na grama, te estraçalhei e te comi, pois acabavas de me trair. Como poderia crer em tuas palavras? Muito sofri por tua causa, portan- to conheço tua mentira e não posso confiar em tuas palavras. Não
acabaste também de ouvir o que disse Jehovah? Se tiveres algum conhecimento da Verdade, explica-me tudo isto e me convence do contrário, que acreditarei em ti e farei tua vontade.”
8. A serpente falou de novo: “Nisto tudo cabe culpa ao teu ir- mão Abel. Quer apoderar-se do domínio a fim de roubar-te os di- reitos de primogênito. Ele age com tanta astúcia a ponto de cegar o Amor da Divindade, manifestando beatitude, para que deixe agir sobre tudo que existe na Terra, enquanto te pisará com escárnio. Quando me encontraste na grama e fizeste o que te aconselhei, terias sido soberano de tudo, caso a astúcia de teu irmão não descobrisse o plano, pois veio junto de ti com falsidade. Sim, ajudou-te, não para galgares o trono que te compete, mas para a miséria e completa nulidade de teu ser altivo, o que há muito deverias ter sentido.
Até mesmo ficou invejoso por ter o Senhor aceito teu sacrifí- cio, igual ao dele, e soube levar a Vontade enfraquecida de Jehovah no sentido de Ele rejeitar o teu sacrifício e, além disto, te passou uma séria reprimenda.
Já não foi do agrado dele que o Senhor não te tivesse ani- quilado de vez. Portanto, observa como ele, ainda aparentemente orando, pretende convencer o Senhor a efetuar aquilo que até então deixou de executar. A astúcia de Abel chega ao ponto de querer con- vencer o Senhor a lhe passar todo o Seu Poder, quando então o tirará do trono. Isto feito, Deus passará a sofrer na Terra, enquanto ele será um deus dominador no Trono de Jehovah.
Levanta-te, pois é a última vez que ainda te posso suprir com a força necessária para salvar-te e a Deus. Vai incontinenti e convence-o com palavras doces para que venha aqui. Então hei de algemá-lo de mãos e pés. Apanharás uma pedra, ferindo-o mortal- mente, coisa que tinha projetado para ti. Deste modo, libertar-te-ás da morte certa e abrirás os Olhos do Amor cego de Deus traído, que te fará soberano na Terra, sujeitando a ti a morte do pecado.”
Deste modo persuadido em seu coração, Caim se dirigiu a Abel, dizendo com voz maviosa: “Irmão, vem aqui e liberta-me da serpente que de novo quer aniquilar-me!”
Retrucou Abel: “Já acaba de acontecer o que pensavas e aquilo que exiges de mim em tua perversão, hei de fazer com amor; a morte que pretendes aplicar-me, virá sobre ti; e meu sangue, com o qual impregnarás a Terra, clamará a Deus e virá sobre ti e teus filhos. A pedra com a qual matarás teu irmão tornar-se-á pedra de escândalo em que todos os teus descendentes se despedaçarão. A serpente, porém, há de corromper todo sangue da Terra, e os filhos abençoados clamarão por justiça. Em seguida virá sobre vós uma grande treva, e ninguém entenderá a voz de seu irmão, assim como desde já não entendes a minha, porquanto te deixaste ofuscar por tua própria maldade, através da figura da serpente, dentro e fora de ti e será para sempre a verdadeira maldição do Julgamento Divino!
Vê como o Senhor me mostrou o plano de tua maldade oculta e tua ira tremenda, de sorte a saber o que pretendes fazer a mim. Leva-me qual vítima inocente e faze o que manda tua perver- sidade, cuja cegueira durará até o fim de todos os tempos, a fim de que a serpente venha provar sua mentira e tu venhas a saber qual de nós será o traído.
O ultraje aplicado ao Senhor te algemará e após executada a ação maldosa, teus olhos e ouvidos se abrirão para veres como Ele me aceitará, o último sacrifício agradável de tua mão. No futuro não te será dado vítima alguma, mas apenas a morte, com a qual sacrificaste teu irmão.
Tenho todo o poder sobre ti e seria facílimo destruir-te como àquela montanha, além do rio, em direção ao Norte. Irei fa- lar-lhe com as seguintes palavras: ‘Aqui estou, Abel, filho abençoa- do do Senhor, cheio de poder e força do Espírito Santo; desapare- ce para sempre, a fim de que Caim venha a saber quão enorme é sua mentira!’
E agora vês, Caim, como desapareceu a possante montanha pelo poder do Espírito do Amor. Da mesma forma me seria possível destruir-te. Mas, a fim de que vejas não existir fraqueza em Deus, nem tendência dominadora em teu irmão, seguir-te-ei qual cordeiro para o matadouro.”
Amavelmente, Caim tomou o braço de Abel e disse: “Que pensas tu de mim? Procuro tua ajuda e tu queres culpar-me de um crime, antecipadamente? Acompanha-me ao lugar onde a serpente te espera e destrói-a como fizeste à montanha, libertando-me e a ti da sua repreensão.”
Retrucou Abel: “Qual seria a diferença entre ti e a serpente? Julgas que também eu seja um fratricida? Por isso seguir-te-ei, mor- rendo para a vida, enquanto viverás para a morte!”
Tais foram as últimas palavras de Abel para Caim; quando chegaram ao ponto em que a serpente aguardava Caim, evidenciou-
-se a astúcia do mesmo, pois ela enroscou-se em pés e mãos de Abel, atirando-o ao solo, tomou uma grande pedra com a qual esmagou a cabeça de Abel de sorte que o sangue e os miolos se esparramaram sobre a terra. Em seguida, a serpente tomou a pedra na boca e a carregou à frente da porta de Caim, escondendo-se na areia, atrás do espinheiro.
MALDIÇÃOEFUGADE CAIM
Neste instante, nuvens negras se aglomeravam de todos os lados sobre a cabeça de Caim, e enormes raios fulminavam em to- das as direções, acompanhados de fortes trovões; ventanias fortíssi- mas começaram a rugir e atiravam grandes massas de saraiva sobre os campos férteis, destruindo-os inteiramente. Foi essa a primeira saraiva atirada dos Céus, como prova de Amor sem Misericórdia, porquanto a Divindade fora ultrajada de novo pelo crime de Caim aplicado em Abel.
Caim correu para dentro de sua cabana, encontrando sua mulher no solo e alguns filhos não abençoados ao lado, como mor- tos. Apavorado, ele amaldiçoou a serpente, saiu da cabana e encon- trou a pedra sobre a qual tropeçou, levando forte queda. De novo amaldiçoou a serpente maldosa e a pedra mortífera.
Tendo-se erguido com o corpo macerado, dirigiu-se à beira do rio para procurar a serpente e destruí-la. Quando lá chegou, de-
parou com um monstro horroroso, do comprimento de seiscentos e sessenta e seis varas, sete de largura, com dez cabeças e cada uma munida de dez cornos, qual coroa.
Após se ter aproximado dele, o monstro usou as dez bocas, di- zendo: “Então, forte Caim, assassino de teu irmão Abel, porventura estás disposto a lutar comigo? Podes começar tua obra de destruição!
Quando me encontrava na grama e ainda estava fraca, foi possível me estraçalhares e assimilares minha carne e sangue; agora, tal não surtiria efeito, pois o bom alimento que me preparaste com o sangue de teu irmão, fez-me forte e poderoso. Se estiveres disposto a me destruir, podes começar a alimentar tua vingança com o meu sangue. Dispondo de apenas dez dedos, pois não tens dez mãos, não poderás pegar cada cabeça de per si, as oito restantes te aniquilarão com seus cornos e hão de te engolir com suas oito bocas!”
Profundamente assustado, Caim fugiu da serpente, amal- diçoando-a, pois fora traído. Em seguida, refletiu: “Quem poderá reconciliar-me com Deus, eternamente Justo, uma vez que meu ir- mão Abel não mais existe? Três vezes amaldiçoada serpente, és tu a assassina de meu irmão e querias fazer o mesmo comigo! Se soubesse que com o meu aniquilamento também tu serias aniquilada, por sete vezes haveria de vingar sua morte em mim mesmo!”
Neste instante, a serpente se apresentou atrás dele na figura de uma moça atraente e disse: “Caim, faze isto, e eu comerei a tua carne e beberei o teu sangue e nos tornaremos perfeitamente unos, dominando o mundo inteiro.”
Virando-se para ela, Caim retrucou: “Esta é tua verdadeira figura pela qual te tornas mais horrenda. Quem te vir com as dez cabeças, há de fugir de ti qual Julgamento de Deus; mas, a quem procurares com esta figura, seguir-te-á, amando-te acima de Deus e julgando-se o homem mais feliz do mundo. As criaturas te erigirão templos e altares, alimentando-se de teus excrementos. Se eu não te tivesse visto com as dez cabeças, também me teria tornado teu es- cravo; mas agora te conheço perfeitamente e te desprezo nesta figura muito mais do que na anterior.”
Perguntou a moça: “Mas, Caim, como podes temer este meu corpo tão delicado e sedutor?” “Cala-te”, retrucou ele, “teus mem- bros delicados são serpentes cheias de veneno e debaixo de teu peito repousa uma couraça impenetrável com a qual teus braços de ser- pente sufocarão meu gênero pobre e fraco, pois nesta figura farás do próprio leviatã um servo obediente.”
Nesta altura, a mulher anguiforme incendiou-se em sua ira interna a ponto que toda sua natureza iluminava qual sol, e toman- do a figura de Abel, disse amavelmente: “Caim, tolo cego, meu ir- mão maldoso, aquele a quem mataste com uma pedra encontra-se transfigurado diante de ti e te oferece a mão para a conciliação. Não temas a figura da serpente, que és tu mesmo! Quem se tornou infiel a Deus, tu ou a serpente? Foste tu ou a serpente quem se aproximava de tua mulher sem antes prestar o sacrifício a Deus? Foste tu ou a serpente quem amaldiçoou o calor e em sua preguiça enorme ofere- ceu apenas palha ao Senhor? Foi a serpente ou tu a se enraivecer con- tra teu irmão, no ciúme tenebroso? Não foi ela uma exteriorização de tua própria maldade, na qual resolveste matar teu irmão?
Como podes amaldiçoar a serpente — que és tu mesmo — tomando o teu irmão como serpente personificada? Não foi ele mes- mo que te perguntou se poderia ser um fratricida? Responde se não foi assim. Se não for, podes amaldiçoar a serpente. Não me tomes a mim por serpente, mas a ti mesmo, pois vim do Alto, como irmão transfigurado, para ajudar-te. Estende-me a tua mão ainda macula- da pelo sangue de teu irmão, para que seja purificada pelo meu amor fraternal e possas encontrar Graça diante dos Olhos do Senhor!”
Eis que Caim, em sua cegueira, se deixou tentar por Sa- tanás, fazendo menção de estender a mão ao tentador. No mesmo instante, um raio caiu entre os dois, e o suposto Abel tombou ao solo como serpente. Caim, todo trêmulo, aguardava o julgamento do Alto. — E a voz de Jehovah falou das nuvens: “Caim, onde está teu irmão Abel — onde o deixaste?”
Encorajado pela presença da serpente, Caim respondeu: “Como podes inquirir-me? Por acaso sou protetor dele?” Com maior
ímpeto, a Voz de Jehovah prosseguiu: “O sangue de teu irmão, com o qual impregnaste a terra, clama por Mim! Vi tua ação! Onde está Abel, teu irmão?”
Retrucou Caim: “Senhor, meu pecado é tão grande que ja- mais poderá ser perdoado!” “Sim”, disse Jehovah, “por isso sê amal- diçoado na Terra que absorveu o sangue de Abel. Se no futuro pre- parares um campo, ele não te proporcionará o pão, pois terás de te alimentar de cardos e abrolhos, e hás de perambular sem pouso nem teto, qual animal feroz!”
Assustando-se sobremaneira, Caim disse com voz trêmula: “Senhor, acabas de me expulsar deste país e terei de fugir diante de Tua Face, não encontrando pouso, nem teto. Sê Misericordioso para comigo, pois as criaturas hão de me matar onde quer que me encontrem.”
E Jehovah respondeu: “Não, ninguém há de te matar, pois quem isto fizer será morto sete vezes! Para que ninguém venha aten- tar contra ti, marcar-te-ei na testa com um sinal negro.”
Assim, Caim fugiu com seus familiares para um país lon- gínquo, além do Éden, chamado Nhod. Éden era um território de pequenos montes, carregado dos melhores frutos, muito do agrado de Caim. Mas, ao olhar para cima, ele via em todos os montes um homem de cenho cerrado, como se estivesse aguardando a chegada de Caim para vingar-se. Tal aparição era obra de seu temor, con- cluindo não poder ficar ali.
Avançando para o Sul, chegaram a uma grande planície. Tão exaustos estavam, que caíram ao solo e dormiram três dias e três noites. Um vento forte, vindo das montanhas, despertou-os, sopran- do e rugindo sobre as vastas planícies, e finalmente se acalmando nas profundezas do país que se chamava Nhod, ou seja, superfície seca do mar.
Quando Caim dirigiu o olhar para cima divisou os homens nos cumes, não sabendo o que fazer. Algum tempo depois, levan- tou os braços e clamou: “Senhor de Justiça, se os meus gritos ainda chegam aos Teus Ouvidos, dirige Teu Olhar Misericordioso a este
fugitivo marcado, por causa de minha companheira e dos filhos, pois Tua Santidade marcou minha fronte com a treva do pecado para que não fosse reconhecido meu crime, e também as mãos e o peito do grande pecador, cujo pecado é demasiado grande para que pudesse ser perdoado.”
Eis que surgiu sobre a cordilheira uma nuvem com a altura de setenta e sete homens, e uma voz, que era a de Abel, dizia: “Caim, conheces esta voz?” Ele respondeu: “Irmão Abel, porventura vens para te vingar de mim, teu assassino? Então age com justiça, mas poupa tua irmã abençoada e seus filhos!”
De novo a voz falou: “Caim, é pecado quem pratica o mal. Mas, quem paga o mal com o mal, é servo do pecado. Quem faz o bem pelo bem, paga sua dívida e nada sobrará em seu benefí- cio. Quem retribui o bem várias vezes, merece os seus irmãos. Mas, diante de Deus, só vale o bem feito pelo mal, e a bênção para os que amaldiçoam os benfeitores, dando a vida pela morte!
É nesta condição que me aproximo de ti; portanto, não temas a minha presença, pois fui enviado do Alto para mostrar-te como o Senhor é Verdadeiro e Fiel nas Suas Promessas e informar-te que deves ficar neste país e te alimentares, com os teus, dos frutos aqui existentes, certificando-te que teu irmão te perdoou através do grande amor de Deus dentro de si.
Deves apagar o meu sangue com as lágrimas de remorso até que o sinal desapareça de tua fronte. Deves conduzir tua com- panheira e teus filhos no temor do Senhor. Se o fizeres por temor a Deus, continuarás vivo, mas proscrito. Se o fizeres por amor, hás de tocar o Coração endurecido da Justiça.”
CONTRATODOSENHORCOM CAIM
Com essas palavras, Caim se acalmou. A nuvem desapareceu e ele chorou de remorso e começou a procurar alimento para sua numerosa família. Meditou sobre o seu afastamento do Paraíso e a perda do Amor de Deus, tendo sido expulso para dentro da justiça
rígida, encontrando-se no limiar do Julgamento Divino. À medida que meditava, aumentava seu pranto, duvidando de poder algum dia conquistar uma partícula do Amor.
Acompanhado dos seus, ele chegou ao pé de uma amoreira cheia de frutos. Como estivessem famintos, fizeram menção de co- mer esse alimento saboroso. Caim, tomado de bons pensamentos, disse: “Minha mulher e meus filhos, abstende-vos de colher esses frutos, pois ignoramos se contêm vida ou morte. Prosternamo-nos, antes, diante de Deus pedindo-Lhe que os abençoe para nós. Se assim o fizer, pela Sua Imensa Misericórdia, convém, primeiro, agra- decer-Lhe, para em seguida nos saciarmos com parcimônia.”
Após ter Caim feito a prece de contrição em voz alta e pedi- do a Deus que tirasse o possível veneno do arbusto, abençoando-o, subitamente surgiu uma nuvem das montanhas e um raio se proje- tou dentro do arbusto, do qual fugiu uma grande serpente, de boca aberta, em direção a Caim, que muito se assustou. Mas, os raios não a deixavam em paz, impelindo-a para a areia do deserto. Depois de ter desaparecido, Caim dirigiu o olhar para o Alto, agradecendo em silêncio por se terem livrado do perigo.
Em seguida, percebeu como da nuvem avermelhada caíam grandes pingos sobre o arbusto, a ponto de encharcarem a terra numa vasta extensão. Caim e os seus perceberam a Magnitude do Senhor e de novo caíram ao solo, e ele orou: “Senhor, Tua Justiça é grande e incompreensível; mas quão imenso é o Teu Amor por seres capaz de Te lembrar do maior pecador, e imensa deve ter sido a mi- nha maldade que não quis aceitá-Lo!”
Eis que da nuvem plena de bênção se ouviu o seguinte: “Caim, Minha Justiça se transformou em Amor, mas este Amor es- tará somente com aqueles que não o procurarem na miséria e no sofrimento, e sim na sua alegria e liberdade.
Dar-te-ei um prazo de dois mil anos, durante os quais nin- guém será atingido pela Minha Justiça, que transformarei num re- ceptáculo que colocarei acima das estrelas. E de Meu Amor farei um outro que porei debaixo da Terra. Podeis fazer o que quiserdes:
Praticando o mal, vossas ações hão de encher o receptáculo da Justi- ça, que estourará quando estiver repleto, deixando cair todo o peso sobre os praticantes do mal, matando-os. O recipiente do Amor, por sua vez, se ficar vazio debaixo da Terra, receberá os mortos para um prolongado sofrimento purificador. Os que se deixarem purificar serão levados para os astros a fim de enfrentarem longas lutas. Os que endurecerem em virtude de maldade interior serão futuramente atirados sob o solo deste receptáculo, onde haverá eterno clamor e ranger de dentes, na Ira de Deus.
Aproximai-vos do arbusto umedecido pela bênção e comei de seus frutos para satisfazerdes a fome, considerando sempre Quem vos acumulou de tamanha Graça! Espalhai-vos pelo país da planí- cie, mas que ninguém se atreva a pôr os pés nas montanhas, cujos cimos são abençoados e destinados para moradia de Meus Filhos. Quem desrespeitar tal Mandamento será vítima de animais vigilan- tes, como: ursos, lobos, hienas, leões, tigres e serpentes enormes que se encontram na base das montanhas, inclusive dos animais mansos que posteriormente vos serão submissos.
Se alguém se tornar muito devoto e passar pela prova de fogo do Meu Amor, poderá penetrar no centro das montanhas e tirar ferro e cobre para o preparo de ferramentas. Alimentai-vos e multi- plicai-vos, mas repeli a semente da serpente através do justo temor de Mim, que Sou Deus, o Eterno, Justo e Santo. Amém.”
HANOCH,FILHODECAIM, LEGISLADOR
Por certo tempo eles seguiram os Mandamentos de Deus, e Caim gerou Hanoch, isto é, a “honra de Caim”. Chamando todos os filhos, ele disse: “Aqui está vosso irmão, dado por Deus para vosso senhor, a fim de que haja ordem e terminem vossas contendas. Ele vos dará as leis, premiará os fiéis e castigará os infratores, para que nos tornemos um povo grande e glorioso, igual aos filhos de Deus. Eles dispensam as leis porque possuem o amor, que os liberta, mas que para nós foi posto debaixo de seus pés, em virtude de meu pe-
cado. Seus pés nos dizimarão, caso não tenhamos alguém que nos represente e nos justifique diante de seu grande poderio.
O Deus deles é também nosso Deus. Ele é Pai para eles; para nós Ele é Juiz. O Pai conhece o amor deles, e Seu Olho e Ouvido estão com eles. Tal não se dá conosco. Somos livres para agir, mas se quiser- mos resistir, necessitamos de leis e de ordem. Pois um poderia matar o outro numa contenda, pela sua vontade, e o receptáculo da Justiça se encheria antes do tempo, provocando nosso aniquilamento sob o peso de nossas iniquidades. Vamo-nos unir e juntar pedras, grandes e pequenas, para construirmos uma morada alta e sólida para ele. E, para cada um de nós, uma pequena ao redor da grande, para que ele possa fiscalizar nossas atitudes. Ele estará isento de qualquer trabalho, um soberano em vosso meio, alimentando-se por vossas mãos.
Por ora, sou eu, como pai, vosso legislador, em Nome da Justiça Divina, e ai daquele que desobedecer às minhas leis. Minha maldição há de atingi-lo duramente, e não haverá piedade, porque em meu coração não existe amor, mas unicamente justiça.
Onde há amor, há misericórdia, e o amor vale por justiça. Mas, onde impera a justiça, vale o direito pelo direito, justiça por justiça, preço por preço, fidelidade por fidelidade, obediência por lei, julgamento para desobediência, punição para delito, maldição para traição e morte por morte.
Para santificar este meu pronunciamento, juro pelos Céus e Sua Justiça implacável, e pela Terra, morada inclemente da maldi- ção de Deus, que todo infrator será atingido por aquilo que ora vos transmiti como pai e regente.
Vosso irmão virá como verdadeiro soberano e legislador, se- gundo justa compreensão e arbítrio, de sorte que estará isento da lei, porque todas as suas ações serão lei até que ache por bem sustá-la. Acabo de vos comunicar minha vontade. Portanto, agi como man- da, se quiserdes subsistir no rigor da Justiça pela lei da ordem, para evitarmos o julgamento que haverá de atingir a todos.”
Todos se puseram a trabalhar na construção de uma cidade, levando sessenta anos para tanto. Como as construções desmorona-
vam seguidamente, somente concluíram o palácio do novo regente após Eu ter mostrado a Hanoch, em sonho, como deveriam traba- lhar. Sensibilizou-Me a atitude dos filhos que eram expostos a maus tratos por parte de Caim, rigorosamente justo, a dirigir os seus qual tirano, debaixo do terror das punições, sem dó nem piedade, pois nele não havia amor, justo que era na obediência às leis, sem conside- rar que a obediência, pura consequência do temor, não é obediência, mas simples amor-próprio. Quem ama a si mesmo cumpre a lei de medo do castigo, pois sente autopiedade com a dor do castigo em sua fraqueza desprotegida. Encontrando oportunidade de se ver intima- mente à vontade, amaldiçoará a lei e seu autor, pisando-a com os pés.
Se tal homem ficar forte será duplamente cruel sobre as leis, boas ou más, destruindo-as junto com o legislador. Isto deveria ser observado por todos os chefes e legisladores de nossa época. Aguar- da-os o mesmo destino caso julguem que o temor seja o único meio para conservar a ordem e suas vantagens, pela cega obediência dos escravos. Do contrário, todos hão de sentir quais os frutos das leis que não tenham sua origem no amor puro e desinteressado, aqui ou no Além.
Caim agia cruelmente porque nem sempre encontrava plena Graça e Solicitude junto de Mim quando, após uma ação má, derra- mava lágrimas de arrependimento. Isto Eu fazia porque seu arrepen- dimento se dirigia somente à perda da Graça e não do Meu Amor.
Quem assim se entristece, não o faz pela perda da vida, se- não pela do bem-estar. Seu remorso é falso porque não se importa com a perfeita reunião Comigo. Se Eu lhe desse aquilo que ele não pediu nem quis, receberia a morte, porque a livre vontade é a pró- pria vida do homem.
Eis o caso de Caim que expulsara o amor, agarrando-se à justiça, sem considerar não haver justiça sem amor, e que a justiça é o próprio amor sublime, sem o qual tudo sucumbiria.
Quando a cidade ficou pronta, Caim conduziu Hanoch à sua residência e deu-lhe pleno poder sobre tudo, na presença de filhos e netos, dizendo: “Hanoch, neste palácio, construído para teu uso exclusivo, transmito-te os meus direitos paternais, para nos conduzi- res, segundo tua vontade, que deve ser considerada santa. A lei em si é sem importância, mas tudo depende de seu cumprimento, e toda infração terá seu castigo.
Deste modo seremos livres pelo cumprimento, e não pela lei. Tu, como legislador, estás isento de qualquer imposição, pois tua liberdade tem que ser santa em virtude da lei. Se também estivesses preso à lei, ela te impediria de agir na esfera da liberdade. Tens que estar fora da mesma como se não conhecesses lei alguma. Mas cada ação tua tem que ser considerada como rigorosa lei e, se quiseres, todos terão que agir como mandares e seus movimentos nada mais serão que manifestação de tua vontade.”
Eis que o novo soberano se expressou da seguinte maneira: “Ouvi-me, súditos meus de ambos os sexos. Ninguém deve conside- rar algo posse sua, pois tudo é meu, para que terminem as conten- das. Ireis trabalhar somente para mim e para os meus celeiros. Em compensação, tereis alimentos na medida de vosso zelo, e os fiéis poderão aproximar-se de mim. Usufruirão melhor alimentação os fiscais e executores dos direitos e das punições. Ai dos desobedientes! Serão expulsos para as montanhas e as feras hão de estraçalhá-los. Os infratores de minhas leis por preguiça, desatenção, desleixo, se- rão açoitados até sangrarem. Aqueles que ousarem contradizer-me serão punidos até os ossos, e sua língua lhes será arrancada e atirada às serpentes. Quem me olhar com desprezo terá furados os olhos, para não mais poder fitar o seu soberano. O preguiçoso será tratado como animal de carga, com paus e porretes, a fim de que seus pés se tornem mais velozes que suas mãos. Além disto, não vos dou outra lei senão o fiel cumprimento de meus desejos e determinações, que vos serão transmitidos dia e noite. Amém.”
A estas palavras, todos, inclusive Caim, se assustaram sobre- maneira, abandonaram a residência de Hanoch, amaldiçoando seu pai cruel que lhes havia proporcionado destino tão inclemente. À noite sentiram fome e não se atreveram a procurar alimento, de sor- te que se aproximaram de Hanoch, dizendo: “Senhor, trabalhamos o dia todo, dá-nos de comer, conforme prometeste.”
Orgulhoso, ele se ergueu e retrucou: “Onde estão os frutos do vosso trabalho? Trazei-os aqui, aos meus celeiros, que mandarei distribuí-los a cada um segundo seu direito.” Assim, todos trans- portaram o que tinham: alguns, muito; outros, pouco. Caim e sua mulher nada levaram supondo que estivessem livres dessa obrigação. Hanoch distribuiu os frutos, dizendo: “Quem trabalhou, há de co- mer; quem não tiver trabalhado, jejuará.”
Assim sendo, Caim e sua mulher tiveram que jejuar. Por isso abandonaram a residência de Hanoch, sem encontrarem coração bondoso entre os seus filhos. Diante disto, dirigiram-se aos campos e se alimentaram dos frutos que sobraram. E não havendo habitação para eles, dormiram ao relento.
Quando, pela manhã, os seus filhos para lá se dirigiram a fim de trabalhar, encontraram Caim colhendo frutos. “Vede”, disseram, “pela primeira vez ele trabalha neste país. Bem feito, pois preferiu a justiça ao amor!”
Uns colhendo frutos, outros construindo moradias e celeiros, e outros, ainda, servindo ao soberano para o seu conforto, de sua mulher e filhos; ao meio-dia terminou o trabalho e todos voltaram à sua residência, transportando as provas de seu zelo e pediram ali- mento, inclusive Caim e sua mulher.
Enraivecido, Hanoch ergueu-se e disse: “Quantas vezes pre- tendeis comer durante o dia? Julgais que eu vos mando colher para vos saturardes? De que deveríamos, eu e os meus serviçais, viver, pois eles não devem trabalhar, mas carregar o seu soberano na palma de suas mãos! Afastai-vos e que ninguém se atreva a pisar o limiar de meu palácio! De hoje em diante os meus empregados hão de receber os produtos para mim. Podeis vos alimentar somente dos
frutos caídos ao solo. É nova lei, que deverá ser respeitada, pois ai dos infratores!”
Profundamente triste e emocionado, Caim disse: “Ó Hano- ch, grande soberano, meu ex-filho, porventura teus pais não estão isentos daquilo que determinaste para teus súditos? Se devo ser igual a meus filhos, ordena-lhes que sustentem pai e mãe idosos, cansados e fracos. Ou permite que me afaste até o fim do mundo, para que não veja a grande tribulação de meus filhos a sofrerem sob o jugo pesado da justiça.”
Retrucou Hanoch: “Como podes perguntar? Porventura não ajo certo se aplico o ensinamento e o poder que me deste? Tu mesmo determinaste que somente eu estaria livre da lei e não fizeste exceção contigo. Como podes exigi-lo de mim, forçando-me a dar exemplo condenável pela desobediência a ti, o primeiro legislador? Se entre nós não existe amor, mas apenas justiça, como podes pedir uma exceção como graça que jamais se coadunaria com os direitos das leis de teu soberano? Que me importa seres meu pai? Tu me ge- raste sem que eu o tivesse desejado. Se o fizeste sem minha vontade, da mesma forma também me fizeste soberano. Dize-me, então, qual a minha obrigação para contigo diante daquilo que fizeste de mim. Foge para onde quiseres, a fim de não te atingirem as consequências severas da justiça. É a única graça que te concedo livremente, por- quanto faço o que quero!”
PARTIDADECAIMPARAO MAR
Chorando de tristeza, Caim partiu com sua mulher e quatro filhos, dois rapazes e duas moças, e após quarenta dias de marcha chegou às margens do mar, assustando-se sobremaneira, pois julga- va ter atingido o fim do mundo. Então, conjecturou: “Se por acaso Hanoch me perseguir, para onde irei? Diante de mim está o fim do mundo. De cada lado se encontram montanhas altíssimas que não devo pisar, e os Olhos e Ouvidos do Senhor se fecharam para mim. Além disso, vejo somente frutos desconhecidos e não abenço-
ados. Quem teria coragem de saboreá-los? Nossos provimentos se esgotaram.
Tentarei pedir ao Senhor. Ele nos atenderá ou nos deixará su- cumbir, dando-nos um fim merecido, porque durante todo esse tem- po, em nossa imensa cegueira, não reconhecemos a Sua Vontade.”
Eis que Caim, após setenta e sete anos, começou a orar para Mim, três dias e três noites, dizendo milhares de vezes: “Senhor, Justiceiro e Amoroso, dirige Teu Olhar para Teu grande devedor e aplica a Tua Santa Vontade em mim!”
Como essa atitude Me condoesse, enviei-lhe Abel, numa língua de fogo, que dizia as palavras por Mim inspiradas: “Caim, ergue-te e olha-me para dizeres se ainda te lembras de mim.” Ele se levantou e com temor observou a chama, sem reconhecer-me. E disse: “Quem és tu, ser estranho nesta chama?”
E Abel disse: “Sou teu irmão, dentro da chama do Amor Di- vino. Que desejas?” “Meu irmão”, disse Caim, “meu filho Hanoch tudo me tirou, inclusive minha vontade. Só posso dizer: Que se faça em todos nós a Santa Vontade do Senhor!”
Disse Abel: “Segundo a Vontade Dele deveis vos alimentar de todos os frutos aqui existentes, pois a serpente te enxotou para aqui e ficou com os teus filhos na cidade de Hanoch, com todo o seu veneno, e nada mais vos poderá fazer. Quando a criatura abdicar de sua vontade, nada mais se pode fazer por ela, e quem submeter sua vontade à serpente, será seu prisioneiro, finalizando suas ações.
Mas, quem tiver fugido de seus fortes laços e salvar a sua vontade, depondo-a diante da Face de Jehovah, receberá Dele uma nova vontade a fim de que possa, futuramente, agir como Seu ins- trumento. Deste modo, é da Sua Vontade que ajas daqui por diante segundo a Vontade Dele. Ainda que tu e os teus descendentes se- jais encontrados pelos de Hanoch, não vos reconhecerão, porque o Amor do Senhor há de vos queimar.
Ser-te-á tirado o nome de Caim para receberes o de ‘Etíope’ que significa ‘o sem vontade’, segundo a Vontade de Deus. Terás que
trançar um grande cesto de vime, com a ajuda de tua família, com sete comprimentos de um homem, três de largura e um de altura, que será vedado com resina e piche. Uma vez pronto, deve ser levado à beira do mar, onde colherás frutos durante quarenta dias. Depois de guardados no cesto, subireis no mesmo.
Então o Senhor mandará uma grande enchente que sus- penderá o cesto, que vos levará a um país longínquo, no meio dos mares, onde estareis seguros das perseguições de Hanoch. Haverá por toda parte pequenos países neste grande mar, e quando tiverdes aumentado em demasia, podereis povoar todas as ilhas, segundo a Vontade do Senhor.
Se não O esquecerdes, Ele vos entregará um grande conti- nente — onde ficareis até o fim do mundo — que será antes puri- ficado da maldição pelas enxurradas, que matarão os descendentes de Hanoch e muitos filhos de Deus que se deixarão prender pelas suas belas filhas.
Sereis poupados das enxurradas, por ter a Vontade do Se- nhor vos colocado sobre as águas de Sua grande Misericórdia. Se necessitardes de algo, já sabeis onde encontrar o grande Doador, que não vos abandonará se não O abandonardes no coração. Agora, aproxima-te, Caim!”
No momento em que Abel abraçou Caim, este se tornou negro qual carvão e seus cabelos ficaram crespos, o mesmo aconte- cendo aos demais. E Abel falou: “Irmão Etíope, agora estás livre de qualquer culpa, que continua com Hanoch, e convém agires segun- do a Vontade do Senhor. Amém.”
ARAÇADE CAIM
Em seguida, Abel desapareceu e Etíope saciou-se pela pri- meira vez dos frutos e cumpriu as ordens recebidas. Assim sendo, o seu tronco povoou até os nossos dias todas as ilhas nos mares e, mais tarde, após o extermínio da grande serpente pelas chuvas, também os continentes hoje chamados de África, América e Austrália. Sua
raça não foi exterminada e continua a mesma até o momento, como prova das crueldades de Meus filhos e Hanoch.
Vive, portanto, Etíope, natural e espiritualmente até este momento, numa ilha, no centro das grandes águas, que jamais será encontrado por mortal, como constante observador de vossas ações. Ele se alimentou de frutos variados e gerou mais setecentos filhos durante mil anos. Após isto, ele foi renovado por Mim e não mais se alimentou, por ter sido saciado com Meu Amor para toda a Eterni- dade. Eis o melhor alimento, pois quem dele se suprir não verá, não sentirá, nem saboreará a morte. Seu pensamento será uma livre saída da vida para a Vida, do vivo para o Vivo, que sou Eu Mesmo. Desta forma saciado, Etíope vive ainda hoje em físico como primeiro filho do homem e pode observar todas as atitudes e ações dos homens, portanto é testemunha remota de todas as Minhas Ações até hoje.
Ele conheceu Noé, Abraão, Moisés, todos os profetas e Mel- chisedek, o Sumo Sacerdote. Ele foi testemunha de Meu Nascimen- to e da Minha nova Criação, através da maior de todas as Minhas Obras, isto é, a Obra da Salvação. Desta forma ele se conservou até a completa Descida de Minha Cidade Santa, o que começa a se dar agora quando será recolhido com fiel guarda. Além de Mim, nin- guém conheceu a serpente tão a fundo quanto ele, a quem ela deu muito o que fazer.
Eis a história de Caim, que vos foi dada para reflexão sobre vós mesmos a fim de que possais descobrir vosso mal pela raiz e des- truí-lo pelo fundamento, para reencontrar em Meu Amor o Paraíso há tanto tempo perdido e vos tornardes verdadeiros e fiéis cidadãos de Minha grande e Santa Cidade, onde sou vosso Pai desde eterni- dades. Amém.
GOVERNOÍMPIODE HANOCH
Voltemos a Hanoch e mostrarei sua situação em apenas trin- ta anos de existência. Hanoch havia escolhido a mulher mais bonita e mais duas concubinas, excedendo-se em impudicícias. Com isto,
seu raciocínio obscureceu-se de tal forma que esqueceu completa- mente seu Governo. Os poucos pensamentos que conseguia regis- trar voltavam-se inteiramente para o conforto, o luxo e a luxúria.
Satisfazia-se com a apresentação de bons frutos trazidos pelos súditos, vestes macias feitas de ervas mais flexíveis, entregando o Governo aos ajudantes. Seus súditos se aperceberam disto e se apro- veitaram de sua cegueira. Os serviçais também notaram tal estado de coisas e se tornaram tão astutos como a serpente e procuraram entor- pecer o seu senhor de todas as maneiras. Permitiam aos súditos toda sorte de distrações, desde que entregassem suas oferendas em dobro.
Como os serviçais percebessem que podiam agir a seu bel prazer, começaram a reger, dando ordens aos súditos: primeiro, de- dicar ao soberano um culto divino por meio de vários sacrifícios; segundo, entregar-lhe a filha mais bonita de cada um, e a esse feliz doador seriam dispensadas as oferendas, tornando-se livre proprietá- rio de sua moradia, com direito de ingresso no palácio do soberano, com cujos serviçais poderia palestrar e anualmente ver a face do rei para agradecer-lhe por tamanha graça.
Com isto, a serpente conseguira um golpe genial. Os genito- res começaram a cuidar das filhas com o intuito de fazê-las mais bo- nitas, de sorte que elas não ligavam para os homens simples, pois se julgavam destinadas ao rei. Com esta trama os serviçais arrebataram o Governo para si e convenceram Hanoch de que ele não mais era rei e sim um deus para o povo, sendo desonroso para sua majestade dar leis aos vermes da terra e estando eles dispostos a assumir em- preendimento tão desprezível para sua pessoa. Bastaria ele externar sua aprovação ou descontentamento, que todos os bens colhidos em grandes quantidades seriam guardados como sempre.
Além disso, conviria que se mostrasse somente uma vez por ano, quando todos haveriam de se prosternar diante dele. Caso um dos vermes poeirentos merecesse graça especial, bastaria dar-lhe um pontapé na cabeça. Se isto se desse com um homem, pelo sacrifício de uma filha bonita e tentadora, poderia ser erguido do solo para ver a face do soberano, tornando-se cidadão do deus Hanoch. Essas
sugestões agradaram de tal modo à sua vaidade, que aceitou imedia- tamente tudo que lhe fora sugerido.
Deste modo, os serviçais conseguiram aquilo que há muito procuravam, isto é, a legislação, punição e todo o aparelho governa- mental. Surgiram, em vez de um, dez soberanos, que pouca diferença faziam entre homens, seus irmãos, e os próprios animais, classifican- do-os de bestas racionais e irracionais. Somente quando tal animal praticasse um golpe astucioso era-lhe permitido chamar-se homem.
Quando os dez dirigentes perceberam como eram cegamente obedecidos, cada um ia escolhendo dez serviçais entre os cidadãos livres, elevando-os a um certo estado de nobreza, com sua família. Em compensação, suas filhas bonitas deveriam tornar-se concubi- nas com as quais geravam cem ou mil filhos, que eram entregues aos cuidados dos homens desclassificados. Quando cresciam, os de sexo masculino também eram desclassificados, as moças se torna- vam concubinas, já aos doze anos, tornando-se estéreis. Se perdiam seus encantos, eram expulsas e tinham que trabalhar para os homens irracionais.
Tal estado de coisas durou mais de trinta anos. Mas, como as criaturas se tinham multiplicado em várias centenas de milhares, não mais podendo ser supervisionadas, construíram-se, com o con- sentimento de Hanoch, mais dez cidades que receberam o nome dos dez reis: Kad (o ladrão); Kahrak (o chefe das prostitutas); Nohad (o traidor); Huid (o mau); Hlad (o frio); Uvrak (a semente da serpen- te); Farak (o cruel); Molakim (o mentiroso); Uvrahim (o lisonjea- dor) e Thahirak (o grande blasfemador).
Essas cidades foram construídas nos moldes de Hanoch. No centro havia um elevado burgo, rodeado de muralha e fosso. Como não houvesse naquele tempo instrumentos apropriados com exceção de pá, picareta e escavadeira, tinham que aproveitar as mãos para cavar o solo, quais toupeiras.
Não pretendo considerar as crueldades ocorridas durante tais construções, mas levar-vos ao ponto principal. Quando as dez ci- dades foram concluídas, os dez soberanos se dirigiram a Hanoch, dizendo: “Grande e poderoso deus, cheio de força e sabedoria, teu povo cresceu sob a direção sábia de tua justiça insondável, esten- dendo-se a todo o país. Não pode mais ser supervisionado daqui do palácio e, caso não fosse fiscalizado, faria o que bem entendesse. Po- deria até mesmo chegar ao ponto de voltar ao antigo deus de Caim, que talvez o atendesse, e seríamos atacados e aniquilados.
Também não teríamos os serviçais indispensáveis para reco- lherem os produtos, e talvez tivessem o desplante de aproveitar aqui- lo que fora produzido apenas para ti, ó grande deus!”
A esta explicação, Hanoch se viu muito embaraçado, pois ignorava a que ponto o seu povo se havia multiplicado. Finalmente, esbravejou: “Por acaso não seria oportuno matá-los, reduzindo-os ao número inicial? Que me dizeis a respeito?”
Os conselheiros retrucaram: “Isto é inteiramente impossí- vel. Haveriam de nos estraçalhar tão logo matássemos apenas um e convém relembrares o receptáculo acima das estrelas, do qual Caim tanto nos falou. Qual seria o resultado, caso cometêssemos qualquer crueldade?”
Opinou Hanoch: “Neste caso, cada um de vós ocupará uma das dez cidades e regerá em meu nome, estabelecendo leis segundo compreensão e conhecimento de causa. Se um de vós afrouxar no justo zelo, será substituído pelo mais fiel. O primeiro a apresentar os frutos receberá o louvor da justiça e aceitarei o pouco como se fosse muito. Os demais terão que trazer grande quantidade, que conside- rarei como pouco, recebendo louvor ou repreensão justos. O último será entregue ao primeiro a fim de que se corrija no zelo e no rigor, pois a justiça é o único fundamento de um reino.
Eis minha vontade justa e severa, pois sou deus e sobera- no, e não tendes, nem podeis ter outro. Houve há tempos um deus
igualmente poderoso enquanto fora justo. Mas, desistiu da justiça e teria feito o bem tanto aos malfeitores quanto aos bons, em virtude de um amor semelhante ao nosso sentimento para com as mulheres bonitas, com o que se aniquilou, não mais existindo.
Estou em seu lugar, portanto de nada adiantará clamardes pelo antigo deus. Em todas as circunstâncias tereis que vos dirigir a mim, que disponho de todo poder e força! Amém.”
Tal medida era precisamente a água que os dez soberanos desejavam para os seus moinhos, pois ficavam autorizados a cometer os maiores desatinos e a trair o povo e seu tolo deus.
Estavam satisfeitos com a grande tolice de Hanoch que, mo- vido de temor e tribulações, transformara a vontade deles em lei e fi- nalmente começava a se convencer de sua própria divinização. Neste ponto enganaram-se redondamente, pois ele sabia não ser deus al- gum, sabedor que era de suas fraquezas e do seu esgotamento físico.
Querendo manter os outros em sua cegueira, continuando a ser deus em seu próprio benefício, conjecturava: Fácil é pregar-se aos cegos, pois não diferenciam o preto do branco e consideram a noite dia, e vice-versa! Todavia, também se enganava neste ponto, de sorte que entre eles havia uma verdadeira relação de tolices, pois um julgava o outro mais tolo.
Voltando aos seus aposentos, Kad disse: “Meus irmãos, so- mos filhos de Caim, que conheceram Adão e Eva, ambos nunca vistos por Hanoch. Caim foi um malfeitor como nenhum de nós foi nem será, e como ele se tivesse voltado para o Deus de Adão, recebeu o que Lhe pedira.
Que mais necessitamos? Fomos testemunhas de Suas gran- des Ações, portanto sabemos onde habita o Grande Poderoso. Faça- mos o que fez Caim e vos garanto que dentro em breve se demons- trará quem é propriamente o Senhor nas planícies. Convém que cada um de nós construa um altar de sacrifício para Lhe ofertar os frutos do país, e o poder há de se apresentar. Entrementes, poderá Hanoch, o tolo, esperar pelo tributo de sua majestade e imaginada santidade!”
Ergueu-se em seguida Kahrak, dizendo: “Irmãos, se assim é, ganhamos a causa. De minha parte concordo com Kad. Seríamos mais tolos que o próprio Hanoch se fôssemos alimentá-lo na sua tolice e contribuir para sua impudicícia, pois sabemos que nos dá, como graça especial, uma mulher que não mais lhe agrada. Será mais interessante escolhermos as belas para nós. As menos favore- cidas entregaremos aos nossos serviçais e as restantes serão posse de nossos súditos. Hanoch poderá, então, se tornar incestuoso com as próprias filhas. Por que não deveríamos fazer o mesmo que ele fez com nosso pai? Não reservou para si certos atos que Caim esqueceu de praticar sendo obrigado à fuga? Que nos impediria em pagar-lhe na mesma moeda a fuga de Caim? Segundo minha opinião, aliás mais vantajosa para todos, pergunto se não pretendem seguir-me junto do antigo Deus, tão sabiamente aceito por Kad.”
Todos concordaram com o disposto de Kahrak e Nohad prosseguiu: “Todos vós conheceis minha profissão, a qual exerci com fidelidade e zelo. Mas, se vos perguntar qual foi o meu lu- cro, haveis de responder: nada vezes nada. Cooperei na traição do grande traidor e me tornei um traído. Em virtude de suas fraudes fui obrigado a viver mal e a privar-me de distrações para, em vez de louvor e recompensa, receber as mais rudes reprimendas e ame- aças. Creio ter-vos dado razões de sobejo que justifiquem minha insatisfação e cabe a vós julgar se tive razão de atirar sobre a cabeça de Hanoch a minha revolta diante de tamanha injustiça. Sou, por- tanto, da mesma opinião de Kad e Kahrak. Assim, tomarei conta da minha cidade.”
Huid, por sua vez, disse com maior ímpeto: “Quem seria capaz de contar as gotas de sangue do povo fraco que passaram pe- las minhas mãos, segundo os veredictos de Nohad, o traidor, que é tanto quanto nós descendente de Caim. Não que o povo tivesse infringido uma lei, mas, apenas para distração de Hanoch. E quanto às construções, é-me inteiramente incompreensível como esses po- bres ainda estavam vivos após tanto tempo de martírio. Em todas as ocasiões ele nos lançava em rosto a fragilidade do dito receptáculo
acima das estrelas, esquecendo-se completamente do outro, debai- xo da terra.
Pergunto-vos se o povo não passaria melhor debaixo dos cacos do receptáculo do que sob constantes flagelações. Que teria ele feito para o receptáculo do amor debaixo da terra? Acredito que muito pouco, com exceção das inúmeras gotas de sangue de nos- sos irmãos.
Nós mesmos, como seus funcionários, tivemos que ser cru- éis a fim de evitar qualquer suspeita. Agora, as cidades estão cons- truídas, o povo está distribuído, o poder é nosso tanto quanto a nova compreensão do Deus antigo e o abençoado sacrifício. Que mais necessitamos? Se o povo obedecia quando era maltratado, cer- tamente não se tornará infiel se quisermos curar as feridas por meio de leis mais sábias e brandas. Sou tido como mau; mas desejava saber quem é pior: eu, Hanoch ou a serpente de Caim. Creio ser Hano- ch mestre de maldade, e a serpente terá deitado no coração dele sua ninhada infernal, do contrário seria impossível engendrar tantas crueldades para seus irmãos. Por isso julgo aconselhável submetê-lo ao nosso regime e o povo, pouco a pouco, lhe retribuirá tudo. Deste modo, poderá ele tomar nos ombros o tributo justo e levá-lo para onde quiser.”
Terminado esse discurso, levantou-se Hlad, dizendo: “To- dos vós sabeis como eu era obrigado à insensibilidade para personi- ficar a justiça severa, concordando de bom grado com toda a mal- dade. Conquanto não fosse o executor, era o fiscal incumbido de contar os golpes aplicados por Huid e seus carrascos. Naquele tempo eu tinha de parecer insensível. Agora serei o inverso. Serei contra Hanoch naquilo que parecia ser contra o povo; e aos irmãos darei a recompensa pelos sofrimentos aplicados por Hanoch.
Como concordo com todos vós, creio não ser injusto meu julgamento se ajo segundo meus sentimentos que, de há muito, fo- ram endurecidos. Quem tem sensibilidade para a dor e o martí- rio, tê-lo-á também para o bem. Vamos, portanto, reger pelo bem. Quem fizer o mal será tratado com indulgência, por ser nosso irmão;
ao obediente e benfeitor retribuiremos dez vezes sua ação. Feito isto, ofereceremos um sacrifício digno ao antigo Deus que certamente ficará satisfeito se Lhe devolvermos aquilo que Caim e Hanoch irri- soriamente perderam.”
Eis que se levantou Uvrak e disse: “Vossas opiniões são jus- tas, mas a de Hlad é a mais acertada. Concordo com ele, exceto numa coisa: devemos ser precavidos em tudo que empreendermos. Justiça, benefícios, julgamentos razoáveis, ordem, são coisas de gran- de valia para o povo como para nós. Acontece que os cidadãos livres estão cientes que somos soberanos e que Hanoch é um deus para eles e o próprio povo se fixou nessa utopia.
Se pusermos as mãos em Hanoch, teremos desafiado a to- dos. Se ele se puser em seu meio, explicando que lhe amarramos as mãos a fim de não poder impedir os maus tratos, o povo cairá sobre nós até nosso aniquilamento.
Por isso é preciso cautela e astúcia para que nosso empreen- dimento surta efeito. Opino, pois, o seguinte: Pagaremos o tributo a Hanoch durante três anos, trataremos bem o povo, esclareceremos os mais inteligentes acerca das traficâncias de Hanoch, enquanto mostraremos as características de Deus. Que tudo fora feito para salvá-los do pesado jugo e este era o momento de agir. Acredito que Deus não nos negará o poder se Lhe oferecermos um sacrifício. Considerai o meu discurso, irmãos e filhos de Caim.”
Todos se curvaram e disseram: “Assim será, para que as pa- lavras de todos sejam aplicadas contra Hanoch, maldito ultrajante de nosso pai e de nosso Deus poderoso.” Em seguida sentaram-se, com exceção de Farak que, de olhar atento, procurava descobrir se não havia algo de oculto em suas propostas. Seu intelecto positi- vou sua desconfiança. Por isto, disse: “Irmãos — se ainda mereceis esta classificação honrosa — acabo de ouvir vossos discursos, nos quais apresentastes vossos pensamentos, mas ocultastes vossa con- cupiscência. Cada um de vós pretendia mostrar a Hanoch que, por fidelidade a ele, organizara uma reunião dos soberanos, levando-os a um julgamento infame contra ele, para que soubesse em que mãos
havia colocado os dez governos. A esta explicação Hanoch haveria de conferir-lhe poder sobre os demais que, na sua crença, poderiam participar do destino de Caim.
Patifes! Perguntai-vos se foi a honestidade que vos fez pro- gredir, pois tudo que somos devemos à astúcia, fraude, lisonja e si- mulação. Não teria o povo sofrido bastante? E o que lhe teríamos feito de bom por nos ter alimentado? Não teriam aqueles homens o mesmo direito aos produtos da Terra? É-lhes vedado se alimentarem dos frutos maduros, mas somente dos estragados. Não satisfeitos com isso, pretendeis multiplicar sua infelicidade?
Querendo reger o povo, que não mereceis tratar de irmão, deixai toda maldade e astúcia, e conduzi-o diante da Face de Deus e sede verdadeiros irmãos de Hanoch por fidelidade, do contrário Deus não considerará vosso sacrifício. Auxiliará os fracos, fazendo-
-vos escravos das feras. Meditai sobre o discurso de Farak, o cruel.”
Terminado este discurso, os chefes quedaram silenciosos, sem poderem apresentar uma palavra de justificativa, e quase todos pensavam: Ele se antecipou junto ao antigo Deus, pois como pode- ria descobrir nossos intentos? Quem poderá persistir ao lado dele? Se fosse possível exterminá-lo! Mas, antes que erguêssemos nossa mão, a dele nos teria aniquilado. Aguardemos o decorrer das negociações.
Como ninguém se manifestasse, Farak adiantou-se, dizen- do: “Ninguém tem coragem de me responder? Onde ficaram vossa astúcia, fraude, precaução, lisonja, mistificação, mentiras, poder e vosso deus traído, Hanoch? Vosso pensamento não passou desperce- bido ao meu ouvido, mas, seja como for o decorrer de nosso gover- no, fareis o que for justo. E quem não seguir esta linha de conduta será desterrado como Caim, de quem dizeis ser vosso pai, que toda- via agia com justiça, razão por que foi obrigado a fugir, só Deus sabe para onde. Foi justo, com medo do julgamento, errando nas suas ações, pois nada fazia por amor, como determinou o antigo Deus.
No lugar da justiça colocastes astúcia, mentiras e inúme- ras patifarias e acreditais que o antigo Deus vos auxiliará em todas as vilezas se Lhe oferecerdes um sacrifício qualquer; enganai-vos
completamente. Ele tem Olhos muito penetrantes e conhece vossa natureza desde o início. Por isso, Ele não vos atenderá, mesmo se lhe oferecerdes o mundo inteiro como sacrifício e não purificardes, primeiro, vosso coração com o fogo de um amor ilimitado para com vossos irmãos, abstendo-vos da impudicícia, que não se coaduna com homens de duzentos anos.
Respondei-me abertamente, como também vos falei sem rodeios. Não anseio por domínio ou principado, como vós, mas unicamente pela fiel execução das obrigações e segundo o agrado de Deus, razão por que nunca cometi injustiça, nem violei moças e meninas como vós, tidos como cruéis. Eis minhas últimas palavras a fim de que saibais quem sou, o cruel, mas que nunca havereis de sentir-me como tal, a não ser neste momento, para impedir que tudo se perca para sempre no despertar da ira do Deus Eterno e Santo! Amém.”
RESOLUÇÃODOSDEZ SOBERANOS
Como ninguém se atrevesse a contestar a palavra de Farak, ergueu-se Molakim, dizendo: “Teu discurso nos atingiu em cheio; no entanto, foi bom o sentido de nossas palavras, com exceção da condenação de Hanoch. Foram apenas deturpadas por desejos ín- timos, que se evidenciaram em vista dos poderes conferidos. Se abolíssemos as exigências maldosas e quiséssemos nos tornar irmãos verdadeiros do povo, bem como do próprio Hanoch, porventura continuaríamos a ser patifes?”
Respondeu Farak: “O desejo representa a vida da vontade; se fôsseis exterminar todo e qualquer desejo, como haveríeis de agir como soberanos? Ninguém deve abolir os desejos, que são a fagulha do amor em Deus; apenas não devem tomar a direção errada.
Sua direção justa trata de conquistar Deus com o seu amor, e todas as suas ações, segundo o conhecimento da vontade suprema dentro de nós, que conservará o amor-próprio na humildade, em virtude do sentimento da nulidade e fraqueza incompreensível.
A falsa direção do desejo se transforma em egoísmo ou com- pleta cegueira e inibição da vontade, e as ações se dirigem às necessi- dades próprias, desconsiderando os seus irmãos. Os desejos errôneos aumentam, abafam a humildade e criam o orgulho, situação em que o homem procura aliviar o seu grande peso. Sendo cego e surdo, portanto não vê nem ouve o que o pudesse ajudar, ele se apossa de todos os recursos possíveis, acumulando novos pesos que sufocam a vida provinda de Deus, tornando-o irracional e alimento da morte. Este alimento se encontra na matéria telúrica, no fogo, na água, no ar e na terra, mãe da carne ou da morte. Onde existir carne, existirá a morte, razão por que todos nós haveremos de morrer.
Quem, pois, se mantiver no amor-próprio, estará no amor de seu físico, alimentando a morte que o prenderá em todas as suas fibras. Deste modo, tornar-se-á excremento da morte, adubando o campo onde fora lançado o fruto da perdição eterna.”
Eis que Molakim tomou da palavra, dizendo: “Todos vós co- nheceis o meu ofício, que não me fora conferido por Hanoch nem pelo povo, mas por vós, com exceção de Farak, isto é, fui obrigado a mentir para Hanoch e o povo; apenas para vós tive de mostrar a causa de meu conhecimento. A partir de agora atiro para longe as minhas mistificações e declaro: Se Deus descesse dos Céus, Suas Palavras não seriam mais sábias que as de Farak. De onde lhe vem tamanha sabedoria? Sou cego e surdo como vós, mas uma voz inte- rior me diz: Deus fala pela boca de Farak! Devemos atender esta Voz, caso queiramos viver; do contrário, as lágrimas de nossos irmãos se transformarão numa torrente, sufocando-nos em nossa depravação.”
Encorajado, Uvrahim se adiantou e disse: “Agradeçamos ao antigo Deus que, abrindo a boca de nosso irmão, evitou caíssemos em desgraça devido ao nosso desenfreado desejo de traição ao próxi- mo, merecendo por isto um julgamento das alturas.
Fui lisonjeador contumaz e fiz muita coisa pior que vós e o próprio Hanoch, com todo o seu poder. Não fosse eu, de há muito ele teria desistido de sua divinização, pois muitas vezes me disse se- cretamente que esta divindade lhe provocava terror, não o deixando
em paz dia e noite. Seguidamente havia amaldiçoado a ideia infeliz de Uvrak; todavia, dela não podia se libertar por causa do povo.
Abjuro a lisonja, convicto de que a sabedoria de Farak há de sarar a ferida de nosso irmão, assim como nos abriu os olhos para avistarmos o abismo no qual perderíamos a vida. Que Farak nos seja um guia fiel para a luz do Alto, do verdadeiro Deus, que Se nos tornou estranho como fora a Adão.
Com isto deponho meu reinado aos pés do amigo de Deus e serei feliz em considerar-me servo fiel do único homem neste país que recebeu a Graça de Deus.
Opino, pois: A cidade Farak deve ser uma cidade santa, onde buscaremos conselho seguro para nossa conduta. Seja ele nos- so soberano e guia, segundo a sua sabedoria provinda de Deus, e intermediário entre Hanoch, nós e o povo, pois queremos ser apenas servos que se alegram por servir a todos. Tenho dito, em nome de todos. Amém.”
O discurso de Uvrahim animou Thahirak e os demais que haviam pronunciado palavras de cobiça diante de Farak, de sorte que ele também se dirigiu à assembleia, dizendo: “Vossas palavras tocaram-me o fundo da alma e dispenso relatar as minhas cruelda- des e blasfêmias contra Deus, que considerava fraco porque não re- agia às nossas infâmias. Não mereço estar em vosso meio para pedir desculpas, tampouco externo qualquer pedido pessoal, seja de servo ou de soberano, mas que se cumpra a vossa vontade. Deste modo será extirpada a pedra fundamental de toda maldade, da fraca cons- trução de todo ultraje. Assim, talvez possa ser erigida uma constru- ção mais meritosa dentro da sabedoria de Farak, do Deus verdadeiro e poderoso. Espero apenas vossa piedade para poder levar mulher e filhos e seguir o caminho trilhado por Caim.”
Farak ergueu-se novamente e disse: “Thahirak, Deus e os es- píritos livres não podem desfazer o que foi feito; muito menos nós, humanos. Se existisse uma fagulha de sabedoria divina na criatura, ela certamente se pronunciaria da seguinte forma:
Este homem errou tremendamente em sua consciência mal- dosa, pois não dispunha da Graça do Alto e estava cego em seu amor-próprio, em prejuízo seu e de todos os atingidos. Um jato de luz da Misericórdia Divina fê-lo ver sua perversidade e crueldade. Apavorado e com remorso, renunciando a tudo que até então lhe trazia satisfação, que dirias a ele? Perdoá-lo-ias como se nunca tivesse pecado, satisfeito com sua transformação. Muito embora humano, julgaste certo. Quanto mais Deus, como Origem de toda a Verdade, haveria de concordar contigo, ciente do porquê de nossos erros.
Condenamos nossos irmãos segundo o número de seus pe- cados, haja ou não remorso. Deus não condena nem julga erros co- metidos e arrependidos, mas somente os não arrependidos. O que foi feito nunca desaparecerá, permanecendo na recordação de Deus, como mácula na linha de nossa vida. Esta linha não será julgada no início, nem no meio, mas no fim, pois ela cresce reta pelo amor e sua justiça, ou torta e envergada pela maldade e sua injustiça.
Assim sendo, a força da Sabedoria de Deus endireitou tua linha sinuosa. Não deves condenar-te, mas prolongar tua linha de vida, com retidão, para o verdadeiro Deus, com toda fidelidade e justiça, e vez por outra deves olhar para trás, para a linha retifica- da por Deus. Assim, ao descobrires um desvio, de pronto poderás evitá-lo com a Graça do Alto, que iluminará o destino de tua vida no Reino do Amor Eterno. Aceita o que te é oferecido por Hanoch e guarda essas minhas palavras. Vós outros, sede irmãos entre vós e conduzireis o povo segundo a Vontade de Deus todo Poderoso.”
Todos aceitaram de bom grado o conselho de Farak e diri- giram-se para suas cidades, executando as ordens dadas por ele. E o povo rejubilou-se com tal orientação.
Depois de convertido por Farak, Hanoch lhe disse: “Irmão, falaste e agiste bem, pois onde há uma criatura, pode-se aguardar amor e misericórdia do Alto. A morte finaliza tudo. Quero curar as feridas, ao teu lado, pois com tua compreensão foste capaz de evitar uma grande desgraça.”
Assim, este governo melhorado prosseguiu durante mais de quinhentos anos sob a direção dos filhos e netos de Hanoch, como: Jrad, o mais moço (o violento discípulo de Farak); governou cem anos; seu filho mais moço, Mahujel (o fatalista e profeta ou adivi- nho) também governou cem anos. Em seguida, seu filho mais moço, Methusael (entusiasta ou cultor da Natureza e suas forças) governou cento e dez anos; e, finalmente, Lamech, o filho deste, que quase Me esqueceu totalmente (inventor de castigos mortais, praticados sob seu regime) regeu durante duzentos anos.
Este merece maior estudo porque com ele terminou a sobera- nia, dando lugar à idolatria e cobiça e à maldita filosofia naturalista como maior obra da ilimitada maldade da serpente.
Aliás, Lamech não tinha direito de regência, porque somente o filho mais moço poderia assumir o governo e apenas em caso de morte ou acidente caberia tal direito ao primogênito e, por morte deste, o do meio teria tal privilégio.
Naquele tempo ainda era vivo Johred, filho mais velho de Methusael, e seu irmão mais moço Hail. Lamech, homem carrancu- do, orgulhoso e traiçoeiro que, em sua vaidade desmedida, defendia o ponto de vista de lhe assistir também direito de regência, revoltou-
-se com a antiga praxe. Rodeado de maus companheiros de ideias semelhantes, organizou um conselho por ocasião da posse de Hail, após a morte de Methusael, a fim de conseguir os meios para atingir o seu intento.
Um deles, que se chamava Tatahar, o sanguinário, deu-lhe o seguinte conselho: “Somos setenta e sete homens, fortes como car- valhos, destemidos como tigres, corajosos como leões e cruéis como hienas, e tu és nosso mestre. Cremos não te ser difícil pôr um ponto final à soberania de Johred, com uma clava na mão, naquele local
onde há dias caçamos tigres. Se uma hiena esfaimada tiver triturado os ossos dele, poderás acrescentar o jovem Hail como sobremesa. Sendo tu descendente direto de Caim, Hanoch, Jrad, Mahujel e fi- lho de Methusael, quem poderia discutir contigo acerca da regência? Age com rapidez, que estaremos a teu lado.”
Tal conselho muito agradou a Lamech que, no dia seguinte, encontrou oportunidade para sua execução, com ajuda da serpente. Sabedor de que Johred e Hail se achavam na mata, ele e seus capan- gas se ocultaram atrás das árvores. Quando os dois irmãos se apro- ximaram, Lamech atirou-se sobre eles, matando-os sem dificuldade.
Sofreram isto porque se orgulhavam de sua sabedoria, pois como filhos de soberanos esqueceram que a verdadeira sabedoria reside somente na maior humildade, e quando esta é posta de lado, a sabedoria também vilipendia.
Isto te sirva de advertência, Meu servo, caso pretendas so- brepujar teus irmãos por te ter dado o dom da sabedoria. Se te tor- nasses impudico, ladrão ou dissipador, tal dom, raro entre as criatu- ras, se tornaria fraco em ti. Se te orgulhasses com ele, Eu o tiraria, abandonando-te na floresta do engano e serias estraçalhado pelas dúvidas, restando-te apenas um nome sem valor. Recebeste-o na hu- mildade, e assim terás de conservá-lo e passá-lo a todos os irmãos.
LAMECHSETORNA REI
Após tamanho crime, Tatahar voltou satisfeito para Hanoch e ordenou que fosse levado ao conhecimento dos habitantes das dez cidades o que havia sucedido a Johred e Hail, provocando o terror entre todos. Os mais inteligentes, cerca de três mil, sem contar mu- lheres e crianças, se reuniram e se dirigiram à cidade de Hanoch, e o principal orador disse a Lamech: “Em que floresta se deu tamanha desgraça, pois queremos descobrir o local onde talvez ainda se en- contram vestígios que nos convençam da veracidade desta informa- ção. Também queremos procurar a fera sanguinária e exterminar sua espécie, vingando Johred e Hail.”
Retrucou Lamech: “Tomastes uma boa resolução. Eu, como vosso soberano legal, vos acompanharei e meu servo Tatahar, com seus camaradas bem armados, será nosso guia.”
Todos se levantaram e, acompanhados de Lamech, foram à floresta, onde encontraram o local ensanguentado e os restos dos trajes que piedosamente foram recolhidos. Isto feito, seguiram mato adentro, em grupos de cem e próximos uns dos outros, a fim de pro- curarem a hiena maldita. Enraivecidos, conjecturaram: “A fera cer- tamente se refugiou nas montanhas. Conquanto ninguém se atreva a pisá-las, nós violaremos esta lei. Vamos, pois!”
E Lamech respondeu: “Concordo convosco, mas ficarei aqui, à espreita de qualquer animal feroz que tenha fugido ao vosso ata- que.” Os três mil homens iniciaram a marcha montanha acima e mal se atreviam a olhar para trás devido à imensa altura. Durante três dias efetuaram a busca, sem êxito. Desanimados, arremessaram suas clavas contra uma rocha que lhes impedia o avanço e amaldi- çoaram as florestas como moradia de feras, pedindo explicações às árvores e praguejando contra o Sol, as estrelas e a Lua, que assistiram a tamanho ultraje.
O mais forte entre eles, chamado Meduhed, pronunciou então o seguinte discurso: “Que tolice é esta? Vossas clavas estão sendo partidas contra as rochas; se na volta encontrarmos uma fera, não teremos com que nos defender. Sabeis que não se pode lutar contra Deus, que facilmente pode transformar árvores em pedras, caso tivesse poucas feras para nos castigar pela desobediência de pi- sarmos as montanhas, não obstante a proibição de Caim, Hanoch e Farak. Talvez seres superiores habitem nessas alturas, contra os quais nossa ação seria inútil. Voltemos enquanto é dia, menos perigoso que a noite.”
Quando se aprontavam para voltar, Meduhed avistou um homem alto numa saliência da rocha. Este homem era Seth, filho de Adão e representante de Abel, de quem recebera a Minha Ordem de seguir para a Terra prometida, com Adão e Eva. Lá deveriam habitar as montanhas, longe do antigo Paraíso.
Como Seth não tivesse perdido a faculdade de falar o idioma de todas as criaturas, dirigiu-se a eles com as seguintes palavras:
“Filhos rudes, que esquecestes Deus! Qual teria sido o castigo justo de Deus que vos trouxe aqui para vossa perdição? Que procu- rais neste local proibido? Afastai-vos para o abismo predito, do qual não haveis de fugir antes que essa rocha vos dizime!”
Apavorado, Meduhed se atirou de joelhos, pedindo miseri- córdia. Inspirado por Mim, Seth se comoveu e disse: “Somente tu, Meduhed, poderás erguer o olhar para mim, porquanto impediste que teus irmãos cometessem grande maldade diante de Deus. Deve- rás saber quem é a dita hiena esfaimada: chama-se Lamech e perma- neceu na planície dirigindo o bando de Tatahar.
Ai de quem se atrever a pôr a mão naquele homem, pois terá se antecipado a Deus, destruindo o laço do Amor Divino e desatando o imensurável firmamento dos julgamentos da Divin- dade, que atirará grandes colunas de fogo sobre a Terra toda, para destruí-la. Ergue-te e volta com os teus. Não ligues para Hanoch, mas observa sempre a ti mesmo e a Deus, justo Salvador, dos que O consideram.”
Neste instante, Seth ficou iluminado. Os outros se assusta- ram de tal maneira que debandaram, saltando sobre pedras e rochas e atingindo a planície antes do pôr do Sol, e à meia-noite se encon- travam em suas casas.
EMIGRAÇÃO,COMORIENTAÇÃODE MEDUHED
Antes de se separarem, Meduhed se dirigiu a todos, dizendo: “Tenho algo de importante a vos dizer. Vistes e ouvistes aquele que nos advertiu sobre a conhecida hiena, prometendo vingança por se- tenta e sete vezes. Se o deixarmos viver, sofreremos o mesmo destino que os irmãos dele. Se nos vingarmos, receberemos castigo do Alto. De qualquer maneira, aguarda-nos a morte certa.
Esqueçamos tudo e deixemos este país, em direção ao Sul, onde encontraremos pequena cordilheira, fácil de transpor. Se che-
garmos ao fim do mundo, será melhor vivermos lá do que nesta intranquilidade!
Lembremo-nos das palavras daquele gigante e confiemos apenas em Deus, e talvez amanhã vejamos o Sol naquela cordilheira. Aprontai vossas famílias, animais e provimentos e dentro do menor prazo estaremos aqui reunidos para a partida.”
Dentro de duas horas todos estavam prontos e, após Me- duhed constatar a presença de todos, agradeceu a Deus e fugiu com dez mil homens, vinte mil mulheres e igual número de came- los e mulas.
Antes de surgir o Sol, já haviam alcançado a cordilheira dis- tante, o que não teria sido possível sem Minha Ajuda, pois distava trinta horas de marcha.
Enquanto a multidão descansava e se alimentava dos frutos transportados, Meduhed, acompanhado de dez companheiros, se distanciou, para se prosternar com amor diante de Deus. Em êxtase, descobriu muita coisa maldosa em seu coração, levando-o a chorar.
Percebendo sua sinceridade para Comigo, gravei as seguin- tes palavras em seu coração: “Meduhed, levanta-te diante de Minha grande Misericórdia. Foste salvo com todos que te seguiram, movi- dos pelo teu amor ao próximo. Todavia, não podes permanecer aqui, mas segue o curso desse pequeno rio durante setenta dias. Quando chegares às grandes águas farás um estágio de outros setenta dias. Em seguida, concentra-te como hoje, que te mostrarei os meios para caminhardes sobre as águas, para um grande país, onde estareis li- vres das perseguições de Lamech, o fratricida. Tereis que vos lembrar sempre de vosso Deus e que sois um povo do qual sou Pai, Santo e Amoroso.
Também fostes Meus filhos quando esta Terra surgiu como gota de orvalho de Meu Coração, e o Sol, como lágrima de Mise- ricórdia de Meu Olho Onipresente! Tratai de vos tornardes, pelo amor, aquilo que fostes em outros tempos, quando a Terra alimen- tava uma raça pervertida e aquele grande Sol ardia na Minha Graça. Segui em Meu Nome. Amém.”
Meduhed transmitiu Minhas Palavras aos companheiros e todos se sentiram profundamente comovidos. Incontinenti, se pu- seram em marcha e, após setenta dias, atingiram o grande mar — que chamais de Oceano Pacífico — que se apresenta amarelado nas margens e azul nas profundidades em virtude da mistura das cores do fundo, do sal amoníaco e dos raios solares que lá se quebram.
Convencidos de ser Eu bom Guia, todos se prosternaram e agradeceram, pois Meduhed lhes servia de exemplo nesta devoção. Sumamente felizes por sua salvação, ergueram-se e Meduhed subiu numa pequena elevação de sete toesas, pronunciando um longo e inspirado discurso, tornando-se justo pregador em Meu Nome.
Seu conteúdo foi o seguinte: “Irmãos, ouvi as palavras que vos transmito por Ordem de Deus e que são de suma importância. Deus, o Altíssimo, nos salvou milagrosamente das mãos assassinas de Lamech e nos conduziu até o fim do mundo, onde vedes o come- ço das águas. Certamente estaríeis felizes de viver neste país tão belo e hospitaleiro. Mas, Deus nos permitiu uma estada de apenas setenta dias, pois durante esse tempo um exército de Lamech, chefiado por Tatahar, há de nos descobrir. Aquele que caísse em suas mãos seria estraçalhado qual ovelha pelo tigre.
O Senhor mostrou-me um lugar onde encontraremos ins- trumentos semelhantes aos dos filhos que habitam nas montanhas, para reconhecermos que Ele é Pai de todos nós, se aceitarmos Seu Infinito Amor.
Devemos usar os instrumentos para o corte das árvores e preparar dez mil troncos da melhor espécie. Eles devem ser liga- dos por pregos, que também encontraremos entre as ferramentas. Quando esta base estiver pronta, três troncos devem ser coloca- dos nos lados, um por cima do outro. O interior deve ser vedado com piche e resina que as mulheres e as crianças poderão colher das árvores.
Temos que construir essas arcas à margem do mar e no úl- timo dia fixar em cada ponta um ramo verde, como prova da vitória obtida pela Graça do Alto. No dia da promessa saberemos o que nos
competirá fazer, pois o terror de Hanoch ainda prende nossa aten- ção. Não temos soberano, mas apenas Deus, Senhor de todo Poder e Força, Justo sobre todos, desde sempre. Devotamos submissão e obediência a Ele, e quem se rebelar não será punido pelos irmãos, pois Deus Mesmo o castigará com a retirada de Sua Graça.”
OCÂNTICODE MEDUHED
Quando Meduhed terminou seu discurso, todos se proster- naram diante de Deus, louvando-O sobremaneira. Em seguida ca- minharam, guiados pelo Espírito da Graça, para o interior daquele país, onde acharam dentro de uma gruta numerosos instrumentos: machados, picaretas, plainas, facas, serrotes, martelos, verrumas, formões e milhares de pregos.
Incontinenti tomaram os instrumentos e começaram a tra- balhar, cheios de gratidão, razão por que sua tarefa foi executada tão rapidamente que poderia ser considerada um milagre. Assim, conse- guiram construir duzentas e cinquenta arcas, em apenas quinze dias que foram atadas por cordas para evitar fossem carregadas pela maré crescente.
Sobrando-lhes ainda quinze dias de repouso, permiti que, por Meduhed, recebessem melhores conhecimentos de Mim, do sábado — no qual deveriam se abster de qualquer trabalho para se entregarem inteiramente a Mim — e todos deveriam atingir a sabedoria de Farak e Meduhed. Se Me amassem com humildade, Eu Me tornaria Pai bondoso e lhes tiraria a morte, pois seriam aceitos como filhos no Seio do Amor Divino até a época de todas as épocas, quando viriam para junto do Pai, saciando-se dos eflúvios imensu- ráveis do Seu Amor.
Sumamente felizes com esta promessa, rodeavam Meduhed, ansiosos por ouvir diariamente algo mais a Meu respeito, o que Me alegrava no Céu e a todos os anjos no Universo.
Por intermédio de Meduhed Eu lhes ensinava a gravar as palavras por meio de sinais ou quadros correspondentes ao senti-
do espiritual. Deste modo, dentro em pouco aprenderam a ler e a escrever.
Assim, criei um povo que até hoje permanece em suas ori- gens, do que falarei posteriormente. Em seguida, inspirei Meduhed a entoar um cântico de louvor, que foi gravado e lido para o povo, que exultou de alegria, somente abrandada por um milagre — uma chuva de Meu Amor, porquanto sua alegria era justa. Estavam felizes com o conhecimento de Meu Nome, do Meu Amor e mais ainda por ser Deus Magnânimo como Pai de Seus filhos. Esta bênção sur- preendente os impeliu para dentro de suas cabanas de barro, galhos e junco e não teriam terminado seu louvor, caso não lhes transmi- tisse um sono suave.
PARTIDADOS MEDUÍTAS
Decorridos os restantes cinquenta dias, todos foram convo- cados por Meduhed, inspirado por Mim, que lhes disse: “Organi- zai-vos em redor daquela colina para ouvirdes a Vontade revelada do Altíssimo. Deveis juntar as ferramentas e colocá-las em cima de palha, em cada arca, dividindo-as pelas embarcações. Em seguida, levai para lá os frutos colhidos durante trinta dias e colocai-os nos cantos, debaixo dos galhos de figueiras. Os camelos e mulas ficarão para provarem a Lamech que aqui estivemos, deixando para trás o irracional, salvando apenas o humano, portanto, divino. As ferra- mentas devem ser cobertas com galhos e peles de animais. Isto feito, voltai aqui para vos transmitir as demais instruções do Alto.”
Todos se curvaram perante Meduhed e, ligeiros, cumpriram as suas ordens e dentro de sete dias tudo estava organizado. Quando voltaram à colina, felizes e alegres com a tarefa concluída, ele lhes disse: “É da Vontade do Senhor que cada arca seja ocupada por cen- to e vinte pessoas — quarenta homens e oitenta mulheres. As crian- ças serão acomodadas em peles de animais. As mulheres sentarão nas cobertas e capas. Os homens devem ficar de pé, com o rosto voltado para a direção tomada pelas arcas em virtude do vento e convém ali-
mentar-se somente ao meio-dia. Nenhum deles deve dormir, sentar nem deitar, pois o Senhor os fortificará, mantendo-os alerta durante a permanência nas grandes águas. Mulheres e crianças não deverão se servir dos frutos, mas pedi-los humildemente aos pais e maridos, pois assim serão um povo segundo a Vontade de Deus, merecedor de Sua Graça e Amor.
E quando todos estivermos dentro das arcas, o mais velho de cada arca, a um sinal vindo do Céu, deve se preparar para cortar a corda que as mantém presas à margem, pois um forte vento as impelirá para alto-mar, à vista de Tatahar, que chegará precisamente quando estivermos longe da praia.
Veremos como atirarão pedras dentro d’água que não nos atingirão. A Mão Protetora de Deus nos conduzirá velozmente para um país enorme e longínquo, no meio de um grande mar, que se chama Ihipon(Japão)distante daqui trinta dias e trinta noites. Tal país será nosso enquanto durar o mundo. Descobri-lo-emos através de uma grande montanha ardendo em chamas de Amor Divino(Fujiyama).
Haverá apenas uma entrada por entre duas montanhas ele- vadas e ardentes. O lado marítimo está sempre cercado de imensas vagas. No interior haverá muitas montanhas, nas quais não existem tigres, hienas, lobos, ursos, leões e serpentes, pois se assemelham a uma muralha que atinge os Céus, dificilmente galgadas.
Há no interior grandes planícies cobertas de frutos deliciosos e povoadas de animais mansos e úteis que fornecerão leite para nosso alimento. A terra terá o sabor do mel, pois não contém areia nem pedras, podendo ser comida qual pão. Não existe em todo o planeta o que se lhe assemelhe, pois não é demasiado quente, nem frio.
As criaturas que lá viverem segundo a Vontade do Senhor não envelhecerão, e sua morte será um sono suave. Em seguida, virão seres invisíveis que despertarão tais criaturas para levá-las junto de Deus. Não haverá vestígio de pó que se agarrasse nos pés de um ressuscitado.
Mas, quem não fizer a Vontade de Deus, também morrerá, sem todavia ressuscitar. Os vermes comerão sua carne, cabelos, ossos
e pelo. Sua alma e seu espírito voltarão a ser base das cordilheiras por milênios, na consciência trevosa de sua miséria e completa nuli- dade, até que sejam assimilados por um animal qualquer, segundo a Vontade do Alto, passando de degrau a degrau pelo mundo animal, completamente mudo, para finalmente alcançar a dignidade homi- nal. Guardai-o bem, pois em tal caso tereis que morrer milhares de vezes para atingirdes a vida do Amor e da Graça de Deus.
Antes de atingirdes quarenta anos de idade não deveis to- car em vossas mulheres, assim mesmo somente para a procriação abençoada por Deus. Ninguém deve possuir mais de duas ou três mulheres. O que passar daí será considerado pecado, encurtando vossa vida e tornando-a penosa, enfraquecendo vosso amor a Deus, que vos tirará todo saber, que é acréscimo para os que cumprem Sua Vontade.
Também não deveis considerar algo posse vossa, mas posse de Deus, e quem afirmar: Essa haste é minha — será castigado com cegueira para que jamais possa colher frutos, e terá que aprender a viver do Amor de Deus e do próximo.
Os pecadores comerão erva e folhas secas, pois, pelo peca- do, se igualaram a animais. Enquanto não se remirem de seus erros, não se atreverão a comer outra coisa, se pretenderem conservar a vida. Isto diz respeito mormente aos impudicos e às jovens que se entregaram à volúpia. Seu físico será acometido de peste e serão des- terrados para as fronteiras do país, onde só nascem ervas e folhas. Além disto, o Senhor recomenda o amor ao próximo e que ninguém venha a ser juiz de seu irmão, pois o fraco deve procurar o mais forte para receber ajuda. O mais sábio deve servir a todos como devoto conselheiro.
Ouvistes a Vontade de Deus. Agradecei-Lhe de coração, dizendo: Senhor, todo Poderoso, fortalece nosso coração para que possamos nos tornar merecedores e louvar-Te pela imensa Graça de sermos igualmente Teus filhos. Tua Vontade Se faça. Amém.”
Terminada a pequena oração, todos subiram nas em- barcações e tudo ocorreu conforme Meduhed havia anunciado.
Os pobres meduítas eram perseguidos pelas hordas de Lamech, guiadas pela serpente, mas Eu impeli as embarcações, em grande velocidade, para as margens de um grande continente rodeado pelos mares.
Os lamechitas, porém, foram perseguidos pela crescente maré até as montanhas, onde foram estraçalhados pelas feras. Era de sete mil homens e sete mil mulheres o número dos perseguidores. Deles sobraram sete rapazes e sete moças, que voltaram a Hanoch. Relataram os acontecimentos e trouxeram os animais deixados pe- los meduítas, entregando-os a Lamech, a quem narraram a situação estranha, pois lhes parecia que um grande rei morava acima das es- trelas. As criaturas não deviam desafiá-Lo, mas adorá-Lo, pois até o mar, os ventos, os raios e todos os animais ferozes Lhe obedeciam. Além disso, teriam ouvido uma Voz, qual trovão, que teria se dirigi- do aos elementos.
Ao ouvir isto, Lamech se enraiveceu e resolveu vingar-se em Mim, pois a serpente havia dominado o seu coração. Voltando-se para os jovens, disse: “Exijo satisfação e reparação daquele Rei es- telar. Como sabeis onde Se encontra, transmiti-Lhe o que mando. Caso Se negue a obedecer, dizei-Lhe que O amaldiçoei e, ainda que seja poderoso, será por mim estraçalhado como foi o meu povo pe- los animais Dele. Com o Seu irrisório poder é apenas cordeiro fraco perto de mim, rei dos leões. Incendiai as matas, para que Suas feras sejam assadas e Ele ainda possa Se alimentar de sua carne e ossos. Caso não queira deixá-las queimar, poderá levar as águas para lá e afogar todo o Seu Poder.
Tudo que faz é por medo de mim, pois conhece o meu po- der e força, que muito trabalho Lhe dão e ainda O exterminarão, se não executar minha vontade.”
Os jovens se afastaram para pensar. “Se ele”, diziam, “é tão poderoso, por que não vai pessoalmente concretizar sua vontade? Todos nós sabemos até onde chega o poder de nossas mãos. Quem teria visto apenas um Dedo do Rei dos astros? Lamech é uma mosca perto de Tatahar e seus asseclas. Mas, onde estão? Somente nós nos
salvamos e vimos o imenso Poder e ouvimos o discurso do grande Rei, diante do qual a Terra toda estremeceu. É preferível louvá-Lo, ao invés de ameaçá-Lo. Talvez nos aceite, como fez a Meduhed, e Lamech poderá medir suas forças com Ele.”
Dito e feito. Executaram seu plano, tomaram camelos e mulas carregados de frutos e se dirigiram para as grandes águas — o Oceano Pacífico. O primeiro orador, então, disse: “Que faremos agora? Não sabemos para onde ir. Peçamos ao grande Rei que nos oriente sobre nosso destino, pois certamente foi por Seu intermédio que nos desvencilhamos das garras de Lamech. Por isto chamo por Ti, grande Rei, cujo Nome desconhecemos, para que nos transmitas a Tua Vontade ou nos aniquiles, pois é preferível sermos extermina- dos por Ti do que servir a Lamech.”
Mal terminou a prece, um vento começou a soprar das montanhas e uma imensa hiena, de aspecto furioso, em carreira desabalada, postou-se diante do pequeno grupo, como se quisesse escolher o melhor bocado. Apavorados, fizeram menção de se atirar ao mar, mas o orador protestava com voz forte: “Fiquemos onde estamos, protegidos pelo Poder do grande Rei, e não temamos esta pequena hiena, porquanto fugimos de uma muito mais perigosa.
Crede-me, Ele há de nos salvar. Confiante em Sua Proteção, irei meter minha cabeça dentro da boca do animal; se sofrer um aci- dente, fugi para dentro da água. Percebendo que nada me sucedeu, agradecei ao grande Rei por Se ter aproximado de nós.”
Cheio de fé, o orador executou o seu intento, saindo incó- lume da boca da hiena, e o pequeno grupo imediatamente se atirou ao solo para agradecer por este milagre. Depois de quase se extenua- rem em seus louvores, a própria hiena começou a falar: “Olhai para mim, descendentes de Caim e Hanoch, e vede minha figura cheia de fúria e ódio, destinada a zelar pelas montanhas e os filhos de Deus, a quem chamais de grande Rei. Dize-me se, como animal, jamais teria infringido a Vontade de Deus. Minha existência é pó e terra; meu tempo é curto, apenas alguns anos, dias e horas. Nada espero. Do Criador tenho a lucrar apenas aquilo que minha voracidade me
proporciona, e quem me tiver visto ultrapassar os limites prescritos por Deus, que me atire uma pedra.
Grande é vossa admiração pela minha obediência às Leis de Deus, pois uma fera vos demonstra o vosso completo esquecimento de Deus, ensinando-vos a Vontade Dele. Não existe animal tão feroz capaz de atacar outro de sua espécie para saciar sua fome. Vós, cria- turas destinadas à vida eterna, vos unis para matar o semelhante por mera tendência de domínio.
Onde está vossa glória? Sois quatorze criaturas e eu uma só; no entanto, vos assustastes com um animal infeliz que, inicialmente, se destinava a vos servir. Certificai-vos se na floresta uma fera procura dominar outra; caso se torne invejosa é imediatamente expulsa do grupo, e nunca um animal obrigou outro a fazer-se ladrão para ali- mentar o preguiçoso. Caso se tenha tornado fraco, um carrega alimen- to para o outro. Isto nos ensina a Vontade Divina em nosso íntimo, e não há um irracional que levante a cabeça sem a Vontade de Deus.
Onde, na Terra, existe algo mais cruel do que vós, criaturas? Serpentes, leões, tigres, são verdadeiros anjos perto de vós. Se tivés- semos capacidade de amar, como haveríamos de amar a Deus! Mes- mo assim, demonstramos nosso amor pela obediência a Ele, muito mais do que vós que esquecestes não somente o Seu Amor, mas Dele Mesmo que vos criou.
Inquiri pedras, ervas, águas de fontes, tudo enfim que vos rodeia, e tudo relatará das maravilhas de Seu Amor; somente vós, criaturas destinadas à eterna felicidade, pudestes esquecer inteira- mente o vosso Deus e Criador. Demônios O conhecem e fogem Dele; Satanás O conhece e O odeia, pois é Deus e Soberano de sua existência. Quem sois vós que, de demônios, vos tornastes criaturas livres, julgando-vos deuses só porque podeis vos matar uns aos ou- tros e erigir montões de pedras que chamais de cidades?
Em suma, antes de vos inteirardes de outra finalidade, de- veis privar do nosso convívio durante setenta dias para aprenderdes conosco humanidade e amor ao próximo, e por ele, a Deus. Só en- tão o Senhor vos mostrará um local de paz. Segui-me sem susto.
Quem tiver boa vontade nada sofrerá. O desobediente não merece ser estraçalhado pelos dentes de uma hiena, pois o espera o destino dos demônios, através do príncipe satânico, Lamech.”
Deste modo, o grupo de quatorze pessoas acompanhou a hiena à sua cova, onde aprendeu, pela natureza das feras, os mes- mos direitos da humanidade, obediência e conhecimento de Mim, esclarecendo-os acerca da diferença entre humanos e irracionais, e quão desprezíveis eram. Tudo isto por Minha especial Graça, que lhes demonstrou a Minha Vontade nos animais.
CHEGADADOSMEDUÍTASAO JAPÃO
Deixemos este pequeno grupo na escola dos irracionais, ali- mentando-se de bagos silvestres, ervas e raízes e nos dirigiremos ao Japão, onde aguardaremos os meduítas que, após trinta dias e trinta noites, com o auxílio de Meus ventos favoráveis lá chegavam, feli- zes, dando loas ao Meu Nome, precisamente na embocadura de um grande rio que os conduziu ao interior do país.
Emocionado com a beleza do mesmo, Meduhed se atirou ao solo rendendo-Me graças durante uma hora, e todos o observavam com respeito. Terminada sua prece, pela qual percebeu nitidamente a Minha Vontade, ele fez uma vistoria em todas as arcas e recomen- dou que não desembarcassem antes de agradecerem a Deus durante três horas. Caso o Senhor, por um sinal, abençoasse este país tão belo, ele saltaria primeiro por terra. Isto feito, os companheiros e seus familiares deveriam seguir seu exemplo. Mas, não deveriam deixar de adorar a Santidade divina e louvar Sua imensa Misericór- dia e Graça.
Cumprida essa ordem, olharam para o alto, por insinuação de Meduhed, e viram uma nuvem luminosa cobrir toda a região e uma chuva abundante dela se desprendeu durante uma hora. Em seguida, a nuvem abençoada se dividiu, surgindo um arco-íris e uma brisa suave transmitia a Meduhed ter Eu abençoado a terra e pode- riam desembarcar, como fora prometido.
Uma vez reunidos, Meduhed lhes disse: “É da Vontade do Senhor, nosso Deus e Pai, que nos amemos como irmãos, e cada um seja severo consigo mesmo e meigo e amoroso para com o próxi- mo. Jamais alguém deve querer sobrepujar o irmão, pois para Deus só vale um coração puro e humilde. E caso alguém receba a Graça que Ele me conferiu, deve estar pronto para servir a todos e a dar o melhor exemplo. Somente os menores são obrigados à obediência incondicional, em virtude de sua fraqueza inata e indispensável edu- cação. Mas, quando conhecerem a Vontade de Deus dentro de si, a obediência deve ceder ao amor e respeito aos pais. Deveis prestar ouvidos aos mais sábios a fim de vos informardes dos Desígnios de Deus. Precavei-vos, todavia, de render-lhe maior respeito, amor e veneração do que a um irmão menos sábio, porém de boa vontade.
Vosso respeito para com o sábio deve consistir apenas de amor a Deus e ao próximo e obediência aos desígnios divinos, atra- vés do coração humilde do semelhante. Que jamais uma inverdade ultrapasse vossos lábios, pois a mentira é a origem de todo mal. Lon- ge de vós esteja a alegria maldosa ante a penitência do pecador, pois o vosso amor deve ajudar o irmão em erro.
O país pertence a todos e o produto do solo deve ser ali- mento dos necessitados, e o forte deve colher para os fracos. Sede bondosos para com os animais que vos fornecem o leite saboroso.
Que cada um se submeta ao seu irmão, procurando ajudá-lo; nunca deve ser dada uma ordem, pois convém tratar-vos com amor a fim de vos tornardes filhos de Um Só Pai. Como o Senhor nos dá mais do que necessitamos, devemos ser moderados, alimentando-
-nos com sobriedade, para que sejamos saudáveis. Assim fala o Se- nhor: Abençoadas sejam moderação e medidas justas; amaldiçoado seja o excesso e condenados os caminhos tortuosos nos quais cam- peiam a impudicícia e a prostituição, que hão de encontrar a noite da perdição e da morte eterna! Por isto, colhei o supérfluo da bênção e construí celeiros de madeira e não de pedra, como fez Hanoch.
Guardai as ferramentas sob os celeiros. Ninguém é dono dos depósitos, pois todos trabalham em conjunto a fim de que não haja
miséria para vós e vossos descendentes. Perto das montanhas encon- trareis pedras lisas e duras para triturar os grãos. Juntando água à farinha, conseguireis fazer massa para o pão. Além disso, tais pedras devem ser usadas para anotardes o que acabo de vos transmitir pela Vontade do Senhor.
Ele Mesmo vos diz neste momento: ‘Enquanto vós e vossos descendentes viverdes dentro desta ordem, não haverá outro povo que se aproxime para perturbar vossa paz, e Eu Mesmo vos ensinarei muitas coisas boas e úteis. Se transgredirdes a Minha Ordem, esque- cendo vosso Deus, enviarei um povo que vos subjugará, fazendo-vos escravos. Um imperador destruirá vosso santuário, ordenando a ma- tança de muitos, enquanto outros serão atrelados ao arado, como animais. Apossar-se-ão de tudo, deixando-vos à míngua, enxotan- do-vos para a margem do rio.
Não mais recebereis frutos e pão para pagamento de vosso trabalho, mas distintivos, segundo o grau do serviço prestado, que vos garantirão um pouco de alimento. Se ainda assim não voltardes à Ordem, tereis que devolver ao imperador um quinto de vosso lucro, como imposto, o que provará que sereis obrigados a pedir trabalho e, por meio dele, pagar o tributo.
Em tal situação não haverá no país um pontinho que não seja anexado pelo imperador, que o dividirá entre os seus favoritos como arrendatário. Sereis escravos dos favoritos e palacianos, que decidirão sobre vida e morte, dando-vos ervas e raízes para alimento. Quem se apossar de um fruto apenas será castigado com a morte.
Além disto, o imperador tomará vossas mulheres e filhas bonitas para si e seus favoritos, e sereis obrigados a atirar vossos filhos no rio. Em compensação, tereis de alimentar os filhos dele, para que vos maltratem. Eu, porém, taparei os Meus Ouvidos até os fins dos tempos para não escutar vossas queixas, e vosso destino será pior que na época de Hanoch. Gravai isto nas pedras para vossa futura recordação.’
Esta é a Vontade de Deus, meus irmãos. Segui os conse- lhos recebidos, que podereis continuar como povo independente,
sem perda de vossos direitos. Finalmente, Ele também ordenou que prendêsseis as arcas umas às outras, fazendo uma ponte sobre o rio, para podermos penetrar o país e usá-lo com justiça. Ajoelhai-vos para agradecermos ao Senhor por esta imensa Graça e acompanhai-
-me, dizendo: Santo, Bondoso e Poderoso Deus, nós Te agradece- mos! Que a nossa voz atinja Teus Santos Ouvidos e que Teu Olhar penetre nossos corações humildes. Desconhecemos o quanto é vazia nossa alma, por isto queira nos agraciar com o Calor de Teu Amor. Se esquecermos a Tua Santa Vontade, não permitas sejamos punidos pelos homens, mas Tu Mesmo nos castigues segundo Tua Justiça e Meiguice, e transforma o nosso coração para nos tornarmos iguais aos Teus filhos. Amém.
Ide e cumpri tudo no devido tempo e convencei-vos como o Senhor é Verdadeiro e Fiel. E se tudo tiverdes feito sem O esque- cerdes antes e depois do trabalho, antes e depois de cada refeição, antes e depois de dormirdes, antes e depois do pôr do sol e, princi- palmente, antes e depois de vos unirdes à esposa, pedindo a bênção do Senhor, havereis de gerar filhos da vida e da luz; caso contrário, somente filhos da morte e da treva.
Viverei perto deste rio, naquela gruta acima da montanha, morando com os meus. Tanto a montanha quanto a gruta me foram dadas pelo Senhor, por amor a vós, a fim de me encontrardes, sem- pre que necessário.
Atingirei idade avançada e serei testemunha de vossas ações boas e más. De todos que aqui se encontram serei o último a vos seguir diante da Face do Senhor.
Vós, meus companheiros, que vos tornastes sábios e instru- ídos, distribuí o povo pelo país e ensinai-o no que precisar e na lua cheia voltai para receberdes conselhos e orientação. Amém.”
Terminado o sermão, Meduhed foi alvo de grande respei- to por parte do povo, que se ajoelhou para render honras e preces durante três dias. Com os seus instrumentos construíram a ponte e mais tarde espalharam-se em todas as direções louvando-Me sem- pre. Deste modo muitos se tornaram inspirados como Meduhed,
vivendo felizes durante mil e novecentos anos, quase até a época de Abraão e não foram aniquilados pelo dilúvio.
Posteriormente, começaram a esquecer-se de Mim, pois Eu os havia feito o povo mais instruído e rico da Terra, resultando daí a inclinação para a escultura e queda na mais densa idolatria e desenfreada impudicícia. Como Eu tivesse fechado os olhos duran- te seiscentos anos e não percebesse a menor tendência para o arre- pendimento, instiguei, conforme havia anunciado por Meduhed, o povo da atual Mongólia . Um anjo invisível o guiou para o Japão, construiu uma ponte de ilhas, partindo da atual China , da qual ainda hoje algumas dão testemunho, de sorte que os invasores lá chegaram a pé, como os israelitas ao atravessarem o Mar Vermelho. Nesta ocasião fiz surgir, através do fogo interno da Terra, várias ilhas para eventuais refúgios de alguns sábios, que lá passavam a viver, servindo-Me em silêncio, até que os chamei para o Meu lado.
Em tais grutas ainda se encontram pedras com inscrições, como prova de Meu Amor, mas que ninguém seria capaz de ler, por serem mais difíceis que os hieróglifos egípcios, que somente poderão ser lidos por um renascido ou por uma sonâmbula em ligação com o seu espírito despertado.
Deste modo, ainda se encontram na gruta — que naquela época se chamava de Gruta de Meduhed — o Cântico dos cânticos e alguns instrumentos. Todavia, é hoje inalcançável por encontrar-
-se numa montanha muito elevada, o que se deu devido ao fogo e posteriores terremotos.
Assim, esse país ainda se acha sob constituição imperial, se- mimongol, e semijaponesa. Quem tiver dúvidas, que viaje para lá e procure convencer-se. Mas, não lhe adiantará muito se não tiver alcançado o completo renascimento. E quem o tiver atingido, não somente vislumbrará a superfície da Terra como suas profundezas.
Tudo o que ora vos transmito é verdadeiro para os Meus filhos, pois não o faço para o mundo. Por isto, não devem medir o Meu Amor, Sabedoria, Palavras e Graça pelo conceito munda- no. Não quero brilhar diante dele, mas desejo ser amado por vós.
Possuo inúmeros sóis para brilhar perante o mundo. Se criticardes Minha Escritura com vossa sapiência mundana, qual será Minha atitude com vossa tolice? Aprendei Comigo, e somente depois de orientados por Mim, compreendereis onde estão as melhores regras, Comigo ou com o mundo. O mundo tem a palavra no sentido; Eu tenho o sentido na palavra, razão porque muito dissipa quem não recolhe Comigo.
Antes de prosseguir na Minha Criação, desejo transmi- tir-vos algo a respeito do Meu anjo, precisamente àqueles que em cada linha se escandalizam por conceitos gramaticais. Se não forem maldosos de coração, poderão corrigir as falhas de Meu escrivão. Quem se atrever a melhorar uma frase será por Mim olhado com desagrado. Não procureis a palavra no sentido, mas o sentido na palavra, se quiserdes chegar à Verdade. Ela se encontra no espírito e não o espírito na Verdade, pois ele é livre e precedeu qualquer regra, deixando fluir a Verdade de seu íntimo. Se alguém julgar que Eu não Me adapto ao mundo com estaveste, guarde-Me em casa. Melhor será acrescentar à Minha Escritura uma regra dedu- zida do que uma crítica mundana, pois é mais sublime dar do que receber. Amém.
UMAPRÉDICA ANIMAL
Voltemos agora à escola da hiena, onde procuraremos os qua- torze estudantes, para registrarmos o adiantamento nesse curto es- paço com relação à melhoria de sua alma. Prestai bem atenção para ouvirdes uma forte admoestação partindo da hiena, de um tigre, um leão, um lobo e um urso. Os homens são cheios de mentira e não há quem diga algo verdadeiro ao semelhante, pois a experiência vos demonstrou o quanto os intelectuais se acham no erro; pois todos os seus conceitos são substituídos por outros, às vezes, piores. Por- tanto, não é supérfluo ouvirdes palavras do âmbito da natureza sem dolo, gravando em vosso coração o quanto é verdadeiro, justo e fiel o vosso Santo Pai.
Quando chegou o tempo prescrito, a hiena se apresentou pe- rante o grupo assustado, a fim de despertar sua atenção através do medo, e disse, de boca escancarada e com Minha Permissão: “Levan- tai-vos da morte, pois assim o quer o Senhor e Deus Onipotente de todos os seres. O tempo passou veloz, dia e noite se revezaram sobre vossa fraca existência. Naquele tempo em que fostes guiados por mim até aqui, vistes a Lua brilhar em sua fase plena, iluminando as trilhas íngremes dos picos até chegarmos à grota habitada por mim e meus filhotes. Foi posta à vossa disposição para vosso conforto na frescura do solo. De novo a Lua se apresenta grande e cheia, e aquilo que ela vos ensinou neste curto espaço deveis futuramente copiar com fidelidade. Vossa luz mundana terá que diminuir como a luz lunar a fim de vos capacitar à aceitação de uma nova luz celeste, um verdadeiro amor sem egoísmo, sendo ele a Graça do grande Deus benevolente.
Assim como eu agora vos falo, qualquer objeto poderá se tornar capaz de falar pela Graça do Alto. Mas, se continuardes de corações endurecidos e dominadores, prosternai-vos perante nós re- lembrando-vos desse discurso e o quanto vos encontrais abaixo de nós, e a posição dos filhos de Deus acima de nós.
Qual seria o animal que procurasse dominar sua espécie? Porventura já vistes um irracional se apossar de algo, ou tirar algo de outro animal? Já nos vistes assassinar, mentir ou praticar impudi- cícias para satisfação de nossa volúpia? Quando teríeis visto come- termos uma ação que não se enquadrasse em nossa natureza? Não seria justo que os animais aprendessem de vós o uso de suas forças? No entanto, somos nós, feras, a vos ensinar meiguice e o sábio rigor da vida. Envergonhai-vos senhores do mundo, por ter um inseto que zune nos meus ouvidos maior sabedoria que vós e a cidade de Hanoch com as dez circunjacentes. Muito embora sua existência não dure mais que alguns dias e quase nenhum vestígio exista de sua ação, ele realizou muito mais do que vós desde os tempos de Caim com vossas fabulosas construções e os martírios aplicados aos seme- lhantes, pois o inseto cumpriu a Vontade de Deus e se alegrou com
sua existência. Vós conseguistes esquecer o vosso valor e sobretudo o valor infinito do Amor Santificado de Deus, Eterno e Santo.
Ó Santo e Poderoso Deus, por que não criaste apenas hienas, tigres, leões e lobos e ursos, que sempre cumprem a Tua Santa Von- tade? Nunca deverias ter cogitado de criar o ser humano, que não somente esqueceu Tua Vontade, mas até a Ti Mesmo.
Olhai, seres humanos de pele lisa e bela, a minha figura hir- suta e miserável; não parece ser ela envolta na noite da maldição di- vina, enquanto a vossa se encontra na mais elevada bênção do Amor Eterno? Como é possível que sob a coberta da morte se encontre gratidão ao Criador, enquanto que sob vossa pele abençoada só se vê escárnio, desprezo e esquecimento total do Criador?
Por isto vos tornastes excremento do inferno pela desobedi- ência, enquanto minha espécie, com toda submissão à Onipotência Divina, há muitos milênios antes de vós palmilhando os campos do planeta, jamais se afastou da Ordem Divina, embora sentisse o peso de sua selvageria.
Considerai bem as palavras de uma fera e elevai-vos à dig- nidade do nome de criaturas; tratai de alcançar o estado humano, considerando o quanto se acham acima de vós os filhos de Deus e que deveis vos tornar ao menos parecidos com eles. Terminei o meu discurso e podeis aguardar outro. Amém.”
Após ter a hiena terminado seu discurso, um enorme tigre saltou à frente do grupo amedrontado, fitou-o com rigor açoitando o solo com sua cauda, e de olhar fixo dirigiu-se ao orador e che- fe, dizendo: “Sihin, este será o teu nome, que significa seres filho do céu terrestre, um céu dos animais que possuem uma alma do fogo solar. Ela tornou-se oradora falando à vossa alma que vem de Deus e vos foi dada para grande vexame diante de mim e de todos os animais sanguinários das florestas, pois esqueceu-se do grande Doador, enquanto nossa alma nunca se atreveu a discordar de Sua Ordem. Também somos dotados dos cinco sentidos, temos memó- ria, desejo e sabemos diferenciar terra e água, fogo e ar, dia e noite, seco e molhado, alto e baixo, íngreme e plano, frio e quente; temos
visão muito aguçada diante da qual nenhum espírito maldoso se pode ocultar, pois depara com um juiz implacável, pronto a iniciar a primeira revelação, para beber seu sangue impuro a fim de que não venha poluir as montanhas santificadas.
Todos vós presenciastes o que sucedeu ao exército de Ta- tahar. Julgais que foram os jumentos e camelos que vos protegeram de nossa ira justa? Nada disso! Deus nos ordenou de vos poupar e não houve um entre nós que não obedecesse à Santa Vontade do Criador.
E vós, seres humanos, que não somente possuís os cinco sentidos, mas usufruís igualmente de uma alma imortal e, dentro dela, de um espírito divino, fostes capazes de esquecer Deus e des- considerar Sua Vontade e Seu Santíssimo Nome? Ó gênero miserá- vel deste planeta, o que pretendes ser, se Deus — o Santo, teu Cria- dor amoroso, pelo Qual surgiste — foi exterminado por ti? Ele, que, além disto, te supriu de liberdade perfeita a fim de atrair-te cada vez mais ao Seu Coração Paternal!
Vede a erva. Ela louva a Deus, pois O conhece em sua mu- dez, enquanto vós nada sabeis Dele em vossa plena liberdade. Olhai as montanhas, as pedras, a água, tudo que se apresenta aos vossos sentidos louva e honra a Deus, e todos os Céus estão cheios de Sua Imensa Graça, Glória e Honra! De que estais vós repletos, se fostes capazes de perdê-Lo das vistas e do coração?
Termino de falar, pois não é possível fitar-vos por mais tempo e controlar a minha ira justa. Apenas acrescento que deveis lembrar do que vos disse um tigre feroz, na mansidão de uma ove- lha, segundo a Vontade Divina, caso o Amor Eterno vos salve de nossas garras, macias em comparação com vossas mãos sanguinárias, a fim de vos destinar para importante povo desta Terra. Aprendei da Natureza, caso vosso coração tenha emudecido diante da Voz de Deus. Amém.”
Havendo o tigre terminado seu discurso, foi a vez do leão, que, subitamente, saltou por detrás do arvoredo, postou-se diante de Sihin e começou a falar: “Ouvi-me, cegos e surdos, pretensos di-
rigentes do orbe, reis e soberanos do mundo! Qual seria o primeiro dever de uma criatura livre, detentora das forças dadas por Deus, considerando o Amor do Onipotente? Não deveria descobrir a Von- tade do Criador para cumpri-La e assim conquistar a Graça perdida, tragada por vossa incrível desobediência?
Porventura assim agistes? Jamais conhecestes a Deus, e, se- gundo vossa opinião, não existe dever com relação àquilo que se des- conhece. Pergunto-vos como foi possível esquecerdes Aquele que Se faz lembrar dia e noite, e de cuja Majestade manifestam o Sol, a Lua e as estrelas? Sou um habitante forte e cruel desta zona inóspita e sou obrigado, por minha natureza miserável, a procurar alimento dos julgamentos de Deus sofrendo a pior fome. Confesso que se alguém me socorresse com apenas algumas gotas de água para saciar minha sede abrasadora, segui-lo-ia qual anjo da guarda e partilharia com ele o meu último bocado para morrer de amor por meu benfeitor.
Vós não somente martirizais e matais vossos irmãos que para vós trabalham, como sois ingratos para com Deus, amaldiço- ando as Suas Bênçãos, Sua Graça, transformando Seu imenso Amor em veneno de víboras.
Ó Lamech, quiseste incendiar as florestas para nos destruir porque éramos obedientes à Vontade Divina. Que faremos contigo, pois esqueceste a Deus e mataste teus irmãos, querendo atirar sobre nós a culpa deste crime! Não pensamos em vingança, conquanto conheçamos teus planos. Vós, ingratos, pretendeis vingar-vos nos inocentes. Aprendei de mim a serdes gratos e obedientes, e agi se- gundo os planos do Amor Divino. Amém.”
Neste instante, se aproxima de passos mansos um lobo vo- raz e se dirige ao grupo, dizendo: “Encontra-se diante de vossos co- rações amedrontados, um lobo temido, mas chamado pelo grande Amor Misericordioso do Santo Deus a fim de mostrar-vos Sua Von- tade, por vós esquecida em vosso amor-próprio, domínio e desprezo de tudo que vos pudesse recordar a Existência do Criador.
Por este motivo, o Amor Eterno designou justamente a nós, as feras mais desprezíveis, para vos ensinar a obediência, meiguice e
humildade, e mostrar-vos que através de nossas atitudes Ele permi- tiu que nossas línguas se dirigissem aos mortais.
20. A Vontade de Deus Se expressa da seguinte maneira: Sois todos iguais perante Deus, por isto ninguém deve supor alguma vantagem sobre o próximo. Não haverá força, beleza, juventude, idade, virtude, sabedoria a vos conferir quaisquer direitos, pois essas dádivas devem ser aplicadas no auxílio mútuo, para dar-vos opor- tunidade de praticar as virtudes divinas. Foi somente o puríssimo Amor que levou a Divindade a vos criar e, por vossa causa, uma infinidade de seres são destinados a vos servir.
Todavia, vossa cegueira e surdez impedem que percebais algo daquilo que vos beneficiaria, pois a sensualidade e o amor car- nal vos atiraram às trevas, às garras da morte. Mudai de índole, equi- librai vossos desejos, purificai-vos com amor e tornai-vos semelhan- tes na humildade, obediência e ordem na criação da prole. Desisti da impudicícia, procriai com a Bênção de Deus, tornando-vos pais verdadeiros no Amor e na Graça de Deus. Devem os filhos primeiro obedecer ao vosso sábio amor, onde encontrarão a Vontade Divi- na e Sua Graça. Só então descobrireis que não fomos nós, feras, e sim a Vontade de Deus a vos dirigir Suas Santas Palavras por nosso intermédio.
E se alcançardes o que vos foi ensinado pelo Amor do Cria- dor Eterno, descobrireis que não somente irracionais, mas toda cria- tura será capaz de vos falar, e a morte se apartará de vosso coração, e de olhos e ouvidos abertos percebereis os milagres divinos em toda sua clareza. Considerai o que um lobo acaba de vos dizer milagrosa- mente, percebendo, que para o Amor Eterno e a Santidade de Deus todas as coisas são possíveis, e assim descobrireis fenômenos ainda mais singulares pela Graça de Deus. Amém.”
Após ter finalizado seu discurso pleno de Minha Sabedoria, apresentou-se um grande urso diante do grupo contrito, fitando-o com inquietação, como a demonstrar que o ânimo dos presentes era igualmente tolhido e inquieto. Finalmente abriu a boca e, segundo Minha Vontade, começou a dizer com rigor e dignidade: “Quem é Deus, quem sois vós, e quem sou eu? Após ter Deus, o Eterno, Santo e Onipotente, criado este mundo visível com todos os sóis, planetas, luas, mares, montanhas, vales e planícies, através de Seu Verbo poderoso, cobrindo tudo com flora e fauna, e percebendo que tudo estava perfeito segundo Sua Santidade, o Seu Amor disse a Deus, no centro de Sua Santidade Infinita e Onipotente: Tudo está condignamente preparado. Façamos também o ser humano como semelhança perfeita do Meu Amor e Minha Graça a fim de que pos- samos ser louvados por seres individuais e deste modo, no futuro, todas as criaturas possam ser salvas, para atingirem de novo o estado livre de consciência de sua existência útil para Mim.
Assim aconteceu. Dentro em pouco se apresentou o homem livre e eterno em toda sua majestade, dotado de todas as infinitas perfeições, privilégios e capacidades. Deveria alcançar as perfeições infinitas da semelhança de sua origem santa, isto é, de Deus em Sua Esfera santificada.
Ele tinha o poder de falar com toda a criação e não havia sol, por mais afastado que fosse, que não ouvisse sua voz forte e inquiridora. Além disto, nenhum anjo se atreveria a negar resposta ao grande orador.
E Deus Mesmo, Visível ao filho amado, falava-lhe qual irmão, dizendo: ‘Olha-Me, Meu querido Adão, dou-te um mandamento leve e curto, não para experimentar-te, mas para fazer-te perfeita- mente livre e poderoso igual a Mim. Cumpre-o até Eu voltar junto de ti. Se fores fiel, permanecerei junto de ti e tudo será teu, Comigo.
Tudo terá que se submeter ao teu poder. Mas, lá adiante vês uma árvore com belos frutos, ainda não abençoada por Mim, por
motivo muito sábio. Não deves saborear o sumo doce da maçã, pois no dia que assim fizeres, antes de Minha Volta abençoada, pecarás, tornando-te fraco, cego, surdo e mortal. Meu amado Adão, con- sidera as Palavras de teu Criador Amoroso e não deturpes a maior Obra de Meu Amor e de Minha Sabedoria, que já alcançou tama- nho progresso.
Agora não mais depende de Mim e de Meu Poder, mas uni- camente de ti, em virtude do livre arbítrio tão dificilmente concedi- do. Podes manter tua vida ou aniquilá-la. Respeita este leve manda- mento e torna-te um segundo deus, por Mim e em Mim.’
Passaram-se apenas sete dias e o primeiro homem, tão livre e elevadamente criado, esqueceu Deus em virtude da apresentação de seu segundo eu tornando-se fraco, surdo e cego, pois desrespeitou o Mandamento cheio de Amor de um Criador Bondoso e Santo.
Com isto, o Eterno irou-Se e destruiu toda a Criação visível diante dos olhos do arrependido vilipendiador. Nada ficou poupa- do, nem uma pedra do tamanho de uma maçã, nem um animal que há milênios caminhava sobre as campinas ainda magras da Terra. Tudo encontrou sua destruição no infinito mar de fogo da ira da Divindade.
Para Deus nada mais era santo. Culpado ou inocente, não fazia diferença à grande Ira. Em todas as esferas infinitas ouvia-se Sua Voz terrível anunciando a eterna perdição a todos os seres. Os mun- dos estremeceram e se desintegraram nos seus alicerces e seus destro- ços despencaram com uivos e clamores diante da Face irada de Deus.
Todavia, ocorreu algo que jamais um anjo poderia compre- ender. Enquanto Ele, o Santo, tudo destruía com a Destra, em virtu- de do ultraje pelo pecado do grande réu, a Mão Esquerda protegeu o queixoso pecador. Bastou que uma pequena lágrima caísse no Olho cruelmente irado de Deus e toda Sua ira desapareceu, e uma nova Criação lhe sorria e todos os mundos se encheram de novo de inú- meros seres a serviço do homem desobediente.
Continuou agraciado após o pecado por quase trinta anos com todo o poder e força que tivera antes. No entanto, caiu em erro
de novo por ter se esquecido do amoroso Criador, no atordoamento de sua volúpia. O Criador então o expulsou do Paraíso, enquanto num outro ponto o deserto tinha que florir sob os pés do gran- de pecador.
O fratricida Caim foi contemplado com um país frutífero porque se arrependera do crime cometido, e foi salvo das garras de seu filho Hanoch, recebendo ainda o mar e todo o território daquele país. Assim também ocorreu com Meduhed e seu povo. E agora Seu infinito Amor Se evidencia convosco e Seu Coração não Se fecha diante de Lamech, o maior réu. Vede, criaturas indignas, o Amor infinito de Deus ainda vos envolve, não obstante vossos pecados. Ouvi Sua Voz transmitindo Sua Graça. Em direção ao meio-dia há um país a vós destinado. Enquanto termino meu discurso e vos prosternais diante de Seu Amor, Ele vos enviará um anjo que vos conduzirá até lá.
Considerai o Que seja Deus, o que sois vós e o que podeis ser através de Seu infinito Amor. Em vossa Graça recebida por Ele, refleti quem somos, irracionais desprezíveis, e envolvei todos os se- res com o Seu Amor, como Ele o faz, pois também nós, seres mu- dos, nos alegramos da vida. Permiti, portanto, pelo Amor Divino, que também nós consigamos obter uma nova luz da vida liberta de Deus, na qual todos devem viver.
Prosternai-vos diante de Deus, vosso Santo Pai, vertei lá- grimas de arrependimento do verdadeiro amor e deixai-vos guiar pela Mão do Onipotente ao dito país, onde sereis um povo confor- me orientação trazida pela Sua Santa Boca, por um irmão angeli- cal. Amém.”
Nem bem o urso terminara seu discurso, sumiu da vista de todos e em seu lugar se apresentou um anjo, Abel, de veste lumino- sa, que tinha se pronunciado através dos animais. É este o mesmo fe- nômeno quando qualquer ser físico se pronuncia, pois um anjo fala na alma do vidente ou profeta. Tais coisas são apenas compreendidas por eles mesmos, que também escrevem, o que é mais difícil, razão porque até mesmo os apóstolos preferiam a fala à escrita.
Quando os presentes, em número de quatorze, avistaram o anjo, ele começou a falar com meiguice: “Filhos de Caim, que ainda vive e viverá até o fim de todos os tempos, inatingível por todos os mortais até o final de toda maldade, quando o Onipotente fará anunciar grandes feitos por um pequeno vidente, mencionando vosso pai original: Acabastes de ouvir as maravilhosas palavras das bocas das feras que Deus amansou por mim, fazendo com que se pronunciassem para vós, mais pervertidos que todos os irracionais, através da imensa maldade da serpente de Hanoch, e agora por La- mech, terrível criador de abominação, diante do qual todo o Univer- so sente verdadeiro horror e em cujos ombros pousam julgamentos de peso universal preenchendo quase totalmente o receptáculo aci- ma das estrelas.
Como sois os mais jovens que se viram obrigados à unifi- cação ao exército de Tatahar, o Amor misericordioso de Deus apie- dou-Se de vós, fazendo com que percebêsseis o ultraje de Lamech em sua ira dominadora.
Em seguida, conduziu-vos milagrosamente por um trecho longo, velozmente, pois um homem comum levaria cento e vin- te dias para percorrê-lo. Salvou-vos das garras mortíferas das feras quando Tatahar encontrou seu julgamento final e demonstrou-vos a morte pela morte, e agora enviou-me, que já sou compenetrado da vida, para despertar-vos da morte e ensinar-vos a vida na humildade e na constante obediência à Santa Vontade de Deus e levar-vos a um país preparado pelo Amor eterno. Só depois de vos terdes manifes- tado pela humildade podereis reconhecer, através da Graça, o valor verdadeiro e santo da vida e, por ele, o Amor do Santo Criador e Pai de todos os anjos e homens, não só deste mundo, mas de inúmeros outros que jamais imaginastes. Este conhecimento é dado apenas aos filhos e anjos de Deus.
Ainda assim, virá uma época em que todos os mundos se curvarão diante deste, pois sua luz será maior que a de todos os Céus. A Santidade de Deus iluminará todos os povos de boa vontade. Se continuardes fiéis na humildade e obediência à Vontade Divina, essa
Luz também chegará até vós, vivificando-vos inteiramente. Mas, se porventura um se sobrepuser acima do outro, tal Luz claríssima sur- gida do Âmago de Deus chegará junto de vós como a luz do sol mais longínquo, na noite mais trevosa da Terra.
Os descendentes de Lamech atingirão com suas cabeças o firmamento por causa de seu orgulho, perfurando-o em sua obsti- nação cega e muda como vilipendiadores trevosos, precisamente na- quele ponto onde se encontra o grande receptáculo, bastante frágil devido ao acúmulo de crimes vários. O grande receptáculo cairá por terra, cheio de pecados e de terríveis julgamentos de Deus. Então se afogarão no lodo do ultraje todos os praticantes do mal, arrastan- do consigo inúmeros filhos de Deus que se deixaram prender pelas filhas da serpente. Procriarão filhos de ira e da maldição de Deus, chamados filhos do inferno e rebentos de dragões, e só se pouparão oito pessoas.
Antes que isto aconteça, o Senhor enviará, durante trezen- tos anos, doutrinadores e profetas que os advertirão de Seus Jul- gamentos, recomendando a penitência para o perdão dos pecados e total modificação de sua vida infernal e mostrando os traços da verdadeira Vida de Deus, de Seu infinito Amor e Graça e como até mesmo nas pequenas coisas se notam os Julgamentos divinos.
Então sucederá que a corja maldita se apossará dos dou- trinadores e dos profetas, matando alguns, enquanto outros serão envolvidos por serpentes que os atrairão ao charco da impudicícia onde se perderão e morrerão espiritualmente, tornando-se assassinos de sua própria prole.
Nesta altura Deus enviará o último doutrinador, um irmão que se chamará Noé — o único filho justo — de nome Mahal, permitindo que viaje pelas cidades pervertidas para externar suas profecias. Este filho passará por horrores, perverter-se-á e finalmente abandonará Deus, sucumbindo no lamaçal.
Só então se encherá o receptáculo do pecado e do julgamen- to, estourando com todas as maldições. Será atirado à Terra, que se incendiará em todos os pontos, partindo de seu centro, e somente
pelo pequeno número de justos o Amor misericordioso de Deus abrirá as comportas celestes. Ondas colossais se atirarão sobre os picos mais altos para amainarem o fogo do inferno e conservarem e purificarem os filhos e a própria Terra, para que produza um gênero melhor, segundo a Vontade de Deus.
Não sereis atingidos nem pelo fogo, nem pela água, se hu- mildemente respeitardes a Vontade de Deus que soa: Vosso primeiro pensamento seja dirigido a Deus, à Sua Vontade, Seu Amor e Sua Graça. E quando o dia se findar nos braços da noite estelar e o últi- mo raio do Sol se apagar docemente, deveis vos recolher com pensa- mentos luminosos de vosso espírito.
Não vos preocupeis com o alimento material. Todo país abençoado por Deus produzirá o necessário para os habitantes enquanto cumprirem a Vontade do Pai. As criaturas foram cria- das exclusivamente para conhecerem Deus e Sua Vontade Santa, cumprindo-a por palavras e ações, e louvando o Nome Santíssimo do Criador.
Se isto for por vós esquecido apenas por um dia, numa aná- lise aparente, o coração de quem se esqueceu de Deus será tocado por uma tristeza exortadora, emudecendo por sete dias. O solo produzi- rá frutos abundantes quando pisado pelo obediente, mas o produto de quem desobedeceu será nulo, porque a terra se tornará estéril, dando apenas poeira, pedras, cardos, abrolhos e bagos venenosos.
O Amor e a Sabedoria infinitos de Deus dão a cada um o que merece. Aos filhos obedientes dão pão, mel, leite e frutos do- ces, materiais e espirituais; aos desobedientes e orgulhosos filhos da serpente Deus dá pedras, cardos e abrolhos a fim de que pereçam e se salve ao menos o espírito atingido, podendo ser vivificado pelo infinito Amor Misericordioso do Santo Pai.
As mulheres devem cobrir seu físico, principalmente a ca- beça, para não despertarem a tentação nos homens, assim como a serpente seduz com seus olhos tentadores as aves inocentes. As mu- lheres são geralmente filhas da serpente e cheias de seu veneno. De- vem ser obedientes aos maridos na medida da Vontade de Deus. Se,
porém, eles algo vos exigirem contrário aos Mandamentos divinos, podeis descobrir vossa cabeça e lembrá-los dos deveres de Deus.
Os homens que desconsiderarem a Vontade de Deus per- derão a Voz de Deus e da natureza, recebendo uma lei externa que os transformará em escravos do pecado e do inferno, se não dobra- rem seu coração, purificando-o pela obediência humilde, pedindo a Deus, com temor e amor, que o abençoe de novo.
Agora cobri-vos com as vestes preparadas pelos filhos de Deus a fim de vos diferençardes como homens e mulheres. Longe de vós estejam o luxo e o orgulho. As vestes devem somente prote- ger-vos contra o frio. Ponde uma venda nos olhos para não terdes vertigens sobre os abismos que iremos atravessar guiados por Mim. Somente no local pré-fixado podereis usar a luz dos olhos para vos maravilhardes com a visão da pátria que o Imenso Amor do Pai vos reservou. Lá recebereis alimentos das mãos de dois filhos de Deus — um homem e uma mulher — para fortalecimento de vosso espírito. Que assim seja.”
Deste modo, Abel os conduziu durante sete dias e noites num trajeto que duraria trinta dias, sem repouso e alimento, pois como eram Meus hóspedes, Eu os alimentava espiritualmente, e o espírito nutria alma e corpo. Quando chegaram ao ponto determi- nado, os filhos de Deus, ou seja os filhos do Meu Amor, Ahujel e sua mulher Aza (Filho do Céu e Justo Desejo Silencioso), netos de Adão, os receberam, tirando-lhes a venda dos olhos. Os sete casais muito se admiraram diante dos filhos do Meu Amor, que mediam a justa medida do homem, quer dizer, o homem com seiscentas e ses- senta e seis polegadas e a mulher medindo sessenta e seis polegadas menos, enquanto os outros mal atingiam sessenta polegadas.
Uma vez refeitos de sua estupefação, o anjo lhes disse: “Eis o local do vosso destino, e esses filhos grandes devem por vós ser consi- derados como genitores dados por Deus. Eles sempre vos confirma- rão aquilo que Deus vos falar no coração, despertando-vos tão logo vosso espírito for acometido de sono e vos ensinarão coisas úteis, material e espiritualmente. O contato físico será apenas permitido
após a bênção de vossos genitores e, ainda assim, precavei-vos de qualquer abuso, sendo a castidade vosso lema. Jamais devem a dis- córdia, raiva, inveja, avareza e impudicícia vilipendiar vossa geração, mas a moderação em tudo e o amor a Deus sejam vossa ordem. Se assim agirdes, vossa vida será longa e a despedida da Terra será na Luz da Graça infinita do Pai Eterno, onde vos espera o prêmio me- recido no Seio do Criador, acima das estrelas e, finalmente, em Seu Amoroso Coração. O Amor de Deus vos abençoe, Sua Graça vos ilumine, santifique e conduza à vida. Amém.”
Deste modo fundou-se a China, que fora poupada do dilú- vio e até hoje se encontra em situação melhor que outros países, com exceção de algumas deturpações levadas para lá por outras criaturas. Que jamais um não renascido se atreva a pregar-lhes o Meu Evan- gelho. Amém.
ORIGEMDOPOVO CHINÊS
Antes de voltarmos para Hanoch, preciso esclarecer-vos acer- ca dos habitantes da China. Com relação ao tamanho dos filhos de Meu Amor, surgidos de Adão, estais enganados na suposição de ta- manho físico, pois seiscentas e sessenta e seis polegadas representam o número exato de Meu Amor na criatura, ou seja, seiscentas para Mim, sessenta para o próximo e seis para si mesmo. A medida da mulher corresponde à medida divina no homem. O amor ao pró- ximo e o amor-próprio da mulher se diferenciam por sessenta pole- gadas e compete a ela obedecer em tudo ao homem. Como extrato do amor-próprio do homem, ela só pode amar-se nele, caso o amor dele seja justo. Sendo ela a mais próxima dele, seu amor ao próximo se dirige a ele. Aliás, eram esses dois filhos de Adão, como todos eles, mais altos e fortes que os filhos enfraquecidos de Caim.
Como Sihin fosse o primeiro a dirigir sua alma para Mim, foi ele o mais obediente, guiando os demais neste sentido. Por este mo- tivo disse-lhes na presença de Aza: “Sihin, abençoo-te em Nome de nosso Deus, e o país deve receber o teu nome. Escolhe a irmã mais
bonita para esposa e gera filhos abençoados, iguais aos de Deus, chamando-os de ‘filhos do céu’ e ‘filhas da terra’. Quando os meus numerosos descendentes forem levados por Deus, os teus devem se tornar guias amorosos e sábios de teus irmãos.
Procura o amor, e a sabedoria te será dada; teu tronco não há de morrer até o fim dos tempos; pois o Senhor dará ao teu tronco grande linhagem a fim de que teu nome persista até o fim dos tempos.
Receberás umamulher. Mas, no futuro, devem os homens tomar várias para garantir a conservação de sua geração. Todavia, precavei-vos de qualquer impudicícia e procriação não abençoada. Se isto tudo for por vós respeitado, em mil anos vosso povo se terá multiplicado como erva na terra e estrelas no Céu.
Eu e meus poucos descendentes vos abençoaremos e guiare- mos durante quinhentos anos. Em seguida virá a tua vez até o fim. O tempo deve ser calculado pelo amadurecimento de um fruto que amadurece cinco vezes numa circunvolução da Terra em redor do Sol. E sempre que tiverdes descoberto algo novo, deveis olhar para dentro de vós, onde encontrareis uma visão pela qual deveis deno- miná-lo. Vossas ações devem ser expressas por linhas corresponden- tes e a execução por meio de pontos. Deste modo, assinalareis o que ireis no futuro aprender, ver e assistir por nosso intermédio, trans- mitindo o necessário à vossa prole até o fim dos tempos, para futuro testemunho da perversa geração. Amém.”
Mas, em virtude do livre arbítrio, também esse povo não continuou sempre o mesmo. Aproximadamente cento e vinte anos após o dilúvio, os descendentes de Sihin se haviam desenvolvido para importante povo que, devido a várias discórdias, se dividiu em partidos, com hábitos e cerimônias diversos. Uns diziam que somente os primogênitos seriam capacitados para guias. Outros contestavam, pois aconteciam primogenituras femininas; portanto, deveria a orientação ser entregue ao coração mais compreensivo. To- davia, também este ponto encontrou oposição entre o povo, pois houve quem dissesse: Tratando-se apenas do coração, por que não
deveria o de um irmão inferior ser hábil para tanto? Ainda outros rejeitaram tudo com a afirmação: Que continue tudo como fora no início até o fim dos tempos. Ao que outros retrucaram: Devemos sempre perguntar a Deus e jamais agir de modo próprio. — Se as- sim é, diziam alguns, cada um poderá agir sem necessitar de um ou vários guias. Opinavam outros: Deus não Se manifesta a todos para que as criaturas com isto não se tornem desnecessárias. A isto, outros responderam: Neste caso, deve cada vidente ensinar o que percebeu e deixar a orientação a Deus. Mas, diziam outros, quem nos garante que o vidente e doutrinador pronuncia sempre a Palavra de Deus?
Por este motivo foram criadas inúmeras seitas que dividiram o reino em vários ramos doutrinários até três mil e setecentos anos após a criação de Adão, quando surgiu o construtor da muralha, Tschi-Hoang-Ti, da linha Hehu-Tsin. Este começou a pregar com ênfase, profetizando que um grande povo, não muito distante de suas fronteiras, os havia descoberto. Caso todos não se unissem a fim de construir uma muralha ao redor do país, tal povo irromperia com violência sobre eles.
Ele mesmo havia recebido de Mim o poder de evitar tal inva- são até que a muralha fosse completada, poder que duraria somente dez anos, razão por que deveriam se apressar em realizar esta obra enorme e santificada, segundo Minha Vontade.
Todos começaram a trabalhar e após oito anos a muralha estava terminada e munida de torres nas quais sempre se achavam cem homens que deveriam manter a ronda. Isto não durou muito porque este falso profeta se havia traído por ter recolhido as escri- turas religiosas, mandando queimar aquilo que não se prestava para seu espírito de déspota.
Assim conseguiu ele, por meio da violência, unificar o grande império dominando-o durante sessenta anos. Seu filho, com o mesmo nome, tornou-se complacente e desleixado. Em compensação, o filho deste, o terceiro sucessor, pagou com a pró- pria vida o crime de ainda mais cruelmente perseguir os crentes durante uma rebelião.
-Hu-Pang juntou um exército de simpatizantes, dominando todos como chefe e no final se apresentou como imperador e filho do céu. Recolheu antigos escritos e fábulas, organizou a religião e os sacerdotes foram obrigados a velar sobre o santuário. Dividiu o povo em classes ou castas, com leis que ninguém podia desobedecer sob pena de morte.
Fundou ele o conhecido império celeste ou a grande di- nastia de Han, que se estendia além da muralha para Oeste. Assim existiu esse reino até o quarto século antes da Encarnação do Meu Verbo, quando de novo sofreu uma grande separação, perdendo grande parte da Tartária e da Mongólia. Dividiu-se em três reinos beligerantes, chamados Tschenkue e no quarto século após a Encar- nação do Meu Verbo este tronco se extinguiu. Sob o mesmo feitio popular e sacerdotal, este reino caiu sob o domínio de soberanos mongóis e tártaros, que se localizaram na região do Lago Baikal, onde se encontram até hoje.
Eis a breve história da China. Quem possuir fé fraca, pode- rá fazer uma viagem para se convencer da veracidade. Mas o resulta- do seria o mesmo caso viajasse para o Japão. A um cego não adianta o uso de uma lamparina em dia claro. Ao vidente basta a luz do sol.
Como os quatorze filhos foram bem orientados, voltaremos por algum tempo a Hanoch, para observarmos as loucuras de Lame- ch. Uma vez chegados à época de Noé, faremos uma pequena visita a Adão, e em seguida abriremos as comportas dos céus.
AFAMÍLIADE LAMECH
É fácil de se imaginar que por tais emigrações a cidade de Hanoch, bem como as demais cidades, perderam muito de sua po- pulação e, além disto, Lamech havia perdido seus fiéis e seu poder. Em virtude disto, foi ele obrigado a usar meios mais suaves de go- verno, ao menos por trinta anos, para que o povo se tornasse nova- mente submisso e disposto a trabalhar para o conforto de Lamech.
Músico e inventor de instrumentos musicais, possuía ele duas mulheres, Ada e Zillá, tendo a primeira dois filhos, Jabal e Jubal. Zillá tinha um filho, Tubalkain, e uma filha, Noêmia. Com a Minha Permissão, este se tornou mestre no preparo de metais, e No- êmia domadora de feras, contribuindo desta forma para penetração nas minas. Ela era sumamente bela e possuía uma alma humilde, mas corajosa, e seus olhos eram dotados de grande força, a ponto de poderem derreter pedras e dentes de animais ferozes.
Eis a família de Lamech que contava ainda alguns servos, ca- mareiras e concubinas sem importância, ao todo umas trinta pessoas obrigadas a trabalharem com afinco para seu sustento e vestuário. Passados os trinta anos, o povo começou a imigrar para Hanoch para adquirir apetrechos de metal por meio de troca. Também apa- reciam pessoas das dez cidades circunjacentes para se deleitarem com a música de Jubal e a rara beleza de Noêmia, que atraía muitos, pois era considerado infeliz quem não a conhecesse.
Noêmia tornou-se esposa de seu irmão, com o qual teve sete filhos, desajeitados, rudes e imbecis. O motivo disto foi o excesso sexual que ela fora obrigada a tolerar pela vontade de seu pai, que visava novamente o domínio, pois por este meio muitos homens se tornaram submissos a Lamech. Noêmia ficou sendo objeto de admiração até seus oitenta anos e durante esse tempo o povo havia crescido e se tornado obediente a Lamech. Percebendo o seu poder, ele voltou a ser severo e duro, instituindo inclusive a pena de morte para os reincidentes.
Nesta altura, os filhos de Adão enviaram um bom mensageiro com a Minha Ordem, para as planícies de Hanoch, a fim de difun- dir o Meu Nome na corte de Lamech, que o recebeu com atenção. Tal mensageiro era neto de Adão e se chamava Hored (o temível), sábio e solteiro. Após ter aceito a orientação, Lamech cumulou Ho- red de grandes honras, reuniu todas as moças da corte e lhe propôs a escolha da mais bonita. Eis que Hored se inclinou para a mulher de Tubalkain, contra a Minha Vontade, e ela teve que obedecer ce- gamente às ordens de Lamech.
Tubalkain, acostumado à infidelidade, não se alterou com a situação, tanto mais quanto Hored lhe garantira que as feras nada lhe fariam devido às armas e armaduras que ele aprenderia a usar com o auxílio dos ajudantes que Hored lhe daria. Tubalkain se deu por satisfeito e Hored voltou para as montanhas com sua esposa.
Quanto à chegada dos ajudantes, tratava-se de mera promes- sa, pois Hored não voltou para junto dos seus, escolhendo um lugar isolado para não ser invejado por quem quer que fosse.
Em virtude de tais trapaças, Tubalkain se viu obrigado a per- suadir seu irmão Jabal a construir cabanas nas raízes das monta- nhas e habitá-las como vigia. Deste modo surgiu uma verdadeira fábrica de metais, cujos produtos variados eram muito procurados. Os filhos de outros habitantes eram entregues a Tubalkain como aprendizes, e assim cresceu em breve tempo um povo que inspirava temor a Lamech.
Atemorizado, ele pensou: Que devo fazer? O crime prati- cado em meus irmãos pesa em minha alma. Meu segundo genro ordenou-me a confessá-lo perante o povo. Se assim agir, não estarei seguro de minha vida. Não o fazendo, terei Deus e Seus filhos nas montanhas contra mim, que poderão destruir-me.
Eis que uma forte voz ecoou em seu peito, dizendo: Relata a tuas mulheres o crime praticado em Johred e Hail. Quem se vingar em Caim será castigado sete vezes; em Lamech, porém, setenta e sete vezes!
Satisfeito com tal orientação, Lamech obedeceu. Mas, quando as mulheres souberam o que ele havia feito, se apavoraram e se tornaram mudas. Passado algum tempo, elas o abandonaram secretamente, dirigindo-se para as cabanas de seus filhos. Antes de lá chegarem, foram abordadas por dois habitantes das montanhas, conseguiram falar de novo e foram aceitas nos cumes dos montes.
Lá se informaram a respeito de Noêmia. Os guias lhes con- taram que Hored havia sumido por infidelidade e inveja, e eles não podiam revelar o seu esconderijo. Caso elas quisessem aceitá-los, eles as esposariam, pois Ada contava cento e dez anos e Zillá apenas cem.
Eram belas e podiam ser comparadas a jovens de vinte e quatro anos da época atual.
Ambas se deixaram abençoar e seguiram com seus maridos para junto de Adão, que contava novecentos e vinte anos. Quando ele os viu, disse: “Meus netos, conheço todos os meus descendentes que se encontram em minha bênção, após a de Abel, pelo Amor eterno. Mas desconheço essas duas moças. De onde vêm?” Eles res- ponderam: “São mulheres difamadas por Lamech.” Retrucou Adão: “Que é isto? Conheço o filho Matusalém, com cento e vinte e seis anos, que jamais conheceu mulher. Amaldiçoada seja a mentira e a boca que a proferiu. Falai, quem são elas?”
“Não te enraiveças, Pai Adão, pois também de Caim surgiu um Lamech na planície amaldiçoada. Ele assassinou dois irmãos. Essas moças continuaram devotas na própria maldição; por isto, o Senhor nos enviou a salvar o que estava perdido. Se assim agimos, abençoa o que foi salvo por Ele.”
Disse Adão: “Já é abençoado quem foi salvo pelo Senhor; ide em paz e conservai os tesouros do Amor eterno e a Misericór- dia. Amém.”
MOTIVODAQUEDADOSFILHOSDO ALTO
Deste modo, os dois seguiram com as esposas e conservaram tão fortemente esse tesouro no coração que para Mim sobrou ape- nas um pequenino espaço, o que não podia estar dentro de Minha Ordem. Seus corações obscureceram-se aos poucos, pois a sensuali- dade aumentava constantemente. Seus filhos também nutriam essa fraqueza e assim pouca diferença havia entre eles e os hanochitas.
Quando os filhos de Adão notaram a beleza das duas mo- ças, indagaram de sua procedência e os guias responderam: “São das planícies de Hanoch, onde se encontram ainda milhares originárias do sangue de Caim. Ide divulgar o Nome do Senhor, que recebe- reis o mesmo prêmio que Hored e nós, e este prêmio se prende ao nosso coração.” Perguntaram: “Onde se encontra Hored?” — e eles
responderam: “Irmãos, nosso amor nos cegou com sua doçura, por isto ignoramos o paradeiro dele. Todavia, presumimos que tenha encetado o caminho de Ahujel e Aza, e sabeis que lá não se che- ga antes que o Sol tenha aparecido e sumido oitenta vezes. Pouca importância tem invejarmos sua felicidade, pois tudo depende de fazermos a Vontade de Jehovah, cujo Santo Nome deveis propalar em Hanoch.”
Eram sete os que ouviram esse conselho e que prontamente se dirigiram para aquela cidade. Antes que lá cheguem, voltaremos o olhar para as planícies a fim de recebê-los, pois agiriam como não chamados em Meu Nome, por interesses materiais.
Lamech não tinha quem o confortasse. A música fazia estre- mecer a sua consciência, pois ouvia nas suaves vibrações os últimos suspiros de seus irmãos assassinados e o som da flauta lhe cortava o coração. Assim, chegou a amaldiçoar Jubal, que lhe impunha a mor- te constante da alma. Por este motivo, Jubal teve que deixar a corte.
Até mesmo suas concubinas mais formosas não conseguiam proporcionar-lhe prazer e elas choravam e rasgavam suas vestes. Quando Lamech viu tal desespero, disse-lhes: “Ada e Zillá não exis- tem mais; que devo fazer convosco? Ide para o campo e trabalhai para não perecerdes em Hanoch, pois não preciso de ninguém além de mim mesmo. Se ainda fosse dono de meu poder, Sol, Lua e es- trelas teriam que se curvar diante de mim. Tornei-me fraco desde Tatahar e não consigo restabelecer meu poderio, mesmo por várias execuções justificadas pelas minhas leis. Quero ficar sozinho com meus poucos servos e conselheiros, limitando meu governo à minha cidade. Fora isto, todos estarão livres e quem se aproximar de minha corte será punido com a morte.”
As trinta moças, entre vinte e quarenta anos e de rara beleza, se afastaram para discutir seu destino. Então, foram subitamente rodeadas por sete homens, altos e fortes, que lhes diziam: “Nada temais. Viemos das montanhas e desejamos vos salvar, caso vos prontificardes a receber nossa bênção em Nome de Jehovah e des- tarte passareis a ser nossas esposas. Depois, deveis seguir-nos para as
montanhas, para onde Noêmia seguiu Hored, e nas mãos protetoras de Aholin e Joliel, dois irmãos que receberam Ada e Zillá, ex-esposas de Lamech.”
As moças retrucaram: “Somos trinta, e vós, sete. Que farão as restantes vinte e três, se cada um de vós só pode receber uma esposa?” Disseram eles: “Ainda que no início só foram criados uma mulher e um homem, os filhos de Deus têm permissão de tomar várias companheiras em virtude da procriação.”
Satisfeitas, as moças seguiram aqueles jovens. Mas, quando chegaram aos cumes das montanhas, não sabiam como dividir os tesouros do amor, razão porque Me pediram conselho. Eis que sur- giu Seth e lhes disse: “Não convém tentardes Deus, de coração falso, perguntando-Lhe como deveis dividir uma presa indevida. Procurai Adão, confessai vosso delito e em seguida dividi as moças entre vos- sos irmãos, após Adão as ter abençoado a fim de vos apresentardes justificados perante Deus. Sabeis ser Ele Santo, e Seu país não deve ser ultrajado pela desobediência e a volúpia de vosso fútil coração.”
Com esta admoestação, o grupo acompanhou Seth até a mo- rada de Adão, encontrando-o em oração ao lado de Eva, Enos, filho de Seth, e Henoch, o devoto filho de Jared. Imediatamente Seth re- latou a Adão o ocorrido e pediu-lhe piedade para o sangue de Caim, restabelecendo a ordem, perturbada pelos sete jovens.
Disse Adão: “Meu caro filho Abel-Seth, és realmente uma cópia fiel do devoto Abel, pleno de amor. Ele abençoou o assassino, por amor, e tu procuras a bênção para o sangue de meu inimigo. Sê mil vezes abençoado e abençoa o sangue ultrajado, distribuindo o sangue entre os filhos. Sendo do Agrado do Senhor, deve cada um tomar uma moça para si, abandonando o país de Jehovah. Seguirá após o pôr do sol, durante trinta dias, tomando morada nos vales e não deve voltar aqui antes que o Sol tenha concluído sua trajetó- ria por cem vezes. Sabes, pela Graça de Jehovah, o quanto é santo este local. Age em Nome de Jehovah e em meu nome, que é santo, pois que o recebi de Sua Própria Boca, como filho incriado, pelas Mãos Dele.”
Eva chorou quando viu a satisfação de Adão e disse: “Como sou feliz com tua felicidade! Mas, quando olho para mim, me en- tristeço em virtude de minha grande culpa e do mal que dela sur- giu. Como não será a situação dos descendentes de Caim!” Adão a consolou, dizendo: “Querida, que és o meu segundo eu, tua tristeza é sempre justa e agradável a Deus. Acalma-te e considera que nada podemos realizar sem Ele, mas com Ele faremos tudo. Ele é Pode- roso, Sábio e cheio de Amor e há de encontrar os justos meios para endireitar o que entortamos.”
Eva agradeceu a Adão e ele a abençoou pela última vez em Meu Nome e viveu ainda dez anos; ela, durante trinta anos. Seth agiu conforme Adão havia mandado. Mas os sete jovens começa- ram a se lastimar porque deveriam se afastar dali. Penalizado, Seth pediu-Me orientação, pois as lágrimas daqueles filhos faziam arder o seu coração. Henoch, então, ergueu os olhos para o Céu e Eu fiz com que dissesse: “Dirigi o Meu Ouvido para a Terra e ouvi as palavras de amor de Seth. Por isto, devem os sete jovens entregar as trinta moças a seus irmãos solteiros, que, todavia, devem manter a castidade durante dez anos. Nestas condições, poderão permanecer ali. Caso contrário, devem fugir de Mim, conforme Adão havia pre- dito. Amém.”
Os sete jovens se alegraram e louvaram a Deus por tama- nha Graça, entregando as moças, acompanhadas de Seth, Henoch e Enos, aos irmãos. Estupefatos, estes se recusaram a aceitá-las. Como Eu percebesse a boa vontade dos outros, disse através de Henoch: “Percebi nos jovens um coração desinteressado que se alegrava em dar alegria aos irmãos. Ficais, pois, com as moças abençoadas. Os dois mais velhos receberão cinco cada um, e quatro moças serão entregues a cada um dos demais. Mas a castidade deve ser mantida. Amém.”
Seth, Enos e Henoch os abençoaram e em seguida relataram o fato a Adão.
Adão muito se alegrou por ter Meu Amor se dirigido até mesmo para as profundezas da maldição, onde se encontrava a cova das serpentes, de sorte que proferiu o seguinte célebre discurso, que se conservou até o dilúvio, passando de boca em boca: “Ó meus fi- lhos, fitai as extensas plagas até onde vossos olhos possam atingir, to- das elas semeadas com meus filhos abençoados. Vede as profundezas e para além do meio-dia a grande montanha sempre ardente. Vede a Terra toda e vede a mim, o primeiro homem, quer dizer, o primeiro que precedeu todas as criaturas em espírito e era mais luminoso que o Sol e pretendia ser maior que Deus! Deus demonstrou o Poder de Sua Santidade e eu fui condenado e atirado nas profundezas in- finitas do mar da Ira divina. Eternidades e eternidades se passaram; no entanto, não houve no Universo um pontinho onde eu pudesse encontrar qualquer pouso.
Enquanto ia de queda em queda, eternamente, comecei a perceber a Imensidade e o Infinito Poder de Deus evidenciando mi- nha fútil intenção. No entanto, pensei: ‘De que me adianta essa compreensão? Estou por demais afastado de Deus, que jamais po- derá saber algo de mim, pois neste vácuo infindo só reina o eterno esquecimento do Senhor. Caí de ira em ira, onde chamas de fogo batiam na minha fronte, constantemente, queimando igualmente as minhas entranhas. Agora me encontro debaixo de torrentes de ira e pergunto: Onde está o Deus irado, e onde estou eu? Defronto apenas com treva muda e infinita!’
Neste momento percebi que uma entidade semelhante a mim se aproximava das alturas na velocidade de um raio, e, agarran- do com violência a minha mão, disse com meiguice: ‘Lúcifer, pobre espírito caído, tu me conheces?’
Respondi: ‘Como poderia conhecer-te neste vácuo trevoso e sem seres? Se puderes destruir-me, igualando-me àquilo que nunca existiu, nem nunca existirá, agradecer-te-ei antecipadamente, a fim de que não voltes a tuas alturas sem gratidão de minha parte.’
A entidade disse: ‘Não te quero destruir, mas conservar-te e reconduzir-te por caminhos desconhecidos, de onde partiste cheio de orgulho.’ Retruquei: ‘Faze o que puderes, mas considera a gran- diosidade da Ira divina. Fui grande e me tornei nulo, e se foste cria- do maior que eu, considera ser Deus eterno e infinito e cheio de Ira flamejante.’
Retrucou a entidade: ‘Nunca calculaste o Amor em Deus? Ainda que sejam imensas as vagas da Ira, Seu Amor chega até onde elas se extinguiram sob os infinitos limites do Universo e onde co- meça um outro Universo.’
Objetei: ‘Quando ainda era um príncipe de toda luz, foi-me mostrada uma chama pequenina a qual eu deveria adorar, pois tra- tava-se do eterno Amor de Deus. Era impossível acreditá-lo no meu brilho luminoso e me via muito além daquela chamazinha opaca. Com isto incendiou-se a ira de minha luminosidade e queria des- truir com a minha luz aquela chama pequenina. Neste momento, a Ira divina apossou-Se de mim e me atirou neste vácuo eterno e trevoso, que atingi somente após eternidades.’
Subitamente, percebi aquela chama pequenina sobre a cabe- ça daquela entidade, que disse: ‘Lúcifer, conheces-Me agora?’ Res- pondi: ‘Sim, Senhor; és o Amor divino e ultrapassas além de Tua torrente infinita de Ira. Considera a Graça de me dar um pouso certo neste vácuo sem fim.’
Eis que uma lágrima do Olho luminoso do Amor eterno rolou nos espaços trevosos da eternidade, tornando-se um imenso mar. E o Amor soprou sobre as imensas águas no abismo, e elas se dividiram em inúmeras gotas. Neste instante estendeu-se a chama sobre a fronte do Amor eterno iluminando as gotinhas para inúme- ros sóis enormes que espargiam o calor do amor eterno nos planetas, e estes, nas luas.
Do centro da Lágrima de Deus flutuou esta Terra para per- to de mim. O Amor a abençoou e bafejou, de sorte que começou a florir qual jardim, liso, plano e belo. Mas não havia qualquer ser na mesma. O Amor a fitou por um momento e imediatamente co-
meçou a aparecer toda sorte de seres no solo, nos mares e no ar. Tudo isto eu vi e agora estou ciente pela Graça especial do Senhor. Quando a Terra estava destarte organizada segundo a Ordem eterna, o Amor ergueu o olhar para as alturas e disse:
‘Poderes santificados do Pai, façamos o homem, dando-lhe uma alma viva para que aquele que caiu encontre um pouso e se humilhe perante Ti e Mim e perante o Poder de Nossa Santidade!’
Um tremendo trovão reboou nos espaços repletos de fogo, e tal trovão era a Voz de Deus, compreendida somente pelo Amor que modelou de barro fino estes pés que já me carregam além de novecen- tos anos, as mãos, em suma, conforme me apresento diante de vós.
Assim surgi. Mas ainda estava sem vida, movimento e rea- ção. Eis que o Amor eterno se inclinou sobre essa forma morta e lhe soprou pelas narinas uma alma viva. No mesmo instante me tornei cheio de vida, o primeiro homem da Terra. Vi a imensa Criação sem alegrar-me com ela e cansei-me de minha existência maravilhosa, não compreendendo como, quando e por que eu ali estava. Minha forma anímica não podia ver o Amor eternamente criador.
Eis que o Amor eterno deitou a forma para se entregar ao primeiro sono e disse: ‘Aqui está teu pouso certo. Deves ingressar no coração desta morada viva, pois foi por Mim criada para ti. Nela encontrarás um quadro onde estará grifada a Vontade de Deus com traços de fogo. Deves respeitá-La, desistindo de tua vontade em tro- ca da Vontade Divina.
É por este caminho estranho que te quero reconduzir. Ja- mais olhes para ti mesmo, mas sempre tenhas em mira o quadro de Deus. Então viverás Comigo eternamente e regerás de um trono todo o Universo. Mas, ai de ti se caíres novamente. O Amor se trans- formará em maldição e Eu darei às criaturas um outro espírito, que partirá diretamente de Mim, enquanto terás que deixar novamente este pouso por eternidades e jamais te será conferido um tempo se- não o do eterno fogo na Ira de Deus e na maldição do Amor.
Considera bem as Minhas Palavras. A Ira de Deus pode ser amainada quando o Amor interferir. Mas, se o Amor te amaldiçoar,
quem poderá proteger-te contra a Ira divina, e qual será o meio de ligação entre a Ira divina e ti? Somente o julgamento e a condena- ção, pois és uma obra de Deus, de Mim. Onde estaria a entidade que pudesse tocar a Glória de Deus? Deve surgir uma obra segundo a Onipotência da eterna Glória de Deus, razão porque te foi dado o livre arbítrio mas, caso não o queiras, não terás valor algum e conhe- cerás a infinita Onipotência de Deus quando Ela te banir à eterna nulidade martirizante.
Com relação a Deus, não existe ser de qualquer valor, e para Ele não importa a existência de milhares de espíritos como tu, pois poderia a cada momento criar inúmeros, maiores que tu, e destruí-
-los para sempre, caso não correspondam à Sua Glória.
Considera, pois, o Ser Divino e Sua Vontade, e qual tua entidade e a ação esperada dentro de teu livre arbítrio, a fim de que Se evidencie a Glória imensa de Deus e em todos que surgiram de ti e caíram contigo.
Vê a imensa sepultura da Terra, como também de todos os mundos cósmicos. Tirar-te-ei o grande peso dos que caíram contigo e os depositarei na Terra e em todas as estrelas, e não haverá um átomo sem utilidade e cabe-lhe abrigar um ser vivo semelhante a ti.’
Nesta altura, o Amor tomou o espírito e deitou-o na forma adormecida. Ele muito se alegrou com isto, vendo-se livre do peso tão grande que teve de suportar por tanto tempo, mas agora estava sendo abrigado na morada viva que o Amor eterno havia preparado. Depois dessa união com o espírito, o Amor eterno me despertou e eu me vi como homem isolado frente à imensa Criação. Além da ve- getação e o Sol no firmamento, nada havia que pudesse contemplar. Comecei a sentir medo, abandonei aquele lugar à procura de alguém e não encontrei um único ser semelhante a mim.
Cansado da procura, deitei-me no solo e adormeci. Sonhei, então, o seguinte: No centro de meu coração descobri um ser mui- to atraente que me dizia: ‘Vê como sou bela e possuo uma forma igual à tua, podendo avistá-la. Se bem que minha forma, em outros tempos, fosse apenas uma grande luz que irradiava seus raios pelos
espaços infinitos, chegando a se aniquilar por tamanha imensidade, nunca pude ver minha forma, vendo apenas luz, na qual se revela- vam inúmeras formas. Elas me foram tiradas, mas em compensação recebi a minha própria forma, mais bela que a luz anterior. Ela tanto me agrada a ponto de me amar a mim próprio e sou por ela amado e posso atraí-la quando quero.’
Adormecendo cada vez mais profundamente neste prazer, vi uma mão luminosa penetrar até o âmago do meu coração e conter o meu segundo eu. No início houve reação por parte dele. Mas, não demorou a se submeter aos poderosos Dedos do Amor de Jehovah. Eles partiram uma costela do meu duplo, atingiram o meu âmago, tirando um verme de suas entranhas. Em seguida fechou o ponto em que o Dedo do Senhor havia penetrado para subtrair o desejo egoístico. Com isto, meu segundo eu não teve a mesma beleza an- terior; sua forma era idêntica à minha e não havia mais atração para ela, pois ambos éramos atraídos pelo Amor eterno. Então percebi que o espírito caiu em sonolência e neste estado se dissolveu, passan- do em todo o meu ser, dando-se a nossa unificação.
Enquanto assim sonhava, a Voz suave do Senhor disse: ‘Adão, filho da Terra, desperta e vê tua companheira.’ Então vi Eva diante de mim e alegrei-me sobremaneira, pois meu segundo eu se havia apartado de mim, sentindo grande alegria que era o primeiro amor que eu, o primeiro homem incriado, senti. Pela primeira vez vi minha esposa amada e a amei com pureza no Seio do Amor eterno de Deus, em toda a plenitude da vida primitiva.
Nesta doce sensação passei três dias e três noites. Subita- mente, senti certo vazio dentro de mim, sem saber de sua origem, nem qual sua finalidade. Meu coração se tornou deserto e minha boca seca, quando, de repente, o Amor Eterno apareceu diante de mim, meigo e cheio de carinho, soprou Seu hálito sobre mim e dis- se: ‘Adão, tens fome e sede, e Eva, teu amor, também. Observa as ár- vores que irei abençoar, cujos frutos podereis saborear para fortalecer corpo e alma. Todavia, não comereis da árvore no centro do jardim antes que Eu volte para abençoá-la. No dia em que dela comeres,
serás penetrado pela morte. Serás tentado, mas sê firme até a terceira tentação. Então vencerás o verme da morte que rói aquela árvore, purificarás Eva, preparando para ambos e para todos os que de ti surgirem, uma vida feliz, livre e eterna em Deus. Criei o tempo para que tua provação fosse curta, mas a vida conquistada, longa.
Não precisarás lutar contra poder estranho, mas somente contra ti mesmo. Fiz com que tudo se submetesse a ti, no entanto, não pude submeter-te a Mim, a fim de que conquistasses a vida. Não desconsideres este fácil mandamento, eleva-te acima de ti mes- mo para poderes viver eternamente. O verme do mal é tua proprie- dade em sua origem e contém o aguilhão da morte. Não mordas o aguilhão do verme que tirei de teu coração, durante o sono, e dele formei Eva. Tu a amas por ter surgido de teu amor e a carne dela veio de teu desejo. Assim, nela perdura a raiz da morte que terás de vivificar pela obediência.
Adão querido, Eu, o eterno Amor de Deus do Qual surgiu toda a vida, te imploro: Não ponhas a perder obra tão grande! Sabes quantos eões se passaram desde que te amparei na queda eterna da morte. Não recusei todos os meios para salvar-te. Se Eu tanto fiz, faze o pouco e devolve-Me o querido irmão em ti, para que nos tor- nemos um só amor em Deus, nosso Santo Pai. Amém.’
Com isto, o Amor me deixou. Eu, porém, alimentei-me e fortaleci-me para cair em desobediência. Ouvi, meus filhos, deso- bedeci ao Amor eterno. A Terra poderá vos relatar a imensidade do meu desatino, pois não ficou uma pedra sobre outra e o Universo transbordava do imenso Poder da Ira divina.
Ocultei-me e chorei lágrimas amargas de remorso, e o Amor eterno não as desprezou, e as de Eva Lhe eram agradáveis. O Amor reparou tudo. — Novamente errei no sábado e chorei minha infâmia. Mas o Amor enviou um anjo que me levou do jardim da tentação para um país conhecido de Seth, um país de correção, de tristeza, mas também para um país de alegria. Quando retirei a mal- dição de Caim, que se perverteu em consequência do meu aguilhão da morte, pois surgira do sumo da maçã envenenada pelo verme
mortal, o Amor de Deus me entregou meu querido Abel-Seth. Há cem anos, o novo anjo do Amor eterno nos trouxe para este país, do Conhecimento e da Verdade eterna de Deus, onde Abel havia enter- rado a espada e colhera os bagos vermelhos e brancos.
Vede, meus filhos, o quanto fez e ainda há de fazer a mim e a vós todos o imensurável Amor de Deus. Portanto, sede alegres se o Amor eterno também procura os filhos de Caim. Todavia, jamais um de nós deverá se dirigir para lá sem ordem expressa do Senhor, pois o próprio solo é feito de excrementos de vermes. Todo o mal deriva das mulheres do abismo; portanto, não vos vilipendieis com elas. Amém.”
CONVOCAÇÃODEHENOCHPARA PREGADOR
Tendo Adão terminado esse discurso com Minha especial aquiescência, sua visão interna se fechou, em seu benefício. Seth, Enos e Henoch se admiraram sobremaneira e não compreenderam o sentido das palavras, perguntando a Adão a respeito.
Estupefato, ele mal sabia ter dito algo e perguntou a que se referiam. Seth, então, disse: “Revelaste-nos o teu surgimento no iní- cio de todos os seres e mostraste os caminhos insondáveis do Amor eterno. Como não o entendêssemos, queríamos pedir-te maior elu- cidação. Perdoa, pois, nossa curiosidade.”
Levantando-se, Adão respondeu, irritado: “Se ouvistes coisas tão maravilhosas, considerai que vieram do Senhor e não de mim; portanto, sabeis a Quem compete vossa gratidão. Se vos dei algo de bom, foi o Senhor a vos agraciar, e não eu. Ponderai bem isto, pois Adão, pai de todos vós, repete aquilo que vos disse anteriormente, isto é, a encarnação de Lúcifer em Adão, através da imensa Graça do Pai Eterno e Santo. Se Ele assim fez, fazei o que vos compete e obedecei-Lhe em tudo. Amém.”
Curvando-se diante de Adão, os três seguiram caminho e comentaram o fato extraordinário. Henoch, o mais moço e, em virtude de sua devoção, um doutrinador em Meu Nome, disse aos
patriarcas: “Adão pronunciou palavras cheias de sabedoria e profun- deza. Não as entendemos, por ter dito coisas que ele próprio ignora- va. Se tivesse falado como homem, facilmente o compreenderíamos. Proferindo coisas em Nome de Deus, por intermédio do espírito, testemunha do Amor divino, nosso entendimento foi nulo.
Existe, porém, Alguém que o entende, e este Alguém é o Amor eterno, do Qual tudo surgiu, inclusive nosso amor para com Ele. Sinto que se alguém permitisse que o Amor penetrasse todo o seu ser, e dali para o Amor em Deus, haveria de entender tais reve- lações. O amor é a raiz de toda a sabedoria e não existe sabedoria senão no amor para com o Amor em Deus.
Possuímos a raiz de Deus. Façamos que ela brote em todas as fibras de nossa vida, e muita coisa grandiosa nos será dada do Mar da Graça do Amor eterno, muito mais profunda que aquilo que Adão nos relatou. Nascemos de Adão e Eva, portanto temos muita carne, mas pouco entendimento de coração. Mas, se, futuramente, nascerem criaturas do puro Amor divino, nosso entendimento será um brinquedo para elas.”
Virando-se para Seth, Enos disse: “Pai, o sentido profundo das palavras de Henoch fizeram vibrar meu coração devido à sabe- doria oculta do Amor divino. Sua sensibilidade é verdadeira, todo o seu ser se manifesta em puro amor e humildade, por isto deverá ser doutrinador de nossos irmãos e filhos. Henoch tem grande amor, poder e força no coração e não haverá quem se lhe iguale, pois não se pode ter amor como se quer, mas à medida que o Senhor nos cumulou. Assim, também o entendimento tem que ser diferente, para que um se torne necessário ao outro, nivelando-se deste modo tudo aquilo que o Senhor permitiu surgir tão sabiamente, em con- dições desiguais.
Acabaste de ouvir meu discurso, Henoch; teu coração é for- te e tua compreensão anula a minha. Fala, portanto, e nos ensina os justos Caminhos do Senhor e demonstra as Pegadas insondáveis para podermos louvar o Nome do Santíssimo, como filhos de Seu Amor eterno. Amém.”
Humildemente, Henoch perguntou: “Seria viável a um filho fraco ensinar aos que ainda muito lhe podem ensinar?” Retrucaram ambos: “Esqueces o que Adão nos ensinou? Os pais apenas geraram em seus filhos moradas para os filhos destes. Se somos geradores do físico e não do amor, Espírito vivo provindo do Espírito de Deus, continuamos sendo somente irmãos e filhos de um Pai Celeste. Por isto, podes pregar com teu amor e esteja certo que saberemos di- ferenciar a voz do irmão da voz do filho de Deus, com a Graça do Senhor. Possuis um grande manancial de amor e podes deixar que irradie seus raios para os teus irmãos.”
Respondeu Henoch: “Falaste certo, pois meu sentir me diz que assim é para Deus. Mas esqueceste algo de grande importância, isto é, qualquer um pode falar e agir à vontade, em Honra de Deus. Pregar em Nome Dele só pode quem recebeu tal missão do Alto. Por ora, tal incumbência me foi dada apenas por vós e não do Alto; por isto, pregarei somente diante de vós. Quando me for dado do Alto, poderei pregar a todos os irmãos o grande poder do Nome do Amor eterno. Quanto ao louvor deste Nome, sabeis o que seja do Agrado do Senhor, pois nem palavras, nem gestos, pensamentos ou cerimônias algo representam para Ele, mas somente o amor e a obediência em tudo.”
Disse Seth, comovido: “Ao te ouvir, tenho a impressão de perceber as melodias de um mundo que surgirá qual raio de Luz da Eterna Aurora do Senhor, para nossos futuros descenden- tes. Não silencies, mas fala sempre, e mostra-nos o que comporta teu coração.”
Erguendo seu olhar para o céu, Henoch falou silenciosa- mente em seu coração: “Santo Pai, tem piedade para com teu filho fraco. Devo dar e só tenho o amor para Contigo. Nada de bom exis- te em nós, senão o amor que Te devotamos e recebemos de Ti. Que poderei proferir se meu amor sempre embaraça a língua e nunca posso louvar-Te por este motivo?
Solta a minha língua, Pai, se isto for de Tua Vontade, para que possa pregar a Glória de Teu Nome diante de todos os Teus fi-
lhos. Enos, Kenan, Mahalalel e Jared sempre pregaram a Tua Glória; não permitas que seja eu filho indigno dos patriarcas devotos.”
Como essa oração silenciosa fosse do Meu Agrado, fiz des- cer um anjo que fortificasse e soltasse a língua de Henoch, que disse: “Amados filhos de Deus, o Amor de Deus me cegou, ensurdeceu e emudeceu por algum tempo. Mas agora o Senhor me fitou e Seu Amor infinito me fortaleceu e soltou a língua. Ele quer que o ho- mem O ame com todas as forças de seu coração, e esta força é o próprio Amor.
Se possuímos amor, devemos ofertá-lo a Quem o depositou tão milagrosamente em nosso coração. Nada possuímos para ofertar ao Senhor que não tivéssemos recebido Dele, pois se Lhe oferecêsse- mos o mundo inteiro, Ele responderia: Se tivesse prazer num mun- do, poderia criá-los aos milhões, inclusive o espaço necessário. Não Me alegro com vossos sacrifícios materiais, mas com um coração ar- rependido e amoroso. Se quiserdes, podereis devolvê-lo a Mim e Eu nele passarei a morar com Minha Graça, e todas as coisas vos serão claras como a água. Mas, se vós próprios tomais morada em vosso coração e trancais a porta diante de Mim, não podendo entrar quan- do quero, em breve tereis gasto o pão da Vida em vós. Eu, o Único Doador do Pão da Vida, não podendo ingressar, a morte eterna será inevitavelmente a consequência do amor-próprio.
Não sinto satisfação em tomar para Mim, pois Minha má- xima Alegria consiste no constante dar. Quem quiser receber a Gra- ça, que deixe preencher seu coração, para que posteriormente Meu Amor consiga nele morar. Quem não preencher seu coração com Meu Amor, não há de saborear a vida em si e a morte o prenderá totalmente.
Agora estamos na época em que dou a todos, primeiro, a Graça; em seguida o Amor, até a grande Época das épocas. Em tal tempo, o Amor será o principal e quem não O possuir, não partici- pará da Luz da Graça e a luz do mundo o aniquilará.
Filhos de Minha Misericórdia, Minha Graça é um imenso tesouro e não há na Terra o que se lhe compare. É Ela uma Luz
das Alturas de Minha Santidade, assim como o Meu Amor é um alimento da Vida. Quem não tiver recebido a Minha Graça, não poderá crer que seja Eu de Quem emana toda a Vida eternamente. Quem não tem fé, semelha-se aos irracionais e será julgado onde estiver. Se alguém Me descobrir em seu amor, receberá torrentes de Graça, desfrutando antecipadamente daquilo que na grande Época das épocas será dado aos homens da Terra, de boa vontade.
Portanto, crede, para poderdes atingir o Amor e, por ele, a Vida. Amai-Me em espírito e que todas as vossas ações sejam teste- munhas da vossa vida e vossa boca testifique serdes filhos de Deus. Hei de julgar as criaturas segundo sua fé. Os Meus filhos serão guia- dos por Meu Amor, e a Luz de Minha Sabedoria lhes será um fanal eterno da bem-aventurança em Mim, seu Santo e Amoroso Pai, hoje e sempre. Amém.” Concluindo, Henoch disse: “Ouviste o que acaba de falar o Senhor?” E Seth respondeu: “Sim, mas deu-se o mesmo como no retrato de Adão, pois temos a Graça, mas falta-nos o amor.”
CÂNTICODEKENANARESPEITODASDEZ COLUNAS
Neste instante se aproximam Kenan, Mahalalel e Jared, e Seth os abençoa em Meu Nome. O primeiro a falar foi Kenan, di- zendo: “Ouvi o meu relato de uma visão que representava dez co- lunas dentro de um grande lago cujas águas batiam violentamente contra as mesmas. Na primeira coluna se achava Adão e dizia para as ondas: ‘Ouvi, filhos, Deus, o Senhor, Santo Pai de todos os filhos gerados por mim, é Deus único e não há outro além Dele. O Uni- verso é pleno de Sua Honra, Santidade e Amor. Acalmai-vos, ondas tenebrosas, para que a Luz de Deus Único vos possa iluminar até o âmago de vossa vida. Amém.’
No mesmo instante, as ondas serenaram em torno da coluna de Adão e uma luz poderosa caiu sobre a superfície das águas, que iluminou qual Sol. Do fundo das águas se fez ouvir um cântico de louvor, que subiu como nuvem clara e radiante até as Alturas eternas e santas do Pai, Deus Único e Verdadeiro.
Perto da coluna de Adão se encontrava uma outra, quase igual. As ondas vivas nem se atreviam a erguer as cabecinhas e cir- cundavam a coluna majestosa como se quisessem dizer: Vê o Nome do Altíssimo, que Se chama Jehovah. Que jamais este Nome seja pronunciado em vão, pois Ele é Santo! Ó criaturas mortais, consi- derai a Quem pertence este Nome, pois Ele é de Deus! — Quando ergui os olhos, vi Seth no cimo da coluna, de expressão muito séria, e repetia justamente aquilo que eu ouvira, julgando que fossem as ondas a se pronunciar.
Não longe dali, via a terceira coluna banhada por ondas lu- minosas. Era ela mais majestosa, rodeada por luz avermelhada, en- quanto as ondas se mantinham quietas e emanavam suave vapor em Honra do Pai. Acompanhei sua direção e vi Enos, o terceiro pa- triarca, que dizia para as ondas caladas: Ouvi, águas da Terra, as pa- lavras do Alto. Podeis mover-vos em ondas suaves durante seis dias e noites. Mas, quando vier o sétimo dia, abençoado pelo Senhor, também vós deveis descansar para louvar o Santo Pai. É da Ordem eterna que tudo que recebe o hálito vivo de Deus e sente no coração dedicado e pensante o Amor do Santo Pai, deve considerar a calma e a comemoração do sétimo dia. Durante seis dias as águas podem trabalhar e se precipitar em grandes vagas. No sábado, porém, deve reinar calmaria, convidando para a cerimônia comemorativa.
Em seguida, vi a mim mesmo como quarto representante, envolto de luz avermelhada e em cima de uma coluna, um pouco menos elevada e rodeada por ondas vivas e alegres. Admirado de mi- nha posição de destaque, percebi com tristeza que mais ao longe as ondas se tornavam escuras e agitadas. Erguiam em inúmeros lugares as cabecinhas espumosas por cima da coluna onde eu me encon- trava, aflito e cheio de tristeza, pois se semelhavam a criancinhas que, desobedientes, procuram com maldade fazer ruir a coluna de pai e mãe.
Petrificado com tal visão, subitamente ergueu-se um tempo- ral formidável rugindo por cima das vagas. Este temporal projetado pela coluna não demorou a conseguir amainar a agitação das ondas
a ponto de apenas um ligeiro rumor se manifestar. Depois que o poderoso Amor do Pai provocou a abençoada calmaria com recur- sos tão extraordinários, minha boca começou a proferir as seguintes palavras surgidas do Coração Paternal nas alturas: Ondas tremen- das, dispostas a desencadear, deveis obediência e amor à coluna de Kenan, se quiserdes umedecer as rochas mortas e rígidas da Terra entristecida.
Ai das ondas espumosas que pretendam erguer-se acima da coluna luminosa de Kenan. Farei com que endureçam pelo eterno Poder de Minha Ira, para sofrimento temporal e eterno! Ao passo que as ondas obedientes terão a Graça, no tempo e na eternidade, de receberem a Luz do Amor eterno que se projeta aos mares da Vida eterna, partindo de Minha Misericórdia. Erguei-vos sempre acima da coluna santa e luminosa de Kenan, pois assim é da Vontade do Pai e Juiz das ondas iradas do mar da vida, e torrentes de Deus em fileiras intermináveis.
Quando terminou esta cena, olhei em direção da quinta co- luna. Era inteiramente escura e os choques das ondas pareciam des- truí-la qual aço incandescente. A morte rugia pelos abismos irados das águas, e onda por onda era atingida por ela. A língua humana não seria capaz de transmitir as crueldades praticadas pelas vagas tremendas.
Saturado com tal quadro que se me deparava aos olhos do espírito no coração da alma dentro da carne, ergui os olhos para o cimo e vi Jared, filho de meu filho Mahalalel, implorando amor ao Pai eterno, para as vagas enfurecidas que se arremessavam umas contra as outras com intenções mortíferas.
Enquanto Jared orava, uma torrente de amor misericordio- so se projetava pelos Céus abertos sobre aquelas ondas em fúria. E vede, de novo rugia a planície do mar da morte e as ondas come- çaram a se desfazer, penetrando novamente nos braços e corações amainados dos irmãos abençoados.
Uma espada flamejante ia sendo arremessada às mãos trê- mulas de Jared, que a brandia ligeiro, com toda força possível e se-
gundo os Desígnios de Deus. Isto feito, ouvi nitidamente as seguin- tes palavras: Balbúrdia terrestre e infiel, não deves atrever-te a matar os filhos do Amor eterno, pois Eu sou o Senhor da Vida e da mor- te. Quem matar seus irmãos, deverá ser punido com os castigos da morte eterna, em espírito e na alma. Por isto, ninguém deve bater, agredir, amaldiçoar ou matar o próximo.
Dirigindo o olhar para a sexta coluna, vi que estava envol- ta em sangue e lama, e no lugar das vagas anteriores rastejavam os vermes mais repelentes. A própria coluna estava completamente en- lameada do sangue do opróbrio e os vermes subiam até o cume, de sorte que não era possível ver-se nela os marcos sublimes da Von- tade divina.
Só se avistavam inúmeros vermes que se esmagavam re- ciprocamente, para em nova união se reproduzirem em vermes cada vez maiores na tentativa de deturparem a forma divina pela qual a Santa Vontade do Pai eterno queria se transmitir às vagas pacificadas.
De repente os Céus incandescentes reboaram, o Sol apagou e a Lua não pôde mais emitir seu brilho de fé, tampouco as estrelas, que caíam em enormes quantidades. Em seguida, começaram a cla- mar inúmeros mortos de todas as profundezas da lama: Cobri-nos, estrelas partidas, para que não vejamos a face de Mahalalel que veio em Nome do Deus eterno e irado como açoite de fogo querendo golpear-nos porque envolvemos a coluna elevada e maravilhosa.
Então os Céus se partiram e de suas fendas se projetavam torrentes poderosas do fogo divino sobre a coluna de Mahalalel. Este, inspirado pelo Espírito do Senhor, disse: Hediondas vagas ver- miformes, o Amor do Senhor é eterno, santo e puro, por isto não deveis praticar impudicícias. Chegou o tempo, um santo fogo do Céu, para vos lavar no fogo da ira, se não vos lavardes antes para vos transformardes em ondas pacíficas, amorosas e penetradas da Graça.
Enquanto estas palavras eram proferidas pela boca de Maha- lalel, sob constantes raios e trovões, as massas dos vermes começaram a serenar e quando atingiram um estado plano, derreteram-se quais
formas incandescentes, no início ainda turvadas, mas aos poucos se clareando em ondas pacíficas.
Deste modo a Ordem fora restabelecida e quando olhei so- bre as planícies alvas das águas purificadas, nada mais vi daquelas massas, porém algumas vagas mais escuras se aproximavam das pri- meiras tornando-se pouco a pouco igualmente mais claras. Então vi Mahalalel ajoelhar-se e agradecer ao Senhor e cada palavra proferida se elevava às alturas eternas do Santo Pai, qual sol radiante.
Subitamente meus olhos depararam com a sétima coluna, inteiramente avermelhada, e Henoch pairava quase em cima dela. Minha estupefação não se prolongou, pois percebi vagas malignas rodeando a coluna, e por baixo delas se encontravam outras, em parte cobertas de lodo, águas roubadas e terrivelmente acorrentadas.
Havia águas do Amor, da Graça, da Vida e da Luz, e muitas outras. Todavia, eram presas por pedras transparentes que represen- tavam os laços do amor egoísta. Grandes massas impelidas por zelo voraz se elevavam quais nuvens delicadas que ultrapassavam as zonas daquela coluna. Quando deparavam planícies aquáticas, em outras zonas precipitavam-se mais velozes que um raio e dizimavam as on- das pacíficas em neblinas que impeliam para as profundezas lodosas. Lá eram imprensadas com seu poder tenebroso para pedras duríssi- mas e cobertas com lodo e detritos da mentira egoística.
Felizmente este quadro não demorou, pois vi Henoch de cuja cabeça se projetavam raios ardentes que revolviam em torren- tes todas as profundezas do assalto. Eis que as vagas começaram a esguichar e rugir. Movidas pelo intenso calor, elas devolveram as águas presas ao amor-próprio e egoísmo com tamanha cobiça, que subiam quais nuvens fogosas aos ares puros e luminosos. Da coluna de Henoch se desprenderam ventos apressados e levaram em alegria desmedida os filhos libertos às mãos amorosas das águas purifica- das através da Graça divina, que havia elaborado os Mandamentos. Após este milagre do Amor santificado, Henoch ergueu os braços e disse com voz enérgica e tonitruante:
‘Ouvi, ondas assaltantes, a Santa Vontade de Deus eterno: cada gota d’água é contada no coração do Amor eterno, e pertence a si mesma e ao próprio Amor. Por isto, ninguém deve se tornar víti- ma de assalto. Ai do ladrão e assassino da posse de águas e seres pu- ros, e ai das águas egoístas. A astúcia de ladrões e assaltantes jamais se manterá em círculos agradáveis, mas há de ser endurecida para pedras incandescentes da maldição eterna e atiradas nas profundezas da Terra. Não deveis roubar, nem furtar; eis a Vontade poderosa do Deus Eterno.’
Eis que ouvi nitidamente as seguintes palavras das profun- dezas: ‘Purifica-nos, luminoso mensageiro da Vontade poderosa de Deus eterno, para que possamos nos tornar agradáveis aos Olhos do Amor divino.’ No mesmo instante começaram a soprar ventos vio- lentos e fogosos, mesclando o fogo do Amor eterno com a planície infinita das vagas atentas. Tornaram-se tão claras como a superfície do Sol e louvaram a Graça de Deus, e soaram harmoniosamente os ecos santificados dos espaços infinitos através das vagas luminosas.
Como ouvistes tão pacientemente meu discurso, prestai atenção ao que se segue. Não muito distante dali percebi uma colu- na inteiramente lisa como aço polido, rodeada por um mar de areia. Tive a impressão de ver à distância algumas ondas do mar. À medida que se aproximavam notei que na verdade se tratava de areia levan- tada pelos ventos, querendo enganar a Kenan.
Algo irritado, levantei os olhos para o Céu pedindo socorro ao Pai. Mas, o Céu continuou esbranquiçado, com esparsos toques avermelhados, e não havia um eco sequer das sublimes alturas. E as ondas de areia cresciam e cresciam sempre, tornando-se tão compac- tas que nem um raio de luz as poderia ter penetrado.
Subitamente vi a figura de Matusalém em cima da coluna, armado de uma espada flamejante, de dois gumes. Os olhos eram vendados com uma venda de linho enlameada, e seus ouvidos esta- vam tapados com resina pegajosa. Neste instante surgiu, ofuscando com brilho celeste, um poderoso condor.
Voando em torno de Matusalém, soltou a venda dos olhos e com seu bico aguçado, limpou seus ouvidos. Isto feito, o condor alçou voo e sumiu nas alturas qual estrela luminosa. Tomando da espada, Matusalém, o fiel e verdadeiro, a fez vibrar em todas as di- reções, e línguas luminosas se desprendiam da mesma, derretendo a resina num tronco à beira da montanha.
As línguas de fogo também se precipitaram sobre a infinita planície e revolveram com a força do fogo a areia para elementos ca- óticos. Eu nada entendia da finalidade daquela ocorrência, todavia, Matusalém se levantou de olhar penetrante e começou a transmitir a Santa Vontade do Pai eterno. E suas palavras se precipitaram quais torrentes levando de roldão as massas arenosas.
O rugir e bramir traduziram as seguintes palavras vindas da Magnitude divina: Poeira insignificante, ouve a Vontade da Santi- dade divina! Jamais apresentes uma manifestação falsa e traiçoeira. Converte-te em água pura e como tal deves flutuar em ondas lumi- nosas e eternas, pois através da mentira aniquilar-te-ás.
Grão por grão começou a se dissolver em gotas límpidas que se uniam às camadas infinitas das águas puríssimas e lavavam a areia ainda agarrada à coluna de Matusalém que procurava im- pedir seu testemunho ao Deus eterno. Assim louvaram a mesma em círculos luminosos, pois a luz da coluna ornava suas cabeças luminosas.
A Verdade unicamente é a manifestação amorosa do amor, por isto a mentira será aniquilada como nenhum outro vício, oposto à Verdade do Amor do Pai. Passada esta cena, pareceu-me ser im- pelido para além das esferas, para poder contemplar a nona coluna.
Que pavor! De abismos infinitos das noites eternas, enla- meada de cores cintilantes, surgia uma coluna terrível a uma altura inatingível. Não havia água, nem areia, nem qualquer movimenta- ção de seres. Treva constante circundava tal coluna interminável e colorida. Procurei descobrir a sua finalidade e origem, mas nem o menor vislumbre se destacava naquela noite infinda. Apavorei-me. A luminosidade de minha própria coluna ia diminuindo aos poucos
a ponto de mal perceber que meus pés ainda se encontravam no seu vértice. Caí de joelhos e pedi de coração ao Pai Eterno e Santo que não me deixasse perecer ali.
Subitamente, uma voz se fez ouvir: Kenan, aprofunda o teu pensamento em Mim, teu Pai e Deus, que hás de ver as coisas de modo diferente. Assim fiz, sem me demorar na origem daquela voz, e a coluna aparentemente interminável começou a se afundar nas trevas da noite eterna. Esse afundamento não se prolongou muito, quando percebi ao longe um rugir semelhante ao trovão das esferas. Antes que me desse conta, vi massas colossais de torrentes se precipi- tarem nos abismos obscuros ao redor da coluna e tudo se encheu de águas em movimento infinito. Aos poucos, vi aparecer o vértice da coluna no qual se encontrava em glória luminosa, Lamech, filho de Matusalém, que se dirigia às vagas com as seguintes palavras:
Ouvi, águas imensas! Não vos aniquileis em vossos desejos. Tudo que tendes em Amor e Graça é Dádiva para sempre e para vossa satisfação infinita. Um objeto não pode ocupar mais que um lugar, por isto, não procureis vossa destruição por desejos desmedi- dos e procurai flutuar em vossa própria esfera para Honra e Louvor do Santo Pai. — Imediatamente as vagas se clareavam, transparentes pela Luz eterna da Vontade divina.
Filhos queridos e patriarcas amados, ouvi com paciência o final de meu discurso e dirigi vosso olhar para as profundezas da Ira divina e através das chamas da ira, a Graça suave que se irradia os povos infiéis da Terra. Até então, todas as colunas possuíam mais ou menos luz própria, pois a nona era até mesmo rodeada de fraco ful- gor colorido. Mas a décima era tão negra que eu apenas a pressentia, sem poder vê-la, pois sua posição e qualidade eram muito ocultas. Esperei e esperei, e aumentando a força da minha visão psíquica por três vezes, percebi que todo o meu esforço era em vão. Até mesmo a minha audição não conseguia perceber o menor sopro de vento.
Enchi-me de pavor, não pude orar nem pedir ao Pai do Amor rápida libertação desta treva pavorosa, pois percebi que tam- bém a minha língua estava paralisada.
De repente, um raio violento surgiu do fundo das trevas até as alturas dos Céus aparentemente cerrados. Se bem que um raio sempre é acompanhado de trovão, desta vez nada disto sucedeu. Noite densa se estendia de uma eternidade para outra e durou mui- to, muito tempo até que finalmente apareceu uma estrela diminuta como consequência do raio veloz. Fixei o olhar para aquela estrela e então meus ouvidos perceberam, não palavras, nem rugir ou bramir, mas aquele som semelhava-se às flautas dos pastores pretendendo reunir as ovelhas de Abel.
Ouvi somente os sons, quando subitamente uma palavra cortou a minha alma, dizendo: ‘Tua língua acaba de ser solta, Ke- nan. Ora e pede ao Pai da Luz, do Amor, da Vida por tudo isto e para a coluna partida na morte.’ Assim fiz por muito tempo, e en- tão uma voz forte chamou-me e disse: ‘Levanta-te e olha os imensos abismos da morte tenebrosa. Nesta coluna, a décima, está marcado o adultério, e a parte inferior — do amor — jaz dispersa no abismo da morte, enquanto a superior — da Graça — ainda se encontra presa no firmamento e não se deixará atrair pelos destroços antes que a base desta coluna não seja lavada do excremento da serpente. A base é a Terra, morada pecaminosa, e o excremento da serpen- te representa a carne tentadora de todas as mulheres das planícies de Hanoch.
Ai da Terra estrumada com o sangue dos irmãos que em virtude do físico feminino se mataram! Em breve hei de fazer jorrar grandes torrentes dos Céus, para matar os corpos tentadores pelos quais toda a água em redor da décima coluna fora consumada. Car- ne tentadora dos vermes, costumas lavar-te diariamente com ervas aromáticas e tratar tua pele com óleos e unguentos finos a fim de tornar-te ainda mais tentadora para os filhos do Santo e Eterno Pai. Uma eterna maldição pousa em tua nuca, isto te diz Jehovah, Deus Todo Poderoso e Eterno. Dentro em breve te prepararei um banho que há de satisfazer tua volúpia.
A maneira pela qual isto sucederá, Kenan, ser-te-á mostrado neste instante, pela Graça do Pai. Ergue-te no vértice de tua própria
coluna apagada e olha para os abismos, onde verás o que acontecerá em breve.’
Imediatamente me ergui e olhei para os abismos da morte, onde vi quantidades enormes de nossos filhos deixando as monta- nhas abençoadas para se dirigirem àquelas filhas. Juntavam-se a elas e criaram homens fortes e moças belas. Eles se tornaram soberanos que matavam e assassinavam os filhos pobres e desprotegidos. Tor- rentes de sangue inocente começaram a jorrar, e este sangue clamava ao firmamento por vingança.
O Céu, então, se partiu em dois e de sua fenda luminosa, flutuou um anjo para perto do amor de Lamech, dizendo: ‘Cons- trói, Noé, a arca da Graça, conforme o Senhor te ordenou, e te abas- tece com tudo que te foi indicado. Acontece que a Terra já arde em diversos pontos, incendiada pela Ira Julgadora do Deus Eterno.
O sangue inocente abalou fortemente a Graça do Céu. Por isto, o Santo Pai determinou de lavar a Terra da maldição e prepará-
-la para uma geração melhor, que surgirá de ti, pois foste fiel a Ele.’
Quando o anjo terminou de falar, o firmamento partiu-se e de suas fendas enormes e cheias de fogo, se precipitaram torrentes violentas de água, como Graça Paternal, para apagarem o fogo e o pecado da Terra. Nem bem as enchentes começaram a cobri-la, vi inúmeras gerações surgirem das planícies procurando desespera- damente os cumes das montanhas. Vi mulheres alvas se agarrarem temerosas às rochas escarpadas, de mãos sangrentas, clamando por socorro. Tudo em vão, pois ventos de fogo impeliam as crianças mais tenras, queimando-as e atirando-as, como alimento da morte, para dentro das torrentes enfurecidas.
Estes ventos em fúria, depois de limparem os picos proteto- res daquelas criaturas, rugiam com escárnio: Agora podes te lavar e preparar, alimento diabólico, nos braços aromáticos da morte eterna e receber o prêmio de tua constante preocupação pela qual todas as gerações, desde Adão, caíram.
Felizmente, esta matança da carne pecaminosa e dos filhos caídos não durou muito, pois vi grandes massas d’água subirem os
mais altos cumes e não havia outra criatura além de mim. Já estava habituado a ver uma nova coluna tão logo as águas haviam preenchi- do os abismos da morte. Mas, desta vez, nada mais apareceu.
Admirei-me sobremaneira quando vi a arca da Graça na- vegar em ondas pacíficas e quando ela tinha atingido o ponto onde vira a última, as vagas se retraíram e a arca da Graça parou em cima de uma coluna grande e maravilhosamente luminosa. No telhado da arca abriu-se uma janela pela qual uma pomba mansa esvoaçava alegremente por cima das ondas. Mas, como nada encontrasse além delas, retornou e entrou ligeira pela mesma janela.
Uma vez fechada, ventos fortes começaram a soprar em to- das as direções, produzindo grandes massas de nuvens. Este furor não demorou e cá e lá começaram a aparecer picos montanhosos, dos quais alguns principiaram a verdejar, formando graciosos jardins.
De novo abriu-se a janela à vista de Kenan e o voo das pom- bas tomou rumo para aqueles picos verdejantes. Em seguida, volta- ram munidas de ramos verdes, para a arca da Graça.
As águas começaram a descer rapidamente e as montanhas e vales surgiram da Terra fértil aquecida pelos raios acolhedores do Sol, transformando-se em campos e matas. No lugar da coluna, a terra cresceu ao seu redor até que a arca mesma se encontrava em solo verdejante. Novamente abriu-se a janela da arca, dando passa- gem a inúmeros pombos, que não mais retornaram.
Percebendo o recuo das águas, Noé abriu as portas para dar passagem aos animais de todas as espécies, e finalmente desceram seus familiares, que se atiraram ao solo para agradecer ao Senhor pela salvação de tão merecida ira divina. Em seguida surgiu de cima do arco-íris um anjo luminoso trazendo a seguinte mensagem:
Noé, único laço de Meu Amor, hei de despertar de ti a se- mente da vida que arrancará da morte a enorme presa. Sinto piedade dos que pereceram nas torrentes do pecado; por isto, enviarei poste- riormente um poderoso Salvador e jamais visitarei a Terra com tais julgamentos. O arco-íris transmitirá aos povos essa mensagem de que jamais o farei até o fim dos Tempos. Só Eu sei o que sucederá depois.”
Todos se curvaram diante de Kenan, sem saberem como in- terpretar o que ele havia relatado. Após longo silêncio, Seth começou a proferir as seguintes palavras: “O que vem a ser isto? O discurso misterioso de Adão ainda não foi assimilado por todos e as palavras entusiásticas de Henoch também continuam a fazer certa confusão em meu intelecto, e agora vem Kenan comentando uma visão sobre- natural que somente Deus poderia entender. Que nenhum de nós se atreva a compreender tais coisas, pois convém deixar tal critério entregue a Deus.”
Neste instante, Henoch se adiantou e pediu permissão para dizer algumas palavras que lhe eram induzidas na alma: “Kenan foi destinado a vislumbrar um átomo daquilo que jaz nas profundezas e nas alturas de Deus Poderoso. Como é possível que passe à nossa frente todo o Universo e no entanto continuamos vivos? Quem te- ria assistido ao milagre de uma erva que se curva diante de nossos passos? Que grandiosidade divina nela se oculta, entretanto nós a pisamos com nossos pés indignos e continuamos vivos.
Não ocorre conosco o mesmo que às crianças ao fitarem um pedaço de pão mais duro, enquanto esperam um mingau? Não deveríamos dar-lhes o pedaço de pão só porque estão habi- tuadas a alimento mais macio? Quando então alcançariam sua força total?
Assim, também o Pai deseja que nos tornemos adultos em Sua Graça, para não somente vermos as coisas, mas também as en- tendermos. Quando Adão nos relatou os caminhos primordiais de seu espírito perdido, pelo qual também o nosso se perdeu e se per- turbou, não havia tanta coisa incompreendida. É lógico que o espíri- to existia antes do corpo, assim como Deus existiu antes de qualquer criatura, pois é a Origem de tudo.
Nunca uma ave botou um ovo vazio e sabemos que o con- teúdo deveria existir antes da casca protetora. Porventura alguém poderia supor que o espírito surgisse e se desenvolvesse no corpo?
Seria o mesmo que construir-se uma cabana na suposição que fosse produzir um morador.
Por que se dá a fecundação antes do nascimento? Por que surgiu o homem antes da mulher? Como podemos ouvir o sussurro do vento de longe, enquanto as nossas árvores ainda estão calmas? Ele existiu antes de chegar perto de nós, e as árvores por certo não produziram o vento que as animou.
Poderia alguém afirmar que o fruto fora produzido por cau- sa da árvore, ou que esta existia antes a fim de produzir um fruto? Como então podeis querer afirmar que Deus deitou as sementes na Terra, de onde nasceram as plantas, produzindo frutos cheios de sementes onde se encontra o fruto renascido?
Se Deus nos ensina a Ordem eterna através de Suas Obras milagrosas, e que a vida ou a força devem preceder àquilo que deve surgir, por que nos admirarmos que Adão nos tivesse relatado a lon- ga história de seu espírito, demonstrando que também nós estamos envolvidos nela, assim como nossos descendentes até o Fim dos Tempos! Isto prova a Imensidade da Graça e Misericórdia de Deus, nosso Pai.
Devemos temer a Deus, não porque nos dá o pão, mas por- que não O amamos, pois nossa falta de amor para com Ele é idêntica à nossa morte. Nosso dever mais sublime deve ser nosso constante amor para com Deus que nos amou muito antes que tivéssemos surgido na matéria.
Vede os inúmeros animais ao nosso redor. Também exis- tem através desse amor, mas não o podem retribuir por não estarem amadurecidos. Um esposo pode dizer à sua companheira que o ame em todas as suas ações. Mas, isto não pode ser proferido por um jovem para uma mocinha ainda sem noções do verdadeiro amor. Preciso é haver primeiro o amadurecimento, depois a bênção e em seguida o amor.
Através de Kenan, Deus nos demonstrou nosso pleno ama- durecimento para o amor. Por que então nos admirarmos como se fôssemos crianças, quando nos deveríamos admirar de nossa incons-
tância no amor, motivo pelo qual a Graça se desfaz em nós, igual ao Sol sobre a superfície trêmula da água!
A visão de Kenan nos diz apenas que devemos amar a Deus acima de tudo e nos arrepender de cada momento de desamor que nos provoca a morte. Amar e viver é a mesma coisa. Quem pos- sui vida vive na felicidade de sua existência consciente, tornando-se amigo de sua vida. Mas quem se afastasse desta alegria, afastar-se-ia da própria vida, chegando até mesmo a se matar duplamente: pri- meiro, em virtude da falta de amor para com Deus, e segundo, pelo amor-próprio, como Caim se tornou um fratricida.
Nossa vida ou nosso amor estão em Deus, e Deus unica- mente é nossa vida e amor. Se nos tornarmos fracos em nosso amor a Deus, nossa existência também se enfraquece a ponto de fitarmos ao nosso redor como se fôssemos cegos e surdos. Quando o Santo Pai resolve nos despertar com Sua Graça, achamos isto absurdo. Mas, Deus é Santo e Severo, e não Se alegra com admoestações e tenta- ções. Por que deveria tentar-nos Aquele que contou nossos cabelos antes que tivessem nascido em nossa cabeça? Porventura ignorará o que faremos?
Necessitamos muito de Sua Graça, dádiva abençoada do Pai, a fim de fortalecer nossa vida enfraquecida. Considerai com o amor a Deus, nosso Santo Pai, a visão de Kenan e facilmente percebereis ter Ele apenas apontado nossa grande fraqueza de amor para com Ele. Somente pelo amor fortalecido tudo nos será claro. Amém.”
ADÃOFALADESUA FRAQUEZA
Todos Me louvaram por ter dado a Henoch tamanha sabe- doria que lhe permitisse revelar o sentido oculto da visão de Kenan.
Nota: Todos vós recebestes coisas muito mais grandiosas sem que alguém tivesse tido uma manifestação de louvor e amor por essas Graças. Ninguém deseja se tornar um servo, obrigado a ser ins- trumento de Minha Graça pelo simples prêmio de Me servir no ver- dadeiro amor. Inspirei somente um para tolo do mundo, para que
fôsseis elevados a grandes honras perante os anjos, e este homem é Meu servo fraco e pobre, Jacob Lorber, que viveu muito tempo entre vós sem que alguém notasse ser ele tolo perante o mundo. Mas, ele Me procurou e Eu permiti que ele Me achasse, inspirando-o diante de vós para animal de carga. Ele vos trouxe um novo Pão do Amor celeste, que dá e exige amor. Se este animal de carga se encontra em caminho lodoso e vós vos saciais do pão de seu cesto, por que des- considerais que seus pés se encontram até os tornozelos dentro do lodo? Quem preza o Pão e a Água da Vida, não deixe atolado o ani- mal de carga. Quem puder libertá-lo, que o faça, do contrário seus pés poderão enfraquecer de temor, não podendo carregar o alimento para vós, a menos que Eu Mesmo o liberte, levando-o para onde Eu o quiser. Em tal caso, não continuará convosco. Tenho muitos filhos, porém poucos dispostos a se deixarem tratar como tolos. É fá- cil comer-se o pão quando preparado; porém, difícil deixar-se atrelar no arado por amor e pouca recompensa. Considerai-o bem e louvai-
-Me pela obediência. Quem algo fizer neste sentido, nada perderá, mas receberá de volta tudo a seu tempo. O servo poderá dizer onde lhe aperta o sapato.
Depois de os patriarcas Me terem louvado, Seth mandou que se levantassem e disse: “Irmãos, diante das palavras de Henoch, jul- go acertado que impeçamos seu trabalho material, pois se Deus o destinou para trabalhador de nossos corações fracos de amor, nossos filhos poderão resolver a parte material. Henoch há de receber de livre vontade o que os patriarcas lhe desejam proporcionar a fim de que tenha tempo para trabalhar nossos corações, segundo a Vontade de Deus. Ele se tornou um predileto de Deus; portanto, também o deveria ser para nós.”
Em seguida, todos visitaram a cabana de Adão, onde rece- biam sua bênção diária. De voz embargada, este falou: “Acabastes de receber a minha bênção e agora pretendeis vosso fortalecimento com alimento e bebida. Eu e Eva já estamos idosos e não podemos mais trabalhar para nosso sustento. Sabeis que sempre fiz questão que ninguém trabalhasse para mim, a fim de dar bom exemplo. Hoje
isto foi impossível. Sinto fome e sede, e, quando estiverdes saciados, lembrai-vos de vossos pais, e tudo que fizerdes seja feito por amor, a fim de que o bocado não se torne duro e amargo. Esta pequena preocupação não durará muito, pois não hei de habitar essa cabana por muito tempo; espera-me outra, onde habita Abel. Tende alegria em fazer isto para vossos pais enquanto estivermos entre vós. Dentro de alguns anos, que passarão rápidos, haveis de procurar com tris- teza aquele que ora vos pede alimento em sua fraqueza, todavia não encontrareis sua cabana.”
Sumamente comovidos com as palavras de Adão, todos co- meçaram a chorar. Finalmente, Seth se controlou, dizendo: “Pai e filhos, nunca uma palavra mais santa do que esta que irei transmitir foi pronunciada, desde que existem Céu e Terra: Que caiam todas as estrelas, que Sol e Lua percam para sempre a sua luz, que todos os mares, lagos e rios venham a secar, antes que Adão e Eva não sejam suficientemente nutridos. Que ambos aceitem o que acabo de ofertar e continuem entre nós até o Fim dos Tempos. Vós, Enos e Kenan, ide apanhar alimento fresco e dizei à minha companheira, Jéa, vossa progenitora, como Adão e Eva necessitam de alimento. Jéa também precisa confirmar aquilo que eu acabo de jurar perante a Face de Deus.”
ADÃOABENÇOASEUS FILHOS
Não demorou e os dois mensageiros chegaram à cabana de Adão oferecendo o alimento a Seth, que por sua vez o passou a Adão. Este, antes de levar um bocado à boca, ergueu os olhos para o Alto para agradecer ao Pai por essa dádiva. Quando saciado, ele disse para os filhos: “Que a Bênção de Deus e a minha pairem sobre vós e vossos descendentes. Enquanto a Terra existir, vosso tronco deverá subsistir para sempre e os efeitos hão de se manifestar em todos, para que se possam fortalecer do nosso arrependimento constante diante da desobediência contra Ti, o mais Santo e Amoroso Pai. Esta Bênção se evidenciará como novo Sol do Amor e da Graça divina.
Nunca vos esqueçais de vosso pai e considerai a fraqueza de Eva. E tu, Henoch, que foste designado para pregador do Amor, sê igualmente abençoado por mim em todos os teus descendentes e que deles possa surgir um grande pregador que, com a Palavra da Vida eterna, revelará aos homens o Reino de Deus.”
Humildemente, Henoch pediu que Adão pusesse as mãos em sua cabeça, para se tornar capaz de falar diante de quem ouvira a Voz de Deus diretamente. Adão, porém, redarguiu: “Não deverias ter mencionado tal fato, Henoch. Se bem que podemos confessar nossos erros perante todos, ninguém deve diminuir o nome de seu irmão e tirar-lhe a honra dada por Deus Mesmo. A humilhação é permitida, exceto na presença de menores ou inferiores, para que não fiquem orgulhosos ou aborrecidos.
Que isto vos sirva de lição e para mim de conforto, pois as- sim serei capaz de ouvir as Palavras de Deus, da boca de Henoch. É algo diferente se um irmão fala para o próximo acerca do Universo, criado por nossa causa, ou se pronuncia Palavras de Deus. Estas só deve ouvir quem se tiver humilhado diante da Santidade julgadora do Criador.
Quem presumir que o irmão fale coisas suas e não de Deus, caso a sua língua tenha sido abençoada, pronunciará o seu próprio julgamento no amor-próprio, admitindo que também ele seria ca- paz e que qualquer um poderia ser porta-voz de Deus. Como vosso pai físico e gerador de vossa alma, digo: Vede as flores no campo, cada qual diferente em forma, cor, perfume e utilidade; no entanto, só a rosa é a mais nobre e destinada a fortalecer a visão fraca com seu orvalho, se antes disto o coração se regozijou com seu perfume maravilhoso. Observando as inúmeras estrelas no Firmamento, per- cebereis que não existem duas com a mesma luz. Todavia, há apenas uma entre todas que chamais de ‘estrela de Abel’, que brilha qual gota de orvalho na luz do Sol. Para Deus tanto faz cuidar de um átomo ou de um sol, de um inseto ou de um mamute. É o mesmo que alguém que tivesse muitos dons, podendo dar grandes ou pe- quenos com a mesma vontade e amor. Henoch foi doado com amor
e recebeu uma língua abençoada e um coração iluminado, por isto terá que dar o que tem. Fala, Henoch, e fortalece os teus pais com o supérfluo da Graça Divina.”
AVINDADO SENHOR
Pedindo silenciosamente pela inspiração do Senhor, Henoch se pronunciou da seguinte maneira: “A imensa Graça de Deus, nosso Santo Pai, chegou até nós como bálsamo suave surgido da aurora distante; sim, o Santo Pai está entre nós! Tu, Adão, talvez digas: Mas, como, se o Senhor disse que eu jamais haveria de vê-Lo, pois man- daria um anjo que me conduzisse durante o tempo que Lhe aprou- ver! — Acontece que Deus não cumpriu Sua Palavra por imenso Amor, sendo Sua Ira igual à ira de uma pomba para os arrependidos, enquanto Seu Amor é qual fonte vivificadora que alimenta constan- temente o mar do mundo.
Todos vós patriarcas e também tu, Eva, olhai para o Alto e vede o grande Santo entre nós, o Pai que faltou com a Palavra a Seus filhos. Acabei de falar, e que Se pronuncie Quem me inspirou, pois, diante Dele, minha língua emudece. Santo Pai, pronuncia Tu Mesmo o grande Amém.”
Conforme Henoch havia falado, assim aconteceu, pois Eu pronunciei o grande Amém, visível para todos. Imediatamente se atiraram ao solo e Me adoraram em sua contrição sincera, sem que alguém tivesse ânimo de erguer o olhar. Chamando cada um pelo nome, ordenei que erguessem a cabeça para conhecerem o Santo Pai. Adão Me reconheceu e fez menção de falar, mas sua língua não obedeceu ao seu grande amor. Cheio de piedade, permaneci por algum tempo entre eles a fim de inspirar-lhes força e coragem para suportarem o trovão de Minha Voz e entenderem o sentido das Pa- lavras do Amor eterno que transbordava qual torrente da Fonte Ori- ginal e eterna de todo Ser e Vida.
Depois que todos se sentiram vivificados, Adão se ergueu amparado pelos filhos e disse, cheio de amor, confiança e humil-
dade: “Santo Pai, embora estivéssemos cheios de pecados, Tu nos olhaste pleno de Misericórdia e Amor. Por isto, ouso perguntar-Te, qual seria a fibra vital em nós que justificasse a Tua Presença? Reve- la-nos o que motivou Teu Amor a Te aproximar de nós? Perdoa-nos esta pergunta; todavia, se faça sempre a Tua Vontade!”
Quando Adão terminou de falar diante de Meu Semblante, todos se prosternaram e adoraram o Meu incompreensível Amor; aproximei-Me deles e fi-los levantar para ouvir Minha Palavra: “Meus filhos, ouvi-Me; ouvi Aquele que vos deu uma alma imortal e um espírito vivo a fim de que reconhecêsseis o Meu Amor para con- vosco. Dar-vos-ei futuramente a Vida eterna, resultado de nosso re- cíproco Amor, caso a grande culpa do Amor tiver apagado a mesma, em época futuramente projetada por Mim. Assim como vos criei por Misericórdia, hei de criar tal momento através de Meu Amor.
Se agora sou um Espírito da Graça entre vós, serei posterior- mente um Homem de máximo amor entre os homens. Conquanto reconheçais que Eu, o Pai, Me aproximei de vós como o Espírito mais elevado e eterno de todo Poder e Força e sentis ser Eu a vos falar, vossos descendentes não Me reconhecerão, como Irmão fraco e pobre, mas Me perseguirão e finalmente farão aquilo que Caim fez a Abel. Mas, será difícil matar-se o Senhor da Vida, pois Minha aparente morte servirá de vida eterna para os que crerem ser Eu o Salvador, revestido do Poder do Amor, a fim de expiar a culpa de vossa desobediência entre vós e no mundo inteiro, em todas as es- trelas, onde também existem criaturas que se originam de ti, Adão. Essa culpa se transformará em eterno julgamento para os incrédulos e renitentes, em sua maldade egoísta.
Voltarei sete vezes. Na última, virei no fogo de Minha Santi- dade, e ai dos impuros! Viverão no eterno fogo de Minha Ira!
A Minha primeira Vinda se deu no início do mundo para criar todas as coisas, por vossa e por Minha causa. Dentro em breve voltarei nas grandes águas, para lavar a Terra da peste. As profun- dezas da Terra se tornaram um horror cheio de lodo e peste, sur- gidos de vossa desobediência. Virei por vossa causa, para que não
sucumba a Terra toda e continue um tronco, cujo final descenden- te serei Eu.
Voltarei pela terceira vez de várias maneiras, assim como ora aqui estou entre vós, visível e invisivelmente na Palavra do Espírito, para preparar os Meus Caminhos.
Pela quarta vez, voltarei em imenso sofrimento físico, na grande Época das épocas. Logo após, voltarei pela quinta vez no Espírito do Amor e toda Santidade. Na sexta vez, voltarei interna- mente para junto de cada um que sentir sinceramente a Minha Pre- sença no coração e serei Guia de quem se deixar conduzir cheio de fé para a Vida eterna. Mas também estarei longe do mundo. Quem for aceito terá a Vida verdadeira e Meu Reino será seu para sempre.
Finalmente, voltarei mais uma vez, como já disse, e essa volta será definitiva, dependendo da vontade de cada um. Continuai no Amor, que vos salvará. Amai-Me acima de tudo, pois será vossa vida eterna, e amai-vos reciprocamente para serdes poupados do jul- gamento. Minha Graça e Meu Amor Original sejam convosco até o fim de todos os tempos. Amém.”
Neste instante, a visão se fechou para todos.
OSENTIDOPROFUNDODAPALAVRADE DEUS
Depois de todos se terem refeito, Adão dirigiu-se ao pequeno grupo: “Acabastes de ver e ouvir o Senhor da Eternidade, Deus do Universo, nosso Querido e Santo Pai! Ele é o Mesmo como eu O vi, antes que um mortal O visse. A Voz é a Mesma, cheia de Poder e Força, a cujo Doce Som obedecem mundos e sóis, após terem abandonado sua nulidade, tornando-se aquilo que são, inclusive o maior e mais poderoso espírito que ora se transformou em verme rastejante no pó. Eu mesmo fui colocado em seu lugar como criatura miserável, má, ingrata e cheia de revolta.
O meu espírito se destinava a ser um irmão do Amor eterno da Santidade do Pai. Mas o egoísmo impeliu-o para esta nulidade sem nome. Não sendo possível nos aproximarmos da Divindade,
Ela Mesma Se rebaixará a fim de nos suprir daquilo que jamais um espírito criado poderia imaginar, isto é, Ela quer Se tornar Pai e até mesmo Irmão, unindo-nos assim a Ela para a Vida eterna. Meus fi- lhos, a língua emudece diante de tamanha Grandiosidade de Amor; por isto, prossegue tu, Henoch, pois para tanto foste designado.”
Com humildade, Henoch, inspirado por Minha Graça e Misericórdia, disse: “O que poderia uma criatura fraca dizer quan- do o Amor eterno e a Sabedoria do Pai pronunciaram palavras tão profundas? Considerai que foi Deusque aqui pronunciou palavras grandiosas e nós não as entendemos, pois estamos cientes do que fez para que nós e todo o Universo surgíssemos.
Todavia, temos que confessar que tudo, inclusive a minús- cula poeira do Sol a girar em nossa cabana, nada representa perante Deus, muito embora a completa revelação da consistência do átomo nos ocupasse por uma eternidade. Onde estaria a criatura que com- preendesse a eterna Sabedoria do Pai?
Tudo que vemos é apenas uma Palavra pronunciada por Deus. E quantas Ele acaba de pronunciar, o Mesmo Pai que através do onipotente ‘Que assim seja’ preencheu o Universo com inúme- ros universos. A própria poeira terá que se transformar num corpo celeste e o Universo necessitará de uma dilatação infinita antes que compreendamos o que pretende realizar o Pai para Se transformar em Irmão. Só podemos amá-Lo, e que este amor cresça, pois Ele é o Próprio Amor, e nós somos o que somos, por Ele.”
ABÊNÇÃODIVINANA TERRA
Depois de Henoch ter concluído seu discurso, ele Me agra- deceu pela inspiração recebida. Em seguida, curvou-se diante de Adão e dos patriarcas, que o abraçaram, gratos por Eu o ter dotado de tamanha humildade. Mais tarde, todos se dirigiram, a conselho de Adão, às suas cabanas, enquanto Henoch apanhou seu leito e o levou para a cabana de Adão, onde Eva, já idosa, o ajudou a torná-lo bem macio. Entrementes, chegava Seth com sua companheira, tra-
zendo a refeição para Adão, Eva e Henoch. Antes de se deitar, este pediu a Adão que abençoasse o leito a fim de que sua alma também conseguisse descansar. “Pois, se o corpo repousa”, dizia ele, “a alma deve ter paz. O corpo repousando mal, o espírito não se pode exer- citar na autoanálise e na semelhança de sua forma original em Deus. Sendo o sono, como descanso físico, um benefício de Deus através da natureza, a paz da alma representa o calor interno e silencioso do Amor eterno, do qual é formada a substância para o perfeito desen- volvimento do espírito e assim se tornar um verdadeiro receptáculo do amor, quer dizer, da Vida de Deus.
Não se trata de algo sem importância que me leva a te pedir, pai dos pais, a bênção para o meu leito. Nada existe no mundo que não surgisse da Vida e através dela nos demonstrasse os caminhos da salvação pela infinita Misericórdia do Amor eterno.
As criaturas não deveriam deixar de abençoar tudo, pelo Amor de Deus, isto é, os fenômenos, a noite, o leito, o descanso e tudo o mais. Isto feito, as visões durante o sono demonstrarão à criatura pura as obras do Amor, tornando-se fácil analisar a si mes- ma. Quem desconsiderar as visões e a bênção do leito e do descanso, semelha-se a um cego e surdo, pois o Amor e a Vida desfilarão à sua frente inteiramente mudos.
Se eu não for capaz de perceber a grandiosidade nas coisas ínfimas, como poderia perceber o Infinito e, Nele, o Amor eterno, a Sabedoria, o Poder e a Força de Deus? Por isto, Adão, meu pai, não me negues a bênção de meu leito e dá paz à minha alma para que possa repousar alegremente no Amor de Deus e testemunhar da imensa Graça no Espírito da Verdade da Infinita Misericórdia.”
Deixando-se conduzir para o leito de Henoch, Adão o aben- çoou por três vezes. Em seguida, lhe disse: “Se tu precisas desta bên- ção, todos a necessitarão, inclusive eu; mas, quem o faria para mim?”
Retrucou Henoch: “As montanhas estão carregadas de tua bênção e teu leito certamente foi olhado por Aquele que te aben- çoou antes que um ser humano tivesse erguido o olhar para as mo- radas luminosas do Santo Pai. Se assim é, como poderias me pedir
uma bênção se eu mesmo sou apenas uma partícula de tua bênção provinda de Deus?
Fica na paz de Deus! A própria Terra te foi dada como esca- belo da imensidade de tua bênção; e teu leito já foi abençoado muito antes e assim proporcionou-te um repouso livre e uma paz sublime para tua alma, enquanto a minha é apenas uma alma surgida de ti, portanto uma partícula da enorme bênção que recebeste da Mão do Amor eterno do Santo Pai. Não te preocupes com aquilo que o Senhor te facultou antes que um Sol iluminasse a Terra.
Quanto a mim, posso apenas agradecer-te pela bênção de meu leito; abençoar o teu leito seria um ultraje de minha parte. Como poderia dar quem nada tem, pois recebeu tudo de Deus? Eu recebi apenas amor e só posso transmiti-lo conforme o recebi. A própria bênção só foi dada a ti, e nós mesmos somos tua bênção. Repousa, portanto, na paz de tua alma provinda de Deus.”
Sumamente comovido, Adão disse: “Deste modo falou meu filho Abel quando na fuga do paraíso levava em seus ombros a mim e a minha bênção e ma devolveu no país de Euchipe.
Quanto mais te ouço, tanto mais reconheço a doce voz de meu Abel. Embora teu corpo não seja o dele, tens a mesma constituição, e teu modo de falar tem o mesmo amor e o mes- mo espírito.
Santo e Grande Deus, a Terra por certo não será habitada por dez vezes mais do que eu a habitei e ainda o farei. Mas, ainda que vivesse até o fim, que mais poderia imaginar caso Tu, ó Jeho- vah, me restituísses o meu Abel? Este desejo aparentemente irre- alizável cumpriu-se maravilhosamente. Só Te posso agradecer pela devolução de Abel em Henoch, portanto me devolveste a bênção de que me achaste digno, pois de sua estirpe deverá surgir um rebento como irmão de todos os meus filhos. Queira aceitar, ó Jehovah, mi- nha profunda gratidão.
E tu, Eva, não preparaste em vão o leito de Henoch, tão macio e agradável, pois aquele a quem choraste durante seiscentos anos, nos foi devolvido em Henoch. Alegra-te comigo, pois ele ja-
mais morrerá, mas viverá depois de nós para voltar após de onde veio. Não é assim, Henoch?”
Respondeu Henoch: “Sim, Adão, minha carne é de Eva, minha alma veio de ti e o meu espírito, de Deus. Como deixaria de ser aquele a quem abençoaste, Abel, teu descendente querido, pois o meu espírito e o de Abel são um só, provindo de Deus. Repousai, tu e Eva, na paz de vossa alma.”
ORAÇÃOMATINALDEADÃOE HENOCH
Assim, os três se recolheram, dormindo até que uma brisa fresca e matinal os despertou. Cada um fez uma oração silenciosa, enquanto Adão pronunciava: “Santo e Amantíssimo Pai, em Teu Nome cheio de Poder e Força despertei para um novo dia. Permite que durante o mesmo possa pensar e agir de modo que o pôr do Sol me transmita suavemente: Adão, regozija-te, pois não desviaste teu olhar da Face de Jehovah e teus pés, das trilhas do Amor Eterno, e assim como o Sol caminhou silenciosamente, aquecendo o firma- mento, teu coração seguiu o doce sussurro do Espírito Eterno.
Pai, que nunca desviaste Teu Semblante de mim, não o faças hoje, nem por todo o sempre. Que Teu Amor afaste as pedras do meu trajeto, para que os meus pés não me levem à queda, impedin- do seguir os Teus Caminhos com retidão.
Conta os meus cabelos e que nenhum se perca; fortalece-
-me, pois sou fraco, a fim de poder abençoar os meus filhos dados por Ti. Atende o meu pedido, em nome de todas as criaturas e se- res. Amém.”
Em seguida, Henoch, a pedido de Adão, pronunciou seu pe- dido a Mim, da seguinte maneira: “Grande Deus e Santo Pai, muito embora saiba que não consideras as palavras pronunciadas, quero atender ao desejo de Teu filho Adão. Quem poderia aprofundar-se na Grandiosidade de Tuas Infinitas Ações de Amor? O que é o ho- mem para que Tu Te lembrasses dele, Tu diante de Quem eternida- des se desvanecem quais flocos de neve?
Quão imenso deve ser Teu Amor, pois que a criatura fra- ca ainda consegue existir diante de Ti em sua ingratidão, suposto amor e humildade. Jamais poderá avaliar sua imensa culpa e nuli- dade frente à Tua Santidade. Ainda que possuísse o pleno amor de todos os irmãos, o que seria o meu amor comparado ao Teu? Todos os universos são apenas gotas de orvalho diante de Ti. Que seja o meu amor fraco e imperfeito tudo o que possa oferecer-Te, e queira fortificar-me cada vez mais, segundo a Tua Misericórdia. Amém.”
CONSIDERAÇÕESMATUTINASDE HENOCH
Disse, em seguida, Adão: “Henoch, transmissor do Amor eterno de Deus, chamei-te de Abel, mas com isto fui injusto e in- grato para com o Pai. Abel foi meu primeiro filho abençoado, dado por Deus, portanto predileto de meu coração e instrumento fiel da Mão Divina para minha salvação. Tu foste enviado posteriormente como bálsamo fortificador, para que a ferida provocada por Caim sarasse em meu coração no fim de minha vida. Se fosses apenas alma e espírito de Abel no corpo de Henoch serias o mesmo que Abel, igual a Seth, que Deus colocou em lugar daquele. Tu foste pelo Se- nhor, através de Seu Amor, depositado na semente de Jared para que te tornasses um fruto puro do Amor e demonstrasses a todos o Caminho suave do mesmo. O Amor é superior à nossa sabedoria, sujeita a falhas, enquanto o Amor cria do próprio lodo marítimo, montanhas e rochas.
Henoch querido, deixa-te abraçar e abençoar, para que tua bênção perdure até o fim dos tempos. Deitaste um bálsamo em meu coração endurecido, que começa a se tornar meigo como fora quando pela primeira vez o Senhor me entregou minha compa- nheira querida. Começa a desabrochar uma roseira com muitos galhos em meus pensamentos, e em cima vejo um botão que, ainda fechado, brilha mais que o Sol ao meio-dia. Tudo isto foi reali- zado por ti.
És, portanto, nem Abel, nem Seth, mas uma existência pura do Amor de Deus, pela semente de Jared, com vida própria, jamais sujeita à morte. Divide o teu supérfluo entre todos para poderem re- conhecer que somente o Amor é a Vida verdadeira e eterna de Deus, e não a sabedoria. Somente agora reconheço que serei indestrutível apenas no Amor, pois toda nossa sabedoria terá que ser destruída perante Deus. Mas o Amor, o pequeno Amor, será futuramente de- senvolvido por Deus, por ser Ele Mesmo puro Amor.”
Terminando de falar, Adão apertou Henoch contra o peito e pediu-lhe para verificar a situação das estrelas, do Sol, dos ventos etc. Quando chegou ao ar livre, Henoch orou: “Ó Santo Pai de Amor e Misericórdia! Quão pequeninas e isoladas brilham as estre- las enormes em Tua Imensa Casa! Entretanto, seu número não tem fim, a Casa não tem paredes, pois tudo flutua em Tua Misericórdia e se agarra a Teu Amor, não havendo força senão a Tua a conduzi-las pelos infinitos trâmites da vida.
Jamais terminarei de louvar-Te e cada átomo me incentivará a prosseguir em meu louvor, pois me deste um coração cheio de amor e devoção. Sempre hei de ser alegre por Tua imensa Bondade que manifestas a cada um que se regozija em Teu Nome. Alegria, alegria, bela companheira do Amor, quão doce és para o coração que palpita segundo a Vontade do Santo Pai. Aceita, Amantíssimo Pai, com Paciência, o meu fraco balbuciar. Amém.”
ALEGRIADEJAREDCOMSEUFILHO HENOCH
Enquanto Henoch se prontificava a observar tudo conforme Adão lhe havia recomendado, aproxima-se Jared, dizendo: “Meu fi- lho, não consegui conciliar o sono por teres encontrado tamanha Graça perante Deus. Quem jamais se teria atrevido a procurar a ca- bana abençoada de Adão, após o pôr do sol, e agora te foi concedido habitá-la! Dize-me, o que te traz a esta hora, deixando habitação tão santificada!”
Retrucou Henoch: “Caro pai, aquele que me incumbiu de determinada tarefa está acima de ti e de mim, é o primeiro entre nós todos na Terra e cabe-lhe ser o primeiro a saber do motivo que me trouxe aqui. Tão logo ele aparecer, sabê-lo-ás ao surgir do sol.”
Enquanto Henoch assim se externava, surgia Seth de sua ca- bana, sendo respeitosamente cumprimentado por ambos. De pron- to, Seth repetiu a mesma pergunta de Jared, sem conseguir informa- ção. Como se admirasse da atitude de Henoch, este respondeu: “Pai Seth, és um filho abençoado e tomaste o lugar de Abel; sabes, pois, que Deus e Adão estão mais perto de ti que eu e meu pai, Jared.
Se Adão me incumbiu de estudar certos fatos pertencentes a seu coração, não podes exigir de mim que te forneça o resultado, que ele deverá dar, como pai de todos.
Tudo que possuo te pode ser dado sem restrições, pois te pertencia antes que fosse meu. Mas, Adão tem certos privilégios e terá que receber primeiro para poder retransmitir a todos nós. O Sol se aproxima do horizonte, a Lua está desaparecendo e as estrelas abandonam seu palco noturno, enquanto Adão já se acha esperando por mim diante de sua porta. Mais um pouco de paciência e logo sabereis o motivo de minha atitude.”
Dirigindo-se para a cabana de Adão, Henoch se curvou dian- te do mesmo, entrou em companhia deste e lhe relatou fielmente o que havia observado. Uma vez cientificado de tudo, Adão dirigiu-se primeiro para Eva e disse: “Fiel companheira, repousa na Graça de Deus até eu voltar, pois os filhos já aguardam a minha bênção, nas montanhas. Tu, caro Henoch, leva-me à montanha ao Sul, a fim de que minha bênção acompanhe os raios solares.”
CANÇÃOMATUTINADE HENOCH
Chegando à montanha, sete minutos antes da aurora, Adão se ajoelhou e agradeceu pelo novo dia, pedindo a Minha Bênção a fim de que pudesse abençoar em Meu Nome todos os seus filhos. Imediatamente sentiu o Meu Sussurro delicado, passando-o para
os demais. Mas também se lembrou dos filhos das planícies e no mesmo instante rompiam os primeiros raios do Sol no Horizonte, despertando grande emoção no primeiro homem da Terra. Assim, transmitiu sua alegria para Henoch e pediu que se expressasse con- forme havia feito após a prece matinal.
Henoch, porém, respondeu: “Exiges algo que sou incapaz de realizar. Não sou inspirado qual Seth, mas transmitirei aquilo que se manifesta dentro do meu coração. Meu pai, o que vem a ser esta manhã passageira diante da aurora eterna do espírito surgido do Infinito Amor do Santo Pai! Este Sol com seu fraco fulgor, o que representa sua luz perante a eterna Glória do Amor divino? Ele é o último ponto de partida de uma fagulha de Graça do Amor de Deus; no entanto, nos deslumbramos com sua majestade. Que farí- amos se conseguíssemos ver a Fonte Original de toda a Luz do Pai em Sua Santidade?
Longe de mim querer criticar o Sol, mas ele deveria ser o pri- meiro professor a nos ensinar: Fracas criaturas, por que vos admirais de mim, que sou simples iluminador da Terra? Quão fraco é aquilo que ofusca o vosso olhar na minha superfície comparado com o que abrigais no peito! Se tivesse eu recebido vosso menor dom, minha luz penetraria nos polos do próprio Infinito. Assim não sendo, e meus raios se retraindo, o olhar de vosso espírito projeta com todo poder sua força e recebe em troca outros mais fortes e renovadores, da Aurora eterna do Amor em Deus.
O Sol tem toda razão em nos transmitir tal conhecimento através de seu primeiro raiar, pois nosso coração se alegra com sua presença e todos os animais se regozijam, assim como as flores a abrirem suas corolas; mas, considerando que, para sentirmos o belo, preciso é haver uma criatura capaz de projetar tais pensamentos caso sua alma tenha atingido a serenidade do Amor de Deus, todo e qualquer pensamento subsequente se encontrará dentro da verda- deira ordem.
Se sabemos disto, como nos alegramos diariamente quando o Sol, segundo a Vontade de Deus, é impelido em determinada hora?
Ao passo que, considerando nosso espírito livre, não nos extasia- mos com a luz da nossa centelha divina, que jamais se apaga, porém brilha com a mesma capacidade de amor e força, nos âmbitos da Graça e de todo Amor de nosso Santo Pai. Facilmente nos admira- mos com o ninho de uma ave, louvando a Deus por esse milagre, enquanto uma obra inestimável do espírito imortal é simplesmente desconsiderada.
Como eleva a nossa alma o rumor dos cedros quando um vento implacável os sacode com violência. Mas, o sussurro do espí- rito do eterno Amor é desapercebido pelo nosso ouvido habituado a ouvir a fala na tempestade, sem perceber a chamada forte da Voz de Deus no próprio peito.
Praticamos nossas oferendas e acreditamos prestar um agrado a Deus caso deitemos a face no pó. A verdadeira oferenda ao Senhor, do puro amor em espírito e verdade, não é por nós considerada.
Acredito que, se fazemos a oferenda para prova visível de nos- sa cegueira espiritual, não devemos desconsiderar a coisa principal pela qual unicamente se condiciona a Vida verdadeira e eterna do Amor em Deus. Isto também nos diz a casca da árvore, pois nin- guém poderia afirmar que a árvore existe por causa de casca, pois esta protege o vegetal para ocultar as forças criadoras de Deus aos nossos olhos, enquanto Ele falaria: Ocultei a vida dentro da carne para que a morte não a perceba, e também ocultei Minha Posse den- tro de ti a fim de que a abrigasses até a época da revelação. Debaixo da casca age um poderoso impulso, organizando tudo segundo o amor santificado de Deus.
Assim, tudo que vemos com os nossos olhos físicos é apenas uma veste morta na qual age uma vida serena que nos deve atrair, isto é: a nossa própria. Se isto tivermos feito, os milagres que nos rodeiam se tornam vivos, quando anteriormente nos deixávamos enlear pela simples observação.
Quem poderia admirar-se de uma gota d’água por ser água? Pois, o que faríamos na contemplação do mar ou de uma forte chuva a fortificar o solo? Mas, quando o espírito vislumbrar sua própria
figura dentro de uma gota d’água, então começará a colher para o receptáculo da vida e não se cansará de estupefação ao descobrir dentro de si e de seus irmãos o maior milagre, ou seja, o eterno e infinito Amor de Deus, cheio de humildade dentro de nós.”
ASABEDORIADE HENOCH
Sumamente admirado com o discurso de Henoch, Adão lhe disse: “Ó amor, quem és tu que não consigo aborrecer-me conti- go? És um formidável orador, Henoch, e me demonstraste nitida- mente a minha culpa tocando precisamente os pontos que até hoje foram respeitados por todos, desde Abel. Mas, quem poderia ficar sentido contigo quando pronuncias coisas puramente provindas do Amor eterno?
Nenhuma criatura poderia pronunciar-se como tu, a menos que tivesse recebido inspiração do Alto; além disto, ninguém teria forças para falar algo diante de mim, caso não tivesse recebido senti- do tão poderoso por parte da Onipotência do Amor do Pai.
Falas sem receio e distribuis amor do grande receptáculo, não te cabendo responsabilidade, pois teu amor assume toda a culpa, portanto também a minha.
Teu pronunciamento se assemelha a um sol que surge no horizonte, que no início pode ser fitado com alegria. Mas, à medida que se eleva, qualquer observador se vê obrigado a cobrir os olhos. Jamais poderei assimilar inteiramente o quanto me disseste, fazen- do-me alegre e triste. Alegre porque nunca teu espírito angelical che- gou a brilhar como agora; triste, em consequência da visão clara de meus inúmeros erros diante de Deus e de Sua Santa Ordem.
Considerando, porém, que ontem nos anunciaste a inespera- da vinda do Amor eterno, fico de novo alegre. Agora deixa-nos vol- tar à cabana, onde Seth nos aguarda com o desjejum. Em seguida, visitaremos os filhos para alegrá-los com nossa presença. Eva, Seth, seu primeiro filho Enos, o primeiro filho deste, Kenan o primeiro filho deste, Mahalalel e o primeiro filho deste, Jared, teu pai, estarão
presentes. Que nunca venhas a calar-te pois tuas palavras nos fazem um grande bem. Eis que Seth vem ao nosso encontro; vamos!”
GRATIDÃOELOUVOR VERDADEIROS
Ao chegarem à cabana de Adão onde Eva os aguardava, Seth e os demais fizeram menção de pronunciar a oração matinal, quan- do Adão os advertiu a ouvirem a de Henoch, que dizia: “Santo e Amantíssimo Pai, ouve o fraco balbuciar de um mísero verme da Terra no dia de Tua Eterna Misericórdia e Teu Infinito Amor. Foi da Tua Vontade extrair do pó da Terra nosso pai Adão, e dele, Eva, nossa mãe, neles depositando a força procriadora, de onde surgiram e ainda surgirão inúmeras gerações até o fim dos tempos. Louvor e gratidão por essa Graça, cuja magnitude conseguimos apenas sentir, pois determinaste aos seres que nunca existiram, que surgissem e se firmassem no conhecimento de si mesmos e de Ti, para conhecer-Te em toda liberdade e ver Tua Majestade, admirando-se das Obras de Teu Poder e Glória.
Que tenhamos sempre em mente que fora o Teu Amor a fa- zer surgir do pó da Terra nosso pai Adão, e que a Mão de Teu Amor o modelou segundo Tua Imagem, e a nós todos também. Aceita nosso brado insignificante, conquanto indigno de se aproximar de Teu Coração, e abençoa nosso alimento. Amém.”
Após todos se terem saciado, Henoch, que agradecera pelo desjejum a pedido de Adão, prosseguiu: “Seria muito justo que agradecêssemos constantemente por todas as dádivas conferidas por Deus, e com voz tão forte a fazer estremecer até o Universo. Mas, de que serviria ao Senhor caso quiséssemos demonstrar-Lhe o efeito de Seu Amor em nosso peito?
Ele nada disto necessita, pois sabe perfeitamente o que de- positou em Suas Obras. Representamos algo somente em nossa hu- milde fraqueza, mas nossa força é tolice diante dos olhos de Sua Santidade. Sendo Ele nossa força, como nos vangloriarmos daquilo que não nos pertence, pois é Posse Daquele Que nos supriu em
Sua Imensa Misericórdia a fim de que nos tornássemos Sua verda- deira posse?
Se pretendemos louvar e agradecer condignamente ao Se- nhor, que o façamos com humildade e em nossa fraqueza, e assim Ele nos considerará, fortalecendo-nos com Seu Infinito Amor.”
Algo surpreendido, Adão redarguiu: “Mas, que acabaste de falar? Se eu não o entendi, como o entenderão os meus filhos, por cuja razão pedi que falasses? Segundo minha compreensão, não de- vemos louvar nem agradecer ao Senhor, pois todos nós somos Obras Dele, e a recordação de Suas Obras nos levaria a que Ele Mesmo Se louvasse e agradecesse.
Neste caso, nossa ação seria simples ultraje diante de Deus, se julgássemos ser os obreiros, enquanto é Deus o Criador de tudo. É preciso que nos esclareças melhor, do contrário sucumbiremos em nossas dúvidas.”
Estupefato, Henoch respondeu: “Mas, como é isto possível? Quem poderia comer a madeira da árvore, quando ela produz o doce fruto? Ao saboreá-lo, agradecemos pelo fruto e não pela árvore que o produziu. Se fôssemos nós a madeira de uma árvore e conse- guíssemos produzir um fruto, quem deveria agradecer ao Senhor, a árvore ou o fruto?
Por acaso não representa o fruto uma Dádiva de Amor do Senhor? No entanto, ele não pode nem deve Lhe agradecer, mas sim à arvore como lei libertada conquanto surgida do mesmo fruto; e isto porque lhe fora dada do Alto a força ininterrupta de produzir um fruto vivo e neste inúmeros outros.
Qual é a diferença se se planta um galho no solo do qual em algum tempo surgiria outro vegetal, ou se se deita na terra um fruto com o mesmo resultado?
Nós representamos os galhos, e a semente é a Bênção de Deus. Se reconhecemos que não somos fruto nem semente, mas ape- nas galhos e vegetais para que fôssemos abençoados com fruto e se- mente, a voz dentro de nós representa o fruto e a semente que, por si, não devem louvar e agradecer, porquanto merecem louvor e gratidão.
Somos comparáveis à árvore e aos galhos, e convém lou- varmos e agradecermos pelo que somos e não pelo que recebemos, a fim de nos tornarmos inteiramente livres diante de Deus, corres- pondendo aos Seus Santos Desígnios.”
CONFISSÃODE KENAN
Todos se admiram da profunda sabedoria de Henoch, jovem tão despretensioso, e o próprio Adão se viu obrigado a calar. Kenan, porém, disse: “Pai Adão, até agora fui visionário obrigado a interpre- tar nos antessábados as minhas e as tuas visões no firmamento a fim de que as passasses para os filhos.
O Senhor houve por bem abençoar e soltar Pessoalmente a língua de Henoch; por isto não ouso expressar-me diante de todos. Que esta incumbência seja igualmente dada a Henoch! Se em outros tempos lavamos o corpo dele com orvalho matinal, tanto mais ne- cessitamos ser lavados com o orvalho de seu espírito.
Confesso abertamente: Quem não for lavado com essa água sucumbirá e sua vida murchará qual erva sem alimento umedece- dor. O Senhor agraciou apenas um, para que os demais se fartas- sem quando necessário. A vida foi dada a todos, mas a imortalidade acolhe em si apenas um, para todos. Quem quiser recebê-la será imortal como ele. Quem a desconsiderar, morrerá na época em que o Senhor deitar Sua Foice na erva seca.
Se deitamos a mão no coração, percebemos seu pulsar ritma- do. Mas, se perguntarmos: Onde bate teu pulsar, coração inquieto? — ouviremos a resposta tétrica: Bato constantemente na porta ênea da morte eterna e aguardo com grande pavor o momento de ser tragado.
Se perguntarmos ao coração de Henoch: Onde bates? — ele responderá: Bato constantemente nas portas luminosas da vida e estou certo de que elas dentro em breve se abrirão para receber-me na plenitude da Vida de Deus, da qual agora apenas uma gota de orvalho me anima e vivifica. Isto percebi por várias vezes em mi- nhas visões. Mas, que isto não continuará assim todos aprendem
pelo amor à vida. Não podemos dar o que não possuímos, todavia podemos receber de quem tem. Henoch o recebeu do Alto, poden- do e querendo transmiti-lo; depende de nós querer aceitá-lo. Por isto, Henoch, usa tua língua cheia de vida para sermos lavados dos pés à cabeça, com o orvalho provindo da Aurora do Senhor. Pai Adão, deixa que Henoch nos esclareça os sinais celestes e terrestres. Amém.” Prossegue, em seguida, Henoch: “As estrelas seguem seus trâmites e brilham ora mais, ora menos; os ventos sopram de vários pontos carregando nuvens sutis ou massas imensas em suas asas; os vegetais tremem com seus galhos — e nós desconhecemos a ra- zão de tudo isto. Mas, quando se aproxima a colheita, constatamos que o Senhor soube dirigir sabiamente os Seus elementos, não nos preocupando a trajetória final dos ventos. Este quadro representa a melhor explicação, pois tudo que é feito pelo Senhor é bem feito. A nós compete entregarmos tudo a Ele sem querer interpretar os Seus Caminhos, pois é preferível procurarmos a nós mesmos e a vida dentro de nós. Nisto reside todo o segredo de nossa vida. Amém.”
AGRUTADE ADÃO
Após ter Henoch terminado sua interpretação, Seth o abra- çou, dizendo: “Quão breve é a palavra do Amor nos caminhos lu- minosos de sua sabedoria, cheios de vida, força e ação! Se o intelec- to humano contar todas as estrelas com dificuldade, investigar os trâmites dos ventos, mirar o rumo das nuvens, quiser dispersar as neblinas adormecidas nos vales e pretender sondar da flora como descansara durante a noite, a fim de deduzir o resultado da colheita futura — a interpretação de Henoch caiu do Céu e nos livra de to- das as fúteis observações que se igualam ao conhecimento da época que passou há séculos. Continua, Henoch, a nos esclarecer a teu modo, para talvez produzirmos igualmente os frutos abençoados da Vida eterna.”
Nisto, Adão se levanta e diz: “Minha bênção se estende a to- dos os de coração bom e devoto. Agora procuraremos nossos filhos
em missão para transmitir-lhes o que os espera no dia de amanhã, por parte de Henoch. Que o Senhor proteja todos os nossos pas- sos. Amém.”
Todos se põem a caminho e depois de certo tempo alcançam uma gruta da qual corria uma fonte puríssima. A gruta era chama- da de “Repouso de Adão” e a fonte “O Ribeirinho das Lágrimas de Eva”, onde Adão costumava descansar. A gruta era enorme e fa- cilmente comportaria vinte mil pessoas; sua altura media mais de cem metros. De certo modo tratava-se de um túnel que, em direção ao Sul, dava passagem a um cone verde-amarelo em cujo centro se achava uma fonte que jorrava alto, pela qual a luz do Sol se quebrava em vários prismas coloridos.
Esta é a razão por que Adão apreciava este local, cuja pas- sagem era permitida somente aos primeiros filhos, pois os demais poderiam cair em idolatria por esta maravilha. Chegando ao centro, onde havia grande quantidade de blocos de cristal colorido, entre os quais havia um chamado “A Cadeira Dourada do Pai”, Adão e os acompanhantes tomaram assento. Somente Henoch ficou em pé ao lado de Adão. Prontamente é ele convidado a falar e não se fez de rogado, dizendo: “Sempre que alguém era convidado a falar eram-lhe feitas perguntas. Agora devo falar sem que tivesse sido in- quirido. Assim sendo, posso expressar o que meu olhar percebe em traços indeléveis no coração. Esses traços são vivas demonstrações do Amor eterno e da Misericórdia do Pai, portanto usarei as palavras imortais de nosso Deus, nosso Santo Pai, cheio de Amor, Graça e Misericórdia.
Essa gruta é um quadro fiel do coração humano em relação a Deus. Não conseguimos descobrir um ponto opaco sequer, com ex- ceção do solo. Olhemos para o alto, a cúpula iluminada por milha- res de prismas coloridos, como vivificam a fonte viva. Quem poderia descrever o deslumbramento que surpreende o olhar por mutações constantes, em que cada gota se parece a uma estrela cadente que, pelo seu atrevimento de querer subir ao Céu, é imediatamente ati- rada ao solo.
Se dirigirmos nosso olhar para o Sul, o caminho reflete uma luz esverdeada. Se voltarmos o olhar de onde viemos, ele irradia uma luz amarela e finalmente vermelha. Assim, nossa visão é constante- mente surpreendida por uma luz diferente. É justo agradecermos a Deus por tamanhas maravilhas, mas outra é a questão caso pergun- tarmos ao nosso coração se o Criador teria feito tudo isto apenas para nossa distração, ou se teria ocultado outros fatores que devemos procurar para a verdadeira glorificação de Seu Santíssimo Nome.
Nós mesmos representamos essa gruta na vida eterna, com um início ao Norte e um final ao Sul. Encontramo-nos no centro em nossa vida física, pelo qual entramos como filhos da Graça e Misericórdia que apenas veem o ponto central da vida, desconsi- derando que essa gruta da vida não está fechada, pois mantém para todos uma saída para o Sul.
Meus queridos, a chamazinha sublime do Amor eterno é uma simples luz, e a visão da alma representa a cúpula majestosa. A fonte é comparada ao nosso espírito que tende constantemente a subir para a luz; no entanto, é sempre retido com a seguinte admo- estação: ‘Por que almejas subir? Lá em cima não há caminho para ti; fica, ou volta à bacia dourada de teu amor humilde e obediente. Lá deves fitar-te na luz enganosa de tua alma para estares pronto a seguir a direção do ribeirinho. Somente então os raios possantes do Sol da Graça te levarão como nuvenzinhas de fogo, em perfeita liberdade de tua vida, de onde vieste.’ Peço que essa interpretação seja acrescida às anteriores.”
CONFISSÃODE ADÃO
Entusiasmado, Seth se levanta e diz: “É realmente assim como tu, caro Henoch, acabas de falar, pois percebi como minha inteligência dava verdadeiros saltos. Mas, quando essa força fútil me entregava à minha própria fraqueza em alturas limitadas, pronta- mente caía, como essas gotas, na bacia de minha nulidade inata, onde sou tragado, humilhado e finalmente arrastado pelo hábito e
a rotina reconhecendo a grande Lei que o Senhor depositou em mi- nha natureza. Como não recebi Dele asas para voar, convém perma- necer em casa e aguardar com gratidão até que a eterna Misericórdia se digne que eu, a gotinha modesta, seja recebida pelo ribeirinho que a levará para onde ilumina a Graça do Senhor, não havendo perigo de perecer. Dize-me, Henoch, se compreendi tuas palavras.”
Muito contente, este respondeu: “Entendeste perfeitamente a voz do Amor que se projetou à minha língua. Nada do que digo é meu, mas expressão do Amor eterno do Pai, pelo que devo agradecer com todas as forças do meu ser. Futuramente nada existirá em mim que não seja dedicado ao amor, louvor e gratidão ao Pai Santíssimo.
A criatura nada pode e nada faz, ainda que se veja lisonjeada pela consciência benéfica de uma vida superior dentro de si, pois convém entregar-se qual gotinha ao Senhor, que a conduzirá segun- do Seu Amor e Sua Ordem, o que será um benefício para ela.”
Concluiu em seguida Adão: “Meus filhos, o Senhor preparou nosso orador, abrindo-lhe os olhos e libertando nossos ouvidos a fim de compreendermos as grandes finalidades do Pai. Já que ouvimos a interpretação desse meu local predileto, sigamos em frente, pois a Terra comporta ainda muitos segredos para nós.”
Após boa caminhada do grupo, chegaram a um grande vale onde habitavam muitas famílias que, felizes, se deixavam abençoar por Adão e agradeciam em Meu Nome. Deste modo, também se fez o convite para o dia seguinte, sábado, quando deveriam cuidar de um sacrifício condigno. Os patriarcas, entrementes, seguiam cami- nho até que uma rochabrancalhes cortou os passos. Todos se aco- modaram na relva, rodeados pelos filhos menores que se apressavam em trazer água fresca ou frutos.
Pensativo, Adão olhava para o cimo da rocha, caindo em profunda meditação, que ninguém interrompeu, pois perceberam lágrimas em seus olhos. Finalmente, voltou o olhar para os filhos e disse: “Eis minha própria culpa! Ó Grande, Santo e Justo Deus, por que permitiste que minha culpa crescesse para tamanha montanha? Embora esteja eu ainda vivo, ela já atinge quase o Céu. Qual não
será o seu tamanho no Fim dos Tempos? Rodeado de milhares de filhos, num antessábado, aqui estou diante da rocha de minha cul- pa. Do mesmo modo, o último homem há de olhar para o cimo, abandonado de todos os seres e filhos, pagando pelos meus pecados, aguardando com ânsia que a montanha se precipite sobre ele, para exterminá-lo e enterrá-lo sob os escombros de minha grande culpa! Vede, meus filhos, lá em cima, onde ainda há fogo e fumaça, eu surgi e pequei diante da Face de Deus e da Terra.
Era perfeito e todas as criaturas me eram submissas e com- preensivas, desde o centro da Terra até aquele mundo, o mais alto e último, que jamais será atingido pelo pensamento de qualquer espírito. O que resultou de minha culpa? O que foi feito de mim na treva de meu pecado? Um miserável verme no pó, incapaz de supor- tar o mínimo de uma vida miserável.
Quem caísse da última estrela no alto até a mais longínqua da profundeza, teria feito o salto de um grilo comparado à queda de minha situação elevada até este abismo sem nome.
Desde minha existência terrena fui colocado nas alturas para a minha maior humilhação e autoconhecimento. Reconheci-me e por isto caí ainda mais; sim, até aqui, e meus pés caíram ainda mais através de Caim. Ó terrível queda! Eu, que não encontrava seme- lhante além de Deus, sou obrigado a pedir ensino e pão aos meus filhos. Assim é e assim deve ser em Nome Daquele que aprouve fazer de mim o que sou diante de todos.”
Terminando sua confissão, Adão começou a chorar, como- vendo a todos, com exceção de Henoch. Eva sentia duplamente o peso da tristeza, mas procurava ocultá-la para não o impressionar ainda mais. Eis que Seth se aproximou dele, dizendo: “Não chores pelo que te fez o Senhor. Se fosses mau genitor, como poderíamos te amar? Nunca descobrimos algo de maldoso em ti, e tudo que recebemos de ti foi e será sempre bom. Por isto, não te lastimes pela sábia conduta do Santo Pai.
Se em tempos idos te fora dado poder sobre o Universo, este poder era facultado pelo Senhor de todo Poder e Força. A Posse
do Senhor pode ser retirada segundo Sua Ordem. Assim, Ele faz somente o melhor para o nosso bem e, por Sua Misericórdia, po- demos nos chamar de Seus filhos. Desanuvia tua fronte e alegra teu coração, e permite que Henoch nos transmita algo para o proveito de nosso espírito.”
Satisfeito com as palavras de Seth, Adão pediu que Henoch aceitasse o convite de Seth, mas somente depois do afastamento dos demais, com exceção de um que tinha cabelos pretos. Não pertencia ao tronco deles, pois tinha fugido de Lamech para juntar-se como mortal aos imortais. Como de costume, Enos, Kenan e Mahalalel informaram os filhos de se apresentarem antes da aurora diante da cabana de Adão, trazendo as suas oferendas. Por ora deviam se afas- tar, pois o pai necessitava de breve repouso. A determinado sinal, poderiam se reunir de novo para acompanhar Adão até os filhos do meio-dia, de onde então poderiam voltar aos seus lares.
Isto feito, Adão se dirigiu ao forasteiro e disse: “O que te trouxe até aqui? Responde ou foge das vistas do pai dos pais da Terra. Em tuas veias corre sangue mortal e em tua fronte vê-se niti- damente o sinal de Caim. Fala!”
O estranho atirou-se diante de Adão e balbuciou alguns sons inarticulados, que ninguém entendia, com exceção de Henoch. Seth virou-se para Adão dizendo: “Teu zelo mata o filho da Terra. Retira tua justiça e pede que Henoch o vivifique para poder cumprir tuas ordens.”
Adão consentiu ao desejo de Seth e disse para Henoch: “Eis um morto das profundezas. Vivifica-o e solta sua língua para que possa expressar o desejo de seu coração.” Levantando-se, Henoch protestou: “Como é possível classificá-lo de filho morto da Terra porquanto vive, sendo apenas um pobre homem das planícies! Se um animal enfermo se apresenta diante de nossa habitação, não o enxotamos, mas damos-lhe tratamento até que se cure. Mas, quando se apresenta um pobre e perdido homem da profundeza, deixamos que se atire no pó qual verme.
Todavia, vimos que aqui chegou vivo e sabemos que toda vida e existência provêm de Deus. É preciso que lhe façamos ver
o Grande Deus das Alturas, pois Seu Amor ultrapassa os limites de nossos pensamentos mais arrojados. Como então não deveria o Amor eterno tocar os filhos das profundezas? E se o Amor aqui o atraiu, cabe-nos não o afastar, mas aceitá-lo como se tivesse nascido aqui, onde ainda existem fogo e fumaça, julgando tolamente que a pedra represente nossa culpa!
Pouca importância tem a altura de tal rocha, que é apenas rocha, assim como nós somos filhos imortais de Deus, ela perecível, nós eternamente imperecíveis. Tudo depende de nosso amor que não deve excluir qualquer ser, muito menos um pobre irmão da pro- fundeza. Somos apenas filhos do Amor e, por isto, filhos de Deus. Façamos por merecer aquilo que somos.”
ASMAEL,O FORASTEIRO
1. A pedido de Adão, Enos ergueu o forasteiro e disse: “Neste instante me veio a recordação de um sonho em que nos encontráva- mos nesta zona maravilhosa, alegrando-nos com os inúmeros filhos convidados para o sábado. Súbito, surgiu uma figura luminosa em nosso meio, a ponto de nos apavorarmos com o seu forte brilho. Não demorou a revelar-se como Abel, trazendo um homem igual a esse e dizendo para Adão: Além de mim, ninguém sofreu por parte de Caim, não contando a perda de meu corpo. Pude perdoar-lhe de coração, porque nunca tive rancor contra ele. Quando mais tarde ele fugia da perseguição de seu filho Hanoch até chegar à beira de um grande mar, onde quase pereceu de calor, fome e sede, eu me acer- quei dele com a Permissão do Pai. Suas lágrimas de arrependimento muito me tocaram e ensinei-lhe a tecer um cesto que o levou, com os seus, para um país longínquo. O mesmo fiz com vários outros descendentes dele, de melhor índole.
Nunca, porém, tive ânimo de conduzir um deles para junto de ti, Adão, pois conhecia teu rancor contra Caim. No entanto, sabia que o Pai havia dito a ele quando fugia cheio de arrependi- mento: Quem matar Caim, será punido sete vezes. Agora te entrego
um fugitivo, segundo a Vontade de Jehovah; dá-lhe o que procura e aceita-o com amor paternal. Em suas veias corre também o teu san- gue. Anima-o com tua bênção, que o Senhor há de despertar os teus filhos para poderem pregar o Nome Dele aos filhos das planícies, para salvação da Terra.
Este foi o meu sonho e agora vejo o mesmo homem entre nós e vi também o luminoso Abel deixar este local. Henoch certamente também o viu, pois ficou silencioso. Expressei o meu pedido; fazei o que vos apraz.”
Henoch confirmou a assertiva de Enos, enquanto Adão, curioso, indagava: “Onde se encontrava Abel?” — Ambos aponta- ram o mesmo lugar, onde Abel confessara sua fidelidade e seu amor perante Adão. Sumamente feliz, ele exclamou: “Aceitarei a todos, ainda que fosse o próprio Caim trazido por Abel. Trazei-me o fraco protegido de Abel para abençoá-lo e mostrar-lhe, em mim, o pri- meiro homem da Terra, não gerado, mas diretamente surgido da Mão poderosa do Amor eterno, e a mãe de todos os homens, que surgiu de mim, e, finalmente, Aquele do Qual testemunham todas as Eternidades como nós mesmos que recebemos um espírito eter- no de Deus.”
Assim, Adão abençoou por três vezes o fugitivo e perguntou-
-lhe seu nome. Ele respondeu: “Perdoa-me, pai de todos os pais da Terra, mas não tenho nome. Fui apenas escravo que nas planícies não têm nome, sendo chamados por berros e gritos. Podem enten- der a linguagem, mas não lhes é permitido falar, pois a desobediên- cia lhes acarretaria a morte mais cruel. A morte ainda é o meio mais suave de sofrimento e não ousarei relatar as crueldades praticadas pelos esbirros de Lamech.”
Apavorado com o que ouvira, Adão já se prontificava a pronunciar uma maldição sobre as planícies. Mas o homem inter- rompeu seu intento, dizendo: “Não faças isto! Eles não carecem de maldições e Lamech é suficiente para a Terra toda. É preferível que abençoes os sofredores, pois, ai deles caso aumentasses o solo trevoso daqueles pobres animais. Seu sangue clama às estrelas, pedindo vin-
gança, e se fores pronunciar alguma imprecação, as ondas sangrentas haveriam de banhar os cumes das montanhas sagradas. Pai de todos os pais, abençoa onde pretendes amaldiçoar.”
Comovido, Adão retrucou: “Pobre filho provindo do sangue de Caim, como conseguiste falar qual Kenan? Tuas palavras tradu- zem o verdadeiro sentido, como se estivesses entre nós qual cantor sagrado por Deus.” Respondeu o outro: “Muito me alegra ser lou- vado pelo pai de tão sábio professor. Foi Abel, teu filho luminoso, que me soltou a língua para que pudesse pronunciar a verdade em formas agradáveis a ti e aos teus. Deixa, pois, que o pobre fugitivo procure em vosso meio o poderoso Soberano de justiça e bondade, do Qual testemunham todas as estrelas, a Lua e o Sol. Pronuncia o teu amém, ó pai dos pais da Terra!”
Tocado de profunda emoção, Adão não conseguia proferir palavra. Finalmente disse: “Não havendo qualquer dúvida a respeito da veracidade de tua assertiva, que se faça segundo almeja o teu co- ração. À minha direita vês o jovem Henoch, abençoado orador do Senhor, que será teu futuro professor. Como ainda não tens nome, chamar-te-ei de Asmael, que quer dizer Forasteiro à procura de Deus. Aqui tudo tem que ter uma denominação, de acordo com sua con- dição e propriedade, razão porque ninguém pode ficar sem nome.
Cada nome tem que corresponder ao dono, que terá de viver fielmente dentro do seu valor, do contrário será mentiroso. Assim, terás que fazer o mesmo para não te tornares um mentiro- so perante Deus e todos os Seus filhos. Deste modo, te abençoo, chamando-te de Asmael, e te elevando para meu filho, aceito pelos demais, e Henoch será teu irmão e professor. Tu, Jared, o guiarás. Que o Senhor abra o teu coração e todos os sentidos de tua alma para Vida eterna de teu espírito em Deus. Amém.”
Asmael atirou-se aos pés de Adão, beijou-os e agradeceu de viva voz pela grande Graça recebida. Percebendo os efeitos da bên- ção, disse: “Não mereço o nome maravilhoso de Asmael; no entan- to, creio que um nome obriga a seguir a lei à medida que o conhe- cimento lhe abre o caminho. Se alguém fosse obrigado a seguir os
trâmites distantes do Sol e das estrelas como portador de um nome unificador, teria que cumprir sua obrigação, ainda que ultrapassasse o compromisso. Para quem várias vezes teve que lutar contra a mor- te, não se torna difícil seguir o caminho da Vida eterna. E quando se foi obrigado a batalhar no lodo trevoso, pelo caminho que leva à luz mais escassa, muitas vezes abafada no início por dúvidas terríveis, facilmente seguirá a trilha luminosa para a Vida. Maravilhoso nome é o de ‘Asmael’, estrela guia para as alturas eternas da Luz e da Vida. Não será em vão que o forasteiro usará tal Graça. Amém.”
A HUMILDADE
Em seguida, ergueu-se Adão, dizendo: “Henoch, chegou a tua vez de falar. Fiz o que me competia, segundo minha vontade amorosa. Mas, nosso amor nem sempre é puro, portanto o êxito de sua ação não pode ser santificado. Mostra-nos os justos caminhos de teu tutelado.”
Dirigindo-se a Mim no íntimo, Henoch disse: “É justo eu ser por vós convidado a me expressar; todavia não se justifica que venha a revelar em minha fraqueza o que todas as eternidades não conseguirão compreender. Porventura julgais que Deus considera um menos que outro, caso ambos pretendam seguir Sua Vontade?
Quem de nós afirmaria não poder enxergar os raios de luz e todas as coisas banhadas por ela? Quem não ouviria o mais leve sussurro que passasse por uma folha seca? Por acaso existiria alguém que não recebesse todos os sentidos, inclusive um coração vibrante? Qual a criança que vos procuraria para um conselho sem que fosse atendida em suas necessidades?
Se vós, criaturas caídas, sois misericordiosas com os estra- nhos, quanto mais o Pai vos suprirá com tudo que necessitais. Assim sendo, não julgueis que eu seja um órgão escolhido para receber a Voz de Deus, pois também sois capazes disto. Dirigi-vos a Ele, que recebereis aquilo que for de Sua Vontade.”
Perplexo, o grupo se calou. Passado algum tempo, todos co- meçaram a se perguntar pelo sentido das poucas palavras de He-
noch. Eis que Seth tomou a palavra, dizendo: “De que nos adianta nossa responsabilidade, porquanto sabemos perfeitamente da nossa capacidade e a medida do Amor do Pai para conosco e o que até hoje ouvimos de Sua Voz. Esta faz parte do Amor, assim como a Sabedo- ria pertence à Graça. Como poderia alguém amar o Senhor e falar por Sua Inspiração, antes de ter recebido o Amor e a Sua Palavra? Quem poderia se vangloriar disto, além de Henoch? Temos a Graça de sermos filhos de Deus e entre todas as criaturas possuímos o dom de sermos humanos, dotados dos mesmos sentidos; que cada um de nós se pergunte se, com tudo isto, temos os mesmos sentimentos.
Daí se conclui que nem todos recebem a mesma Graça, muito menos o mesmo Amor. Sabendo, de própria experiência, da inconstância do Amor, os sacrifícios exigidos para o seu fortaleci- mento, muito embora não afirme que não sejamos capazes de nos tornarmos sempre mais fortes no amor para com o Senhor, certo é que recebemos somente a Graça e, por ela, a capacidade de con- quistar definitivamente o Amor. Nunca o Amor nos será dado a um simples pedido, ainda que muito desejado. Em suma, se aprouve ao Senhor doar o amor a alguém, como fez com Henoch, isto é simples misericórdia, e Ele não necessita pedir conselho para tanto. Pode- mos querer tanto quanto quisermos; o Senhor continua o Mesmo e age segundo Sua Sabedoria insondável, pois somos apenas testemu- nhas de Suas Ações.
Tua modéstia e humildade me são conhecidas, Henoch, sen- do a razão de meu afeto. Não necessitas exagerar, demonstrando tua humildade quando se trata de um serviço que deves a Deus e a nós. Já que começaste a ser orador de Deus, não é suficiente indicar-nos o Senhor, ao Qual todas as coisas são possíveis, pois cabe a quem foi especialmente doado socorrer os menos agraciados, demonstrando que realmente somos Seus filhos.
A verdadeira humildade não deve se afastar do âmbito do amor, caso deva ser do agrado de Deus, e somos obrigados a nos so- correr reciprocamente, quando necessário. Não hesites e supre-nos com o Amor de Deus.”
Nisto se levanta Adão e diz: “O pronunciamento de Henoch foi duro, e o de Seth, suave. Se ambos falaram com justiça, nenhum deles será por mim criticado. Uma coisa é certa: Não se deve dar às crianças alimento para o qual ainda não nasceram dentes. Cabe a ti, Henoch, amolecer o alimento proporcionado, para que tenhamos o devido proveito.”
A este convite, Henoch proferiu o seguinte discurso: “As palavras de Seth foram muito justas, pois é a Vontade do Alto, e todos têm o direito do amor para socorrer o próximo em caso de necessidade.
Mas, julgai o que deveria ser feito se o pai Adão, a fim de não ser obrigado a falar numa questão dos filhos, lhes desse uma resposta curta e dura. Eles não entenderam a resposta e eu tampouco, quer dizer, somente aquilo que ele explicou sob sigilo, para que eles não caíssem em preguiça mental. Se então me obrigassem a falar mais explicitamente, qual das duas exigências seria mais importante?
Impossível não concordardes comigo se, pelo meu silêncio, mantive a ordem de Adão até sua contraordem, pois a palavra dele está acima de qualquer desejo infantil. Sabendo que quando falo não o faço por mim, mas é o Senhor Quem Se pronuncia, como é possível me fazerdes reprimendas se ontem tivestes a prova flagrante como o Senhor visivelmente conduziu minha língua fraca? Se assim é, quem merece reprimenda? Porventura poderia eu externar além da Vontade do Senhor, ou dar mais do que recebi?
Ainda que tivesse recebido em plenitude, mas a Vontade Dele me determinasse certas restrições às quais eu obedeço com te- mor e amor, julgai se não agi acertadamente considerando a Vontade do Pai acima dos desejos dos filhos, que em conjunto nada podem contra Ele e tampouco algo conseguem sem Ele.
A reprimenda contra mim é tão fútil como contra uma ár- vore que não produz outros frutos além dos que o Senhor lhe deu, sejam doces ou amargos. Quanto ao Senhor, onde estaria a criatura
que não aceitasse cada Palavra Dele, para cuja compreensão teria de estudar eternidades?
Se alguém duvidar que eu fale por inspiração do Senhor, qualquer pergunta se torna inútil pela falta de fé e a desconfiança do próprio coração. Como poderia alguém fortalecer seu amor para com o irmão, se seu coração vacila com relação ao Senhor? Confiai na Palavra do Senhor, para vos tornardes fortes no amor.
O filho não está acima do pai. Mas, se o Senhor Se dirige ao filho, este pertence a Ele, e o pai não se deveria aborrecer com a Voz do Senhor no filho. Eu, Asmael e Abel vos transmitimos a Vontade do Senhor, o que é realmente milagre para todos. Por que então per- guntais? O justo é agir pelo amor e com fé no Senhor. O que passa disto é problema Dele.”
APALAVRADEDEUSNOCORAÇÃODO HOMEM
Seth se levanta novamente, dizendo: “Que somos nós e o que podemos? Nada. Julgamos sábias nossas palestras. Mas, agora se me tornou claro que toda nossa sapiência é mera tolice perante Deus, não podendo dar-Lhe prazer. Meu discurso não nasceu de coração nobre? E agora? É simples tolice e me pareço a um homem distraído que, dentro de casa, pergunta pela sua residência.
Por que não percebemos nossa futilidade e assim nos ex- pomos perante o Senhor? Agora estamos verdadeiramente enver- gonhados. No entanto, penso que o Pai, em Sua Imensa Meigui- ce, perdoará nossa preocupação e nos aconselhará com Seu Amor. Em Sua Sabedoria nada somos e Ele nos olhará como se fôssemos crianças adormecidas, julgando que outras também nada vejam de olhos abertos.
No futuro, o Senhor inspirará os filhos para professores de seus genitores, dando a estes um coração infantil. Haverá crianças que em sua impotência farão coisas mais grandiosas do que nós com toda nossa força mental. Dize-me, Henoch, se falei certo e conforta nosso coração.”
Sorrindo, este respondeu: “Perdoai a minha aparente dureza, pois não sou eu a manobrar a língua para vosso entendimento, e sim o Senhor a manipulá-la segundo Seu Agrado. Se pronuncio coisas cujo sentido está oculto qual germe no grão, a própria Natureza nos ensina que o fruto maduro não surge ao ser deitado o grão no solo. Este tem que apodrecer para libertar a vida, podendo crescer sob tempestades, raios do sol e chuva.
O mesmo acontece com as Palavras do Senhor. Elas não fru- tificam à medida que são dadas, mas somente quando forem deita- das no solo de nosso coração e guardadas na casca conservadora e resistente. Quando esta casca for dissolvida pelo nosso amor e absor- vida no coração, romperá o germe vivo, ou seja, a compreensão viva e ativa para a luz do sol do espírito, amadurecendo sob provações, chuvas de amor do Alto e luzes da Graça do Pai Celestial, para um fruto de inestimável valor de toda Vida e Amor na Sabedoria de Deus, nosso Pai. Assim Se externa a Vontade do Senhor; portanto, assimilaremos todas as Suas Palavras segundo a Sua Vontade, pro- vando que realmente somos Seus filhos.”
COMPREENSÃODOS PATRIARCAS
Eis que Adão se dirige aos filhos perguntando se entenderam o discurso de Henoch. Retruca Seth: “Como poderíamos entendê-
-lo, se apenas a semente foi deitada no solo? Recebemos o grão com a casca, dotado de vida. Mas a deterioração da matéria ainda não se deu para libertar a vida. Confio na ajuda do Senhor, transformando nosso coração em novo paraíso.”
Adão dirige-se então a Enos, que responde: “Meu pai, vi cer- ta vez um montão de pedras brutas, de cor uniforme. Não demorou a cair uma chuva benéfica do Céu sobre as pedras que anteriormente tinham sido fortemente aquecidas pelo Sol, de sorte que cada gota era imediatamente absorvida. Começaram a exalar um forte vapor, a ponto que não mais conseguia vê-las. Neste instante, um vento mais impetuoso afastou os vapores das pedras, que se apresentaram
inteiramente diferentes. A cor, antes uniforme, se transformou em multicor, a água as fez transparentes e algumas se desmancharam numa massa branca. Assim consegui ver suas formas variadas.
Deste modo, penso ver diante de mim e dentro de mim tal montão de pedras que, pelos raios da Graça do Alto, foram bas- tante aquecidas, havendo pouca diferença entre elas. Tenho certeza de que quando aparecer a chuva, acompanhada de tempestades, o efeito será idêntico àquelas que vi, semelhando-se as transparentes à compreensão total, e as deterioradas à decomposição da qual surgirá nova vida do solo de meu coração, assim como da massa informe brotou uma erva vicejante.”
Quando Kenan é inquirido, ele responde: “Há pouco tempo percebi, num dia muito quente, que zonas distantes começavam a se desvanecer, não surtindo efeito o maior esforço visual. Finalmente desapareceram e a luz do Sol não conseguia impedir a aproximação daquela ocorrência. As montanhas vizinhas eram pouco a pouco tra- gadas por aquele fenômeno apavorante e comecei a sentir receio por nossa Terra, levando-me a correr para dentro de minha cabana.
Durante a noite caiu um temporal. Raios e trovões se reve- zavam em sua fúria, e uma tremenda chuva caía do Céu, espatifan- do-se nos picos para em seguida cair com estrondo furioso nos vales e dirigindo-se para o mar. Todos nós tremíamos e nosso temor de Deus foi profundo.
Orei. A tempestade passou e a manhã surgiu. Saí da cabana e olhei admirado e grato em redor. Foi a manhã mais linda de minha vida e eu vislumbrava as coisas mais distantes. Por isto, creio con- victamente que após essa noite tempestiva de meu coração venha a surgir uma aurora serena pelo amor a Deus, nosso Santo Pai.”
Quando a pergunta foi feita a Mahalalel a respeito de seu entendimento com relação ao discurso de Henoch, este respondeu: “Há tempos tentei olhar para o sol, o mais que pudesse, para talvez descobrir algo como na Lua. Não levou tempo para perceber o meu desatino, pois quando não mais consegui fitá-lo e desviei o olhar para outro lado, notei que meus olhos nada viam. Perdi-me de tal
modo que só podia sentir o solo e a mim, sem ver algo. Assim pas- sou-se o dia e mal notei que a noite começava a deitar suas sombras sobre a Terra.
Meus filhos me conduziram para casa, onde orei para que o Pai me devolvesse a luz dos olhos que perdera pela minha grande tolice. Adormeci e a noite proporcionou-me bastante orvalho em minhas pálpebras e uma brisa suave refrescava o fogo nos olhos. No dia seguinte apareceu, graças a Deus, uma manhã suave e fresca; minha visão fora fortalecida, não para satisfazer qualquer tolice, mas para apreciar os campos floridos e considerar as inúmeras formas surgidas da própria decomposição. Por isto, acredito que se minha visão espiritual está ofuscada pela grande Luz da Graça divina, uma serenidade noturna e o orvalho do amor, secundados por uma brisa fortificante do Santo Pai, farão brotar, na grande Aurora do espíri- to, uma vida maravilhosa da decomposição de meus pensamentos e sentimentos endurecidos.”
Em seguida, Jared se pronunciou da seguinte forma: “Que devo dizer? Henoch surgiu de mim, como o Sol parece nascer por detrás das montanhas. Mas, não demora a subir acima da Terra que se banha nos seus raios possantes, e toda a vida é despertada para uma alegre atividade e desenvolvimento maravilhoso, da decompo- sição da noite. Deste modo, creio firmemente: Henoch foi elevado como Sol, a uma altura incalculável e toda a minha natureza é por ele ofuscada. Mas, esta luz deve agir como a luz solar e minha ig- norância terá que se transformar em bênção. Se a Luz da Vida age e atrai o germe vivo que se encontra dentro da decomposição, for- mando-o e dirigindo-o maravilhosamente, eu, em minha serenidade humilde, serei recompensado pelo Senhor. Que Ele dê a cada um o que Lhe apraz. Amém.”
Disse em seguida Adão: “Como todos já se pronunciaram, vejamos como Asmael assimilou as palavras de Henoch. Peço que te manifestes.” Então Asmael, inspirado por Mim, disse: “As Palavras do Pai Amantíssimo foram muito difíceis de compreender na pro- fundeza das raízes da Vida. Eu, verme sem valor, deveria demons- trar-vos de que forma o Infinito se junta ao finito, a morte à vida, a noite à Luz, a Terra ao Sol, o tempo à Eternidade, e a criatura a Deus.
Se eu fosse capaz disso, a Terra não seria iluminada tão par- camente com um sol apenas, pois de cada palavra, de cada som, haveriam de nascer exércitos de sóis a rodear o planeta. Creio que o poder de tais palavras e sua compreensão final estejam acima da função de um escravo recentemente arrancado da morte que preten- desse desvendar o maior milagre.
Por muitas vezes notei ações inteligentes praticadas por irra- cionais, a ponto que os homens não seriam capazes de reproduzi-las mesmo com o maior esforço. Mas as palavras que definissem seus produtos, este milagre meus ouvidos jamais perceberam. Então pen- sei: a ação mais sábia não seria capaz de revelar a Vida à existência. Vi aranhas morrerem em meio de suas teias arrojadas, e até mesmo nos grandes palácios das cidades das profundezas a morte celebra- va sua tenebrosa colheita. As próprias criaturas demonstravam, sem palavras de Vida, tanto quanto uma pedra o faria com outra pedra.
Mas, as palavras surgidas da Vida nos demonstram a própria Vida. Porventura a Vida Original poderia se encontrar em algum lugar senão na Palavra? Na Palavra existe Vida. A Palavra é Vida, e Deus é a Palavra e a Vida. A Vida só se encontra na Palavra, e a Pa- lavra se deve ter criado em Deus e encontrado a Vida da qual tudo surgiu e se formou.
Se agora ouço de Henoch a poderosa Ação da Palavra e per- cebo que tudo se transforma dentro de mim, deixo de perguntar pela vida. Já a encontrei na Palavra, e quem não se satisfizer com este testemunho da Vida, dificilmente encontrará outro.”
Todos, com exceção de Henoch, muito se admiraram com as palavras de Asmael. Percebendo sua perplexidade, Henoch pronun- ciou o seguinte discurso: “Perdoai-me de eu tomar a palavra sem ser convidado, mas torna-se necessário maior esclarecimento. O que eu agora pronunciar serão Palavras da Vida, do Alto cheio de Luz e da profundeza cheia de Vida. Nas Alturas, Deus é a Luz de toda Luz, e em Sua Profundeza ela é Vida de toda Vida.
Se dirigirmos o olhar para o Alto e para a Terra, em sentido natural, notaremos em cima tudo cheio de Luz e na Terra tudo em intensa movimentação. Múltiplas existências jazem nos grãos ocul- tos no solo e inúmeras sementes do mundo animal se encontram em seus ninhos aquecidos, nas vísceras dos irracionais, aguardan- do o calor e seu nascimento para a luz. Antes que os sulcos, os ni- nhos e as vísceras sejam totalmente aquecidos, não surgirá vida nos germens que se libertasse de sua prisão para se erguer nos espaços cheios de luz.
Porventura não vemos no verão e no inverno a mesma luz a iluminar a Terra? No entanto, não é o mesmo calor a aquecer os sul- cos terrestres. Se fosse a luz a trazer o calor, este deveria ser constante sob os mesmos raios do Sol. O inverno nos ensina que assim não é.
Pergunto: O que vem a ser o calor, se ele não depende da luz e esta, portanto, não é portadora do calor? O calor é a própria Vida oculta, mesmo na profundeza e não se pode libertar. Mas, se a luz tiver iluminado bastante nas profundezas da Terra, ela desperta o calor que rompe seus invólucros congelados. Em seguida se une à luz formando um ser que estende suas raízes no seio original da Vida. Lá procura sua nutrição, enquanto liberta sobre o solo a parte homogênea à luz a fim de conservar desperta sua luz. Tanto na flora quanto na fauna dá-se o mesmo; tudo é atraído pela luz e impelido pelo calor. Isto, porém, é apenas um fenômeno natural, e a mani- festação em formas variadas vale somente para o ser, como portador de vida superior.
Se seres homogêneos se atraem, enquanto heterogêneos se re- pelem, deduzimos não serem impelidos e atraídos pelo mesmo calor e a mesma luz, pois existem luz e calor roubados, pelos quais todo joio e todos os vermes e insetos são impelidos e atraídos. Todavia, isto é percebido por um ser mais elevado e livre. Mas, como?
Ouvi-me. Se a forma de todas as coisas em sua multiplicida- de é a expressão do calor natural em ligação com a luz, e se diferencia somente pela capacidade de aceitação de mais ou menos luz ou ca- lor, também a linguagem humana é uma forma do calor espiritual, ou seja o amor divino no coração e a luz do espírito, ou seja a Graça divina no homem.
Como poderíamos pronunciar palavras conexas, caso não nos fossem dadas como formas eternas do espírito? Quem nos en- sinou a classificar todas as coisas? Somente Deus, por ser Ele o re- sumo eterno de todas as formas, a Vida e a Luz, o Amor e a Própria Sabedoria, a eterna e indissolúvel união de Ambos, sendo a Forma Original de todas as formas e o Ser Primário de todos os seres, ou o Próprio Verbo!
Se alguém tiver encontrado, aceito e assimilado a palavra ex- terna, não o fez com um objeto, mas encontrou uma vida espiritual, porquanto cada palavra é uma forma, surgida de calor e luz espirituais. Se assim é, por que nos admirarmos do pronunciamento de Asmael?
Não somos, em tais questões, semelhantes aos peixes que, dentro da água não a veem, e nós, rodeados de ar, não o vemos? Tudo tem sua razão de ser. Possuímos a Vida indissolúvel na própria palavra. Mas, esta vida se assemelha à oculta dentro do grão. Se diri- girmos nosso coração para o mundo, encontramo-nos no inverno, e a curta luz da Graça não consegue libertar dentro de nós o calor es- piritual. Se voltarmos nosso coração constantemente para o Senhor, a incessante Luz da Graça nos libertará em breve e conseguiremos nos elevar como formas vivas ou palavras vivificadoras para o eterno despertar na Luz do Senhor.
Quem isto não fizer, é assaltante e ladrão e se transformará em joio, uma espécie qualquer de verme e para a terrível forma pri-
mitiva da vida idêntica à dos que habitam nas profundezas. Quem possui a Palavra tem a Vida eterna, e a Vida será segundo sua pala- vra. Eis a interpretação das palavras de Asmael.”
ADÃOFAZUMRETROSPECTODESUA VIDA
Após ter tomado um pouco de leite e mel, Adão se dirigiu a seus filhos, dizendo: “Foi aqui que eu tudo perdi por minha própria culpa, e mil vezes mais o Senhor permitiu que encontrasse neste ponto. Ó Paraíso, belíssimo jardim no qual eu brilhava qual Sol nascente amparado pela Mão do Senhor, e era mais poderoso do que o impulso de todos os mundos e me tornei um habitante pre- sunçoso e fraco.
Deu-se a minha queda e tu, Paraíso, doce ilusão, não conse- guiste amparar-me. Minha ruína te pressionou e teu solo macio foi imprensado qual folha de algodão arrancada do tronco para ser pisa- da pelos nossos pés. Em virtude de minha fuga, cresceste para uma altura fútil de tua fraqueza e não sentes mais o passo do poderoso. Mas, também nada há de louvável em ti, senão a simples recordação de ter sido o meu débil apoio.
O Senhor, percebendo em Sua Misericórdia que teu solo era por demais frágil para o meu peso colocou pedras sob meus pés para evitarem uma futura queda. Solo abençoado, no qual agora repou- sam os pés que me ampararam e carregaram há quase novecentos anos, o que não te fora possível fazer durante trinta anos. Foi ele a causa humilhante de eu ter sido um habitante mais firme, pois consegui erigir-te dentro de mim através da grande Graça do Alto e estou certo que jamais hás de tombar. Ainda que assim fosse, não ha- verias de me curvar, mas eu mesmo poderei erguer-te para que con- tinues um constante habitante daquele cujos cabelos têm mais valor para o Senhor que toda a Terra, que fora tua portadora vacilante.
Meus filhos, cheguei aqui com profunda tristeza, pois tinha que lastimar a minha perda anteriormente lastimada mil vezes. Fora, porém, o último suspiro e a última lágrima a umedecer a rocha. A
partir de agora não te pisarei mais, pois meus pés hão de palmi- lhar em seu próprio solo, onde o fruto da Vida eterna chegou a amadurecer.
Se algum de vós ainda alimentar qualquer dúvida, volte a falar a respeito, à tardinha. Desejo abençoar os filhos e dizer-lhes que amanhã devem-se encontrar no local habitual do sacrifício.” Isto feito, Adão disse para Henoch: “Que o Senhor esteja contigo e com todos os presentes, inclusive com Asmael. Que Ele guie e prepare os nossos corações para receberem Sua Misericórdia e Graça e po- dermos glorificar o Seu Nome e vivificar nossa alma, despertando o nosso espírito ainda adormecido. A caminho para o Sul, todos devem se manter silenciosos e cuidar de seus passos.”
ASMAELEO TIGRE
Caminhando calmamente, os patriarcas Me louvavam em seus corações, pois havia muita coisa a lhes causar admiração, visto que a Natureza se tornara transparente em virtude de Minhas Pa- lavras. Depois de percorrida metade do trajeto, Asmael parou su- bitamente tremendo em todo o corpo. Convidado por Henoch a explicar o motivo daquilo, pois estavam palmilhando os Caminhos do Senhor, Asmael disse: “Olha naquela direção, onde um tigre pos- sante se dirige para nós e certamente tentará me estraçalhar. Este vi- gia das alturas santificadas não pode ser contido em sua fúria sangui- nária. Sua fidelidade cruel não pode ser comparada com qualquer outra manifestação. Afastai-vos todos e deixai que eu seja sacrificado para que vossa vida se salve. Correi depressa!”
Virando-se para Henoch, Adão disse: “Conduze para cá o vi- gia tenebroso para que Asmael se ponha em contato com o Poder de Deus no homem, razão porque fora destinado soberano da natureza, obedecendo-lhe todas as criaturas.” Incontinenti, Henoch se dirigiu para o tigre que se atirou a seus pés, tremendo. Com voz firme, Henoch lhe disse: “Levanta-te, vai para junto de Asmael e curva tua cerviz diante de teu soberano. Deves carregá-lo com cuidado para
perto de mim e de Adão, em direção ao Sul, onde descansarás. Em seguida para Oeste, com outro descanso. E assim farás para o Norte e finalmente até a moradia de Adão, onde descansarás definitiva- mente, recebendo teu prêmio e final destino.”
O tigre levantou-se e se dirigiu com Henoch para Asmael, fa- zendo o que lhe tinha sido ordenado. Perplexo, Asmael recordou-se de um sonho que sua mãe lhe havia contado. Fora ela muito devota e teve que pagar sua devoção, junto com o marido, com a morte, por se ter negado a adorar Lamech como Deus. Antes de morrer, um esbirro daquele rei dela abusou criminosamente. Como o marido também se recusasse àquela ação indigna, suas vísceras lhe foram arrancadas a ferro. Oportunamente será revelado onde Lamech con- seguia tais instrumentos criminosos.
Entrementes, Asmael