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O GRANDE EVANGELHO DE JOÃO
Volume VI
O GRANDE EVANGELHO DE JOÃO — 11 volumes
Recebido pela Voz Interna por Jacob Lorber
Traduzido por Yolanda Linau
Revisado por Paulo G. Juergensen
Direitos de tradução reservados
CopyrightbyYolanda Linau
UNIÃO NEOTEOSÓFICA
Edição 2020
ÍNDICE
O SENHOR DÁ TESTEMUNHO DE SI E DE SUA MISSÃO (EV. JOÃO 5, 14–27) .19
O SENHOR FALA DO TESTEMUNHO DE SUAS OBRAS (EV. JOÃO 5, 28–39) 20
A ESTRELA NOVA COM A NOVA JERUSALÉM. CONDIÇÕES PARA A VIDA ETERNA 40
OPINIÕES DO POVO QUANTO AO DISCURSO DO SENHOR (EV. JOÃO 6, 59–64) 106
JEJUM E PENITÊNCIA. A PARÁBOLA DO FARISEU E DO PUBLICANO (EV. LUCAS 18, 9–14) 118
A REENCARNAÇÃO. A TERRA, UMA ESCOLA PARA OS FILHOS DE DEUS 144
A DESCRENÇA COMO PROVA DE MATURIDADE PARA UMA NOVA REVELAÇÃO. COMPARAÇÃO ENTRE AS CRIATURAS DA ÉPOCA DE NOÉ
DE DEUS NO CORAÇÃO DA CRIATURA (EV. JOÃO 7, 1) 181
VISITA AO HOSPEDEIRO EM CANÁ. CURA DE UMA CRIANÇA. UM EVANGELHO PARA MÃES 183
BASE PARA O APERFEIÇOAMENTO ESPIRITUAL. A ENTIDADE DE DEUS 197
O NEGOCIANTE CRISTÃO. IMPOSTOS E ESCRAVATURA. OS SACERDOTES PAGÃOS 204
QUEIXA DO COMANDANTE A RESPEITO DA LUTA ENTRE IRRACIONAIS 285
DESENVOLVIMENTO INDIVIDUAL DOS FILHOS DE DEUS 286
REFEIÇÃO MILAGROSA EM CASA DO GENERAL. NATUREZA E AÇÃO DO AMOR 297
PROFISSÃO E HONRA. TUDO É GRAÇA, SOMENTE A BOA VONTADE É MERITÓRIA 309
O SENHOR OS SEGUE SECRETAMENTE (EV. JOÃO 7, 2–13) 317
O SENHOR PREDIZ O JULGAMENTO SOBRE O POVO JUDAICO. A INSTABILIDADE DA MATÉRIA 339
CONSEQUÊNCIA DO ECLIPSE. RENASCIMENTO E DONS ESPIRITUAIS 350
AS EXPERIÊNCIAS DOS DISCÍPULOS DURANTE A FESTA EM JERUSALÉM 351
OS SETE CÃES DE LÁZARO. OS MUNDOS CÓSMICOS COMO ESCOLAS ESPIRITUAIS 353
VALE. A FÉ SEM OBRAS NÃO TEM VALOR 358
O ABORRECIMENTO E SEUS EFEITOS PREJUDICIAIS 360
MILAGRES E SEUS EFEITOS DIVERSOS 388
VISÃO DO MUNDO ANGELICAL. DIFERENÇA ENTRE ANJOS E CRIATURAS .408
LIVRE ARBÍTRIO E MISSÃO ESPIRITUAL DAS CRIATURAS DA TERRA 437
IGNORÂNCIA DO FARISEU QUANTO AO CONHECIMENTO DO SOL E DO DILÚVIO 454
NÃO O SABER, MAS A AÇÃO CARIDOSA TRAZ A FELICIDADE. A JUSTA ABASTANÇA 488
TRÊS PARÁBOLAS QUANTO À MISERICÓRDIA DE DEUS. O SEGREDO DO AMOR 516
GRANDEZA ESPIRITUAL DO HOMEM 526
S
eria ilógico admitirmos que a Bíblia fosse a cristalização de todas as Revelações. Só os que se apegam à letra e desconhecem as Suas Promessas alimentam tal compreensão. Não é Ele
sempre o Mesmo? “E a Palavra do Senhor veio a mim”, dizia o profeta. Hoje, o Senhor diz: “Quem quiser falar Comigo, que venha a Mim, e Eu lhe darei, no seu coração, a resposta.”
Qual traço luminoso, projeta-se o conhecimento da Voz Interna, e a revelação mais importante foi transmitida no idioma alemão durante os anos de 1840 a 1864 a um homem simples chamado Jacob Lorber. A Obra Principal, a coroação de todas as demais, é “O Grande Evangelho de João” em 11 volumes. São narrativas profundas de todas as Palavras de Jesus, os segredos de Sua Pessoa e sua Doutrina de Amor e de Fé! A Criação surge diante dos nossos olhos como um acontecimento relevante e metas de Evolução. Perguntas com relação à vida são esclarecidas neste Verbo Divino, de maneira clara e compreensível. Ao lado da Bíblia o mundo jamais conheceu Obra Semelhante, sendo na Alemanhaconsiderada“Obra Cultural”.
ObrasdaNova Revelação
O Grande Evangelho de João – 11 volumes A Criação de Deus – 3 volumes
A Infância de Jesus
O Menino Jesus no Templo
O Decálogo (Os Dez Mandamentos de Deus) Bispo Martim
Roberto Blum – 2 volumes A Terra e a Lua
A Mosca
Sexta-Feira da Paixão e A Caminho de Emaús Os Sete Sacramentos e Prédicas de Advertência Correspondência entre Jesus e Abgarus Explicações de Textos da Escritura Sagrada Palavras do Verbo
(incluindo: A Redenção e Epístola de Paulo à Comunidade em Laodiceia)
Mensagens do Pai
As Sete Palavras de Jesus na Cruz (incluindo: O Ressurrecto e Judas Iscariotes) Prédicas do Senhor
Cenas Admiráveis da Vida de Jesus – 2 volumes
CURADEUMENFERMONOLAGOBETHESDA(EV.JOÃO5, 1–13)
Naquele dia caminhei com Meus discípulos até aos arrabal- des de Jerusalém, pernoitando em uma hospedaria conhecida. Satis- feito com nossa chegada, o hospedeiro manda preparar uma boa ceia e relata vários acontecimentos chocantes naquela cidade.
Então lhe digo: “Vai amanhã ao Templo e verás Minha Ati- tude para com os fariseus, que saberão, sem restrições, com Quem estarão lidando!” Ele se alegra com tal perspectiva e nos serve mais pão e vinho. Não obstante ter ouvido muitos comentários de Minha Pessoa, ignorava Minha Verdadeira Identidade, motivo por que os discípulos o orientam. Em seguida nos recolhemos.
Na manhã de sábado subimos a Jerusalém, situada numa en- costa rochosa, assim como o próprio Templo com seus vastos átrios, os muros cerrados e terraços. Subentende-se sermos acompanhados pelo hospedeiro.
Nas proximidades do Templo passamos pelo Lago Bethesda (Vedes da — transmite o despertar ou cura), ao lado do estábulo de carneiros, que possuía cinco dependências. Nesses recintos sempre havia grande número de enfermos, como sejam: cegos, coxos, entre- vados etc., esperando que a água se movimentasse, pois de acordo com um velho mito da época de Melchisedek, e segundo a crença firme, mormente dos pobres, um anjo vez por outra descia do Céu para movimentá-la. Ninguém havia visto o anjo; mas supunha-se sua presença pela movimentação estranha do Lago.
Os próprios fariseus eruditos não acreditavam no fenôme- no do Lago, considerando-o dotado apenas de faculdade curadora,
sendo esta também a opinião de romanos e gregos; no entanto, os templários sabiam manter o povo nessa antiga crença, em benefício do Templo. Tão logo a água se movia — o que se dava uma a duas vezes por semana — transmitia um poder de cura tão formidável, a ponto de curar quem tivesse a sorte de ser o primeiro a nela entrar, não obstante sua enfermidade. É natural terem os ricos e abastados o privilégio, enquanto os pobres, impossibilitados de pagar, espe- ravam anos afora até que um guarda mais bondoso os mergulhasse primeiro, e eles saravam no mesmo momento.
O hospedeiro critica acerbamente tal organização, classi- ficando-a de injusta e imoral. Aponta-Me em seguida um velho, coitado, à espera da cura desde trinta e oito anos, sem que um dos guardas tivesse a ideia de facultar-lhe esse privilégio. Tão alterado fiquei que disse ao hospedeiro: “Embora seja sábado, deve ele ser so- corrido!” Em seguida dirijo-Me ao doente e digo: “Queres curar-te?”
Com tristeza ele diz: “Bom senhor, não tenho quem me faça entrar na água quando ela se mexe; ao me aproximar, um ou- tro, mais considerado, toma a dianteira. Como poderia curar-me deste modo?”
Eis que lhe digo: “Então levanta-te, apanha o teu leito e vai de onde vieste!” No mesmo instante ele recupera a saúde, toma da esteira e, de acordo com o hábito, se aproxima dum sacerdote para apresentar-se como curado; sua cura causa espanto, porque a água nunca se movimentara num sábado. Os judeus não teriam se expres- sado; mas o fato de ele carregar a sua esteira num feriado é pronta- mente criticado!
Ele, porém, diz: “Aquele que me curou mandou que eu o fizesse e caminhasse! Possuindo tamanho poder e me tendo feito tão grande benefício, também lhe obedeço. Durante trinta e oito anos ninguém me fez um favor tão grande quanto ele!”
Perguntam os templários: “Quem te disse tal coisa?” Igno- rando o Meu Nome, não pôde responder, e tampouco apontar-Me, porque Me afastei rapidamente do local, em virtude da aglomera- ção do povo.
2.OSENHORDÁTESTEMUNHODESIEDESUAMISSÃO(EV.JOÃO5, 14–27)
Decorrida uma hora, fui com os apóstolos ao Templo, após termos palestrado a respeito de Minha Doutrinação com a família de Lázaro de Bethânia, que conhecia desde Meus doze anos e costu- mava visitar anualmente durante as peregrinações a Jerusalém.
Todos nos acompanham e quando penetramos no átrio, en- contramos o curado, que forçando a passagem, se aproxima para louvar-Me e agradecer-Me!
Eu, então, lhe digo: “Como adquiriste a saúde, trata de não pecares no futuro, para não te suceder coisa pior!”
Ele o promete e descobre o Meu Nome, porque muitos Me conhecem de épocas passadas. Assim informado, ele procura os ju- deus enraizados e lhes conta ter sido Eu, Jesus, quem o curou. En- raivecidos, por Eu ter feito isto num sábado tão importante, eles se viram para Mim, a fim de Me prender e matar! Percebendo o mo- mento de perigo, o hospedeiro Me aconselha a fugir quanto antes desses judeus odiosos.
Eu o acalmo, dizendo: “Nada receies, pois não Me poderão atacar, se Eu não o quiser! Dir-lhes-ei indubitavelmente Quem sou e poderás ver seu verdadeiro ódio, que ninguém precisa temer!”
Enquanto assim falo a sós com o hospedeiro, os outros Me perguntam bruscamente: “Por que fizeste tal coisa num feriado tão importante, ultrajando-o diante do povo? Não podias ter esperado até amanhã?”
Fitando-os com rigor, digo simplesmente: “Até então o Meu Pai no Céu agiu, e Eu também o faço!”
Ainda mais irritados, os judeus procuram cercar-Me nesse momento, gritando em altos brados: “Não basta ter vilipendiado o sábado, ele também ultraja Deus, porquanto O chama de Pai, igualando-se a Ele! Manietai-o para que seja imediatamente es- trangulado!” O tumulto no Templo é enorme e muitos tentam agredir-Me.
Levantando Minha Voz, ordeno silêncio e Me dirijo aos ju- deus enraivecidos: “Em verdade vos digo: Eu, como Filho, nada pos- so fazer — a não ser aquilo que vejo ser feito pelo Pai! Faço, pois, o mesmo que Ele! O Pai ama o Seu Filho e Lhe demonstra tudo que faz e ainda apontará obras mais importantes, provocando grande ad- miração entre vós! Assim como o Pai desperta os mortos, dando-lhes vida, também o Filho ressuscita a quem quer. Cegos, vos digo: o Pai no Céu não julga, pois entregou o julgamento a Mim, Seu Filho, a fim de que todas as criaturas, judeus e pagãos, honrem o Filho como veneram o Pai. Quem, entretanto, não honra o Filho deixa de honrar o Pai, que O enviou!” Enquanto assim falo, o silêncio é completo, pois Eu queria que os judeus calassem.
Por isso prossigo: “Realmente, quem ouve o Meu Verbo e crê convictamente Naquele que Me enviou a esta Terra já possui a Vida Eterna e sua alma jamais cairá em julgamento, ou seja, na morte da matéria, pois passou da morte à vida, em virtude de sua fé viva e vigorosa!
E digo mais: virá a hora e já chegou, onde os mortos de cor- po e alma ouvirão a Voz do Filho de Deus, e quem Lhe der crédito receberá a Vida Eterna! Pois assim como o Pai possui a Própria Vida, Ele faculta ao Filho a mesma Posse. Além disto, legou-Lhe o Poder de fazer o julgamento sobre todos os homens, e isto porque o Eterno Filho de Deus é nesta época também Filho do homem!”
3.OSENHORFALADOTESTEMUNHODESUASOBRAS(EV.JOÃO5, 28–39)
Alguns arregalam os olhos de estupefação, enquanto outros opinam ser ultraje jamais visto o que acabo de dizer. Ainda outros afirmam ser certamente Verdade, pois homem algum havia dito coi- sas semelhantes.
Eu, porém, lhes digo: “Hora virá em que todos, até mesmo os que estão nos túmulos (refiro-Me aos pagãos, mas os judeus não compreenderam), ouvirão a Minha Voz; os que fizeram o bem sur-
girão à verdadeira ressurreição da vida, mas os que praticarem o mal despertarão à ressurreição do julgamento, ou seja, a morte verdadei- ra da alma!”
Então alguns começam a resmungar, dizendo: “Este homem se excede e começa a delirar, pois fala como se ele e Deus fossem idênticos! Quem teria ouvido coisa tal?!”
Eu, porém, lhes digo: “Enganai-vos com este critério de Mi- nha Pessoa, pois como simples homem nada consigo fazer. Ouço, entretanto, constantemente a Voz do Pai em Mim e ajo, falo e julgo de acordo; deste modo, Meu Julgamento é certo, porque cumpro não Minha Vontade humana, e sim a do Pai que Me enviou a este mundo. Se como homem fosse testemunhar de Mim, tal testemu- nho seria falso; existe um Outro, que desconheceis e jamais conhe- cestes, que atesta Minha Pessoa através das Ações conhecidas por todos, razão pela qual sei positivamente ser Seu Testemunho verda- deiro, que Me deu desde sempre.
Enviastes mensageiros para João Baptista, certificando-vos atestar ele a Verdade. Como vedes, não aceito testemunho dos ho- mens: pois atesto de Mim Mesmo através do Pai, e isto, para que vos torneis realmente felizes. Por que não vos agrada?”
Alguns respondem: “Se João, a julgar por tuas palavras, pro- vou a Verdade, seu testemunho era suficiente; para que fim nos ser- viria teu testemunho especial?! Pois de acordo com as palavras dele, já conseguimos a bem-aventurança.”
Digo Eu: “Não resta dúvida ter sido João uma luz flamejante e iluminadora, no entanto apenas o procurastes para vossa distração. Eu, porém, tenho uma prova mais poderosa a Meu favor do que ele; pois as Obras que o Pai permitiu fossem unicamente por Mim efe- tuadas diante de todos provam evidentemente ter o Pai Me enviado como Seu Filho.
Este Mesmo Pai, que Me enviou junto de vós, de há muito testemunhou de Mim pela boca dos profetas, não obstante nenhum de vós ter ouvido Sua Voz e visto Sua Pessoa. Bem que ouvistes o Seu Verbo pelas Escrituras dos profetas; não o tendes, porém, dentro
de vós, porque não credes Naquele que vos foi enviado. Pesquisai na Escritura, que a julgar pela vossa opinião, contém vossa vida eterna, e justamente ela prova de Mim, centenas e milhares de vezes!
Que tendes contra Mim? Acaso não é justo Eu ter vindo sem pompa externa para não vos deixar receosos e apavorados?! Acaso Elias viu Jehovah passar na tempestade ou no fogo, quando recebeu em espírito a profecia de Minha Vinda Espiritual, ou quando se achava oculto na gruta? Não, Jehovah passou num sussurro delica- do! Por que não credes?
Minhas Ações praticadas diante de milhares não dão prova autêntica? Teria alguém no mundo feito coisa semelhante?”
4.TEIMOSIADOSTEMPLÁRIOS(EV.JOÃO5, 40–47)
Dizem alguns judeus: “Tuas Ações são realmente extraordi- nárias, mas te falta a personalidade para tanto; além disto, os essê- nios fazem o mesmo, muito embora sejam nossos inimigos, insinu- ando aos judeus que o Messias surgiria de seu meio.”
Digo Eu: “Conheço-vos bem! Não é de hoje que sabeis da maneira pela qual os essênios produzem seus milagres, o que vos levou à reação, demonstrando ao povo a mistificação, com bom efei- to. Sois tão entendidos em tais artes e truques como eles, e a consi- deração à Minha Pessoa não é das piores em vosso meio. Não é, pois, este o motivo que vos impede Me conhecerdes em verdade — mas, falando simplesmente, não quereis receber de Mim a vida eterna.
Não aceito honra dos homens, em virtude duma conside- ração externa e elevada, porque não Me podem, jamais, dar uma mais sublime que Aquela que habita em Mim! Conheço-vos dum lado bem diferente! O amor de Deus de há muito não mais existe em vós por causa de vosso orgulho, do amor-próprio e da tendência mundana — motivo por que não Me aceitais!”
Respondem alguns judeus: “Proferiste palavras finas e inteli- gentes, mas que não provam seres o Messias Prometido! Na melhor das hipóteses poderás ser um profeta em Nome Dele, embora conste
não surgir algum da Galileia; pois de um Messias Verdadeiro não tens vestígios! Temos razão?”
Digo Eu: “De modo algum! Vou esclarecer-vos a verdadeira situação! Não sou um profeta em Nome do Messias, mas Pessoal- mente Ele Mesmo, em Nome de Meu Pai, com Quem estou plena- mente Uno, sendo Minhas Ações e Obras o Testemunho verídico
entretanto, não Me aceitais! Se vier um outro com grande pompa e em seu próprio nome egoísta, será por vós aceito sem escrúpulos. Como seria possível acreditardes em Mim, estando habituados a aceitar honra recíproca e a consideração de todo mundo, sem terdes jamais procurado a honra modesta de Deus?!”
Respondem os judeus: “Muito bem — dizes abertamente ser Deus teu pai! Se praticamos injustiça por não te darmos crédito, faze queixa junto Dele e veremos o que sucede!”
Digo Eu: “Não espereis Eu vos denunciar perante o Meu Pai! Um outro o fará, isto é, Moysés, cuja vinda com Elias constitui vossa esperança! Ele já veio, sendo tampouco reconhecido por vós como Eu. (Nota: o espírito de Moysés estava em Zacharias e o de Elias, em João).
Se tivésseis crido em Moysés também daríeis crédito em Mim; pois ele testemunhou de Mim. Tendo jamais acreditado em suas profecias, como poderíeis crer em Minhas Palavras?!”
Retrucam eles: “Que te dá direito de afirmares tal coisa, quando ocupamos seu assento?”
Digo Eu: “É preciso que o homem saiba primeiro para de- pois crer. Afirmo que vos tornastes sacerdotes por causa do dinheiro, e desde a infância não achastes necessário fazer a leitura dos Livros de Moysés. Também para quê? Sempre passastes bem sem tal es- forço! Sabeis quem sempre foram Moysés e os profetas para vós? Vossa barriga!”
Os sacerdotes expressam perplexidade e um deles diz: “Aca- so não nos é feita semanalmente a leitura da Escritura, em determi- nada hora? Possuímos somente cinco exemplares e o original que, como Santuário, ninguém pode tocar, sob risco de morte, a não
ser o sumo sacerdote. Como podes alegar não sabermos o que os profetas escreveram?! Pessoalmente não podemos fazer a leitura, mas ouvimo-la quando é feita!”
Digo Eu: “Sim, externamente, caso não adormeçais em vir- tude de vossas barrigas cheias; nunca ouvistes com o coração, por- que está disperso pelo mundo por causa dos desejos. Os Manda- mentos são apenas respeitados pela aparência, por andardes de vestes religiosas; vós mesmos não os considerais! Digo-vos isto porque vos conheço melhor que qualquer um.”
Nesta altura muitos entre o povo começam a resmungar e criticar os templários, que se veem obrigados a se retirar a seus apo- sentos. Deixei o Templo com os Meus discípulos e o hospedeiro, e a convite de Lázaro fomos a Bethânia, vilarejo distante de Jerusalém sete quartos de hora, no cálculo atual. É claro sermos lá otimamente recebidos.
5.OSFARISEUSEM BETHÂNIA
Desta vez não Me é possível demorar-Me, porque sempre vêm de Jerusalém muitos judeus conceituados e entre eles alguns que não Me acreditam. Por isto aceito a hospitalidade apenas por três dias, sem doutrinar e dar provas por causa dos descrentes. Quando Me abordam para formular perguntas, Eu apenas lhes digo: “Aqui não é o local apropriado e além disto não há tempo! Já disse a todos no Templo o que necessitais saber — e é quanto basta!”
Em seguida viro-lhes as costas e saio para o terreiro, com Lázaro e o hospedeiro, onde palestramos muito a respeito dos de- satinos e das atitudes dos templários para com o povo. O hospedei- ro, já crente, não para de Me elogiar por Eu ter dito as verdades a esses mistificadores! Igualmente Lázaro se alegra, pois de há muito sabe Quem Sou.
Enquanto passeamos ao ar livre, aproxima-se João, Meu amado, e diz: “Senhor, que faremos? Os judeus que há pouco tra- taste com indiferença, virando-lhes as costas, estão deveras irritados
e pensam em vingar-se, dizendo: Esperai, que expulsaremos o vos- so Messias orgulhoso! — Procuramos apaziguá-los, mas a situação tornou-se pior e eles ameaçam pedir reforço de Jerusalém!”
Digo Eu: “Vai dizer-lhes que Meu Tempo, que vos predisse tantas vezes na Galileia, ainda não chegou; podem, portanto, cha- mar a guarda e nessa ocasião conhecer ainda mais o Poder e a Honra do Filho de Deus! Transmite-lhes isto!”
Cheio de alegria João repete verbalmente o Meu recado aos judeus orgulhosos e atrevidos, que entretanto se incendeiam de raiva, gritando: “Veremos até onde vai o poder desse nazareno!” Em segui- da, uns vinte correm porta afora para buscar a guarda de Jerusalém.
Não quis, todavia, que tal coisa sucedesse à amável família de Lázaro; por isto, deixo que percorram apenas cem passos distantes da casa, onde se veem subitamente paralisados. Fazem tudo para sair do ponto em que estão, o que lhes é inteiramente impossível, porque é contra Minha Vontade! Eis que começam a gritar e pedir socorro. Percebendo isto, aqueles que no Templo já haviam aderido a Mim aproximam-se deles e perguntam por que aí estão parados, gritando daquele modo.
Rangendo os dentes, os paralisados bradam: “Não podemos nos mexer, pois nossas pernas estão duras como aço! Qual seria o mau espírito que nos fez isto? Ajudai-nos nesta aflição horrorosa!”
Ponderam os outros: “Caluniastes de vilipendiador e ultra- jador de Deus aquele que hoje, no sábado, curou um enfermo — o que não merece! Acaso não vos tornastes mil vezes piores ultra- jadores por terdes chamado pessoalmente a guarda para prender um inocente, provocando má fama à família honrada de Lázaro?! Como cidadãos, e não sacerdotes de Jerusalém, afirmamos: o cas- tigo de Deus vos atingiu de modo visível! Agora acreditamos con- victamente ser o galileu bondoso Aquele que disse de si! Só Ele vos poderá socorrer como Filho Daquele que vos castigou, e ninguém mais no mundo!
Dirigi-vos a Ele e convertei-vos para o Bem e a Verdade, do contrário ficareis paralisados aqui até o Dia do Juízo Final, como a
mulher de Lot!” Essa sugestão não deixa de produzir efeito, pois eles gritam: “Trazei-o aqui e faremos o que exigir!” Os cidadãos voltam à casa de Lázaro, onde Me contam rapidamente o fato ocorrido.
Digo-lhes, então: “Aqueles que por Minha Causa quiseram buscar a guarda da cidade devem por algum tempo fazer papel de guardas para perderem futuramente a vontade de ceder deste modo ao orgulho! Tomaremos ainda uma refeição antes do pôr-do-sol, e depois veremos o que poderá ser feito com os atingidos por Deus. O homem também deve comer num sábado quando tiver fome e não só depois do crepúsculo; que teria o Sol a ver com o feriado, e o tolo sábado dos judeus com o Sol?! Seria este astro melhor e mais honrado num sábado, quando todos os dias são do Senhor?! Vamos à mesa para passarmos bem!”
Lázaro e suas irmãs estão cheios de contentamento, man- dando servir um bom jantar, do qual compartilhamos com alegria. Só depois de terminarmos, algumas horas após, digo a Lázaro: “Ir- mão, vamos aos condenados para ver o que se consegue com eles! Realmente, na menor teimosia ficarão lá até a aurora, a fim de reco- nhecerem que o Filho de Deus não necessita aceitar testemunho e honra humanos!” De pronto nos levantamos e saímos.
6.ACONFISSÃODOS FARISEUS
Quando Me veem chegando, começam a gritar: “Senhor, acode-nos nessa aflição estranha, que acreditaremos em teu nome e tua missão divina! Pecamos contra Deus, quando pretendíamos pôr mãos em Seu Abençoado! Livra-nos deste mal, Senhor!”
Digo Eu: “Vossas palavras soam bem, mas não estão de acor- do com o vosso coração!”
Perguntam eles: “Qual é então a linguagem de nosso coração?”
Respondo Eu: “Se confessardes dentro da verdade, sereis so- corridos, e isto imediatamente após a confissão plena; se negardes, tereis que esperar até amanhã!”
Diz um dentre eles: “Como podemos saber dos pensamentos de cada um?”
Replico Eu: “Nesse ponto não existe divergência entre vós! Falai, se quiserdes!”
Um deles, então, diz: “Sabes, senhor, ser a pessoa muitas ve- zes obrigada a falar de modo diferente do que pensa. Pode ela se expressar de qualquer maneira — e os pensamentos ficam ocultos; mas se consegues ler o que pensamos, nada mais nos resta senão manifestar-nos de acordo.
Perdoar-nos-ás o critério de tua pessoa, porquanto te julgá- vamos um formidável feiticeiro, rogando contra ti as piores pragas, pois observamos há dez anos atrás um hindu que até mesmo chum- bava animais ao solo. Com as muitas experiências feitas é realmente difícil discernir-se um milagre verdadeiro de um fictício, por isto deves compreender a razão de não te considerarmos aquele que re- presentaste no Templo.
Além disto consta nas Escrituras dever a criatura acreditar apenas em Um só Deus, não considerando outros tantos deuses a Seu Lado. Tu te apresentaste como o Próprio Deus, dizendo aber- tamente seres Seu Filho, com o Mesmo Poder que Ele, assistindo-te ainda o direito de julgamento. Quem poderia acreditar em tal coisa sabendo que és da Galileia, onde existem mais pagãos do que ju- deus?! Não conseguimos crer, não obstante a prova que facultaste num sábado comemorativo, fato que lançou maior dúvida à tua su- posta divindade. Agora fez-se-nos a luz, que aumentará quando nos libertares dessa prisão — o que te pedimos com sinceridade!”
Eis que digo: “Sede, pois, libertos!” No mesmo instante rea- dquirem os movimentos e Me agradecem. Eu, então, prossigo: “Sois livres, porém aviso-vos a todos: ninguém deve deixar transparecer uma palavra sequer daquilo que sucedeu aqui! Pois, às vezes, faço milagres que todos podem assistir; em outras ocasiões, somente per- mitidos a poucas pessoas e convém não serem relatados em comum. O motivo importante dessa medida é apenas de Meu Conhecimen-
to. Além disto, não voltareis hoje a Jerusalém, porque tenho vários assuntos a tratar convosco.
Está diante de vós, em Pessoa Singela, Aquele que outrora transmitiu Suas Leis a Moysés no Monte Sinai, sob raios e trovões, e cujo Espírito pairava sobre as águas, antes de Adam. O futuro demonstrará se sereis capazes do crê-lo integralmente! Voltemos a casa para que vós, ainda em jejum, possais tomar alimento!” Todos se calam, sem coragem de trocar palavra.
Ao lá chegarmos, Pedro Me diz: “Senhor, nunca nos disseste isto e somos Teus discípulos permanentes!”
Respondo: “Muitas vezes fi-lo até de modo palpável, mas vossa memória até hoje foi sempre muito curta, e ainda o será por certo tempo! Agora ocupai-vos com outra coisa; tenho a tratar cer- tos problemas com os judeus!” Os discípulos se contentam e saem de casa. A refeição para os vinte templários já se acha arrumada na mesa, sem que se atrevam tocá-la, porque o Sol ainda é visível.
Por isto lhes digo: “Ouvi-Me! Quem é mais: o Sol, o sá- bado ou Eu, que em Espírito sou Senhor de ambos e o fui desde Eternidades?”
Respondem eles: “Se fores realmente o que afirmas, és evi- dentemente mais do que o Sol e o sábado!”
Prossigo: “Sentai-vos e comei! Em épocas atrás constava: ‘Ninguém pode ver Deus e continuar vivo; pois Deus é um fogo destruidor!’ Agora podeis vê-Lo, comer e beber — e além disso re- ceber a vida eterna!”
Alegam eles: “Seria muito bom, se não existisse a Lei de Moysés!”
Afirmo-lhes então: “Onde estou Eu, também se acham Moysés e todos os profetas; fazei, pois, o que é da Vontade do Senhor!” Eis que tomam lugares à mesa e se alimentam antes do pôr-do-sol. Em seguida levo-os a uma pequena colina atrás da casa de Lázaro, onde prosseguimos a palestra.
Ao chegarmos todos à colina, apresentando um belo planalto provido de muitos bancos, assentamo-nos em número de cinquenta e cinco. É lua cheia. Muito embora todos se tivessem acomodado, alguns judeus começam a discutir quanto à ordem dos assentos. Lázaro faz então a seguinte observação: “Meus amigos, depois da- quilo que assistimos, a primazia compete somente a Um, que pre- cisamente escolheu o pior lugar! Como admitirmos nossa pretensão se, como criaturas mortais, nada somos perante Ele?”
Tais palavras do anfitrião respeitado por todos terminam a fútil discussão. Após se estabelecerem calma e ordem, digo: “Antes de mais nada vos ordeno manterdes silêncio sobre tudo que ireis ver e ouvir, a fim de que ninguém seja obrigado, por uma questão de consciência, a crer em Mim e Minha Missão, a não ser unicamente pela Boa Nova destinada a tal fim e as provas escolhidas pela Minha Sabedoria.
Toda coação moral já é um julgamento; pois aquilo que o ho- mem não aceitar e fizer de livre e espontânea vontade, de convicção e conhecimento próprios — não lhe faculta a vida, mas o julgamen- to. Se tiver que se compenetrar da vida verdadeira e espiritual, não poderá ser induzido por outro meio que pelo próprio livre arbítrio.
Nem lei, nem prêmio ou castigo deverão determiná-lo para tanto — mas unicamente sua fé livre, sua convicção interna, o co- nhecimento puro; em seguida, a obediência externa e sua vontade independente, surgidas do puro amor a Deus, e ao Bem e à Verdade.
Afirmo-vos a Verdade mais luminosa: teria sido tão fácil, ou aliás, mais fácil ainda, Eu descer à Terra em Forma Humana, Colossal, acompanhado de inúmeras falanges de anjos e sob fogo, raio, trovão e tempestade, transmitindo-vos, com voz trovejante que destruiria montanhas, o Novo Verbo da Graça — e não haveria umdentre vós que admitisse a menor dúvida. Pois o susto e o pavor fortíssimo o teriam algemado de tal modo, impossibilitando-o ao pensamento mais tolhido. Teria isto adiantado na sua emancipação
interna e real? Em absoluto, e sim seria um julgamento para todas as almas humanas e um aprisionamento de sua índole, a ponto de torná-las duras quais pedras!
Por isto vim nesta Simplicidade e de modo imperceptível, a este mundo, como Me fiz anunciar pela boca dos profetas, para im- pedir que fosse o coração humano algemado, podendo, unicamente pelo poder abençoado da Verdade de Minhas Palavras, o Ensina- mento, reconhecer-Me com Amor e organizar sua vida de modo independente!
Meus Milagres devem apenas positivar ser Eu realmente Aquele Que represento. Por isto advirto-vos mais uma vez nada re- latardes daquilo que se passa nesta noite, para não tolherdes a alma de quem quer que seja! Vós mesmos também não deveis fazê-lo, mas deixar-vos guiar apenas pelo Meu Verbo e Sua Verdade.
Se contestardes abertamente Meus Sinais, submetendo-vos livremente à Verdade de Minhas Palavras, tereis ganho a vida eterna e sua plena liberdade; deixando-vos convencer somente pelas provas, sem considerardes a Verdade que profiro — estareis aprisionados ao julgamento, criaturas maquinais, sem vida interior e verdadeiramen- te espiritual, portanto mortas como pedras.
Predigo-vos isto como Senhor e Mestre Único de todo ser e vida, a fim de agirdes dentro desta compreensão. Aceitai-a, que vi- vereis!” Minhas Palavras abalam a todos e muitos começam a temer os acontecimentos.
Eis que lhes digo: “Meus filhinhos, se começardes desde já a ter medo, não poderei realizar muita coisa diante de vós!”
Diz Lázaro: “Ó Senhor, nem eu nem Teus apóstolos temos medo; mas quem o tiver não levará prejuízo!”
Digo Eu: “Muito bem, prestai atenção!”
8.MOYSÉSEELIASAPARECEMÀCHAMADADO SENHOR
Em seguida dirijo-Me aos judeus e digo: “Não quereis dar crédito de terem vindo Moysés e Elias antes de Minha Chegada; por isto deverão se apresentar e vos dizer quem realmente sois!” No mesmo instante os dois profetas se apresentam, curvando-se com respeito diante de Mim. E Elias diz em alta voz: “Diante de Ti e de Teu Nome têm de se curvar todos os joelhos e corações no Céu, sobre e dentro da Terra!”
A seguir, Moysés se vira para os judeus: “Vilipendiadores do Templo de Salomão, filhos da serpente! Qual o demônio que vos gerou, autorizando-vos a afirmardes ser Abraham vosso pai, por isto vos arrogais o direito de meu assento e de Aaron?! Se tivestes tal ou- sadia, a fim de transmitir aos povos as Leis dadas por Deus a mim
como então não vos é possível reconhecerdes o Supremo, que mas deu no Monte Sinai?!
Alegais ser necessário eu e Elias antecedermos o Senhor — e vede, já aqui estivemos! Quem de vós nos reconheceu e acreditou? Não nos fizestes o mesmo que aplicastes a quase todos os profetas do Senhor? Que vem a ser isto? Vós vos curvando diante de meu nome, entretanto me perseguindo e finalmente me assassinando entre o Altar e o Santíssimo? Respondei-me!”
Diz um com voz trêmula: “Ó grande profeta, aquele que foi amordaçado chamava-se Zacharias!”
Retruca Moysés: “Velho malvado, foste testemunha daquilo que eu disse na reunião sacerdotal, no momento em que voltava do Santíssimo! Foram as seguintes palavras: Ouvi, irmãos! Deus, o Senhor, tocou minha alma, de acordo com Sua Grande Graça e Misericórdia, assim que o espírito de Moysés se apossou de mim. De agora em diante é minha alma e o espírito de Moysés um só in- divíduo, que ora está frente a vós, do mesmo modo como se achava diante do faraó e no Sinai, diante de Deus! Fui o primeiro a organi- zar este assento, ocupando-o a Mando de Deus, e agora sou o último a tomar posse dele, pois no futuro somente o Senhor, que aceitou
neste mundo a carne dos homens, dele fará o que for determinado por Sua Vontade! — Estas minhas profecias tanto vos irritaram, que me jogastes da cadeira, enforcando-me em seguida. Não foi assim?”
Diz um outro judeu, também velho: “Sim — realmente, mas quem podia crer tamanha coisa?”
Opõe Moysés: “Por que a acreditaram alguns devotos que por isto foram por vós enxotados entre pagãos, em países longín- quos, dentre os quais ainda existem alguns com vida, podendo tes- temunhar contra vós?”
Diz outro ancião: “É possível — todavia deveriam ter tido uma visão como prova; nós, nada disto vimos!” Contesta o profeta: “Estás mentindo! Pois tal fato foi demonstrado por sete vezes a to- dos, incluindo o mais ínfimo varredor do Templo, em sonhos níti- dos, sendo por vós interpretados na época de minha mudez. Como podes alegar não terdes tido prova?”
Responde o mesmo judeu: “Ah — então o sonho foi uma visão? Imagina — quem poderia supô-lo?”
Prossegue Moysés: “Raposas ladinas, bem sabíeis de muitos exemplos da Escritura a interpretação de sonhos claros! Haja vista o de Jacob, os sonhos de José, do Faraó e muitos outros que vos explicavam a significação das sete visões; mas vossa tendência para o mundo, o orgulho sacerdotal, a volúpia para o bem-estar, para o ócio pestilento e o adultério de toda espécie vos cegaram e perturba- ram. Por isto temestes perder os prazeres da vida em virtude de mi- nhas profecias, ao invés de vos submeter à Vontade de Deus, fazendo até o momento tudo que vos possa classificar de amotinadores do Senhor. Vermes do pó, agrada-vos esta história verídica?!
Vede, o Supremo e Magno, cuja Face eu, Moysés, jamais teria mérito de olhar, vos disse no Templo: Não Eu, e sim Moysés, a quem esperais, condenar-vos-á junto ao Pai! — Ainda não se pas- sou um dia que isto falou, e Sua Advertência se cumpre; pois eu, Moysés, principal profeta em Nome do Senhor, vos acuso diante de Sua Face Santa de tudo aquilo que praticastes de modo horrendo! Qual será vossa justificativa?!”
Deste modo admoestados, os judeus, tomados de pavor, só conseguem balbuciar desconexamente. Apenas um, mais moço, diz estarrecido: “Meu Deus e Senhor, será o início do Dia do Ju- ízo Final?”
Diz Moysés: “Tenho em mãos minha acusação constante; Ira e Vingança estão com o Senhor! Vosso dia final chegou bem próximo; tudo, porém, depende da Vontade do Supremo. Dizei-me, como interpretais isto?”
Diz um velho judeu, batendo com o queixo de pavor: “Ó grande profeta, dize-nos se iremos ao inferno, irredutivelmente per- didos, e se porventura cada um tem seu próprio dia final!”
Responde Moysés: “No que diz respeito ao inferno, não ne- cessitais perguntar no atual sistema de vida que levais, por ser ele vosso prêmio; toda vossa maneira de pensar e agir foi de forma tal, que vivestes no inferno, fazendo o que lhe serve. Não podeis, por- tanto, lá ingressar por já vos encontrardes nele.
Quanto ao dia final, tereis após a morte um dia recente no Além; contudo, podeis ainda em vida encontrar saída do in- ferno, caso o queirais. Pois aqui está o Grande Guia e Salvador. Ouvi-Lhe e obedecei! Falei diante de Ti, Senhor, podendo Elias to- mar da palavra.”
9.ACUSAÇÃODE ELIAS
Digo Eu: “Elias, predecessor e aplainador de Meus Cami- nhos! Que tens a expor contra esses servos do Templo?”
Responde Elias: “Senhor, Moysés disse tudo! Com ele o Tem- plo deixou de ser uma Casa de Deus, pois tornou-se um antro de as- sassinos e ladrões. Demonstrei-lhes isto minuciosamente no Jordão, provando-lhes até mesmo minha afirmativa. Quando notaram não ter algo de sustentável a contrapor, sendo por isto denunciados de modo incisivo diante do povo, mormente nas acusações feitas contra Tua Pessoa — riram abertamente, declarando-me um tolo beato, a quem se poderia ouvir por algumas horas como simples distração;
todavia, ameaçaram o povo secretamente a não tomar minha dou- trina por algo mais que delírio ridículo.
Despercebidamente se encheram de raiva pelo fato da mul- tidão me considerar e honrar como profeta, fazendo penitência e se deixando batizar. Esses vilipendiadores malvados do Santíssimo de Deus em breve perceberam que por mim o machado tinha sido dei- tado em suas raízes, trazendo-lhes o término de seu domínio vergo- nhoso. Por isto rodearam a Herodes, provando-lhe com falsas provas e tramas inauditas ser seu reino ameaçado por mim. O Tetrarca não podia compreendê-lo por ter firmado contratos sólidos com Roma, sempre respeitados por ele, podendo em qualquer emergência con- tar com a proteção incondicional do Império. Tudo isto de nada adiantou, pois tanto instigaram Herodes, até que este me prendeu.
Embora preso, meus adeptos tinham livre acesso ao meu cárcere e os fariseus não mais podiam importunar seu chefe; nota- ram, porém, que minha doutrina progredia impetuosamente. Isto aumentou sua revolta de hora em hora, e se meteram a intrigar com a perversa genitora de Salomé, a ponto que, na hipótese do Tetrar- ca lhe dar a palavra de honra no consentimento de uma graça, ela apenas deveria exigir minha cabeça. Em compensação, a mãe iria receber secretamente dez mil libras de ouro do tesouro templário. A bela moça achou tal exigência por demais forte, sabendo que Hero- des me estimava; mas um mau espírito apossou-se da genitora, e lhe revelou não estar eu de acordo com sua ligação ilícita com ela, pre- tendendo influir sobre o Tetrarca. Isto causou por parte de Salomé grande revolta, a ponto de — levada novamente pela perversidade materna — exigir o prêmio infame; se bem que entristecido, Hero- des teve que cumprir sua palavra, e eu fui decapitado na prisão.
Cientes do ocorrido, os templários exultaram de alegria, co- meçando a perseguir o povo, que acreditava em mim. Eis, Senhor, a simples ocorrência de sua corrupção, sem contar as minúcias por Ti conhecidas! Acuso-os diante de Ti! És, entretanto, o Senhor desde Eternidades! Julga-os dentro de Teu Poder, Sabedoria e Justiça Infi- nitas! Tua Santa Vontade se faça!”
Digo em seguida: “Foi tal qual falaste; existem algumas cir- cunstâncias por Mim mencionadas em outra ocasião e repetidas por testemunhas oculares! Em síntese, aponta a maldade infernal dessa casta! Agora vos pergunto, Meus fiéis profetas e ora anjos celestes
podeis perdoar aos vilipendiadores do Meu Santuário o crime horrendo que vos aplicaram?”
Respondem ambos: “Sim, Senhor; pois és a Reconciliação de todos. Queira iluminá-los de acordo com Tua Imensa Misericórdia para compreenderem sua grande perversão!” A um aceno Meu am- bos desaparecem, deixando-nos sós.
10.AUTOACUSAÇÃODOS TEMPLÁRIOS
Passa-se certo tempo sem que alguém se atreva a dizer pala- vra; pois a aparição dos dois profetas havia comovido a todos, mor- mente os judeus, que se sentem abalados. Apenas o hospedeiro a Meu lado diz em surdina: “Senhor, este fato demonstra mais que tudo seres, em verdade, Aquele Que representaste no Templo! É evidente ter chegado o Tempo dos tempos com todas as Graças, in- cluindo, porém, o julgamento dos Céus. Se tivesse eu algum mérito para compartilhar um pouco das Graças!”
Digo Eu: “Não só um pouco, mas sim podes usufruir da maior parte! Depende somente de tua vontade caminhares com ale- gria e prazer pela Minha Doutrina, que em breve conhecerás. Vamos perguntar aos judeus a impressão causada pelos profetas!” Em segui- da Me viro para os ouvintes sacerdotes pedindo que se expressem.
Um deles se levanta e diz: “Estamos plenamente convictos não ter sido fraude o que vimos; pois aparições fictícias, que tive ocasião de apreciar em Damasco, não falavam e ignoravam datas recentes e passadas. Por este motivo esta nos impressionou horrivel- mente, porque vimos com nitidez não podermos aguardar perdão dos grandes pecados cometidos contra Deus.
É realmente difícil a vida no mundo! A pessoa é exposta a toda sorte de tentações do mundo e do diabo, dois inimigos da vida,
dos quais se percebe apenas o menos prejudicial; o segundo, que atrai o homem à matéria não é visível, tornando-se difícil alguém se defender.
Confessamos termo-nos tornado grandes pecadores; não compreendemos como chegamos a tal ponto, e podemos apenas di- zer: Senhor, se ainda tiveres Misericórdia, apiada-Te de nós e não nos condenes! Se tivéssemos naquela ocasião a compreensão de hoje, não teríamos agido de tal modo com Zacharias e João! Éramos cega- dos pelo mundo e o diabo, agindo dentro de nossa cegueira e vonta- de diabólicas. Assim como Moysés e Elias nos acusaram diante de Ti com Justiça, fazemos o mesmo contra o demônio, o maior inimigo da Humanidade, pedindo que o chames ao Teu Trono Justiceiro!”
Digo Eu: “Aquilo que em vós faz parte do diabo, de há muito foi-lhe creditado; afirmo-vos, porém, haver no Templo muitos a su- perarem o príncipe das trevas, tal sua atitude com o próximo.
Além disto não cabe tanta responsabilidade às tentações do demônio, conforme pensais em vossa crendice tola! O Diabo, pro- priamente, é o homem com suas tendências mundanas! Daí surgem: amor-próprio — eis um demônio —, a inclinação ao conforto — outro diabo —, orgulho, vaidade, domínio, ira, vingança, inveja, cobiça, altivez, impudicícia e menosprezo ao próximo, tudo isto, demônios criados na base do indivíduo. Não deveis, por isto, ter tanto medo do diabo, tampouco acusá-lo; acusai a vós mesmos, conscientemente, e arrependei-vos, tomando a firme resolução de vos tornardes outras criaturas, começando a vossa regeneração!
Amai a Deus acima de tudo e ao próximo como a vós mes- mos, para que sejais remidos de vossos pecados, grandes e múltiplos! Enquanto a criatura não deixar o pecado, ele não lhe será perdoado; pois é obra do homem surgida de sua carne e da vontade de sua alma.
As boas ações, dentro do Verbo e da Vontade de Deus, são uma Graça do Alto, ainda mesmo a criatura as fazendo de livre von- tade — um mérito do Espírito Divino no coração humano, dado ao homem pela Graça de Deus. Agora conheceis vossa situação; sois livres, podendo fazer o que vos aprouver!”
11.BONSPROPÓSITOSDOSSACERDOTES CONVERTIDOS
Diz o judeu: “Ó Senhor, nunca mais nos abandones, que estaremos todos abrigados! Se bem que o Templo conte cerca de setecentos sacerdotes semelhantes a nós, são eles ainda mais per- niciosos e poderão cuidar deles mesmos, como o fizeram até hoje! Nós, entretanto, apanharemos amanhã nossos trastes e distribuire- mos o supérfluo entre os pobres. Em seguida, mudaremos de vesti- menta para seguir-Te, ainda mesmo Tu nos enxotando com raios e trovões! Uma vez integrados em Tua Vontade provaremos, embora anciãos, ser bem possível envergar-se árvores envelhecidas. Vimos nitidamente não haver vida e salvação, a não ser Contigo; por isto, ninguém mais nos deterá!
Senhor, no começo não éramos maus, pois procurávamos apenas a Verdade Original dentro do Templo! Mas qual não foi nossa descoberta entre suas paredes? Segredos e mais segredos! Caso per- guntássemos a alguém a respeito, diziam-nos: Precisais apenas de fé! Acreditai naquilo que vos é dito, ainda que vos pareça absurdo e con- traditório! Somente o Sumo Sacerdote possui a chave de todos os se- gredos divinos! É ele quem faz os sacrifícios para vós e o povo! — Tais palavras eram bem sedutoras, mas foram fortemente abaladas pelo homicídio de Zacharias; pois ficou provado não terem base real nem em Moysés, nem nos profetas, tampouco nas Escrituras. Pois se assim fosse, nossos chefes não poderiam agir de modo tão inescrupuloso!
Essa decepção fez com que déssemos vazão às nossas paixões, tornando-nos piores que uma legião de demônios. Eles ainda res- peitam o Nome do Altíssimo, enquanto nós não o fizemos, aumen- tando nossa maldade. Mestre cheio de Amor, Sabedoria e Justiça, tendo sido levados pelo mau exemplo dos superiores ao estado pre- sente, esperamos a remissão das nossas culpas, por termos o firme propósito de viver dentro de Tuas Leis, mesmo que isto nos custe a própria vida!”
Digo Eu: “Pois bem; ser-vos-á tudo perdoado — mas so- mente com o tempo e que nenhum de vós volte a pecar! Preten-
dendo seguir-Me em verdade, sede precavidos no Templo para não denunciardes vossas intenções! Meu Tempo ainda não chegou, quando permitirei às raposas ladinas Me perseguirem, em virtude dos pecados do mundo, pois é preciso encher sua medida. Agora atenção ao acontecimento que se aproxima, para que o aceiteis de corações abertos.”
12.TEMPESTADE NOTURNA
Nesse momento se ergue forte ventania e no Oeste surgem nuvens pesadas, de aspecto incandescente. Tal aparição causa admi- ração a todos, por ser fato raro nesta zona. Já se percebe quantidade de raios cruzando as nuvens em todas as direções, e o forte fragor dos trovões. O receio se transmite a todos e Lázaro diz: “Senhor, vê que temporal! Parece dirigir-se para nós! Não será recomendável entrarmos?”
Digo Eu: “Calma, Lázaro; o temporal não viria sem Minha Vontade e ainda saberás o porquê!” Ele se acalma; os judeus, po- rém, desanimam com a aproximação da tempestade e perguntam secretamente aos discípulos se o desencadear dos elementos não Me alteraria.
Eles respondem: “Ele é também Senhor dos elementos; por isto não necessitamos nos preocupar em Sua Presença.” A maioria dos judeus se aquieta; enquanto que os vinte sacerdotes se enchem de medo, pois um raio é seguido por outro, com grande estrondo. Aproximam-se de Mim, dizendo: “Senhor, a Quem todas as coisas são possíveis, ordena a este temporal, senão sucumbiremos todos! Já passamos por três tempestades idênticas, que também à noite pro- vocaram a morte de homens e animais. Choviam raios e trovões, e quem fosse atingido morria instantaneamente. Sobreviveram apenas os que se refugiaram nas casas. Especialmente forte foi a grande tem- pestade ocorrida em Damasco, há vinte anos. Morreram todos que não estavam abrigados. O mesmo poderá suceder aqui, por isto será
melhor entrarmos. Pois a ventania é tão forte que mal nos aguenta- mos de pé!”
Digo Eu: “Deixai isto, pois também ireis conhecer o Poder e a Força de Deus nesta tempestade!” Nem bem acabo de proferir tais palavras, ela se acha acima de nós, estendida para todos os lados, projetando milhares de raios a cada instante. Vários raios caem com forte estrondo na colina. Eis que os judeus começam a gritar: “Ó Senhor, socorre-nos, do contrário pereceremos!”
Respondo Eu: “Acaso algum já foi atingido pelos raios!? Nin- guém corre perigo a Meu lado! Conhecei, pois, o Poder do Pai no Filho; esta tempestade é um julgamento e está sob Meu Poder! Fiz com que surgisse e posso fazê-la desaparecer quando e como qui- ser. Para vós, vinte sacerdotes, é o símbolo de vossas almas; tal foi seu aspecto há três horas atrás, e ainda pior do que se apresenta lá em cima.
Acreditai ser coisa mais fácil para Mim mandar que se acalme inclusive o tufão, do que influir em vossos corações, cheios de pai- xões maldosas! Foram precisas muitas palavras e grandes provas para dominar a tempestade de vossa alma. Para essa tempestade simples, mas forte, basta uma palavra, para que desapareça!
Assim como surgiu Minha Graça após a expulsão de vos- sa tempestade maldosa, apresentar-se-á no Firmamento o mesmo símbolo, tão logo desapareça o desencadear desses elementos. Vede, já se desprenderam inúmeros raios das nuvens negras, de grande extensão, todavia não traduzem o número de vossos pecados! Daí podereis concluir qual vossa índole. Teria que deixar permanecer a tempestade por uma hora, para completar o acervo de vossas faltas! Não tendo isto utilidade para o vosso íntimo, farei com que sere- ne esta tempestade ameaçadora! Ordeno-te, pois, elemento do mal, que te desfaças em nada! Amém!” Instantaneamente tudo silencia, as nuvens se desfazem, as estrelas irradiam sua anterior beleza e ma- jestade, e precisamente acima de nós vê-se uma, enorme e desconhe- cida de todos.
13.AESTRELANOVA COMANOVA JERUSALÉM.CONDIÇÕESPARAAVIDA ETERNA
Indaga Lázaro: “Senhor, eis uma estrela nova, jamais vista! Qual sua origem?” Respondo: “Silêncio, que todos vós ireis conhe- cê-la!” Em seguida abro, por alguns momentos, a visão de todos e a estrela se apresenta qual mundo cheio de luz; em seu centro está a Nova Jerusalém munida de doze torres, e as muralhas no quadrado se compõem de número de pedras preciosas idênticas aos portais da cidade. Por todos eles entravam e saíam anjos, bem como se viam Moysés, Elias e os demais profetas. Admirados sobremaneira, os ju- deus começam a louvar-Me por lhes ter concedido a Graça desta visão. Faço-os voltarem ao estado normal e eles apenas veem a estre- la luminosa, que pouco a pouco diminuindo, perde-se no Espaço. Nem bem termina esta cena, e quase todos Me indagam o que teria sido aquilo.
Digo Eu: “Vistes a Minha Nova Doutrina, trazida dos Céus! É ela a Verdadeira e Nova Jerusalém Celeste, porquanto a antiga de nada mais vale. As doze torres representam as doze tribos de Israel; as doze qualidades de pedras preciosas das muralhas apontam as dez Leis de Moysés, sendo que as primeiras fileiras, em diamante e rubi, apontam as duas Leis de Amor, a Deus e ao próximo. Os anjos a passarem pelas torres significam as inúmeras verdades que serão re- veladas aos homens pelo fiel cumprimento da Minha Doutrina. Os que saem da cidade traduzem a grande Sabedoria da Boa Nova, e os que entram demonstram a maneira pela qual devem as criaturas deixar penetrar o Meu Verbo de puro Amor em seus corações e agir de acordo, para deste modo alcançarem o verdadeiro renascimento em espírito, conduzindo-as a toda sabedoria e verdade.
Eis a significação da visão obtida, de certo modo um verda- deiro Sol de Graças para todos que ouvirem o Meu Verbo; será ele a morada de todos que creem em Mim, ajudando ao Meu lado a cuidarem e guiarem tudo que foi criado no Espaço eterno.
Por ora não o podeis compreender; se permanecerdes na fé em Mim e vivendo dentro de Meus Ensinamentos, sereis batizados pelo Espírito Santo à medida de vossa maturação na fé e no amor. Enviá-Lo-ei a todos que acreditarem em Mim e Naquele Que Me enviou a este mundo, como Filho do homem! Pois a Vida Eterna e Real consiste na vossa aceitação do Filho Verdadeiro do Pai Celeste, praticando Sua Doutrina.
Quando vier o Espírito Santo de que vos falei há pouco, pe- netrando-vos inteiramente, sereis capazes de compreender tudo que ora assistis, sem assimilá-lo dentro de vossa capacidade natural. A carne não pode conceber o espírito, pois não possui vida a não ser em uma manifestação passageira, surgida da força vital da alma, afim com o espírito; pode se tornar semelhante a ele pela união, tão logo se afaste inteiramente do mundo, dirigindo seus sentidos apenas à introspecção espiritual, dentro da ordem e do exemplo demonstra- dos em Minha Doutrina e pela Minha Própria Vida. Por isto deve cada um de vós tratar de salvar sua alma pelo próprio esforço; pois se no Além cair em julgamento, acaso poderia salvar-se sem recursos, quando em vida, com tantos meios a seu dispor, não se salvou, não refletindo no que lhe cabe fazer com seu próprio tesouro, que uma vez perdido, jamais poderá ser conquistado?!
Repito: cada um deve antes de mais nada salvar sua alma! Pois no Além a situação será a seguinte: quem possuir amor, verdade e a justa ordem de Deus em si receberá imediato acréscimo; quem isto tudo não possuir ou sendo pouca sua posse tirar-se-á o dom escasso para que fique isento, desnudo, sem meios e recursos. Quem dele teria pena e procuraria ajudá-lo?! Em verdade vos digo: uma hora aqui vale mais que lá mil anos! Gravai essas palavras em vosso coração; mas por enquanto deve cada um guardá-las para si!”
14.CONFISSÃODEUMSACERDOTE JUDAICO
Diz um sacerdote: “Ó Senhor, Pleno do Amor, Misericórdia, Justiça e Sabedoria, tudo que dizes e até mesmo pensas torna-se ação irredutível para sempre, e difícil é uma criatura se dirigir a Ti! Ainda assim, fá-lo-ei por causa dos companheiros! Senhor, quem conhecer o caminho que leva a determinada meta, que lhe promete o maior benefício na vida, tudo fará para encetá-lo; pois somente um tolo e cego se arriscaria a enveredar por atalhos.
Nós, a partir de agora, conhecemos caminho e destino e podemos com facilidade virar as costas ao mundo e seus prazeres, seguindo como heróis por cima de cardos e serpentes; diante de um exército de demônios apenas lutaríamos para vencer a etapa! Existem, porém, muitos que não tiveram tal Graça indescritível do Teu Convívio!
Que será daqueles que antes de Adam viveram na maior ce- gueira espiritual e os que ainda virão após nossa passagem na Terra? Quem lhes abrirá os olhos e libertará suas almas, no Além? Nós, como sacerdotes e guias do povo, possuímos os Livros proféticos; mas de que nos adiantaram? Onde as provas da existência daqueles iluminados? Morreram não raro diante de nossos olhos, de morte infamante, e jamais voltou alma alguma de profeta para elucidar-nos quanto à vida do Além. Conhecíamos apenas uma fábula incompre- ensível e oposta aos princípios da razão, com a qual se podia conter a plebe inculta.
Por isto travamos conhecimento com sábios da Grécia, con- tinuando a sermos judeus que professavam as leis de Epicuro! Toda criatura tem uma tendência inapagável para a felicidade; de uma vida eterna além-túmulo, não nos foi possível colher provas de espé- cie alguma. De compleição forte procurávamos somente apreciar o lado bom da vida terrena. Para que fim deveríamos incutir no povo uma crença em Deus e na imortalidade, cujas provas não estavam no nosso alcance?!
Foi esta, Senhor, nossa doutrina secreta, semelhante à dos essênios, se bem que não mantivéssemos relações com eles por mo- tivos conhecidos. Perseguimos também os saduceus em virtude de seu cinismo e pelos seus adeptos; pois se a massa aderisse àquela seita, nossa felicidade terrena teria chegado ao término. Agora, após termos recebido provas mais convincentes acerca do Além, através de Tua Graça, toda matéria se nos tornou repelente! Qual a sorte, porém, dos destituídos deste conhecimento?”
Digo Eu: “Isto não é de vossa alçada! Tratai primeiro de vossa salvação, que os outros não serão esquecidos! Quem quiser como vós será salvo da mesma forma; quem não tiver vontade será culpado da própria perdição.
Cada alma continuará vivendo no Além dentro de seu amor e sua fé, portanto de acordo com o seu livre arbítrio. O amor sendo puro e bom, sua vida no Além será pura, boa e feliz; se a inclinação for maldosa e impura, não cogitando da felicidade alheia, seu futuro será mau, impuro e infeliz.
Tirar o amor de uma alma e suplantá-lo por outro seria o mesmo que destruí-la para criar uma inteiramente nova. Tal seria contra a Ordem Eterna, pois aquilo que Deus criou não mais poderá perecer, e sim terá que passar por estados mais nobres e sublimes! No Além, portanto, haverá cuidados para toda alma perdida; mas, como já vos disse: aqui vale mais uma hora do que lá, mil anos!
Ainda assim a nenhuma alma será feita injustiça; pois dei- xando-lhe inclinação e livre arbítrio, isolando-a somente para não prejudicar as boas, podendo fazer em sua esfera afim aquilo que seu amor e inteligência lhe induzem — de modo algum sofre injustiça, ainda que aparente.
Assim como vivestes até hoje, vivem todas as almas diabó- licas no inferno, cujo fogo horrendo é precisamente seu egoísmo e domínio insaciáveis — entretanto alegais terdes passado bem. Dia a dia, entretanto, o verme da morte roía dentro de vós, envenenando-
-vos a existência! Que resultado teria vossa vida confortável?!
O mesmo passarão ainda muitos, no Além, cabendo culpa somente a eles mesmos. Não passarão apenas uma vez pelo terror da morte, e sim inúmeras vezes; este fato é indispensável, pois sem ele todas as almas estariam eternamente perdidas. Para hoje sabeis o suficiente; já passou de meia-noite, portanto vamos nos recolher! Cedo veremos o que o dia de amanhã nos trará. Vamos!” Voltamos a casa, onde nos esperam os leitos. Os judeus têm seu quarto reserva- do onde, sentados à mesa, conjecturam quase a noite toda da manei- ra pela qual poderiam livrar-se do Templo. Finalmente combinam o resgate e em seguida silenciam.
15.OSSACERDOTESSETORNAMADEPTOSDO SENHOR
Ainda antes do pôr-do-sol, Eu, os discípulos, Barnabé e Láza- ro com a família estamos de pé. Martha já está em plena atividade com suas ajudantes no preparo dum desjejum farto e bom; Maria, porém, acompanha-nos, como sempre, ao ar livre, toda atenta para receber de Mim algo para coração e alma. Passada uma hora, os judeus despertam, lavam-se de acordo com seu costume e indagam, aflitos, se Eu ainda estava dormindo.
Diz Martha: “Oh — o Senhor está lá fora com todos os ami- gos há mais de uma hora, e certamente voltará dentro em pouco, pois o desjejum está quase pronto!”
Indaga um sacerdote: “Que direção tomou, para Lhe avisar- mos?” Responde Martha: “Não há necessidade disto, Ele saberá o momento exato!” Vira-se um outro para a irmã de Lázaro: “Deves conhecê-Lo há muito tempo, por saberes de Sua Faculdade Divina!” Diz ela: “É isto mesmo; todavia, não posso louvar vossa ignorância a respeito!”
Respondem os judeus: “Tua reprimenda é justa, e lastima- mos não termos colhido informações de Sua Pessoa, não obstante tivéssemos ouvido falar de Suas Ações na Galileia. Consta ter Ele passado a Páscoa em Jerusalém, onde enxotou os vendedores e agio- tas, derrubando e entornando suas barracas!”
Confirma Martha: “Foi Ele Mesmo; naquela ocasião vossos olhos estavam cegos, corações e ouvidos, tapados! Por isto não O reconhecestes!”
Dizem eles: “Tens razão; mas agora não mais sairemos de perto Dele, pois tomamos a firme resolução de acompanhá-Lo em outras vestes, a fim de que os templários não nos acusem de termos sido seduzidos por Ele, como amotinador. Ainda hoje partiremos para Jerusalém, a fim de nos prepararmos para uma viagem pretensa à Pérsia e à Índia, o que nos será concedido com prazer. Tão logo ti- vermos liquidado este assunto, voltaremos para segui-Lo como Seus discípulos, à nossa própria expensa!”
Diz Martha: “Tal solução é louvável e vos trará Suas Bênçãos! Mas ei-Lo chegando no momento em que terminei o desjejum! Recebamos-Lo com todo respeito e amor e agradeçamos-Lhe no- vamente pelo conforto de ontem, pedindo que abençoe a refeição, compartilhando da mesma.”
Enquanto Martha assim fala aos judeus, Eu Me aproximo, dizendo: “Minha filha, não é preciso fazê-lo de boca quem o faz de coração. A saudação oral é dispensável, porquanto só vejo o coração e seus pensamentos ocultos. Tuas palavras, porém, têm justo valor para Mim, porque surgiram do teu coração!” Com isto, Martha se sente toda feliz.
Então viro-Me para os judeus: “Quereis realmente vos tornar Meus discípulos?”
Respondem todos, inclusive os moradores de Jerusalém: “Sim, Mestre; caso nos aches com mérito para tal, faremos tudo para seguir-Te em todos os Teus Caminhos!”
Digo Eu: “Agis bem, deste modo! Acrescento, todavia: os pássaros têm seus ninhos e as raposas seus covis; Eu, como Filho do homem, não possuo nem uma pedra para repousar Minha Cabeça!”
Dizem os judeus: “Em compensação, Céus e Terra são Posse Tua! Materialmente temos o bastante para suprir-Te e Teus discípu- los, além de dez anos! Deixa-nos seguir-Te e ouvir Tuas Palavras de Vida — e o resto ficará por nossa conta!”
Aduzo: “Muito bem; ide para casa após a refeição e or- ganizai vossos trastes! Em seguida, voltai aqui para Eu deter- minar o vosso futuro!” Sentamo-nos à mesa, fizemos a prece e desjejuamos.
16.OSSACERDOTESCONVERTIDOSRENUNCIAMAO TEMPLO
Quando terminamos, todos agradecem de novo e os judeus se encaminham para Jerusalém. Lá os companheiros e o Sumo Sa- cerdote se admiram da viagem projetada dos vinte templários, já idosos; como, porém, iriam compensar sua ausência com grande soma em ouro e prata, acabam por concordar, desejando-lhes feliz viagem. Rápidos, eles se despedem e mergulham na metrópole, a fim de despistarem a direção tomada. Conhecem no subúrbio um grego, negociante de roupas de sua pátria, onde compram outras vestes, deixando as antigas em poder dele; desconfiado desta atitude, ele começa a indagar do motivo do disfarce.
Os judeus respondem: “Amigo, é mais fácil empreendermos negociatas vestidos à grega; como o Templo tem sido sonegado nas anteriores arrecadações, é preciso suplantá-las através dum comércio prudente com povos pagãos!”
Satisfeito com tal explicação, o grego não faz objeções, por- quanto ia ficar, ainda, com a indumentária sacerdotal, bem con- servada. Os outros lhe recomendam silêncio absoluto para evitar futuros aborrecimentos, e o grego nunca disse palavra a respeito. As- sim, os judeus voltam, por caminhos indiretos, ao nosso grupo, duas horas após meio-dia. Admirados da rapidez deste desfecho, Meus amigos e discípulos indagam como fora possível liquidar assunto assaz complicado.
Um dos judeus então diz: “Caros amigos, com dinheiro tudo é rapidamente resolvido; a importância sendo pouca ou nenhuma, é preciso se esperar tempo imenso e o resultado é mínimo! O Templo não tem mais a renda antiga quando os samaritanos, saduceus e grande número de essênios ainda não tinham apostatado, de sor-
te que os chefes ficam satisfeitos pela redução temporária de seus pensionistas.
Assim nossa fuga foi fácil; além disto estamos convictos da ajuda do Senhor, a Quem rendemos toda gratidão! Onde porém ficaram os demais habitantes de Jerusalém? Contamos uns doze a treze?! Acaso sua despedida dos familiares foi mais difícil que a nos- sa, do Templo?”
Digo Eu: “Exato, pois são pais de família, homens honestos e honrados na metrópole! Dentro em breve aqui estarão! Sentai-vos e servi-vos com alegria, como gregos ‘autênticos’!” Satisfeitos eles o fazem e contam vários fatos do Templo, da falsa Arca da União, por- quanto a genuína perdera seu poder miraculoso desde o homicídio de Zacharias. A nova já conta trinta anos, sem ter operado milagres, entretanto o povo ignorante a adora como legítima.
São feitos comentários acerca da renovação das Leis Mosai- cas, suplantadas por outras, absurdas, castigos e penitências, do fato de se difundirem os falsos milagres hindus, persas e egípcios ao invés das Provas Divinas. Os essênios, por sua vez, explicavam tais magias de modo natural, a ponto do mais ignorante descobrir a fraude. Tudo isto contribuíra para o descrédito do Templo; pois se hoje um sumo sacerdote cura um cego, previamente pago para tal mistifica- ção, cuja visão é perfeita, daqui a pouco os cegos imitam tal cena às dúzias.
Por isto fez-se uma petição ao sinédrio no sentido de impe- dir tais encenações, até segunda ordem, baseando-se em um motivo qualquer. A proposta não foi aceita, pois era preciso efetuar-se mila- gres por causa da plebe — ainda que levando o escárnio do ridículo! De que adiantam aparência sacerdotal, expressão de rigor e a falsa vara de Aaron, se o milagre é tão estúpido a levar os leigos mistifica- dores a boas gargalhadas?!
E assim os pseudo-gregos relatam muitas coisas, causando pasmo entre Lázaro, suas irmãs e o próprio hospedeiro, tanto que aquele diz: “Nunca teria suposto tal situação, pois confesso ter vi- sitado o Templo como judeu íntegro, e quando procurado pelos
chefes, nada podia opor às suas palestras, desejando que todas as criaturas vivessem dentro de tais princípios.
Agora tudo muda de feição! De que servem suas palestras doutrinárias quando apresentam apenas mistificação e o autor, ho- mem inescrupuloso?! Assemelha-se ao lobo voraz em pele de cordei- ro à caça de ovelhas inocentes. Isto será bem anotado por mim! Que dizes Tu, Senhor, a isto?”
17. ATITUDE EGOÍSTA DOS SACERDOTES NO TEMPLO
Digo Eu: “Julgas terem esses judeus relatado algo de novo para Mim? Sei de tudo, até mesmo como Filho do homem! Lem- bras-te quando Eu, aos doze anos, discuti com os doutores no Tem- plo durante três dias?! Já naquela época a situação era idêntica à de hoje — antes disto também; havia, entretanto, alguns sucessores dignos e sinceros de Moysés e Aaron do tronco de Levi, ocupando seus lugares. Zacharias foi o último. Atualmente todas as tribos são representadas no Templo, porque qualquer pessoa pode comprar um posto templário.
Em suma, transformaram a Minha Casa num antro de assas- sinos, onde não mais há salvação! Contudo vos afirmo: podeis ouvir os conhecimentos dos que ocupam as cadeiras de Moysés e Aaron quando pregam o Verbo de Deus; não olhai suas obras nefastas e muito menos imitai-as, por serem fraude infamante!
O fato de serem como são deriva do julgamento de Deus, porque Dele se afastaram, entronizando o dinheiro como divindade. Todos sabem que antigamente os primogênitos de todas as famílias eram educados às expensas do sinédrio, dentro do Templo, até aos quatorze anos, em holocausto a Deus; tais jovens não raro eram ser- vidos e ensinados por anjos visíveis!”
Todos confirmam: “Isto é plena verdade!” Prossigo: “E onde se considera hoje tal hábito?”
Responde um judeu: “Ainda é feito, mas de modo diverso! Ao invés dos primogênitos como sacrifício ao Senhor, o Templo
prefere dinheiro; quem tiver meios pode ficar com o primogênito, enquanto balbucia umas preces na caixa de esmolas, por algumas moedas, em benefício do menino. Caso os pais insistam nos antigos princípios como verdadeiros fiéis, o filho é aceito com cerimônia prescrita e, em seguida, entregue a uma ama qualquer, por pou- co dinheiro. O pequeno subsistindo, é vendido como empregado a um lavrador, onde cresce sem educação e ensino; quando os pais o exigem após os quatorze anos, admiram-se muito de atenção tão re- duzida, recebida no Templo, começando então um convívio difícil. Por tal razão, os pais não entregam mais os seus filhos ao Templo, preferindo a nova instituição. Com os ricos a situação é diferente: são bem tratados contra pagamento e vez por outra até mesmo vi- sitados por pseudo-anjos, que lhes servem e ensinam alguns textos decorados, mas que nem um, nem outro entende o sentido.”
Digo Eu: “Agora basta desses relatos verídicos, pois aí vêm os moradores de Jerusalém e não adianta aborrecê-los. São conhe- cedores de muitos atos do Templo, todavia não necessitam saber a fundo seus segredos maldosos. Não façais comentários a respeito, porquanto vos poderiam causar aborrecimentos terrenos e prejuízos psíquicos! É preferível pensardes o seguinte: Nossos corações são li- vres e encontraram a Luz e o Caminho justo da Vida! — Enquanto Eu os tolerar para que se complete sua medida, fazei o mesmo, acei- tando seus bons ensinos; dos maus convém afastar ouvidos e olhos! Basta deste assunto; os cidadãos já chegaram sem terem desjejuado; devem, pois, saciar-se!”
18.OEVANGELHODA ALEGRIA
Solícitas, Martha e Maria vão à despensa, onde apanham pão, vinho e carne de carneiro assada, arrumando tudo numa mesa ao lado, por não haver espaço na que ocupamos. Como os cidadãos se aproximem com atitude de grande veneração, digo-lhes amavel- mente: “Deixai isto de lado! Sois famintos, portanto saciai-vos com alegria! Se os filhos das trevas, do julgamento e da morte se portam
alegres nos banquetes — por que não o deveriam ser os da Luz e da Vida, em Presença do Pai Celeste?! Pois afirmo-vos: onde Eu estiver, estará o Pai! Servi-vos, pois, e sede alegres!”
Agradecendo, o referido grupo de moradores de Jerusalém serve-se à vontade e começa a relatar a maneira pela qual conseguiu ausentar-se das famílias por alguns meses. Eu os elogio e recomen- do coragem e persistência, pois sem isto teriam pouco êxito como discípulos Meus. Eles o prometem e também cumprem, conforme posteriormente verificar-se-á.
Durante este entendimento, Martha observa em surdina a Lázaro: “Imagina, irmão, deu-se outro milagre! Ontem e hoje nos- sos gastos foram enormes com tantas pessoas; acontece que na gran- de despensa não só o estoque deixou de diminuir, como aumentou dez vezes mais, e nas adegas pequenas e grandes todos os odres estão repletos! Só pode ser Obra de Amor e Bondade do Senhor, de sorte que nos saciamos à Sua Mesa e não Ele à nossa!” As palavras da irmã encabulam Lázaro, não sabendo o que responder.
Observando seu embaraço, digo-lhe também à meia-voz: “Não te incomodes! Pretendemos passar aqui metade do inverno, em pleno sossego, quando seremos ora teus, ora os hóspedes de Bar- nabé. Em tal época haverá muitos enfermos por esses arrabaldes de Jerusalém, que então serão por Mim curados para saberem da Ajuda do Messias, fato que os levará a crerem Nele.
Em seguida visitarei por algum tempo o honesto Kisjonah, irei alguns dias à Galileia para voltar aqui antes da Páscoa. Então ficaremos por longo tempo em tua companhia, precisando muito de ti; por isto abençoei tuas despensas e adegas de modo tão farto! Calai-vos, porém, a respeito!”
Lázaro Me agradece em silêncio e orienta as irmãs, que co- movidas de tanta alegria, se veem obrigadas a se dirigir por alguns momentos ao jardim, para não despertarem a atenção. Entrementes, os hierosolimitanos terminam a refeição e agradecem, fazendo men- ção de saírem.
Digo-lhes, então: “Se nada tiverdes que fazer, ficai conosco para nos alegrarmos; o tempo para tristezas não demorará! Meus discípulos não devem ser sisudos e caminhar com feições beatas e devotas, na expectativa de levarem aos outros a ideia de estarem eles apenas com os pés sobre o solo, enquanto o corpo já se acha no Céu, em consequência de sua evolução espiritual, e sim têm de se apresen- tar de coração e atitude sinceras e simples, despertando confiança no próximo e espalhando muitas bênçãos celestes.
Vede, em Mim habita a plenitude do Espírito verdadeiro de Deus e jamais Me vistes caminhar cabisbaixo e de olhar beato; pelo contrário, Minha Expressão é natural e sincera, Meu Caminho é reto e Minha Atitude é Amável e Alegre com os honestos e felizes, enquanto alegro e encorajo os tristes e aflitos, cabendo-vos o mesmo dentro de vosso livre arbítrio!
Por isto repito: deveis andar pelo mundo de alma aberta, ale- gres e felizes, sem nele vos apegardes. Do mesmo modo que Eu vim ao mundo para trazer a todos a Revelação de regozijo e felicidade sublimes, dos Céus mais elevados, capaz de proporcionar o maior consolo a cada um, a ponto de a morte mais cruel não conseguir entristecê-lo — por saber e ver que não existe morte e que no Meu Reino Eterno não se perde nem esta Terra, tampouco o Céu visí- vel, sendo-lhe acrescentado domínio poderoso sobre muita coisa — também enviar-vos-ei em Meu Nome para transmitirdes a todos os povos esta Boa Nova dos Céus, caso vos torneis aptos em espírito na posse de Minha Doutrina.
Quem poderia ou quereria transmitir Revelação tão feliz de feição triste, tímida, medrosa e cabisbaixa?! Afastai, pois, tudo isto de vós e até mesmo a veneração exagerada para Comigo, do contrá- rio jamais sereis capazes duma convocação e chamada para algo mais grandioso e muito menos para a realização de qualquer coisa subli- me! Satisfaço-Me se Me amardes do fundo de vossos corações; tudo que passar daí é tolo, inútil, fazendo do homem, Meu Semelhante, uma criatura covarde e inapta às coisas grandiosas!”
Obtempera um cidadão: “Ó Senhor, seria tudo ótimo, caso nunca tivéssemos pecado em vida! Nossos pecados ardem em nossos corações diante de Ti, que nos conhece o íntimo e És Santo — e nós precisamente o contrário! Por tal motivo é difícil sermos alegres e felizes!”
Digo Eu: “Pensas não ter Eu noção disto antes de vos aceitar para discípulos?! Perdoei vossas faltas por vos terdes afastado do mal e não mais pretenderdes pecar — e por certo não o fareis! Assim sendo, sois inteiramente livres do pecado, tendo motivo de sobejo para uma alegria sincera!”
Indaga um outro: “Senhor, que vêm a ser as máculas pecami- nosas da alma? Consta persistir uma mancha negra na alma, ainda que alguém seja absolvido do pecado por obras de penitência, de sorte que uma outra, inteiramente pura, dela se desvia no Além, evitando todo convívio; além disto, não poderá ver o Semblante de Deus, até que tenha apagado a mácula no fogo do inferno.”
Digo Eu: “Sim, a mancha perdura na alma até que a criatura desista plenamente do pecado! Quem isto fizer por ser ele nocivo — pervertendo o seu íntimo e afastando-o de Deus, do Reino da Verdade
não precisa temer qualquer mácula em sua alma, tampouco o fogo infernal. Tendo ainda tanto receio das máculas psíquicas, como podeis fitar-Me, cientes de Quem sou? Como sois fracos e tolos!
Afirmo-vos: caso pretendeis tornar-vos Meus discípulos, pre- ciso é despirdes vosso antigo eu, como quem tira uma roupa velha, vestindo uma nova; pois Eu e os princípios rotos e enferrujados do Templo desta época não combinamos. Observai isto, sede razoáveis na fé, alegres e cheios de coragem.” Este ensinamento confortador produz efeito benéfico nos cidadãos de Jerusalém, que logo se servem de vi- nho, tornando-se alegres e começando a relatar quantidade de histórias humorísticas, no que os gregos os acompanham até o crepúsculo.
Nessa ocasião Lázaro ouve certos fatos que lhe provocam for- te abalo, perdendo todo respeito ao Templo; por isto Me diz em
surdina: “Senhor, estou curado até às fibras do meu íntimo e irei reduzir, cada vez mais, minhas visitas ao sinédrio!”
Aduzo: “Farás bem agindo desse modo; deves, porém, fazê-lo mais no íntimo que externamente, a fim de não despertares descon- fiança nas raposas ardilosas, por ainda mereceres grande conceito no Templo! Um brusco retraimento não seria de proveito para Minha Causa, nem para tua pessoa; além disto, considero apenas o senti- mento do indivíduo, pois o homem externo não tem valor.”
20.AINSTABILIDADEDA MATÉRIA
(O Senhor): “Agora traze-Me uma pedra dura e tão grande que suportes o seu peso, pois pretendo fazer uma demonstração!” Lázaro, ligeiro, apanha no terreiro uma pedra de quartzo pesando dez libras, que deita sobre a mesa, dizendo: “Senhor, eis uma pedra duríssima!”
Digo Eu: “Serve muito bem para a experiência, por ser tão dura quanto os corações dos templários e as velhas muralhas do Tem- plo.” Todos estão atentos à Minha Atitude, enquanto digo: “Ouvi! Estamos reunidos num domingo, cheios de alegria e satisfação! E por que não o deveríamos estar? Pois acabastes de Me reconhecer e compreender, se bem que após grande trabalho e sacrifício, de sorte a Eu vos ter aceito! Libertaste-vos de todo julgamento, pelo simples fato de vos dirigirdes à Verdade e ao Bem pela livre e espontânea vontade. Assim sendo, posso vos dar uma prova de Minha Divinda- de, sem prejuízo de vosso conhecimento e vontade livres! Que seria mais fácil: destruir, num momento, esta pedra através de Minha Vontade — ou dizimar de modo idêntico o Templo com tudo que contém em objetos e criaturas? Antes de responderdes analisai a pe- dra, para que ninguém afirme ter sido ela preparada para tal fim!”
Respondem todos: “Não é preciso, Senhor, conhecemo-la de há muito! Foi trazida do Jordão por um pescador, em virtude de sua bela forma redonda!”
Prossigo: “Pois bem, dizei-Me o que seria mais fácil: Eu des- truir esta pedra — ou o Templo!”
Responde um dos neogregos: “Julgamos ser-Te tal coisa in- diferente; pois tanto uma quanto outra seria humanamente impos- sível! Já vimos por diversas vezes o desaparecimento de pedras por magos egípcios; em breve percebemos o truque e não levou tempo para adquirirmos a mesma destreza, perguntando a nós mesmos como podíamos inicialmente acreditar em um milagre.
Aqui a coisa é bem diversa, pois trata-se de uma pedra real e a mais dura que conhecemos. Os gregos sabem fazê-la derreter no fogo para o preparo de vidro, arte que os fenícios em épocas dos faraós entenderam — onde apenas alteravam a matéria do quartzo. Transformá-lo pela simples vontade é preciso que se tenha poder di- vino, fator do qual nós, fracas criaturas, jamais conseguiremos uma noção verdadeira e clara!”
Digo Eu: “Pois bem! Notai que não tocarei a pedra, dizendo-lhe apenas: desaparece, velha condenação!” No mesmo ins- tante nada mais se vê sobre a mesa.
Extasiados, todos exclamam: “Isto só é possível ao poder pu- ramente divino! Jamais foi vista coisa semelhante!”
Eu, porém, acrescento: “Do mesmo modo que esta pedra foi dissolvida em seus elementos originais através de Minha Vontade, poderia agir com o Templo, com todas as montanhas, com a própria Terra, Sol, Lua e estrelas, e desintegrá-los em seu primitivo nada, isto é, em Pensamentos Divinos, que deixam de ter realidade até que recebam forma e consistência reais pelo Amor e Vontade Onipoten- tes de Deus. Neles, porém, não domina o princípio da destruição e dissolução, mas a conservação de todas as coisas criadas, dentro de Sua Ordem; todavia, não traduz isto o julgamento constante da matéria, senão a existência livre em espírito, motivo por que matéria alguma poderá ter consistência neste mundo em julgamento, e sim tudo perdura por certo tempo, apenas dissolvendo-se paulatinamen- te, transitando dentro da Ordem ao elemento espiritual, constante e imperecível.
A matéria é o túmulo do julgamento e da morte tempo- rária, e os espíritos mortos nesses túmulos também têm que ouvir
a Minha Voz e obedecer à Minha Vontade, conforme acabastes de assistir. Da mesma forma que essa pedra foi desintegrada subitamen- te, a Terra toda passará pela mesma dissolução, dela surgindo uma nova, espiritual e imperecível, cheia de vida e felicidade para seus habitantes espirituais, e não haverá mais julgamento nem morte do- minando as paragens celestes; pois ela brotará da vida de todos que dela e sobre ela cresceram.
Acabastes de ver o Poder da Vontade Divina em Mim, e Jerusalém e o Templo de há muito mereciam Eu lhes fazer o mes- mo que à pedra. Mas não — devem existir e agir até seu final. Pelo próprio proceder destruir-se-ão, não da maneira pela qual agi com o quartzo, que pela destruição passou do antigo julgamento a uma existência mais livre, de potência psicoespiritual, e sim como se ani- quila um suicida, cuja alma ingressa em um julgamento mais duro e em numerosas mortes. Por isto deixemo-los até sua época de medida completa, para que não venham a dizer: ‘Nada disto nos disseste, entretanto destruíste-nos!’ Compreendestes a prova que operei aos vossos olhos?”
Respondem os gregos: “Senhor, trata-se de uma prova pro- funda, que apenas assimilamos em parte — pois no todo, somente Tu a penetrarás; talvez o consigamos no Além, pela Tua Graça! Seu sentido é mui sábio e de grande importância, embora de início tives- se aspecto simples! Vendo Tua boa Disposição, Senhor, pedimos-Te dizer-nos como ages para criar algo do nada!”
21.OVINHOMILAGROSO.OTRABALHONAVINHADO SENHOR
Digo Eu: “Pretendeis distrair-vos com Meus Milagres?! Acontece não ser Eu mago qualquer, que efetua suas magias levan- do as pessoas mundanas, ignorantes e tolas, a grande estupefação. Opero Meus Feitos somente dentro da Vontade Daquele Que Me enviou como homem de carne e sangue a este mundo, e também habita dentro de Mim; se, pois, fizer um milagre, terá que servir de
orientação profunda e espiritual da alma, e além disto ter utilidade variada para as criaturas! A prova por vós desejada, conquanto não fosse de má intenção, não tem finalidade e benefício, portanto é me- lhor não efetuá-la. Contudo já sabeis que para Deus todas as coisas são possíveis.”
Defende-se o grego: “Senhor, deves perdoar-nos a imensa ignorância que nos levou ao atrevimento de pedir-Te um milagre!”
Obtempero: “Não, Meus amigos! Vosso pedido foi justo, pois quem pode reduzir algo ao nada, forçosamente saberá fazer o contrário! Tal foi o pensamento que externastes e que foi justo e bom! Teria sido injusto caso tivésseis pensado e falado de modo diverso. O fato de a prova desejada não poder ser feita a seguir, isto é, após a primeira, por não estar dentro da Ordem, não era de vosso conhecimento, e sim apenas Meu. Assim sendo, não errastes, tampouco Eu, por não ter cedido ao vosso desejo. Tendo agora de- sistido em vossos corações, e crendo sem indício de dúvida poder Eu operar uma prova em contrário, fá-lo-ei neste instante! Verificai se ainda existe vinho nos cântaros!” Eles constatam estarem todos vazios. Digo em seguida: “Que estejam todos repletos!”, e o mesmo se dá instantaneamente!
Admirados, os gregos afirmam: “Vede o Poder Milagroso do Senhor! Nem bem pronunciou as palavras e os jarros estão cheios do melhor vinho! Senhor, se fosse possível nos tornarmos plenos de Tua Luz e Graça através de Tuas Palavras de Vida, conforme se deu com os cântaros! Tem paciência com nossa grande fraqueza, Senhor!”
Prossigo: “Isto não posso e não devo fazer com as criaturas, como agi com esses cântaros; pois tudo depende de vosso zelo e livre vontade. Não faltará Minha Ajuda! Tereis que fazer o que vos cabe à medida de vossas forças; o resto será Minha Incumbência. Em verdade vos digo: o que pedirdes ao Pai, em Meu Nome, e dentro de Minha Ordem por vós conhecida, ser-vos-á dado na proporção utilitária para vossa alma. Agora bebei, pois já é noite!”
Os gregos levantam os cântaros e agradecem, dizendo: “Ao progresso geral da imensa felicidade que ontem encontramos, para
todos os povos da Terra! Possam Tua Doutrina e Graça penetrar a todos como este vinho neocriado e saboroso que ora nos vivifica! Tua Vontade se faça, Senhor!”
Todos acrescentam: “Amém”, enquanto Me ponho de pé di- zendo: “Eis um desejo justo e bom; por isto tomemos desta Dádiva Divina, brindando o seu sucesso seguro, no que também acrescento: que assim seja! — Haverá muito trabalho e sacrifício; pois a Vinha do Senhor é grande e ainda possui poucas videiras. Urge cavar a terra e plantar sem tréguas videiras novas, para que a Vinha se torne repleta de plantas nobres e abundantes e que a colheita enorme nos dê o prêmio extraordinário, compensando o esforço!
Teremos que suportar toda sorte de aborrecimentos, sendo perseguidos, difamados e desacatados; mas sabendo o que temos a dar, suportaremos a maldade ignorante do mundo com toda pa- ciência, humildade e meiguice. Pois o Pai quer que os Seus filhos sejam humilhados ao extremo neste mundo, antes de serem elevados à honra imorredoura, que jamais lhes poderá ser tirada.
O Meu Próprio Corpo disto não fará exceção, como já disse e demonstrei aos Meus discípulos. Ainda assim alcançaremos a Grande Meta, vencendo sobre todo julgamento, morte e inferno. Uma vez alcançada a vitória, as Portas Celestes, há tanto tempo cerradas, abrir-
-se-ão para sempre aos filhos recentes de Deus, eternizando a vitória!
Se bem que os oponentes vicejem em forma e caráter diver- sos, o joio progredindo entre o trigo, e na Vinha surgirem e progre- direm as plantas silvestres — fá-lo-ão apenas até determinada época. Em seguida serão arrancados e atirados ao fogo do julgamento, ha- vendo muito clamor e ranger de dentes!”
Como alguns não entendessem Minhas Palavras, finali- zo: “Assim como a Doutrina Pura de Moysés foi deturpada com o tempo pela ganância e a tendência mundana das criaturas, tam- bém sucederá com a Minha Boa Nova. Elas construirão novamente templos, usando-os para a arrecadação de dinheiro e outros bens terrenos, sem consideração pela conquista do Meu Reino. Apresen- tar-se-ão mais orgulhosas que os príncipes mais nobres, e os próprios
reis da Terra, cobertos de ouro e pedras preciosas. Eis o joio entre o trigo e as plantas agrestes na Vinha do Senhor!”
22.OSFALSOSDOUTRINADORESDO EVANGELHO
Perguntam os discípulos: “Senhor, como poderá ser possível? Pois nós o transmitiremos como o ouvimos e os que o recebem não o deturparão. Para tanto Tua Ajuda dos Céus muito contribuirá!”
Respondo: “Por ora não o entendeis! Existem na Terra e no ar espíritos maus e ainda não fermentados, ávidos por se apoderarem da carne humana. São indispensáveis produtos do antigo julgamen- to da Terra, à procura de semelhantes entre os filhos deste mundo e se infiltram em seus sentidos. Isto agrada àqueles, seguindo as tenta- ções ocultas de tais elementos.
Os referidos filhos do mundo se apegam a tudo que chame atenção. Não possuindo o verdadeiro espírito por serem do mundo, organizam tudo que lhes parece conferir posses terrenas, dentro de sua ignorância espiritual e inteligência mundanas, com pompa ex- terna, atraindo muitos espíritos de boa índole.
Tal fato é uma deturpação vasta e rude de uma doutrina por mais pura que seja! Oferecendo tal doutrina privilégios escassos, e apenas espirituais, enquanto uma religião deturpada promete, ao lado dos pretensos bens espirituais, principalmente grandes vanta- gens terrenas — já podeis compreender a maneira pela qual seja vilipendiada a doutrina mais pura.
Sede, pois, precavidos! Com o tempo surgirão, ainda em nossos dias, muitos falsos profetas e doutrinadores, propagando com grande atrevimento: Vede, aqui está o Cristo! Lá está Ele!, fazendo importan- tes milagres à moda essênia, às vezes de modo tal que poderiam ofuscar os primeiros discípulos convocados, caso o permitisse. Não lhes deis ouvidos, mas castigai-os em Meu Nome, por causa de sua mentira, e indicai-lhes a humildade e a aceitação da Vontade de Deus, que vós e vossos adeptos verdadeiros caminhareis por uma trilha limpa!
São facilmente reconhecidos pela fanfarronice, pretensão desmedida de poderes divinos, que jamais tiveram e nunca possui- rão; além disto manifestam grande brilho e ostentação, pompa mís- tica usual nos pagãos e a excessiva tendência do domínio, secundada pela cobiça insaciável de tesouros e riquezas deste mundo. Nestes sinais palpáveis, por certo não será difícil reconhecê-los!”
Exclamam todos, inclusive os apóstolos: “Não resta dúvida, Senhor; nossos adeptos poderão classificá-los do mesmo modo, e Tu não abandonarás Teus verdadeiros seguidores!”
Acrescento: “Ficarei com eles até o fim dos tempos deste mundo! Para hoje chega de provas e ensinos. A partir de agora não operarei, com exceção de curas, outros milagres durante o inverno, tampouco darei novos Ensinamentos; pois já recebestes o bastante e caso algo não entenderdes, estou aqui. Vós, Meus apóstolos, doutri- nai entrementes os novos discípulos.
Até o fim da semana descansaremos neste lar; no sábado ire- mos a Bethlehem para curar enfermos. Isto feito, passaremos alguns dias aqui com Barnabé e também com Lázaro, alternadamente, até metade do inverno. Em seguida, visitaremos Kisjonah, voltando aqui antes da Páscoa. Mais tarde, caminharemos com muitos segui- dores e novos discípulos para Galileia, onde começarei a doutrinar e agir de novo. Agora, trazei lamparinas, pois queremos ser alegres e nestas mesas também pernoitaremos!”
Todos aceitam esta proposta sem sentirem sono, a ponto de palestrarmos além da meia-noite assuntos de somenos impor- tância para a Humanidade; pois Eu Mesmo combinava muita coisa com pessoas amigas e dava-lhes conselhos caseiros, que não fazem parte do Evangelho. Meus discípulos faziam o mesmo, tornando-se amáveis e merecedores de conceito. Também é amor ao próximo auxiliar-se pessoas aflitas e inexperientes em coisas úteis.
Levantamo-nos meia hora antes do surgir do Sol. Tomamos um pequeno desjejum e, em seguida, fomos ao ar livre, em pales- tra amistosa.
Assim passamos até o sábado. Também visitamos vários vi- zinhos de Lázaro, contentíssimos por Me ver e falar e não havia um, amigo do Templo. Os vinte neogregos não são descobertos, embora comentassem as traficâncias templárias, fazendo vários amigos entre os vizinhos.
23.OSENHOREMBETHLEHEM,EMCOMPANHIADESEUSADEPTOS.CURADEMUITOS ENFERMOS
Sábado de manhã partimos para Bethlehem, precisamente num dia de festa, onde grande quantidade de pessoas atacadas de várias moléstias se havia acampado diante das torres da cidade, pe- dindo esmolas. Lázaro, que nos havia acompanhado, então diz: “Se- nhor, vê estas pobres criaturas, que aspecto comiserador!”
Eis que esclareço: “Há muitos entre eles atirados a essa misé- ria por culpa dos fariseus; em compensação podem mendigar. Cas- tigos, tristezas, aborrecimentos, ira e revolta ocultas finalmente deles fizeram criaturas aleijadas — razão por que aqui vim para socorrê-las fisicamente, dando-lhes oportunidade de ganharem seu sustento.” Nesse instante alguns nos pedem esmola.
Virando-Me para eles, indago: “Não seria melhor trabalhar, ao invés de mendigar tão miseravelmente?”
E todos respondem: “Oh, Senhor — mil vezes, caso tivésse- mos a saúde de antanho! Basta olhares nossos pés e mãos para julgar se somos capazes de qualquer trabalho!”
Concordo: “Bem o vejo; queria apenas saber se desejais re- cuperar vossa saúde e trabalhar, em vez de viverdes da misericór- dia alheia!”
Exclamam todos: “Oh, amigo, se isto fosse possível iríamos incontinenti à procura de serviço.”
Eis que oponho: “Sabeis ser hoje sábado e não seria apropria- do curar-vos de vossos males crônicos!”
Respondem eles: “Senhor, somos judeus bem orientados, ainda assim ignoramos ter Moysés ou outro profeta qualquer proi-
bido de fazer-se boa ação neste dia! Sendo possível socorrer a um animal doente, por que não fazê-lo a uma pessoa, caso ainda existam recursos?! Por que motivo os fariseus, quando são médicos, visitam num sábado enfermos abastados? Deveriam saber se com isto vili- pendiam tal dia!”
Digo Eu: “Boa é vossa resposta; agora quero e afirmo: tor- nai-vos todos plenos de saúde!” Eis que percebem endireitarem-se seus membros atrofiados, e um dentre eles, privado do braço direito, adquire-o no mesmo instante. Isto é algo forte demais, razão por que um deles pergunta Quem Sou, pois que Minha Palavra consegue o que é impossível à medicina.
Então lhe adianto: “Ainda o sabereis oportunamente; para hoje levantai-vos e procurai trabalho e sustento!”
Lázaro acrescenta: “Surgindo qualquer dificuldade, ide à Bethânia; o proprietário daquelas terras tem serviço para centenas!” Todos agradecem e se encaminham para lá.
O mesmo milagre curador foi ainda efetuado diante de seis torres da metrópole; pois a velha cidade de David possui sete, três grandes e quatro pequenas. Na última somos abordados por três fariseus, orientando-nos não ser nossa atitude conveniente em tal dia. Os curados, porém, levantam-se rápidos e dizem com gestos de ameaça: “Durante dez anos ocupamos a entrada da cidade e jamais algum de vós se informou de nossos padecimentos, muito menos nos deu uma esmola — e agora quereis obstar este verdadeiro salva- dor pelo simples motivo de nos ter restituído os membros, em parte ausentes?!
Acaso não foi instituído por Moysés socorrer-se a um po- bre animal, mesmo num sábado?! Quanto mais não será obrigação fazê-lo à criatura enferma?! Tratai de afastar-vos — do contrário vos ensinaremos a compreensão das Leis mosaicas.”
Percebendo não ser aconselhável discutir com os curados, os fariseus desaparecem entre a multidão. Os outros, agradecidos pela cura, também se dirigem a Bethânia. Deste modo consegue Lázaro cento e vinte operários de que há muito precisava, que não
constituiriam perigo de serem catequizados pelos templários, como já ocorrera por diversas vezes.
Em seguida, nos afastamos rápidos, tomando direção de uma outra vila que dista duas horas de Bethânia, habitada por gre- gos e romanos. Lá procuramos um bom albergue.
24.ASCURASDOSENHORNASPROXIMIDADESDE BETHLEHEM
O hospedeiro, romano honesto, mas que também falava he- braico, diz: “Muito me alegra vossa preferência — mas deu-se em meu albergue, espaçoso e bem provido, uma grande desdita. Acon- tece que minha mulher e as duas filhas mais velhas, entendidas em assuntos domésticos, há oito dias estão acamadas, com febre vio- lenta! Não há médico, grego ou judeu, que as socorra — e assim, a cozinha está em apuros! Tenho apenas pão e vinho!”
Diz Lázaro, que conhece o romano de há muito: “Não te pre- ocupes com o embaraço caseiro; pois a tua casa é alvo de grande Gra- ça! O famoso Salvador, de quem ouviste falar por viajantes da Gali- leia, está conosco! Pede-Lhe socorro que as enfermas melhorarão!”
Indaga ele: “Onde está? Contaram-me coisas fantásticas de sua pessoa!” Lázaro Me aponta e o hospedeiro se joga aos Meus Pés, pedindo que ajude as doentes, pois acredita nas palavras de Lázaro.
Eu então lhe afirmo: “Levanta-te e verifica o estado das en- fermas, já melhoradas — portanto podem preparar-nos uma boa refeição!”
Ele assim faz e as encontra satisfeitas pela cura, perguntando se devem ir à cozinha! Desejam ainda saber quem foi o causador disto para lhe demonstrarem sua gratidão. O hospedeiro as informa que tal pessoa chegara com uns cinquenta hóspedes, ansiosos de uma boa refeição. Já se passaram cinco horas de meio-dia, portanto convém apresentar seus agradecimentos através de um bom jantar. Tais palavras produzem efeito, pois as moças se apressam com as aju- dantes, enquanto o romano se junta a nós e Me agradece, comovido
pela grande Graça recebida. Eu disto o impeço, dizendo: “Não faças alarde, foste apenas ajudado e nada mais é preciso!”
Opõe ele: “Ó Mestre e amigo — como não?! Sou Teu evi- dente devedor, e além disto confesso considerar-Te eu mais que sim- ples homem; portanto, seria oportuno fazer-se uma oferenda a um homem-deus!”
Acrescento: “Deixa estar! Sou agora homem de carne e san- gue como qualquer um; o resto saberás em tempo! Sê alegre e feliz como nós todos!”
Satisfeito, o romano traz do melhor vinho, que oferecia ape- nas aos patrícios quando de passagem pelo seu albergue, porque mora na estrada principal. Judas, sem titubear, pega do cântaro e o esvazia até a última gota. Os outros discípulos lhe indagam a quem dentre eles cabe o direito da primazia, e ele responde: “Estava com sede; se agi mal, haverá Quem me recrimine e nada tendes a ver com o caso!”
Virando-Me para os outros, digo: “Deixai-o; querer melho- rá-lo seria o mesmo que lavar um negro para que se torne branco!”
Ouvindo isto, Judas se envergonha a ponto de se ocultar du- rante três dias. Nesse ínterim hospedou-se em outro albergue, pois sabia ganhar secretamente algum dinheiro durante as viagens. Todos se sentem aliviados com sua ausência e assim passamos oito dias na casa do romano, tendo Eu curado vários enfermos nesse local.
Quando a afluência se torna por demais forte, partimos ce- dinho para outra zona, onde também somos bem recebidos e igual- mente curamos os enfermos. Nessa ocasião também os discípulos, com exceção de Judas, apõem as mãos nos doentes, que assim se curam. Eu Mesmo poucas demonstrações dei de Meu Poder, pales- trando com Lázaro e o romano, que nos acompanham. Entremen- tes, voltamos aos lares de ambos, onde tudo permaneceu em ordem durante a ausência de quatro semanas. Ficamos outros oito dias com o hospedeiro e em seguida fomos a Bethânia, onde Lázaro sente grande satisfação com os lavradores de Bethlehem. Quando estes Me avistam, caem de joelhos para adorar-Me; pois Martha e Maria os haviam esclarecido quanto à Minha Pessoa.
Eu, porém, lhes digo: “Por enquanto calai-vos! Em breve também tereis oportunidade para falar!” Prometem assim silenciar e voltar à sua tarefa.
25.OSENHORVIAJAPARA KIS
Entrementes Martha relata a chegada de vários sacerdotes durante Minha ausência, informando-se minuciosamente do para- deiro de Lázaro e de onde ele havia conseguido tantos trabalhadores. Ela então respondera ter o irmão feito uma viagem a negócios, talvez para o Egito, e a caminho possivelmente contratara aqueles homens, mandando-os para Bethânia. Eis que um fariseu indagou: “Não nos poderás ceder uns vinte trabalhadores?” Martha lhe disse: “Dirigi-
-vos a eles — pois desconheço sua nacionalidade, por falarem vários idiomas!” Quando o fariseu conversou com alguns homens, estes pareciam conhecê-lo, porquanto lhe afirmaram não serem mais ju- deus e caso ainda o fossem podia ele estar certo de eles não servirem mais a templários. Com isto se afastaram; certamente para voltarem com a chegada do irmão.
Eis que Lázaro Me pergunta o que deveria fazer em tal caso. E Eu o esclareço: “Faze o mesmo que a tua irmã! Nada conseguirão com os lavradores e não te poderão culpar por isto.” Deste modo, Lázaro teve mais calma em sua organização doméstica.
O inverno já se tendo manifestado e sendo poucos os doentes a necessitarem de cura, ficamos alternadamente ora com Lázaro, ora com o hospedeiro, até metade da estação, e nesse tempo os novos adeptos aceitavam a Boa Nova com muito amor e fé segura, exigin- do até mesmo o batismo.
Oriento-os do seguinte: “Por enquanto é suficiente terdes aceito o batismo da Verdade; se, porém, ficardes dentro da Doutrina e agindo como ensina, no que recebereis o batismo verdadeiro e vivo, também podeis receber o de João. Em breve virá uma época em que muitos receberão o batismo verdadeiro do fogo da vida, que
emana do Espírito Santo, ao invés do batismo da água.” Os novos discípulos assim se satisfazem.
Numa segunda-feira partimos de Bethânia a caminho do Mar Galileu, onde contratamos um bom navio. Como já é tarde, os remadores não se atrevem a fazer a travessia, alegando que à meia-
-noite o mar era revolto nessa época.
Eis que os discípulos indagam: “Sois de Genezareth, como então ignorais o Poder do Senhor, Jesus de Nazareth?” Dizem eles: “O quê? Ele está aqui?” Eu respondo: “Sim, sou Eu!” Concluem eles: “Ah, neste caso as ondas poderão subir às nuvens! Embarcai, pois o navio comporta umas cem pessoas!” Assim partimos com bom ven- to, e embora o Mar fosse agitado, os marujos não se preocupam e alcançamos a baía serena de Kis, à luz do luar.
Nem bem atracamos, apresentam-se aduaneiros com as per- guntas de praxe sobre o motivo de nossa chegada e se éramos sujei- tos à taxa. Eu apenas digo: “Chamai Kisjonah, e sabereis de nossa intenção!” Ele não demora a chegar à praia iluminada por tochas, e quando Me avista grita de alegria: “Ó Senhor, que mérito tenho eu, pecador, por me visitares a estas horas da noite? Oh, sede todos bem-vindos! Vamos à minha casa, onde vos servirei de tudo e do melhor! Que alegria inesperada!”
Rápido, descemos de bordo e fomos à residência de Kisjonah, cujo salão é bem aquecido por grande lareira. Todos os domésticos se põem em pleno movimento, e dentro em pouco se acha um grande nú- mero de peixes de especial qualidade na mesa, inclusive pão e vinho. Isto é do agrado de todos, pois que desde cedo nada mais havíamos tomado.
Eu Mesmo sinto necessidade de conforto material após via- gem tão longa, e muito mais os discípulos. Vários fatos são relatados de nossas viagens e acontecimentos, interessando muito a Kisjonah e sua família, levando-o a expressar sua admiração e louvor. Lastima somente a ausência de Maria, que permanecera quase todo verão com ele, mas partira por alguns dias para Nazareth. Tinha sido in- formada de Minha Peregrinação e Ações, sem compreender como
Deus lhe concedera tamanha Graça. Era ciente das ocorrências mi- lagrosas, jamais, porém, teria imaginado tal desfecho.
Deste modo Kisjonah conta acerca do procedimento de Maria durante Minha Ausência, dos dois filhos de José, Joel e Joses, que ficaram em casa à testa da oficina do pai. É inútil relatar tais minúcias, portanto prossigamos.
Também nessa noite não nos deitamos, descansando nos divãs cômodos, e isto, tanto mais quanto estamos habituados a re- pousar pela manhã. Por este motivo não tomamos desjejum; em compensação, o almoço é mais farto, para o qual Philopoldo de Caná, de Samaria, e mais alguns amigos Meus e de Kisjonah são convidados.
Bem, isto tudo é secundário; mas como Philopoldo aborda e Eu explico o problema da Origem do Espírito de Deus em con- fronto com as criaturas, sobre Tempo e Espaço, Infinito e Eterni- dade, a Existência de Deus e dos seres criados dentro de Espaço e Tempo, explicação que se estende até altas horas da noite, unindo almoço ao jantar — pode ser incluído por facultar a qualquer pen- sador elucidação completa acerca da vida material e espiritual do homem, e a Existência Primária e puramente espiritual de Deus.
26.INDAGAÇÕESFILOSÓFICASDE PHILOPOLDO
Philopoldo havia ouvido várias dissertações a respeito do as- sunto quando de sua visita à casa do velho Marcus, em companhia de Kisjonah, acreditando que assim fosse; era, entretanto, um in- telectual, embora de boa índole, e não se satisfazia com a simples fé, desejando provas obtidas por princípios matemáticos. Externan- do suas falhas no conhecimento, diz ele, após o almoço: “Senhor, acredito em tudo que assisti; compreendo e assimilo, porém, muito pouco de tais assuntos, não obstante meu esforço intelectivo, fato que muitas vezes oprime minh’alma! Por isto decidi abordar-Te na primeira oportunidade, e caso fosse de Teu Agrado, desejava maiores explicações de Tua parte.”
Digo Eu: “Se bem que vos prometi enviar e espargir o Meu Espírito sobre vós em futuro próximo, conduzindo-vos à Verdade e Sabedoria totais, sendo, pois, necessário terdes paciência — aju- dar-te-ei em teu zelo honesto, de Própria Boca, tanto mais quanto passarei o inverno aqui até a Páscoa; podes apresentar tuas dúvidas e caso não sejam abordados todos os problemas, haverá tempo em outra ocasião. Tão logo tivermos terminado a refeição, poderás te fazer ouvir, porque ficaremos sentados à mesa. Caso for do desejo de Meus discípulos, poderão amanhã visitar por alguns dias suas famílias; quem não tiver familiares poderá ficar, especialmente João e Matheus, que terão de copiar vários ensinamentos.” Nesta altura Judas pergunta o que deve fazer.
Dou-lhe, pois, o seguinte conselho: “Tens a maior posse en- tre todos, além disto, mulher, filhos e empregados; portanto, tua necessidade de ires a casa é premente e poderás voltar pela Páscoa!”
Minha sugestão não é do agrado de Judas; como ninguém o convide a ficar, parte no dia seguinte. Os outros também o fazem; voltam, no entanto, após alguns dias, permanecendo Comigo, com poucos intervalos. Em seguida Kisjonah serve um vinho especial, por ele cognominado “Amado de Noé”; isto entusiasma Philopoldo de tal modo, começando a externar seus escrúpulos com modéstia.
“Senhor”, diz ele, “meditando acerca de Teus Ensinamentos em casa de Marcus, chego à conclusão de existirem limite e cálculo para Tempo e Espaço, idênticos na Terra através de certos períodos e fatos; em si, porém, são eternos e infinitos, o que em síntese é o mesmo. Sendo isto uma realidade, não entendo os escritos dos anti- gos sábios e teósofos que afirmavam achar-Se Deus, como Origem de toda vida, fora de Tempo e Espaço. Como admitir-se tal axioma num período eterno, sem começo e sem fim, e na existência dum Espaço Infinito nas mesmas condições?!
Se, portanto, Deus existe fora de Espaço e Tempo, a razão humana mais apurada só pode ter a seguinte noção de Deus: ou Ele não existe pelo motivo de não haver possibilidade de vida fora da Eternidade e do Espaço Infinito, ou Deus vive como nós todos
dentro de ambas as definições, sendo a maior loucura aquilo que os antigos sábios afirmavam.
Tu Mesmo me dás tal prova; pois ninguém poderá negar, após ter ouvido Tuas Palavras e assistido a Tuas Ações, abrigares a Plenitude da Divindade. Qual seria o teósofo capaz de afirmar não Te encontrares conosco dentro de Espaço e Tempo? E caso o fizer, terás perdido Tua Entidade Divina: deixarás de ser Deus, mas apenas homem excepcional que conseguiu, pelo nascimento, gênio, talento extraordinário, prática na formação da vontade e finalmente, pela aprendizagem de artes e ciências ocultas, dar-se o cunho de um deus para os homens de boa índole. Teus Atributos, porém, mormente Teu Modo de agir, são tais que impossibilitam alcançar-se sua con- quista pelas condições acima. Assim sendo, desejava ouvir de Ti o que é realmente verdade.”
27.AMATURAÇÃODA CRIATURA
Respondo: “Tua pergunta foi bem formulada dentro da capa- cidade intelectual; entretanto, afirmo estarem os sábios remotos tão certos, ou ainda mais certos que tu! Acaso duvidas poder-se existir perfeitamente em Tempo e Espaço e, ao mesmo tempo, fora deles?”
Diz Philopoldo: “Sim, posso acreditá-lo, mormente Tu o afir- mando! Já esclareci anteriormente não haver objeções a fazer contra tudo que dizes e demonstras; trata-se apenas da compreensão. Uma fé religiosa e pura é para mim qual ultraje contra toda razão, lógica e reflexão humanas, que por certo nos foram dadas por Deus como luz espiritual, única faculdade pela qual o homem consegue reco- nhecer-se a si mesmo, o mundo exterior e finalmente Deus. Assim sendo, sou de firme convicção não dever ele satisfazer-se com a fé cega naquilo que afirma um sábio ou outra qualquer pessoa, dotada de conhecimento em todas as esferas e coisas, e sim deve procurar uma compreensão justa daquilo que aceitou pela crença.”
Concordo: “Tens plena razão; existem apenas alguns senões a serem considerados. Vê, para tudo que existe nesta Terra e até mes-
mo no mundo dos espíritos é preciso uma certa maturação, e esta necessita de determinado tempo! Observa no inverno uma macieira ou videira! Onde está o fruto maduro e saboroso?! Só na primave- ra, quando luz e calor solares se tornam mais intensos, os brotos começam a ficar cheios de viço e mais suculentos, e em breve per- ceberás folhas e flores. Não demora fenecerem, porque são desne- cessárias na obtenção da finalidade mais elevada, apresentando o princípio do fruto.
Indagas: Mas que comparação é esta?, e Eu te digo: este qua- dro corresponde à fé infantil e religiosa da criatura, onde ainda não se pode falar do amadurecimento. Pois Deus é a Máxima Ordem, e tudo que ocorre no mundo tem seu tempo correspondente a Ela.
No início a criança balbucia; pouco a pouco surge a fala e quando se torna mais desenvolvida, os adultos lhe ensinam certas palavras, que ela repete. Acredita em tudo que se lhe diz; ainda não pergunta pelo porquê. Na base da fé religiosa aprende uma quanti- dade de coisas até a adolescência, quando começa a raciocinar, pro- curando a razão daquilo que aprendeu; por enquanto é pouco o calor da vida psíquica, assemelhando-se ao princípio de fruto.
Quando em pleno verão surge a força integral da luz e do calor solares, penetram a base do fruto, que o dilatam mais e mais, fermen- tando os humores projetados. Ele cresce e se enche de líquidos refina- dos, o que facilita a penetração da luz, realizando o amadurecimento.
O mesmo se dá no homem: antes que o calor de seu amor interno não tiver alcançado o mais elevado grau e sua luz o penetre inteiramente, ele dificilmente compreenderá as verdades espirituais, não obstante as melhores explicações externas; quando for penetra- do pelo crescente calor e luz internos da vida, qual uva madura, estará apto e terá dentro de si a explicação mais extensa de todas as suas dúvidas anteriores.
Já te aproximando do amadurecimento, pode-se facultar-te maior luz e calor, do imenso Sol da Graça, de onde surgem e respi- ram todos os Céus e seus habitantes, bem como os mundos mate- riais e aquilo que comportam. Presta, pois, atenção!”
(O Senhor): “Há um ano atrás foste psiquicamente por Mim levado a um Sol muito longínquo, ocorrência que mais tarde foi re- petida em outras ocasiões e locais, de que todos os Meus discípulos são fiéis testemunhas, e também estiveste presente quando o anjo foi buscar a preciosa e luminosa bola de fogo da África Central.
Projetando uma flecha na maior velocidade desta Terra, não terás como exímio matemático a cifra correspondente aos anos ter- ráqueos necessários para ela alcançar aquele mundo solar, entretanto deu-se teu transporte daqui para lá num átimo! Assim sendo, nada tiveste a ver com o espaço terreno, encontrando-se tua alma fora de Espaço e Tempo.
Levarias mais de dois anos, por um caminho bem traçado, a distância da casa de Marcus até a África; para o anjo, ida e volta eram idênticas, portanto Tempo e Espaço nada lhe representaram! Pros- sigamos: imagina a maior velocidade de um objeto que, por exem- plo, fizesse o percurso da distância desta Terra até o mencionado Sol num instante — um espírito poderia transpor num momento uma distância mil vezes maior, por inúmeras vezes; menciono este cálcu- lo por não conheceres número correspondente aos movimentos de ida e volta.
Daí se deduz claramente não poder, jamais, haver relação en- tre a maior velocidade terráquea com a espiritual; por isto tanto uma quanto outra são fatores completamente peculiares. Ambas só têm relações correspondentes entre si, enquanto divergem pela proprie- dade de modo substancial, que se estende até o Infinito. Aperceben- do-te de tal divergência entre tudo que seja terráqueo e espiritual, aceitarás a mesma diferenciação existente entre tudo que se te apre- senta pelos sentidos.
Em relação ao movimento, que desconsidera o Espaço, a rapidez de teu pensamento faculta ótimo exemplo. Imaginando a cidade de Roma, onde já estiveste, conhecendo seu tamanho e dis- tância, lá estás em pensamento, observando suas praças, jardins e
arrabaldes. Teu pensamento, no entanto, não necessita de tempo para te projetares até lá, por não existir Espaço para ele.
Isto te faculta outra confirmação de encontrar-se tua alma em atividade, como ser espiritual, além de Espaço e Tempo, e tu bem podes projetar-te em pensamento ao Sol mencionado, voltan- do na mesma velocidade, sem necessitares de maior tempo na proje- ção pelo Espaço Infinito. Convirás, portanto, não poder existir nem tempo nem Espaço para o Espírito puro.
O Espírito de Deus e de todos os anjos também Se acham no Espaço Infinito e perdurarão por todas as épocas eternas; pois sem o Espírito Divino não haveria criatura, nem espaço e tempo terre- nos. Entretanto, tais poderes puramente espirituais e as inteligências mais elevadas ultrapassam ambos, de modo inconcebível.”
29.AMEDIDADA FORÇA
(O Senhor): “Observemos, além disto, a medida de uma for- ça puramente espiritual em confronto com a maior potência terre- na. Qual será o resultado? Vê, existem no Espaço Infinito mundos solares tão colossais, que em relação à nossa Terra esta poderia ser comparada qual grãozinho de areia perto do planeta! Quando nas estepes arenosas sopra o vento, a areia é compelida com facilidade
e um tufão fá-lo-á tanto mais facilmente com massas enormes! Calcula, pois, um forte vento no mencionado Sol gigantesco! Por certo faria um joguete com planetas iguais ao nosso! Conjecturas, no teu intelecto mundano, que neste caso se deveria sentir o seu efeito até aqui; e Eu te afirmo ser isto às vezes o fato, não só na Terra, mas ultrapassando a mesma.
Certamente já viste estrelas cadentes, das quais algumas, não raro, são tão grandes que poderiam ser chamadas de peque- nos planetas. Trata-se geralmente de poeira cósmica, expelida por erupções subterrâneas através de tremendos tufões provindos de corpos solares; esta poeira cósmica pouco a pouco volta para lá pelo forte poder de atração, a não ser que se aproxime em demasia
de outro corpo cósmico, onde também pode ser atraída, fato, po- rém, incomum.
Tens aí a demonstração da potência colossal das forças da Natureza em ação no Espaço Infinito. Poderás potenciar estas e mais outros elementos da Natureza ininterruptamente, durante milhões de anos: o resultado final da máxima potência de energia, compara- da à Onipotência Divina, será um nada perto de algo real, ou seja, uma mentira em confronto à verdade. De modo idêntico, não há relação admissível entre a máxima potência da Natureza comparada a qualquer espírito puro.
Não havendo, pois, em Espaço e Tempo, força que se meça com a dum anjo, esta força espiritual encontra-se acima de ambas as definições, muito embora esteja individual e independentemente dentro de Espaço e Tempo, apenas em contato com eles por uma correspondência interna e viva, que tudo guia.
A fim de demonstrar mais claramente a infinita supremacia da força divino-espiritual acima de todas as demais energias da Na- tureza, basta Eu te dizer: se todas as forças poderosas da Terra se pro- jetassem impetuosamente pelo Espaço Infinito, durante miríades de milhões de anos terráqueos, não seriam capazes de destruir um átomo da Força do Poder Divino; entretanto, isto poderia suceder pela Permissão de Deus, a ponto que bastaria um espírito angelical querê-lo — e todo Espaço Infinito estaria isento de criaturas mate- riais, incluindo toda constelação cósmica.
Agora dize-Me, Philopoldo, se percebes a maneira pela qual Deus e tudo que seja celeste e puramente espiritual possam estar fora de Espaço e Tempo, entretanto existem efetivamente, porque sem eles não poderia ter surgido criação material!”
30.AFORÇADA LUZ
Diz Philopoldo: “Senhor, está se fazendo, em mim, pequena luz, mas diante de Tua Imensa Sabedoria começo a ficar tonto! Ain- da assim, peço-Te prosseguires!”
Continuo: “Como não; mas presta atenção, para que o pos- sas compreender e assimilar em tua alma! Passemos agora à luz! Ob- serva a iluminação desta lamparina de nafta: sua luz clareia o grande quarto de tal modo que nos vemos perfeitamente. Acaso cem lampa- rinas não facultariam iluminação cem vezes mais forte? Concordas, em virtude de experiência feita por ocasiões festivas! Agora imagina milhões de tais luzes em cima de uma montanha! Não iluminariam uma zona extensa? Ainda assim, não poderiam ser comparadas com a luz da lua cheia, que embora não impressione pelo tamanho, con- segue iluminar metade do planeta de uma só vez. Mas que seria tal luz comparada à do Sol?!
Calcula todo Firmamento coberto pela luz solar! Haveria mortal capaz de suportá-la, por um só momento, sem ser dissolvido qual gota d’água em cima de aço incandescente? Afirmo-te que seu efeito e o calor indescritíveis seriam tais a finalizar a existência, não só de nosso planeta, como a de muitos milhares! Percebes a colossal diferença entre a luz desta lamparina e a de um Sol?
Existem, porém, no Espaço Imenso, sóis centrais miríades de vezes maiores que o nosso, cujo tamanho excede a Terra por um milhão de vezes. Esses sóis centrais irradiam proporcionalmente luz muito mais extensa e forte, a ponto que, em sua proximidade, sóis idênticos ao nosso seriam dissolvidos como gota d’água em aço in- candescente.
Se fosses potenciar a força da luz de nosso Sol até o infinito, encontrarias a mesma relação que achaste na comparação do mo- vimento e da força energética. Se, portanto, a Luz Divina jamais poderá ser alcançada em Espaço e Tempo, deduz-se claramente que tanto Ela quanto Seu Calor de Amor Vital, jamais calculáveis, surgi- dos da Luz, só podem Se achar fora de ambos.
Que, entretanto, existe uma correspondência cheia de vida e constantemente ativa entre a Luz Original de Deus e a luz do Sol, parcialmente criada, podes concluir pelo fato de conter a luz solar a força vital para as criaturas nos corpos cósmicos e planetas, o que nos prova a primavera de todos os anos. Compreendes melhor como
e de que maneira tudo que é puramente espiritual só pode estar fora de Espaço e Tempo?”
31.ANATUREZADIVINAEHUMANADO SENHOR
Diz Philopoldo: “O exemplo da luz elucidou-me bastante; no fundo, porém, perdura muita coisa oculta, disto fazendo parte Tua atual Presença Divina, da qual só posso dizer: se Tu antes da en- carnação habitaste como Jehovah num Céu fora de tempo e espaço com Teus anjos, este Céu deve atualmente estar desprovido de Tua Presença Pessoal, porquanto Te encontras em nosso meio dentro de Espaço e Tempo! Como podes existir como Homem dentro destas definições, e como Deusfora das mesmas, a um só tempo? Senhor, eis um abismo intransponível para minha razão; por isto Te peço certo esclarecimento a respeito!”
Respondo: “Sendo tu sábio do mundo dentro da filosofia de Platon, Sócrates e Aristóteles, tenho de usar sua terminologia, para que Me compreendas melhor.
No que diz respeito ao Meu Eu Divino, não existe diferença entre ‘desde eternidade’ e ‘agora’, referindo-Me ao Meu Ser Intrín- seco! E se assim não fosse, não teria Poder e Força sobre a Criação material em a Natureza; pois todas as criaturas, inclusive seu tempo e espaço, têm relação subjetiva para Comigo, Seu Objeto, porque tudo surgiu de Mim e não vice-versa.
Por isto Eu Sou sempre o Único Ser Precedente e Original, isto é, Objeto Eterno, e jamais, e em hipótese alguma, poderei entrar numa relação subjetiva com a criatura.
Entretanto, por ter tudo surgido de Mim e Eu, através de Mi- nha Vontade, ser em tudo a razão intrínseca na qualidade de Prin- cípio que tudo conserva, guia, orienta, equilibra e vivifica — Sou, dentro do Poder de Minha Vontade e Sabedoria, também Subjeto, portanto o Alpha e Ômega, ou seja o Princípio e o Fim, igualmente o Começo e o Final de toda criatura; em consequência desta Minha Faculdade objetiva e, ao mesmo tempo, subjetiva, posso muito bem
existir como Homem entre vós, pelo Poder de Minha Vontade e Sabedoria, sendo contudo o Objeto Eterno, Único, Vivo e Criador, frente à Criação!
Como Subjeto atualmente Humano (homem), Sou Pesso- almente Inferior e Submisso ao Próprio Objeto Eterno dentro de Mim, muito embora completamente Uno com Ele através de Mi- nha Rigorosa Sujeição, pois sem tal Subjetividade Rigorosa de Mi- nha Pessoa Individual, jamais seria possível União tão estreita.
Eis o efeito de Meu Amor desmedido para com o Objeto e igualmente Seu Amor Imensurável a Mim, de sorte que Eu e o Pai somos Umsó Amor, UmaSabedoria, Uma Vontade, Umavida e UmPoder, pois sem Ele não existe outro Poder em todo o Infinito. Deste modo, estou atualmente dentro de Espaço e Tempo, e igualmente Presente fora de Espaço e Tempo.
Vedes, portanto, existir Eu convosco dentro de Espaço e Tempo; o fato de Minha Existência Intrínseca fora de ambos pro- vam Minhas Obras, que Eu não seria capaz de efetuar caso Me en- contrasse com o Meu Espírito Divino apenas em Espaço e Tempo. Pois esses são limitados por todo sempre, portanto imperfeitos e in- completos; somente aquilo que existe fora de Espaço e Tempo é em tudo ilimitado, perfeito e completo. Elucidar-te-ei esta teoria com vários exemplos para provar-te não ser possível de forma diversa! Presta, pois, atenção!”
32.OESPÍRITODENTRODA NATUREZA
(O Senhor): “Tomemos um grão de trigo em sua unidade e simplicidade: seu destino é evidentemente duplicado; primeiro, serve de alimento às criaturas, e segundo é destinado como semente à produção e multiplicação próprias. Como alimento, transmite ao físico e, através deste, ao corpo substancial da alma suas múltiplas qualidades específicas, passando deste modo como vegetal a uma existência mais elevada e livre. Como se dá tal passagem sabereis na íntegra apenas quando renascidos em espírito, se bem que também
aqui, mas não de modo completo — porquanto sob a influência deste Sol nada perfeito pode existir, sendo todo saber e conhecimen- to mais ou menos imperfeitos — tanto mais, porém, no mundo dos espíritos, onde vos encontrareis espiritualmente fora da encar- nação, de espaço e tempo, e vossa visão, conhecimento e saber serão completos.
Analisemos este grão de trigo apenas como semente, para veri- ficarmos como a emanação espírito-divina, se bem que aparentemente subjetiva, no fundo se encontra objetivamente fora de espaço e tempo.
Eis uma haste de trigo, produzindo geralmente três espigas, cada qual com trinta grãos. Depositando este grão num bom solo, recompensar-te-á no ano seguinte o trabalho havido, com cem grãos da mesma espécie. Se tomares esta colheita, plantando-a num solo fértil, lucrarás dez mil grãos idênticos. No terceiro ano obterás cem vezes dez mil, considerável quantidade de trigo.
A fim de plantá-la necessitarás de campo vasto e a colheita te dará cem vezes mais que a última. No ano subsequente precisarás de um campo cem vezes maior, colhendo dez trilhões de grãos; se assim continuares durante dez anos, lucrarás quantidade tão colossal, que seria indispensável um campo que atingisse metade do orbe.
A multiplicação infinita, repetindo-se na mesma relação, po- derá ser estendida a cem, mil e mais anos, e pelo cálculo verificarás que, após alguns séculos, milhões de planetas não seriam bastantes a fim de servirem de campo à quantidade tão colossal de trigo; pois tal multiplicação pode ser levada a efeito por todo Infinito! Acaso isto seria possível se nesse e em todos os demais grãos não existisse o número infinito através do elemento espírito-divino, fora de espaço e tempo?! Por certo que não!
O que existe neste grão também se encontra em todas as se- mentes e vegetais, nos animais e mormente no homem de semelhan- ça divina, razão por que pode se tornar inteligente e compreensivo; possui o dom da fala e no início sente seu Criador e mais tarde consegue assimilá-Lo cada vez com maior pureza, podendo amá-Lo, sujeitando sua vontade à Divina.
Eis a emanação puramente espiritual e de semelhança divina dentro do homem, igualmente fora de espaço e tempo; pois se fosse algo sujeito a ambos, a criatura não seria capaz de ter noção de si e de Deus, portanto completamente inapta a qualquer educação. Jamais chegaria à razão, a raciocinar nem pressentir o menor vislumbre de Deus, não poderia muito menos ainda conhecê-Lo, amá-Lo e se submeter à Sua Vontade, e seria apenas a casca externa e morta do ovo, não tendo vida em si e muito menos vida espiritual e eterna, fora de espaço e tempo.
Julgo ter esclarecido suficientemente este assunto que tanto te preocupou dentro de um esclarecimento racional. Depende de teu critério se realmente crês ter assimilado tudo na justa compreen- são, ou se ainda perdura alguma dúvida. Na última hipótese poderás te externar; do contrário, deixaremos de lado as explicações a respei- to, tomando algum vinho com pão!”
33.CÉUE INFERNO
Obtempera Philopoldo: “Senhor, eu e por certo todos os outros agradecemos-Te do fundo do coração por esta explicação tão estupenda e maravilhosa, acerca de ensinamentos dos sábios da antiguidade. Naturalmente poderei compreendê-lo melhor quando estiver livre de todos os elementos materiais.
Basta aceitar a maneira pela qual se consegue viver realmente fora de espaço e tempo e igualmente dentro de tais conceitos. Dese- java apenas ouvir de Ti, em poucas palavras, onde se encontram Céu e inferno. Pois consta: Estessubirão ao Céu, aqueles serão atirados ao inferno!”
Respondo: “Vê, nesta cadeira que ocupas podem encontrar-se Céu e inferno, bem juntinhos; no Reino dos espíritos são eles afas- tados por um abismo imenso! Digo mais: aqui onde Me encontro convosco está o Céu mais elevado, isto quer dizer que estamos ‘em cima’, e ao mesmo tempo também se acha presente o inferno mais profundo e maldoso, representando o que é ‘embaixo’.
O espaço material não produz diferença, e sim unicamente o estado espiritual, que nada tem de comum com aquele; pois no Reino dos espíritos existe apenas afastamento real o que se relaciona ao estado psíquico. O local ali nunca poderá exercer importância. Exemplificarei o assunto para facilitar-vos a compreensão.
Suponhamos estarem sentados neste banco dois homens: um sábio religioso, cujo espírito lúcido é conhecedor de muitos segre- dos acerca dos efeitos das Forças Divinas no mundo da Natureza; o outro, perverso malandro, apenas se espreguiça, deixando-se servir como honesto, com pão e vinho, para positivar suas forças a fim de poder mais facilmente praticar suas maldades. Referindo-se ao local, estão eles bem juntos, mas infinitamente afastados um do outro, pelo espírito!
Admitindo haver outro sábio distante deste a umas mil jor- nadas, seriam eles materialmente afastados, porém no Reino espi- ritual completamente unidos, conforme acontece literalmente no Meu Reino.
Disto se deduzirá claramente que, para todo homem bom, existe o Céu onde se encontra, e todos os bons e puros estarão bem próximos dele. Portanto não se poderá dizer: Aqui ou acolá, talvez acima de todas as estrelas está o Céu, e alhures, no fundo da Terra, o inferno!
Tudo isto não depende deste tempo e espaço e tampouco se prende à cerimônia externa, usual no Templo, porquanto só existe dentro da criatura. De acordo com sua vida íntima será seu mundo no Além, criado por ela mesma e onde viverá, bem ou mal.
Todos aqueles que estão dentro da Verdade — portanto na Luz verdadeira provinda do Meu Verbo através de sua fé viva e sua ação complementar — terão no Meu Reino um mundo idêntico na medida perfeita e num aumento eterno daquele que construíram aqui; os que de vontade própria se acham no erro e no mal terão o mundo correspondente numa crescente relação. Pois assim como um homem bom se torna sempre melhor, um mau piora constante- mente, afastando-se do bem, fato comum no mundo.
Observai aqueles cujo orgulho os satura com a inclinação para o domínio! Tão logo tiverem subjugado milhões de criaturas a escravos miseráveis através de seu poder tirânico, reúnem ainda maiores hordas guerreiras invadindo outros reinados, dominando-os e tirando-lhes suas terras, povos e tesouros. Se deste modo consegui- ram conquistar e infelicitar metade do orbe, julgam-se semelhantes a Deus, elevando-se acima Dele; deixam-se adorar e ameaçam com castigos horrendos àqueles que se atreverem a venerar outro deus que não o Czar, a quem unicamente fazem oferendas e sacrifícios. Temos disto exemplo concreto no Rei da Babilônia Ne bouch kaduc czar (Não existe outro deus além de mim, o Rei), e ora se demons- tra nos sumos sacerdotes, fariseus e escribas, que também se julgam deuses, procurando matar-Me, fato que lhes será concedido — mas só por três dias; em seguida ressuscitarei de Meu Próprio Poder, en- quanto eles cairão no julgamento e fim.
Daí podereis perceber que o maldoso sempre se torna pior, assim como o bom melhora constantemente, com a única diferença em ser imposto um limite ao primeiro, onde consta: Até aqui, e não mais além! — Em seguida, haverá sempre um grande julgamento final, facilitando aos maldosos a refletirem, podendo assim ingressar em outra direção.
Esta demonstração referente ao mundo ocorre também no inferno, com a diferença que lá — ou seja, no Reino espiritual — os bondosos, humildes, pacientes e confiantes em Deus são separados para sempre, e apenas os maus têm sua manifestação hipócrita e per- versa, conquanto fútil, por ser sua luz, mentira, engano e aparência completamente fictícia qual sonho dum glutão rico e bêbedo. Pre- sumo estardes todos orientados neste ponto, de sorte que podemos passar o resto da noite alegres e felizes! Caso alguém tenha um pedi- do a fazer, teremos tempo até a Páscoa, pois até lá desejo ficar com Meu amigo Kisjonah. Estás ciente de tudo, Philopoldo?”
Responde este: “Por enquanto; pois fizeste o incompreen- sível de tal forma acessível, que não me resta pergunta a fazer, e presumo dar-se o mesmo com os outros. Isto só é possível partindo
de Ti; pois todos os sábios teriam levado considerável prejuízo em tal tentativa! Por certo podes ler nosso agradecimento no coração.”
Expressa-se um dos neogregos: “Realmente, só podia dar tal explicação Aquele que tudo penetra com o Seu Espírito e é Tudo em tudo! Eis a prova maior e mais convincente para Tua Missão puramente divina. Os milagres produzem muito efeito quando efe- tuados a Teu Modo; entretanto, são certo impedimento à evolução. A palavra vivifica e liberta a alma e vale mais que mil provas que a preenchem de pavor. Por isto, aceita também minha gratidão pelo ensinamento elevado!”
Acrescento: “Julgaste bem, amanhã haverá outro assunto; agora sejamos alegres, até ao amanhecer. Ninguém necessitará dor- mir nesta noite.”
34.AGRANDE PESCA
Fazem-se muitos comentários entre os discípulos, os gregos e Philopoldo, enquanto palestro com Kisjonah acerca do antigo sacer- dócio, os sábios patriarcas, os melhores governadores, em compara- ção com os de Minha Época, aproximando-se destarte a manhã sem que alguém tivesse impressão de ter dormido pouco. Alegremente vamos todos à praia, observando os pescadores atarefados, no entan- to obtendo pouco êxito na pesca. Alguns dentre eles manifestam seu descontentamento, porque desde meia noite estão se cansando, mas o vento que sopra do Oeste impele os peixes para o fundo do mar. Kisjonah pergunta-lhes o quanto pescaram.
Respondem eles: “Enchemos alguns pequenos depósitos; mas que representa isto para quarenta barcos?”
Intervenho: “Remai para alto mar e atirai novamente as re- des; pois é melhor pescar-se quando surge o Sol!”
Concluem os homens, que Me desconhecem: “Amigo, sabe- mos disto; esta ventania é prejudicial, principalmente no inverno, embora todos os ventos sejam nocivos!”
Aconselho: “Fazei o que vos disse, que fareis boa pesca!” Obedecendo, eles avisam aos outros, que entretanto dão de ombros. Ouvindo ser esta a ordem de Kisjonah, eles fazem a redada, conse- guindo resultado formidável, e os melhores peixes quase rasgam as redes, necessitando de muito cuidado para guardar tudo nos depósi- tos. É natural a admiração dos pescadores, pois nunca lhes sucedera isto. Mais tarde Kisjonah os informa Quem dera motivo para tal. Todos acabam por acreditar em Meu Nome, embora alguns Me re- conheçam como Filho do carpinteiro José.
E assim se passa metade do inverno com vários ensinamentos e pequenas ações úteis, não merecendo serem mencionadas porque geralmente se referiam ao bem comum. A chegada de Maria, Minha Mãe, também não trouxe ocorrências importantes, a não ser que estava feliz por rever-Me, deixando que os discípulos lhe contassem tudo que Eu havia feito e falado. Gravou tudo em seu coração, me- ditando e agindo de acordo. Também os dois filhos mais velhos de José vieram a Kis a fim de construírem uma casa, onde Eu Mesmo os ajudei em tudo. Na proximidade das festas da Páscoa muitos come- çam a entregar-se aos preparativos para a ida a Jerusalém, e Kisjonah indaga se pretendo fazer o mesmo.
Respondo-lhe: “Irei conforme prometi, sem comparecer às festividades, muito menos no Templo; em breve voltarei à Galileia para reiniciar Minha Missão!”
Propõem os neogregos: “Se Tu, Senhor, fosses ao Templo para fazer discurso idêntico ao do ano passado, talvez muitos tem- plários fossem alertados e acreditassem em Ti, como nós?”
Esclareço-os com bondade: “Não vos preocupeis, pois ain- da doutrinarei várias vezes no Templo; porém, dos atuais fariseus, anciãos e escribas nenhum será alertado, tratando de sua bem-aven- turança, e sim tudo farão para prender-Me e matar-Me! Para tanto ainda não chegou o tempo; pois sei muito bem o que fazer.” Confor- mados por tal explicação todos se calam. Apenas um episódio antes da partida merece ser mencionado e trata-se da volta de Judas.
35.JUDASISCARIOTESEMCASADE KISJONAH
Todos já estavam convictos de que aquele discípulo não mais voltaria, porquanto não se apresentara aos conhecidos durante o percurso da estação. Súbito ele aparece de surpresa, quando nos en- contrávamos almoçando. Cumprimenta a todos e Kisjonah o con- vida à mesa e Judas aceita sem cerimônia. Kisjonah, homem mui amável e sincero com todos, dirige-se a ele perguntando pela família e o que tinha feito em casa. E o discípulo começa a se estender acerca das vantagens obtidas para os familiares, através de seus trabalhos artísticos, mormente por ter realizado várias encomendas de utensí- lios caseiros por parte dos ricos, de sorte que o lucro proporcionara equilíbrio financeiro durante vários anos. Assim, relata estas e outras mais vantagens inacreditáveis.
Os demais discípulos perdem a paciência e o próprio Pedro, geralmente calado, lhe diz no final: “Escuta, se do teu relato apenas a metade for verídica — o que duvido — deves ser quase tão abastado como nosso amigo Kisjonah, e não vejo por que te decidiste voltar e talvez pretendas acompanhar-nos! Não seria mais prudente ficares em casa para te tornares mais rico?”
Responde Judas: “Isto não compreendes! Gosto de trabalhar, uma vez que esteja na olaria; entretanto, não posso impedir que a recordação dos fatos aqui ocorridos me afastem da oficina. Não sou tão ignorante como julgais, do contrário não estaria aqui! Sinto grande atração pelo vosso meio, mormente do Senhor; mas caso me torne importuno, basta dizer-me, que voltarei donde vim e continu- aremos os mesmos bons amigos!”
Protesta Pedro: “De modo algum; podes ficar à vontade. Criti- co tua falta de consideração quanto à Onisciência patenteada de Deus, pregando-nos uma grossa mentira referente aos teus grandes lucros ha- vidos, sabendo pelo Senhor que jamais uma inverdade deveria passar por nossos lábios. Como procedes desta forma, pois és tanto quanto nós convocado por Jesus?” Diz Judas: “Como provarás que menti?”
Diz Pedro: “Muito facilmente! Primeiro, minh’alma foi ilu- minada pela Graça do Senhor, a ponto de saber se alguém fala a verdade ou não; além disto percebo, neste momento, que dentro em breve surgirá uma prova evidente de tua mentira! Tua bazófia não nos beneficia, nem prejudica; convém, no entanto, refletires se tal atitude se justifica na Presença do Senhor, no Qual alegavas acredi- tar como nós!” Confundido, Judas se cala, pois sente-se descoberto.
Não demora chegarem alguns jovens à casa de Kisjonah pe- dindo esmolas — e ele os faz entrar. Quando Judas os avista, vira o rosto para não ser reconhecido, pois trata-se de seus filhos mais ve- lhos: uma menina e três rapazes. Inquiridos pelo anfitrião, eles pres- tam informações, que não honram o seu genitor. Kisjonah, então, lhes diz ter ouvido falar que precisamente nesta temporada Judas teria ganho muito dinheiro pelo zelo em seu ofício.
Os jovens, porém, contestam dizendo: “Nosso pai havia pre- parado algumas coisas para o mercado; mas quando lá chegou, foi envolvido numa grande briga entre comerciantes gregos e judeus, quebrando-lhe toda louça. Deste modo, voltamos a casa numa po- breza completa e nosso pai nos aconselhou procurarmos a misericór- dia alheia, porquanto ele nada podia fazer por nós; entrementes iria juntar-se ao Mestre milagroso, conseguindo talvez ajuda para nós e nossa mãe. Por isto te pedimos que te compadeças de nós.”
Kisjonah prossegue perguntando: “Há quanto tempo o pai vos deixou?” E eles respondem que deveriam ter passado uns oito dias que não viam o genitor. Em seguida, Kisjonah os leva a um ou- tro quarto, onde lhes faz dar roupas e comida, enquanto eles davam a entender sua aflição e de sua mãe, porque ignoravam o paradeiro de Judas. Kisjonah os acalma, afirmando encontrar-se aquele em sua casa, e que dentro em breve haveriam de vê-lo.
Em seguida Kisjonah se aproxima de Judas e lhe diz: “Amigo, longe de mim eu te querer fazer reprimendas, mas tu na certa tens de mim o mesmo conceito de todo o mundo da redondeza — por que não me confessaste tua situação aflitiva? Teus filhos são mais sinceros
e muito preocupados contigo, ao passo que tu lhes viraste as costas! Acho isto muito estranho e desejava saber tuas razões a respeito!”
Judas, suspirando profundamente, diz: “Amigo, queria ape- nas abafar o meu coração oprimido com fanfarronices! O resultado, no entanto, foi prejudicial, pois o castigo acompanhou minha mal- dade qual serpente veloz, a ponto de me achar coberto de vergonha diante de todos. Deixa juntar-me aos meus filhos para confortá-los e com eles chorar as minhas mágoas!”
Digo Eu: “Ainda não! Alimenta-te primeiro, e no futuro não pronuncies mais mentiras, senão te sucederá coisa ainda pior!” Judas segue o Meu Conselho, todos começam a palestrar com ele e Kisjonah lhe promete cuidar dos filhos, sem culpa de sua desdita, que cabia apenas a Judas. Assim este episódio é resolvido e apenas mencionado a fim de demonstrar a verdadeira índole de Judas.
36.PARTIDADEKISECHEGADANAHOSPEDARIADE LÁZARO
Minha Própria Mãe se vira em seguida para Judas, dizen- do: “Se continuares deste modo, sem jamais modificares teu caráter, teu fim será um horror para muitos, perdurando na recordação até a época final desta Terra. Trata, pois, de poder viver ao Lado do Senhor! Nunca tive bons sonhos com tua pessoa e também sei o motivo! Por isto repito: tem cuidado!” Tais palavras calam profun- damente nos corações de todos.
Após a refeição visitamos o lar de Maria e sua vivenda, que lhe fora dada por Kisjonah. Tudo se acha na melhor ordem. Existe ali uma pequena escola onde Maria ensinava coisas úteis às crian- ças pobres, motivo por que era mui estimada em toda redondeza. Também curava muitos doentes através de passes e preces em Meu Nome. Tal atitude abençoada se estendia para todos e Kisjonah a considerava uma verdadeira joia.
No dia seguinte, isto é, quinta-feira, três semanas antes da Páscoa, despedimo-nos de Kisjonah com a promessa de visitá-lo em
breve. Ele manda preparar um de seus melhores navios, no qual partimos com bom vento. Kisjonah, Philopoldo e Maria nos acom- panham além-mar até a beira do Mar Galileu, no ponto em que o Jordão desemboca para, do lado esquerdo, dirigir-se ao Mar Morto através dum longo vale em direção do Este. Dali segue-se por uma estrada boa para Jerusalém, da qual hoje em dia nada mais se des- cobre, o que também ocorre com todos os lugarejos daquela zona, porquanto o Mar Galileu hoje está reduzido para um terço.
No desembarcadouro havia uma alfândega onde se deveria pagar uma pequena taxa, e isto caso a pessoa trouxesse algo para vender. Desembarcamos, abençoamos os que nos acompanhavam e prosseguimos ligeiros, sem parar, até altas horas da noite. Alcança- mos por fim a casa do conhecido hospedeiro, ainda acordado por- que tinha alguns hóspedes.
Nem bem nos avista, movimenta alegremente a casa toda para servir-nos, pois nada tínhamos tomado desde cedo. Como tam- bém estivéssemos bastante cansados, ele sem mais delongas manda preparar uma ceia, e enquanto esperávamos relata ter tido, o bom Lázaro, um forte atrito com os templários, em virtude dos lavrado- res que Eu lhe havia encaminhado de Bethlehem.
Diz ele: “Os fariseus tudo fizeram para conquistá-los a seu favor, mas os homens os enfrentaram com ameaças caso não fos- sem deixados em paz. Surpreendidos com tal atitude, os do Templo acusaram Lázaro de os ter instigado àquilo, fazendo queixa formal junto ao Governador romano. Este mandara chamar Lázaro para se informar do fato real, e em seguida abriu inquérito com os trabalha- dores. Então Lázaro e eles foram absolvidos da culpa, e os templários informados de não incomodarem mais àquele por ser cidadão de Roma. Caso essas ordens não fossem respeitadas, ele receberia um pelotão de soldados para sua proteção. Isto surtiu efeito; duvido, porém, que se tenham tornado amigos dele, não obstante lhe asse- gurarem terem feito queixa dos trabalhadores, e não de sua pessoa. Deste modo, Lázaro está num pé amistoso com o Templo, ao menos aparentemente.”
Digo Eu: “Sabia de antemão que tal sucederia; poderia ter sido diferente, caso a situação tivesse perdurado por algumas sema- nas. Em tal hipótese, teriam surgido sérios atritos entre templários e trabalhadores, por Mim previstos, mas que desviei através de Mi- nha Vontade. Os servos do Templo alimentam rancor oculto con- tra Lázaro; mas isto não importa, porquanto sentem o mesmo para com todos os romanos, gregos, essênios, samaritanos e saduceus. Tal sentimento de revolta é semelhante a um tolo que se exaspera frente a um grande rio, isento de ponte pela qual pudesse alcançar a outra margem. O rio continua o mesmo, não obstante a raiva do ignorante. A mesma situação se dá com ira e rancor dos templários; assemelham-se ao encolhimento e à reação fútil dum verme no pó contra os passos dos camelos que o pisam. Deixemos tal assunto e tu, caro amigo, vê se consegues algo para comer!”
37.OSSÁBIOSDA PÉRSIA
De bom grado o hospedeiro manda trazer a ceia, e nos farta- mos com grande satisfação. Os demais viajantes vindos da Galileia, Grécia, Samaria e outros países, acostumados a pernoitar neste al- bergue por ser seu dono consciencioso, em breve são informados de Minha Presença. Por isto se dirigem a um empregado, perguntando se é possível falarem Comigo; ele transmite tal pedido ao patrão, que diz: “Não posso responder; pois o Senhor é Único e deve-se respeitar a Sua Vontade!”
Ouvindo isto, digo: “Entre os viajantes se acham quatro ma- gos do Egito nascidos na Pérsia, perto da fronteira da Índia. Três dentre eles são idosos e mestres na magia; o quarto apenas discípu- lo. Seu grande séquito está em outros albergues, pois só trouxeram alguns serviçais. Estes magos, há vários anos em função no Egito, podes fazer entrar para descobrirmos suas intenções.”
O hospedeiro transmite tal recado aos outros, que se mos- tram satisfeitíssimos com este convite, porque já haviam ouvido falar a Meu respeito além das fronteiras de Canaan. Assim, diri-
gem-se com o anfitrião para junto de Mim, curvam-se com muito respeito, embora anciãos, saudando-Me de acordo com seu hábito. Conhecedores do hebraico, entram em pronta conversação com os discípulos.
Então lhes digo: “Sou Aquele a Quem desejais conhecer de perto; sentai-vos para palestrarmos!” Uma vez acomodados junto de Mim, indago-lhes: “Dizei-Me abertamente quais são vossas magias e feitiços, que também vos direi o que faço; talvez possamos nos ser úteis reciprocamente!”
Curvando-se, um mago diz: “Mestre, eis aqui nosso sábio mais idoso, cujo nome é Hahasvar (Protetor dos astros), falará por nós! Conta três vezes trinta anos. Eu conto oitenta e este ao meu lado, setenta e nos astros consta que a partir de agora, cada um terá de vida ainda trinta anos. Chamo-me Meilezechiori (Tenho o poder ou visão de medir o tempo), e o nome de meu vizinho é Ou li tesar (Tem o poder de impor sua vontade). O quarto é ainda muito jovem e não possui nome especial. Passo a palavra ao mais idoso!”
Este então começa: “Aqui já estivemos há trinta anos, vindo do Oriente longínquo; fomos despertados por uma estrela peculiar, pois nos astros estava escrito: No Este distante nasceu um Novo Rei num povo pervertido. Sua Mãe carnal é virgem e jamais foi tocada por homem; Seu Filho foi gerado pelo Poder do Grande Deus e Seu Nome será Imenso entre todos os povos da Terra, onde fundará um Reino por Ele eternamente dirigido como Poderoso Soberano. Felizes os que nele viverem, pois a morte não mais terá poder sobre suas almas!
Assim informados, partimos, seguindo a trajetória da estrela; em Bethlehem encontramos realmente, num velho estábulo de car- neiros, uma criança recém-nascida, à qual ofertamos nossas dádivas. De acordo com nossa combinação, tencionávamos regressar à pátria via Jerusalém. Um espírito luminoso nos advertiu, no entanto, de seguirmos por outro caminho e que também deixássemos de denun- ciar ao maldoso soberano a presença do Novo Rei. Obedecemos;
ignoramos, todavia, até hoje, o que sucedeu à criança milagrosa, não obstante nossas indagações.
Pessoas idosas nos informaram ter sido organizado por parte do cruel Herodes um enorme infanticídio em Bethlehem por causa daquela criança, onde todos os meninos entre um e dois anos foram assassinados pela espada; os pais teriam fugido, em tempo, com o menino prodígio para o Egito, escapando da fúria sanguinária do Tetrarca louco. Durante vários anos procuramos o seu paradeiro, sem algo descobrirmos.
Há bem pouco soubemos em Memphis ter surgido um gran- de taumaturgo na Galileia, operando milagres inéditos nesta Terra, e proferindo ensinamentos tão extraordinários, que obrigam aos mais sábios se ocultarem no pó. Muitas pessoas o acompanham, crentes ser ele evidentemente Deus Mesmo, pois do contrário Suas Ações seriam inexplicáveis. A esta informação aqui voltamos à procura de um possível contato com homem tão excepcional, e isto por dois motivos: primeiro, para nos certificarmos pessoalmente de tudo; segundo, descobrirmos se existe relação entre tal homem e aquela criança de Bethlehem.
Muito embora não seja ele ainda rei, pouca importância representa; pois somos apenas sábios, astrônomos e especiais magos pelo conhecimento das forças da Natureza, tornando-nos regentes de terras e povos nos confins da Pérsia. Não necessitamos temer inimigos por sermos respeitados pelos soberanos vizinhos, que nos tratam com grande deferência, visto nosso poder oculto. Ainda as- sim é este apenas um poder natural, que qualquer pessoa poderá aprender; quanto mais não poderá ser Rei da Judeia aquele homem famoso, que pela simples vontade pode dizimar montanhas e rochas, ressuscitar os mortos e mandar nos elementos!
Aqui chegamos hoje cedo, e constava que ele há pouco tem- po estivera nesta zona, onde é esperado em breve. Agora, à noite, correu boato de sua chegada com os discípulos. Podes imaginar, bom Mestre, o forte desejo que de nós se apossou ao vermos tal
personagem em ti, perguntando-te com máxima modéstia se és real- mente aquele menino prodígio!”
38.SABEREAÇÃODOSTRÊS MAGOS
Digo Eu: “Está tudo muito bem e posso apenas louvar-vos; consta, porém, terem os mencionados magos que visitaram aquela criança milagrosa em Bethlehem morrido há cerca de quinze anos. Como podeis ainda viver e agir neste mundo?!”
Responde o mais velho: “Nobre amigo, em nosso país po- de-se morrer cinco e até mesmo sete vezes, e em seguida continuar vivendo. Isto é possível em virtude do ar, da terra e seus elemen- tos, as ervas milagrosas em conjunto com nosso poder, absorvido das forças ocultas da Natureza. Quando naquela época estivemos em Bethlehem abrigávamos três espíritos da era primitiva desta Terra; agora não estão mais em contato conosco e somos inteira- mente livres.
No momento em que nos abandonaram, dávamos impres- são de termos falecido; entretanto, fomos vivificados pelos nossos próprios espíritos, com os quais ainda viveremos por algum tempo. Quando nosso corpo estiver completamente gasto, não morreremos como as pobres criaturas daqui, e sim deixaremos nosso físico de livre vontade e em plena consciência, para agirmos entre os nossos como espíritos. Eis a nossa situação, nobre e grande Mestre, por sermos ainda um povo primitivo e incorrupto.”
Digo Eu: “Isto Eu sei; como também não ignoro existirem nesta Terra alguns desses povos, no que nada tenho a contrapor. Admito igualmente serdes aqueles três sábios do Oriente, que visi- taram em Bethlehem a criança recém-nascida, voltando agora para visitardes o Rei Milagroso e demonstrar-Lhe vosso respeito, ato que merece louvor.
Pergunto-vos o que costumais fazer em vossas longas viagens e qual seu benefício para vós. É preciso relatá-lo para que ao menos
estes Meus discípulos venham a lucrar convosco. Em seguida vos transmitirei algo de Minha Pessoa.”
Diz o mais velho: “Grande Mestre, se operas tudo aquilo que de ti ouvimos, teus alunos não tirarão grande proveito de nossa par- te; mas já que o desejas, posso te comunicar a questão principal, que consiste em predizermos das estrelas coisa útil às criaturas, e que na maioria também sucede. Para falar com sinceridade, a questão de- pende mais da construção artística das palavras, do que da posição das estrelas, que com exceção de alguns planetas, é sempre a mesma.
Somente por ocasião do nascimento da criança milagrosa, quando ainda nos achávamos sob influência dos mencionados espí- ritos, descobrimos em direção do Este uma estrela de especial gran- deza, munida de grande cauda, dentro duma constelação peculiar. Percebendo sua movimentação mais rápida que as demais, em deter- minada direção, presumimos ter sucedido algo de inédito no Orien- te. Em breve destacou-se-nos algo como escrita astrológica, dizendo: Nasceu um Novo Rei para os judeus, que fundará um Reino Eterno, regendo sobre todos os povos da Terra!
Imediatamente encetamos nossa viagem acompanhando a dita estrela, que nos parecia estacionar em determinado ponto, onde encontramos realmente um nascimento destacado por vários milagres, de sorte não podermos ter a menor dúvida quanto à vera- cidade da predição. Entretanto, não somos capazes de afirmar se as demais profecias referentes ao Rei se cumpriram. Eis nossa ciência dos astros.
No que diz respeito à magia, é dividida em três partes: a primeira surge do conhecimento obtido por múltiplas experiências através da Natureza, que nos capacita efetuarmos milhares de coi- sas, despertando a máxima admiração entre as criaturas ignorantes, proporcionando-nos grande conceito e lucro. Atualmente possuí- mos um segredo para produzir uma espécie de grãos facilmente in- cendiáveis, mas que, em um recinto fechado, através de um pavio, desenvolvem tamanha força que, uma vez colocados no orifício de uma rocha potente, a faz estourar em mil frangalhos com enorme
estrondo. Diante do povo damos a entender que ordenamos a rocha a dizimar-se; na realidade isto foi produzido pela explosão dos grãos mencionados que dias antes lá depositamos, às escondidas. Neste gênero temos quantidade de coisas que despertam estupefação entre os incautos. Disto fazem parte os fogos de artifício, onde sabemos imitar os raios e seus efeitos.
A segunda parte é simplesmente mecânica, mas leva à ad- miração os leigos pelos efeitos do mecanismo ainda estranho, por ser desconhecida a causa, não havendo quem a explicasse, exce- tuando nós.
A terceira parte de nossa magia é realmente fútil, porquanto é apenas realizada por combinações previamente estabelecidas; tem, no entanto, o maior efeito entre o povo, não obstante ocultar somen- te certa agilidade. Eis nossas magias, desmembradas em três partes.
Finalmente, somos também médicos e podemos curar muitas moléstias por meio de remédios ocultos, exterminar toda es- pécie de insetos nocivos, e todos os animais ferozes têm que fugir diante de nós ou então se deixar amestrar, o que já proporcionou grande benefício aos homens. Eis o resumo de nossas artes, Grande Mestre; pedimos-te que igualmente nos dês informações quanto à tua pessoa.”
39.UMABOAFINALIDADENÃOJUSTIFICAOSMEIOS NOCIVOS
Digo Eu: “No tocante às experiências das forças da Natureza, da mecânica e da sua arte, são aceitáveis, podendo daí surgir, com o tempo, grandes vantagens para os homens. Tudo, porém, que se apresenta qual ilusão lucrativa para as criaturas, todas de igual va- lor perante Deus, é nocivo e não do Seu agrado, o Senhor Único de Céus e seres, como já falei e demonstrei aos essênios em certas ocasiões. Muito embora a finalidade fosse boa, conseguida, porém, através de meio mistificador, portanto nocivo, jamais poderá ser abençoada e benéfica.
Existe, por exemplo, um homem gravemente enfermo e os melhores médicos não são capazes de aliviá-lo de suas dores. Um dentre eles sugere aos demais dar-lhe uma dose de veneno, de ação rápida, para ele se libertar de seu sofrimento. Dito e feito — o enfer- mo morre instantaneamente. Bem, os médicos conseguiram aliviá-
-lo, sem, contudo, refletirem por que Deus lhe havia mandado tal moléstia, e qual a situação de sua alma no Além. Assim sendo, o meio foi nocivo, jamais podendo surtir daí um efeito inteiramente bom.
O mesmo acontece com todos os milagres fictícios! Ainda que acompanhados de ensinamentos morais e bons, em benefício do próximo e interpretados como efeitos divinos, no fundo não visam algo de bom; despertam na alma do povo a crendice forçada, daí toda sorte de superstição e no final o ódio fanático aos de crença diversa. E caso cheguem a descobrir a fraude através de um mais inteligente, provando-lhe ter sido o suposto milagre divino uma obra natural, descreem de todos os ensinamentos, em si benéficos, tornando-se quais tigres e hienas contra seus mestres e supostos taumaturgos.
Daí se pode facilmente deduzir não ser possível se alcançar bom efeito através de meio nocivo; se a base é prejudicial e frágil, como nela poderá resistir um edifício perfeitamente sólido?! Num solo arenoso e fofo não é possível se construir um castelo possante, de modo idêntico não se é capaz de alcançar uma educação verda- deira, melhor e animadora com meios falsos.
Até mesmo os Estados mais vastos desta Terra, diante dos quais estremecia metade do orbe, desfizeram-se qual palha fraca, porquanto seu fundamento nada mais era que ilusão fútil e frágil. Por isto desci do Alto a esta Terra, a fim de demonstrar aos homens a Verdade plena em tudo. Quem permanecer nesta Verdade, aceitan- do-a como norma de vida, será realmente livre e possuidor da Vida Eterna, jamais conquistada por qualquer ilusão, mas unicamente pela Verdade plena e edificante.
Nisto se concretiza o Reino que ora estou fundando. Trata-se do Reino do Amor, da Luz e, como efeito de ambos, da Verdade Pura e Sólida. Seu Soberano jamais ocupará um trono terreno, nem terá
em mão um cetro de ouro, sendo sua arma apenas a Verdade; en- tretanto, ela lhe proporcionará a vitória mais gloriosa e eterna sobre todos os povos e criaturas da Terra, e feliz aquele que se deixar vencer por esta arma pura e celeste! Acrescento ainda que Sou Aquele que procurastes, tendo-Lhe rendido honra como criança recém-nascida. Além do mais afirmo que a partir de agora não mais aceitarei ho- menagens por parte dos homens, pois existe Alguém Uno Comigo que me dá toda Honra e Seu Nome é: Amor, Luz, Verdade e Vida. É a base de todas as coisas, o Ser Eterno e a Própria Vida, e tudo que existe partiu Dele. Sabeis agora a quantas andais?”
40.INFLUÊNCIADOSESPÍRITOSDE LUZ
Exclama o ancião, compenetrado da Verdade de Minhas Palavras: “Grande Mestre! Através de tua elucidação estupenda de- duzimos nitidamente seres mais que simples homem, pois nunca ouvimos alguém falar deste modo, e tais palavras têm ação mais poderosa que inúmeros milagres que seduzem por certo tempo, mas em seguida endurecem os corações. Eis por que não te pedimos ou- tra prova. Tua palavra nos é suficiente e saberemos o que nos cabe fazer no futuro e nosso povo será devidamente esclarecido!”
Digo Eu: “Deste modo tereis agido com prudência; no en- tanto, o Bem e a Verdade necessitam de tempo. Por tal razão deveis agir com a devida precaução em vossas atitudes honestas. Pois um povo ignorante não suporta uma luz que ofusque de súbito sem pre- juízo para sua alma, e torna-se qual desvairado, à procura de sombra e treva. Por isto deve a luz ser, no início, transmitida parcamente, a fim de que as criaturas se acostumem pouco a pouco à mesma. No decorrer do tempo suportarão até mesmo a luz mais intensa diante de seus olhos. Se sois reais sábios do Oriente tereis que respeitar fiel- mente este ensinamento, caso pretendais tornar-vos uma verdadeira bênção para o vosso povo!”
Diz o ancião: “Será considerado com rigor por nós e nossos discípulos, pois vemos que tens razão em tudo e és inteiramente
verdadeiro. Desejaríamos ainda saber de ti o que houve com aqueles espíritos que nos guiaram por ocasião de teu nascimento, pois per- cebemos nitidamente que não éramos identificados de modo com- pleto com eles. Enquanto nos dominavam, não era possível agirmos dentro de nossa vontade e podíamos apenas fazer aquilo que eles queriam, e nos davam a impressão de serem o nosso ‘eu’ superior. Em tais momentos também éramos mui sábios, podendo conhecer as forças ocultas da Natureza e sua aplicação; tão logo nos abando- navam, apresentávamos os antigos tolos, sem compreender como chegáramos a tais conhecimentos. Todo conhecimento mais pro- fundo nos foi transmitido por aquelas entidades, as quais também víamos em sonhos nítidos. Qual teu parecer a respeito?”
Digo Eu: “Tal fato nada de especial representa para criaturas como vós; pois todas as pessoas de índole boa são, às vezes, ins- truídas em diversas ciências espirituais e naturais de maneira não tão perceptível, mas convosco deu-se tal fenômeno de modo mais preponderante. Quanto mais simples e concentradas viverem as pes- soas, tanto mais se acham em contato direto com bons espíritos do Além. Eis o que sucedeu convosco.
Quando mais tarde vos tornastes mais mundanos pelas mui- tas viagens empreendidas, os espíritos luminosos vos abandonaram, entregando-vos ao vosso próprio conhecimento, razão, intelecto e livre vontade. Despertaram, entretanto, o desejo ora manifestado de Me procurardes; tal fato se deu em benefício vosso e de vossos povos.
Aqueles espíritos viveram outrora nesta Terra, representando a máxima importância para as criaturas; no Além, todavia, cessam todas as diferenciações do ‘grande’ e ‘pequeno’, e o último homem desta Terra não será inferior ao primeiro, na hipótese de ter reco- nhecido a Vontade de Deus, agindo dentro de Seus Mandamen- tos e Ordem.
A Vontade Divina para todos é a seguinte: Reconhece Deus, ama-o acima de tudo e a teu próximo como a ti mesmo. Sê verdadei- ro e fiel para com todos, e faze ao teu semelhante o que desejas ser feito em teu benefício, que a paz e a união se estabelecerão entre vós
e a Bênção Divina se espargirá sobre vossas cabeças, qual Luz justa da Vida! — Por hoje é só, como base da Verdade, de onde prosse- guireis em toda sabedoria. Podeis vos recolher, pois já é meia-noite.”
Os magos Me agradecem e pedem permanecer o dia seguinte em Minha companhia, o que lhes concedo de bom grado. Em se- guida nos recolhemos. Ao despertarmos de manhã cedo, um bom desjejum já está preparado, enquanto os sábios alimentam o maior dos desejos para Me ver e falar, pois lhes calara profundamente o que Eu havia dito. Por isto escutam na porta durante Minha palestra com o hospedeiro, em companhia dos discípulos. Percebendo que o assunto girava em torno de coisas terrenas de somenos importância, conjecturam: “Hoje ele não dá mostras de sabedoria divina, muito embora tivesse provado ser possuidor de profundas noções!”
Nisto entra na antessala um homem gravemente enfermo; trata-se dum vizinho do hospedeiro, cujos empregados lhe informa- ram de Minha Chegada. Quando depara Comigo, grita: “Ó Jesus de Nazareth, Verdadeiro Salvador, apiada-te de mim e cura-me, pois que assim fizeste a muitos!”
Então Me levanto e digo: “Desde quando sofres de artritismo?”
Responde ele: “Senhor, há sete anos! Suportei as dores, por- quanto não eram tão atrozes; agora se tornam insuportáveis, razão por que pedi que me trouxessem até aqui.”
Virando-Me para os sábios, digo: “Também sois médicos! Acaso não sereis capazes de socorrê-lo com vossa ciência?”
Responde o mais velho: “Mestre, tais enfermos são para nós incuráveis e não existe remédio que os alivie. O Sol não conseguindo curar a um artrítico, não mais haverá recurso.”
Digo Eu: “Quero ver se realmente é incurável!” Em segui- da viro-Me para o enfermo: “Esteja curado e caminha; porém, não mais peques para que não te suceda coisa pior!” No mesmo instan- te o enfermo se cura, endireita os membros torcidos, agradece e se afasta cheio de alegria. Os sábios levam um choque e fazem menção de adorar-Me, no que Eu os impeço. Em seguida Me encaminho
com os discípulos para Bethânia, e os sábios por sua vez voltam no mesmo dia para sua pátria distante.
41.OSUPRIMENTODASCINCOMILPESSOASNOMARGALILEU(EV.JOÃO6, 1–15)
Não é preciso fazer menção da alegria imensa de Lázaro com a Minha Chegada. Nem bem se passam três dias, toda redondeza é informada de Minha permanência pelos lavradores, de sorte que dia a dia se aglomera mais povo trazendo enfermos, prontamente curados. Isto provoca intenso alarido nos arrabaldes de Jerusalém, chegando até aos ouvidos dos fariseus, que não demoram a elaborar planos para Minha captura e morte.
Ciente disto, digo no décimo dia a Lázaro e aos discípulos: “Partiremos para Galileia, pois os templários tramam contra Mim. Não desejo provocar escândalo, para que tua família tenha a necessá- ria tranquilidade por ocasião das festas. Hoje mesmo partirei daqui.”
Decepcionado, Lázaro diz: “Senhor, és Onipotente e capaz de dizimar esta corja nefasta com um só pensamento, trazendo as- sim grande benefício para os judeus de boa índole.”
Concordo: “Bem o poderia; mas tal não é da Vontade do Pai, porquanto devem agir até que se complete sua medida maldosa. Só então cairá o julgamento sobre eles, pois através de seu domínio ilimitado meter-se-ão a espada no próprio corpo. Em seu orgulho se revoltarão contra os romanos, que lhes darão cabo. Afirmo-te: não ficará uma pedra sobre a outra, e seus descendentes não acharão o local onde se encontrava Jerusalém, e ainda que algo descubram, não se poderão guiar com certeza. Isto sucederá pelo mundo, por causa do mundo. Por enquanto, ainda não chegou o momento e Eu não vim para algo destruir, mas a fim de procurar o que está disper- so e perdido. É, portanto, melhor que Me afaste por algum tempo, para que tu e Eu tenhamos paz; pois em breve Me procurarão, sem Me achar.”
Em seguida desjejuamos e partimos; Lázaro nos acompanha até perto do Mar Galileu, junto com grande multidão. Paro à bei- ra-mar, aonde chegamos altas horas da noite e pernoitamos num albergue; no dia seguinte Lázaro se despede, voltando ao lar com seu pessoal.
Parto com Meus discípulos, cujo número ultrapassa setenta, num grande navio, fazendo a travessia perto da cidade de Tibería- des. Quando o povo percebe Minha Partida, aluga de pronto vários navios, seguindo-Me constantemente para ver os milagres que efe- tuava em numerosos doentes. Atracamos, pois, com todos os navios, uma hora distante daquela cidade, num local despovoado, e onde se eleva uma grande montanha.
Digo então aos discípulos: “Subamos! À meia altura quero descansar sem ser percebido pela multidão da cidade. Aquelas pes- soas não têm boa índole e fé, por serem negociantes que apenas cuidam de dinheiro e vantagens.” Imediatamente subimos, alcan- çando o ponto mencionado, muito pitoresco e coberto de grama, ótimo para repouso. Eu e os discípulos acampamos, bem como as inúmeras pessoas que nos seguem, carregando seus cestos de pão. A Páscoa, festa principal dos judeus, já está próxima e é hábito levar-se pão fresco, não fermentado, peixes fritos, ovos e carne de carneiro.
Permaneço uns cinco dias e todos se saciam com provimen- tos e água, pois neste local há uma fonte límpida e fresca. Quando, no quinto dia, a ração é consumida, Pedro Me chama a atenção da constante aglomeração de pessoas.
Passo Meu Olhar por sobre a multidão e digo a Philippe, geralmente nosso mordomo, grego convertido para o judaísmo e vez por outra ainda fraco na fé: “Onde compraremos pão para tanta gente?” Falo deste modo apenas para experimentar este discípulo incrédulo, porquanto já sei o que pretendo fazer. E ele de pronto re- age, dizendo: “Nossa fortuna consiste em duzentas moedas de cobre, e o pão correspondente a essa importância será pouco para que cada um consiga um pedaço.”
Diz um outro igualmente pouco firme na fé, muito embora irmão de Simon Pedro: “Senhor, acha-se aqui um garoto dono de cinco pães e de dois peixes; mas que representa isto para tantos?”
Digo Eu: “Trazei-Me o menino e tratai que o povo se agru- pe em boa ordem!” Como houvesse muita grama, dentro em bre- ve se acomodam cerca de cinco mil homens, excluindo mulheres e crianças.
Tomo, pois, os pães, agradeço ao Pai e os abençoo. Em se- guida entrego pães e peixes aos que se haviam acampado, observan- do a todos os discípulos deverem distribuir individualmente tanto quanto fosse necessário para satisfazer a fome, e todos comeram e se saciaram.
Não havendo possibilidade de comerem tudo, digo no- vamente aos discípulos: “Ide recolher as sobras para que nada se perca!” Eles apanham os maiores cestos, recolhendo 12 com o que sobrara, isto é, do resto de cinco pequenos pães e dois peixes. Admi- rados, exclamam: “Realmente, este provimento geral ultrapassa os dois precedentes! Que deverá ser feito com as sobras?”
Respondo: “Pertencem ao povo, que saberá o que fazer. Não as necessitamos, porque já nos suprimos, e além disto parti- remos, ainda hoje, para Capernaum.” Os discípulos entregam os cestos à multidão e cada um tira uma parte, não havendo quem se queixasse da partilha.
Integrando-se do milagre por Mim operado, dizem: “Eis o profeta que deveria chegar ao mundo, sendo mais poderoso que qualquer poder do mundo e mais sábio que Salomon; é chegado o tempo de fazermos dele rei, ainda que à força!”
Como percebo sua intenção violenta, digo em surdina a João: “Ouve o que o povo pretende; por isto fugirei rápido e despercebida- mente morro acima, enquanto ficareis até a noite. A multidão se disper- sando, voltarei junto de vós; do contrário, dirigi-vos ao mar. Lá vos espe- rará um navio, conduzindo-vos para Capernaum, onde vos alcançarei!”
42.OSDISCÍPULOSNAVEGAMPARACAPERNAUM(EV.JOÃO6, 16–21)
Bem que João disto toma conhecimento; sendo, porém, quem mais se dedica às interpretações espirituais, desejoso por ver em tudo motivo, efeito e finalidade, pergunta pelo porquê desse milagre. E Eu lhe digo: “Cabendo-te assimilares profundamente o segredo do Reino de Deus, toma nota: essas pessoas representam o mundo, que havia absorvido todo seu estoque de nutrição espiritual. Somente um garoto simples tinha ainda alma pura e incorrupta e algo de fé infantil, razão por que possuía cinco pães de centeio e dois peixes.
Os cinco pães apontam estarem seus cinco sentidos puros e intactos, isto é, sua alma se encontra limpa, o que foi demonstrado pela sua grande alegria por satisfazer-Me. Os dois peixes, idênticos ao bem derivante do amor e da verdade provindos da fé, ou o calor de sua vida amorosa e o fogo de sua luz do saber, demonstram sua fé infantil, confiança e dedicação. Ao mesmo tempo, sua pequena individualidade indica a fragilidade e como estão reduzidos, atual- mente, bem e verdade celestes entre as criaturas do mundo.
Além disto, significam os cinco pães a Minha Doutrina. Pa- rece muito pequena para todas as criaturas da Terra; multiplicar-se-
-á, porém, como esses pães; entretanto, sobrarão para os mais sábios, por Mim doutrinados e saciados em espírito, conhecimentos sempre mais profundos e novos, por toda Eternidade. Os doze cestos cor- respondem às doze tribos de Israel, em sua totalidade, à Perfeição Divina jamais alcançada.
Eis, Meu caro João, a interpretação desse milagre. A vontade daquelas pessoas em querer fazer-Me rei do mundo demonstra sua tendência verdadeira, maldosa e pervertida, porque desejam se tor- nar um povo poderoso e temido para abater todos os seus pretensos inimigos, contrariando a Minha Doutrina. Por isto afastar-Me-ei às pressas. E vós, fazei o que vos disse!”
Em seguida, oculto-Me num arvoredo, pelo qual subi até o cume da montanha; pois para Mim, em breve, se apresenta um cami-
nho, ignorado para os que pretendem perseguir-Me. Entrementes o povo se vira para os discípulos, querendo responsabilizá-los de Meu afastamento. Eis que João se adianta e diz: “Por que não impedistes ao Senhor, pois sois em número maior que nós? Sustai tempestade e raio! Ordenai as ondas do mar quando começarem a tragar-vos! Eu, simples discípulo, transmito-vos: mais fácil seria impordes calma aos elementos em fúria, do que dobrar a Vontade do Homem-Deus! Deixai-vos orientar e não sejais tolos! Como pretendeis fazê-Lo rei do mundo para os judeus — Ele, cujo Espírito é Senhor Eterno de Céus e Terra?! Essa conclusão podíeis ter tirado dos muitos milagres que operou diante de vós! Basta Ele querer, para realizar o que é de Sua Vontade. Sua Onipresença e Onipotência não só chegam até aqui, mas abrangem o Infinito; por isto não sejais desvairados e re- colhei-vos, a fim de que não vos suceda coisa desagradável!”
Com estas palavras de João muitos se entregam ao repou- so; alguns, porém, reclamam e querem por força procurar-Me na montanha. Em breve deparam com tantos empecilhos intranspo- níveis, de sorte que voltam extenuados, não compreendendo como Eu poderia ter galgado aquelas rochas escarpadas. Morro abaixo Eu não poderia ter-Me evadido, porquanto todas as saídas estão por eles ocupadas. Percebendo nada poderem conseguir, conjecturam as medidas a tomar e alguns perguntam aos discípulos o que fariam sem o Mestre.
E eles respondem: “Que mais faremos a não ser voltarmos a Capernaum? Lá certamente nos encontrará quando quiser!” Então os mais revoltados se retiram, enquanto outros ficam para observar a atitude dos discípulos; à noitinha, estes se dirigem rápidos para o mar, onde os espera um grande navio. Embarcam ainda antes que a multidão consiga segui-los, pois a descida é difícil e só pode ser feita com muito cuidado e precaução por pessoas não treinadas. Alguns embarcam para Capernaum, enquanto outros aguardam Minha descida. Como não apareço, seguem apenas na manhã seguinte.
Os discípulos navegam com bom vento além mar, crentes que Eu os alcançaria com outra embarcação. O trajeto é considerá-
vel, de sorte que é noite fechada, quando ainda lutam contra forte vento. Vez por outra viram-se para ver se Eu Me aproximo. Perce- bendo não ser satisfeita sua grande saudade de Mim, entristecem-se e presumem Eu chegar na certa pela manhã.
Neste momento, surge forte vento e o mar começa a levan- tar ondas enormes. Por isto os marujos resolvem recolher as velas e usam somente os remos, a fim de evitar acidentes. Tendo remado uns vinte e cinco a trinta estádios, Me veem caminhar sobre o mar revolto, aproximando-Me do barco. Muito embora já ter ocorrido fato idêntico em outra ocasião, são tomados de grande pavor.
Notando isto, digo a todos: “Por que temeis? Não vedes ser Eu?” Eis que fazem menção de Me acolher no navio, porquanto ain- da se via uma grande distância até a praia; no mesmo momento, po- rém, a embarcação havia atracado. Naturalmente isto produz grande alarde entre os novos adeptos; inclusive os marujos se exasperam, presumindo ter Eu morrido e agora Me apresentava como espírito, quiçá, a mando de um feiticeiro — ou então Eu Mesmo fosse tal ho- mem e teria ordenado aos elementos da água a Me carregarem sobre o mar. Esses marujos são gregos, portanto pagãos, e seu critério não podia ser outro; pouco ou mesmo nada sabem do verdadeiro judaís- mo, razão pela qual os deixo nesta ideia. Entrementes nos dirigimos a um albergue conhecido, onde já havia curado um artrítico, que para este fim se fizera descer através de um alçapão em seu leito.
43.OPÃODAVIDA(EV.JOÃO6, 22–35)
Quando na manhã seguinte, após o desjejum, saímos de casa, encontramos na praia grande multidão que nos havia seguido du- rante a noite. São as mesmas pessoas que na véspera ficaram além mar e viram a partida dos discípulos sem Mim. Percebem, portanto, não haver outra embarcação, senão a usada somente pelos adeptos.
Enquanto caminhamos pela margem, chegam ainda outros navios que haviam deixado Tiberíades pela madrugada. Seus passa- geiros desembarcam e vão ao local onde Eu havia abençoado o pão
para verificarem se Eu aí estou. Não nos encontrando, voltam às pressas junto dos navios e embarcam para Capernaum, fazendo tudo para encontrar-nos.
Quando, após grande procura, Me acham em uma escola, que será mencionada posteriormente, e se convencem ter Eu tam- bém feito a travessia marítima, porquanto a pé teria levado alguns dias para tal distância, perguntam: “Mestre, como atravessaste o mar?” Rapidamente faço um aceno aos discípulos para não Me tra- írem, pois pretendo dar uma lição a essa gente, a fim de separar o joio do trigo.
Por isto respondo: “Em verdade vos digo: andais à Minha procura não por causa dos milagres, mas simplesmente por vos ter- des fartado com os pães. Por gratidão Me cognominastes um grande profeta e pretendíeis finalmente declarar-Me rei, porque pensastes: Vede, este tem poder suficiente contra nossos inimigos, que muito trabalho nos dão; de sorte que ele nos poderá arranjar o pão, dispen- sando-nos do trabalho!
Eu, porém, vos digo: o alimento não age sobre a vida espi- ritual da alma, e sim apenas sobre o corpo perecível; Eu, porém, como atual Filho do homem, vos darei outro alimento que agirá eternamente dentro da alma. Para tal fim o Pai no Céu Me selou e determinou. Este alimento consiste em fazerdes realmente a Vonta- de Divina, portanto Obras de Deus.”
Indagam eles: “Esclarece-nos o que nos cabe fazer para efetuar- mos obras divinas, de acordo com tuas palavras. Somos homens sim- ples e não profetas, e só entendemos viver dentro das Leis de Moysés.”
Digo Eu: “Se isto fizésseis, de há muito Me teríeis reconheci- do. Com pavor e rancor ocultos dos castigos terrenos, considerais as leis do mundo, não podendo reconhecer-Me, muito embora tivesse feito milagres que até hoje ninguém conseguiu. Dir-vos-ei o que, a partir de agora, representa a Obra de Deus: crede em Mim, Prome- tido por Deus aos profetas e Enviado a este mundo!”
Admirados, eles dizem: “Quais são os milagres que operas além dos que já vimos? Demonstre-nos, para que possamos crer na-
quilo que dizes. Até então sabemos teres curado vários enfermos, e nos saciaste milagrosamente com quantidade reduzida de pães. Estes e ainda outros milagres maiores foram produzidos por vários profetas a partir de Moysés. Acaso nossos pais não comeram o maná no deserto, conforme consta: Ele lhes deu de comer pão do Céu!”
Replico: “Realmente, Moysés não vos deu o Pão verdadeiro, e sim o do Céu terreno e visível, contido no éter; somente Meu Pai, no Céu verdadeiro e espiritual, ora vos dá por Mim o real Pão Celes- te que dá vida ao mundo!”
Eles não entendem referir-Me Eu, quanto ao Alimento Ver- dadeiro que faculta a vida eterna à alma, apenas à Minha Doutrina, que emana do Amor e da Sabedoria vivos do Pai, portanto é a pró- pria Vida e Sabedoria, dando real existência à alma.
Compreendendo, pois, somente o pão tomado na monta- nha, pedem: “Senhor e Mestre, dá-nos sempre desse pão e nada mais pediremos!”
Retruco: “Não entendestes o que disse?! Eu Mesmo Sou o Verdadeiro Pão da Vida! Quem vier a Mim não sentirá fome, e quem crer em Mim jamais terá sede!”
Opõem eles: “Senhor, estamos evidentemente contigo! Como nada comemos desde cedo, sentimos fome e sede, muito em- bora creiamos seres grande profeta, talvez maior que Moysés, do qual nem se poderá afirmar positivamente ter ele existido, pois nun- ca o vimos. Ainda te encontrando conosco, és para nós, sem dúvida, mais que Moysés e todos os profetas. Ainda assim, estamos famintos e sedentos. Como, pois, deve-se interpretar tuas palavras?”
Digo Eu em surdina a João, “Não é verdade o que te disse ontem, na montanha? Essas criaturas se acham no nível animal; por isto, falo de modo oculto para confundi-las. Devem afastar-se, por- que seu tempo ainda está longe.”
44.AMISSÃODOSENHORNATERRA.CARNEESANGUEDOSENHOR(EV.JOÃO6, 36–58)
Em seguida viro-Me para aqueles homens e digo: “Que fa- lais?! Acaso afirmei não Me terdes visto?! Eu Mesmo sei, afirmei e ainda digo que vistes a Mim e Meus Milagres, entretanto não acre- ditais que tudo o que o Pai no Céu Me dá vem a Mim e Eu jamais expulsarei quem Me procurar.
Guardai o que vos digo: não sou, como vós, deste mundo, mas descido do Céu, não para fazer a Minha, e sim somente a Von- tade Daquele Que Me enviou a este mundo.”
Então indagam: “Qual é, pois, a vontade de quem te en- viou do Céu?”
Respondo: “Difícil é pregar-se para os surdos e escrever para os cegos. Eis a Vontade do Pai que Me enviou: que Eu nada perca de tudo que Me tem dado, mas que o devolva e ressuscite no Dia Final!”
Eis que alguns conjecturam: “Este homem fala de modo es- tranho; parece doido.” Outros Me dizem: “Expressa-te claramente o que há com o Dia Final!”
Digo Eu: “Quando Me tiverdes reconhecido e acreditando em Mim, far-se-á o Dia Final de vossa mente, surgindo um verda- deiro Dia em vossa alma, no qual Eu vos despertarei pelo Poder da Verdade de Minha Doutrina; se, porém, não acreditardes em Mim e não Me reconhecerdes, dificilmente se dará um Dia Final para vossa razão.”
Pedem eles: “Dize-nos com clareza o que seja a Vontade do Pai!”
Prossigo: “Eis a Vontade do Pai que Me enviou: todo aquele que vir o Filho, Nele acreditando e reconhecendo ser Ele o Verda- deiro Messias do mundo, receberá a Vida Eterna e será por Mim ressuscitado no Dia Final! Já vos demonstrei o sentido deste Dia!”
Os judeus, porém, começam a protestar, principalmente por Eu ter dito: Eu sou o Pão da Vida, vindo do Céu. Por isto dizem: “Não é ele o carpinteiro Jesus, filho de José?! Conhecemos muito bem os seus pais — como pode afirmar ter vindo do Céu?! Seu
intelecto e demais faculdades peculiares podem ter origem celeste, porquanto jamais existiu homem importante sem bafejo divino; pessoalmente não poderá positivar ter vindo do Céu qual Pão que alimente para a Vida Eterna!”
Digo Eu: “Não reclameis! Repito: ninguém poderá vir a Mim (reconhecer-Me) a não ser que seja atraído pelo Pai (o Amor de Deus e a Deus) que Me enviou; pois somente Eu (Minha Palavra e Doutrina) o despertará no Dia Final!
Lê-se até mesmo nos profetas: Naquele tempo vindouro
que é o atual — todos serão ensinados por Deus! Por isto vos digo: quem agora o aprender do Pai (Amor de Deus) virá a Mim (reconhecer-Me-á).
Não digo isto na suposição de que tenhais visto o Pai — pois somente Eu, que Nele tenho Minha Origem, vi o Pai desde sempre. Afirmo, não obstante vossa reclamação: em verdade, quem crê em Mim já possui a Vida Eterna (quer dizer, Minha plena ressur- reição no Dia Final) — EU SOU O PÃO DA VIDA!
Se bem que vossos pais comeram maná no deserto (levaram vida carnal), morreram, muitos até mesmo psiquicamente. O Pai, que Eu represento em Espírito e que realmente vem do Céu de todo Ser e Vida, faz com que jamais morra quem se nutrir com Ele (acei- tando e vivendo a Doutrina). E vede, justamente este Pão é Minha Carne, que Eu darei para as vidas humanas desta Terra!” (Nisto se deve compreender o invólucro material do Meu Verbo, onde se acha o sentido vivo e espiritual como gérmen vivo em sua casca morta).
Isto é demais para os judeus completamente destituídos de interpretação espiritual, razão por que começam a discutir. Um gru- po, então, diz: “Deixemo-lo falar e veremos o resultado final!” Os menos ponderados, porém, questionam: “Qual nada! Logo se vê que ele está delirando! Anteriormente se dizia o pão do Céu, que deverí- amos comer a fim de alcançarmos a Vida Eterna; agora exige que se coma sua carne! Que loucura! Como nos poderá dar de comer sua carne?! E quantos poderiam nela saciar-se?! Se isto for condição para a conquista da Vida Eterna da alma, poucos a alcançarão!”
Digo Eu: “Podeis discutir à vontade, entretanto será tal qual Eu disse! Acrescento mais: se não comerdes da Carne do Filho do homem e não beberdes o Seu Sangue, não tereis a Vida dentro de vós!” (Já foi mencionada a significação da Carne; o Sangue, propria- mente o fluido vital do corpo a lhe proporcionar, conservar e ali- mentar a vida e transmitindo-lhe o gérmen procriador, é o elemento interno e espiritual na acepção da palavra).
Agora os judeus não mais se contêm! Alguns começam até a rir, enquanto os mais conscienciosos dizem: “Deixem-no falar! Quem sabe o que ainda virá a proferir, pois sabemos ter ele, às ve- zes, falado com inteligência.” E, virando-se para Mim, prosseguem: “Querido Mestre, pedimos-te falares razoavelmente.”
Respondo: “Como poderei?! Falo como Aquele que conhe- cestes na montanha, isto é, qual grande profeta! Apontai-Me algum que tivesse falado ao povo de modo diverso! Por isto, torno a repetir: quem comer de Minha Carne e beber do Meu Sangue terá a Vida Eterna e Eu o ressuscitarei no Dia Final. Pois Minha Carne é o justo Alimento, e Meu Sangue a bebida verdadeiramente viva.
Digo mais: quem comer de Minha Carne e beber do Meu Sangue ficará em Mim e Eu nele. Como fui realmente enviado pelo Pai eternamente Vivo, e Eu nesta época aqui estou por Causa do Pai, todo aquele que de Mim se alimentar viverá por Minha Causa. Eis o Pão vindo do Céu, não idêntico ao maná no deserto do qual comeram vossos pais, morrendo como já demonstrei — e sim, quem comer destePão viverá eternamente.”
45.OPINIÕESDOPOVOQUANTOAODISCURSODOSENHOR(EV.JOÃO6, 59–64)
Após ter falado deste modo em uma escola em Capernaum, onde, além dos Meus inúmeros discípulos e do povo que Me acom- panhara desde Jerusalém, assistiram muitos judeus, senti que Meu Ensinamento fora pouco assimilado pelos apóstolos, produzindo
grande escândalo e motivo para polêmicas. Alguns opinam: “Não é possível ele se ter referido ao seu corpo e sangue físicos.”
Outros, porém, protestam: “Mas, como então interpretá-lo? Sendo sábio e pretendendo ensinar o povo — mormente em uma si- nagoga — que se faça entender. Somos humanos e não espíritos, e um sábio deve conhecer as pessoas com que lida. Mas este ensinamento foi deveras duro e não há quem o possa assimilar. Se tivesse falado no idioma hindu, nosso proveito teria sido o mesmo. É de se estranhar como tantas pessoas aguentaram essa repetição monótona!”
Obtemperam os mais cordatos: “É realmente verdade; pensa- mos, no entanto, conter aquilo um sentido oculto e que ele talvez assim falasse para obrigar as nossas almas a uma meditação mais profunda. Talvez nos desse uma explicação mais minuciosa caso lhe pedíssemos?”
Respondem os outros: “Então não o fizemos?! Foi precisa- mente quando falou ser necessário se comer sua carne e beber o seu sangue para conquistar a Vida Eterna! Tanto uma quanto outra hipótese não têm valor para nós! Por isto, quem for inteligente, que siga seu caminho como também nós pretendemos fazer.”
Prontamente todos deixam a escola, exceto os inúmeros discípulos e apóstolos, pois esperam receber explicação a respeito. Entrementes conjecturam: “É de fato estranho! Hoje teria feito milhares de seguidores através de um ensinamento racional; assim, prejudicou-Se muito. Quem mais Lhe prestará atenção?!”
Os gregos convertidos também concluem: “Eis um abismo entre a doutrinação em Bethânia e a daqui. Os que se afastaram não deixam de ter razão; entretanto, o perigo de declará-Lo Rei já passou. Agora não haverá impedimento de Ele falar abertamente.”
Percebendo que muitos discípulos se aborrecem por isto, Eu lhes digo: “Como pode isto escandalizar-vos?! Acaso não disse a um apóstolo estarem aquelas pessoas ainda longe da compreensão in- terna do Reino de Deus?! Apliquei a todas uma boa sacudidela, que muito as preocupará e as fará amadurecer para o futuro. Tenho que preparar os homens a fim de que possam mais facilmente assimilar
os segredos do Reino de Deus. Pergunto-vos o que seria caso vísseis o Filho do homem subir onde esteve desde Eternidades?”
Respondem os discípulos: “Isto é bem possível, porquanto Teus Milagres provam tal hipótese. De modo algum é admissível que a pessoa se alimente do Teu Corpo, Senhor e Mestre, para alcan- çar a Vida Eterna. Tudo faremos para evitar a morte, mesmo em se tratando da imediata vida da alma, porquanto o corpo é apenas pó que dificilmente poderá ressuscitar; se, entretanto, isto se consegue somente à custa de Teu Corpo Físico, que além disto só satisfaria alguns poucos, desistimos da Vida Eterna da alma e preferimos fina- lizar a vida nesta Terra. Se Tu Te referes a algo diferente, farás bem dando-nos explicação acertada. Se pretendes subir de onde vieste
onde e como se conseguirá Teu Corpo e Sangue? Portanto, Teu Ensinamento será inútil se não for elucidado!”
Digo Eu: “Não avisei ser difícil se pregar aos surdos e escrever para os cegos?! Porventura não é somente o Espírito que vivifica, en- quanto a carne de nada vale?! As Palavras que vos disse são Espírito e Vida, e não carne e sangue físicos.
Digo-vos abertamente haver entre vós vários de fé nenhuma ou muito fraca e, entre os apóstolos que conheço desde o princí- pio, alguns de fé reduzida — e um é até mesmo avarento, ladrão e traidor!”
46.UMAPROVAPARAOSAPÓSTOLOS(EV.JOÃO6, 65–70)
Minhas Palavras têm o efeito de um raio, de sorte a muitos ficarem horrorizados e alguns Me dizem: “Senhor, por que não nos disseste isto há mais tempo?! Teríamos descoberto tal infame, afas- tando-o de nós caso Tu Mesmo não quisesses tomar medidas, em virtude de Tua Grande Paciência!”
Explico-lhes: “Já vos disse por muitas vezes necessitar tudo de tempo e medida neste mundo. Em época de colheita um lavrador prudente não recolherá o joio com o trigo, mas separá-los-á, fazen-
do juntar em molhos todo joio nascido entre o trigo bom, para em seguida queimá-lo, servindo para adubo.
Por isto vos disse anteriormente que, em verdade, ninguém poderia vir a Mim caso não lhe fosse concedido pelo Pai, em Si o Amor, a Vida e a Verdade, assim como Eu o sou pelo Pai e dimanan- do de Mim, porquanto Eu estou no Pai e o Pai, em Mim.
Ninguém de vós suponha estar realmente Comigo apenas por acompanhar-Me, ouvindo Minhas Palavras e assistindo Meus Milagres, pois somente estará Comigo quem se sentir atraído por Mim através de um amor puro, acreditando sem escrúpulos em tudo que Eu ensino. Além disto, aceita ser Eu Filho do homem sur- gido do Pai, estando Meu Espírito unido com Ele.”
Eis que dizem os adeptos, excluindo os apóstolos e os gregos convertidos para judeus: “Neste caso de nada nos adianta perambu- larmos com Ele! Os temas difíceis e inaceitáveis não é possível acre- ditar-se; amá-Lo acima de tudo é algo impraticável, porquanto Se porta conosco de modo a nos inspirar pouco afeto. Por isto, volta- remos às Leis de Moysés, muito mais claras e compreensíveis. Amar a Deus requer o cumprimento de Seus Mandamentos, de sorte que esperamos nos tornar felizes sem acreditarmos em ensinamentos tão esdrúxulos.”
Com isto muitos se afastam e não mais Me acompanham, muito embora, posteriormente, viessem a refletir acerca de Minhas Palavras. Como Eu a ninguém animasse a ficar e ter paciência, os outros começam a se entristecer, pois não sabem qual medida a to- mar. Eis que lhes digo com amabilidade: “Acaso também preten- deis retirar-vos? Sois perante Mim tão livres como qualquer pessoa desta Terra.”
Vira-se Pedro para Mim: “Senhor, para onde iremos? Ape- nas Tu proferes Palavras de Vida, se bem que não compreendamos prontamente sua profundeza. Em tempo oportuno Tu as elucida- rás, quando nos tivermos tornado mais dignos de Tua Luz Elevada. Além disto, acreditamos desde o princípio seres Tu o Cristo e o Filho
Vivo de Deus, de sorte que jamais Te abandonaremos! Senhor, não nos repudies e tem paciência com nossa grande fraqueza!”
Digo Eu: “Assim está bem e justo. Encontrando-nos ainda nessa sinagoga de Capernaum, não posso deixar de vos esclarecer mais um ponto. Estais lembrados ter Eu no ano passado escolhido nesta zona vós, doze, entre os muitos discípulos, entretanto um de vós é um demônio!”
47.JUDASISCARIOTES(EV.JOÃO6, 71)
Refiro-Me, é claro, a Judas Iscariotes, cuja índole desde o princípio conheço. Era ele, no entanto, muito ativo, bom orador e sabia expor a Doutrina, a ponto de ser escolhido por Mim como apóstolo na justa causa. Como conseguisse através destas quali- dades maior êxito que os onze em conjunto, começou a se tornar convencido.
Seu orgulho sendo posto em cheque em várias ocasiões, ali- mentava ele uma revolta cada vez maior, fazendo-o dia a dia mais retraído e fiscalizando os demais apóstolos, a fim de descobrir algo que os desabonasse perante Mim. Nada surgindo com que pudesse desabafar sua raiva, aumenta sua revolta, levando-o a procurar um meio adequado para prejudicar aos outros. Egoísta e avarento, sabia expor a necessidade do dinheiro, uma vez que os potentados o ha- viam instituído para facilitar o cansativo troco de mercadorias.
Certo dia se externou ao sábio Nathanael, com quem ainda costumava palestrar, da seguinte forma: era claro Eu não necessitar de dinheiro, pois dotado de Onipotência Divina, era fácil viver sem ele. Mas pessoas isentas deste dom e da felicidade de serem Meus adeptos precisavam de dinheiro tanto quanto o próprio Imperador, a fim de que pagasse seus soldados e ministros.
Nathanael sempre procurava provar-lhe ser o dinheiro um gran- de mal entre os homens, muito embora pudesse ser motivo de muitos benefícios nas mãos de um justo. Ainda assim teria o efeito de despertar a ganância, tornando-se geralmente a causa de muitos vícios e crimes.
Conquanto Judas aceitasse tal sugestão, teimava por afirmar ser o dinheiro um mal necessário, igual o corpo para a alma. Ela aproveitando o corpo com temperança, ele seria o templo da saúde, pela qual apenas poderia chegar à Vida Eterna e alcançar a verdadei- ra Filiação de Deus.
Deste modo ele sabia em toda parte lançar seus argumentos, tornando-se difícil uma discussão. Na exposição de seus sofismas, chegava até a declarar — como fazem os espartanos e cretenses — ser o roubo justificado em caso de necessidade, acusando Moysés de tolo, porque classificara tal atitude de grande pecado. Judas não con- siderava que o roubo mais justo levaria as criaturas com o tempo ao ócio; ninguém mais trabalharia e economizaria, sabendo ser possível lhe ser tirado o seu estoque. Se tal hábito fosse permitido — qual o aspecto do amor-próprio e o Conhecimento de Deus?!
Naturalmente Nathanael lhe provara que suas justificativas de roubo não se coadunavam com suas tendências econômicas, por- quanto as destruiria; Judas, porém, lançava sua filosofia subversiva e nada se conseguia com ele. Somente quando Eu lhe dava um cor- retivo ele desistia por certo tempo de suas ideias, entregando-se a reflexões mais ponderadas. Eis por que Eu lhe aplico esta advertên- cia dentro da escola, bem compreendida por ele; os outros apenas supõem ser ele o referido, e não arriscam apontá-lo como ladrão. Eu nada disto queria, embora soubesse o que ele ainda chegaria a fazer. Sua medida tinha que se completar até à queda, e ele mesmo tinha que se convencer serem más todas as suas tendências terrenas, tornando-se um exemplo horripilante para as criaturas, do contrário não haveria salvação para sua alma, nem no Reino dos espíritos.
Eis os traços característicos deste apóstolo, revelados a fim de se compreender por que Eu o classificara desta vez de demô- nio; pois foi um dos que mais se revoltou com Meu Discurso na escola, pelo qual muitos se aborreceram e afastaram, em virtude de ele já ter-se envolvido em várias especulações com aquelas pessoas. Entrementes ele faz observar a Nathanael ter Eu falado em casa de Pedro acerca do prejuízo dos escândalos, entretanto dava motivo a
milhares a se aborrecerem Comigo; como isto se coadunava com Minha Doutrina?
Nathanael lhe lembra ter Eu mencionado os escândalos pro- vocados com crianças. Judas tinha uma resposta pronta, e quando cerca de quatro horas da tarde deixo a escola em companhia dos discípulos, em direção ao albergue, ele não nos segue, procurando alguns amigos na cidade, onde muito se comenta Meu Discurso não compreendido. Eis que ele se demonstra como Meu apóstolo e ora- dor, fazendo, através de sofismas astuciosos, a explicação de Minhas Palavras, conquanto não bem explicadas. Durante sete dias não o vimos em Capernaum. Mais tarde voltou junto de nós.
48.NOALBERGUEDOHOSPEDEIRODE CAPERNAUM
Ao chegarmos ao albergue, encontramos a mesa posta com vinho, pão e peixes, e o hospedeiro muito se alegra com a nossa pre- sença. Após termos acabado a refeição, ele diz: “Senhor, desta vez Tua Doutrina misteriosa não parece ter sido do agrado dos ouvintes na- cionais e estrangeiros, pois se retiraram com revolta. Alguns proferi- ram insultos e os estranhos alegaram teres falado de propósito daquele modo, a fim de Te livrares deles; tal atitude não fora mui delicada de Tua parte, porquanto eles haviam arcado com sua própria despesa.
Aqui vieram muitos fazendo críticas e afirmando teres sido para eles a maior das esperanças, no entanto ficaram decepcionados, não obstante Teus Milagres extraordinários, Tua Doutrina pouco êxito traria entre as criaturas. Deixei-os falar sem responder; em se- guida pagaram suas despesas e partiram.
Pessoalmente agradou-me não teres considerado a inteli- gência orgulhosa desses ‘sábios’; desde ontem à noite, após Te teres recolhido, muitos prós e contras foram externados quanto à mul- tiplicação dos pães e Tua travessia marítima. Cada qual procurava expressar-se com inteligência. Intimamente pensei: Esperai, judeus pretensiosos! O Senhor em tempo oportuno erguerá uma barreira diante de vossa sapiência! E eis que meu desejo se realizou.
Também estive na sinagoga e ouvi a maior parte de Teu Ensi- namento e nada achei de estranho. De há muito sei seres Tu Senhor sobre Céus e Terra e de todas as esferas espirituais, conquanto Te encontres em Figura Humana. Quem, além de Ti, poderia criar o alimento para todos os seres; quem daria aos espíritos e às almas a Vida Eterna, seu amor e sabedoria, no que entendo o Pão vivo e ver- dadeiro, vindo do Céu?! Procurei esclarecer este ponto a alguns mais sensatos; seu raciocínio orgulhoso e teimoso não o compreendeu.
Quando me perguntaram acerca da interpretação de Tua Carne e Sangue, eu lhes disse: Eis um ponto ainda mais fácil de se compreender, positivando minha opinião anterior! Para falar dentro da compreensão terrena: não é a Terra de certo modo um verdadeiro Corpo Divino e todas as águas germinadoras, Seu Sangue?! Onde a origem do alimento material?! Acaso não é o Amor de Deus a nós, criaturas indignas, espiritualmente um solo verdadeiro que nos suporta e alimenta, física e psiquicamente?! E o dom da razão e do intelecto, e atualmente Sua Doutrina — não representam o Sangue de Deus, verdadeiro e vivo, que conforta, alegra e vivifica nossas almas sedentas?!
Muitos então responderam: ‘Está tudo certo; mas por que ele não acrescentou tal explanação?’ E eu respondi: ‘Teria Seus mo- tivos. Por certo pensará o seguinte: Quem deveras crer em Mim compreender-Me-á. Quem, não obstante os muitos Milagres e a Sabedoria de Minha Doutrina, não crer ser Eu o Senhor, Jehovah, Zebaoth, poderá voltar ao mundo e acompanhar os suínos dentro do charco!’ Isto os revoltou de tal forma, que se afastaram. Senhor, acaso agi mal?”
Respondo: “De modo algum. Primeiro, por teres compre- endido a fundo as Minhas Palavras, explicando-as aos ignorantes de acordo; segundo, tua observação final foi bem empregada. Tais pessoas são comparáveis aos porcos, que quanto mais claro e quente o Sol se manifeste no Céu, tanto mais ávidos correm às poças lama- centas do mundo, sentindo-se felizes por poderem revolver os detri- tos. Não lhes dissera claramente que sangue e carne, como eles os
compreendiam, de nada valem, e que Minhas Palavras são espírito e vida?! Aqueles animais não o compreenderam; razão por que tua observação foi justa, levando-Me a ficar alguns dias contigo.
Traze-nos mais algum vinho, porque desejamos passar uns dias felizes. Sinto verdadeira satisfação com tua pessoa; pois Me compreendeste melhor que qualquer apóstolo. À noite iremos pes- car, a fim de abastecer-nos de provimentos. Não Me denuncies na cidade, porquanto isto perturbaria nossa paz.”
49.PACIÊNCIADOSENHORPARACOM JUDAS
Assim, tomamos vinho e comemos algum pão; éramos umas trinta pessoas necessitando de conforto físico. Neste alegre convívio, diz um dos gregos convertidos: “Senhor e Mestre, este hospedeiro deveras amável seria mais indicado a tomar o lugar daquele discípu- lo que sempre dá motivo para Te aborreceres, facultando-lhe o posto de conselheiro, caso Judas voltar. Pelo que deduzimos é ele mais ávido pelo dinheiro que qualquer templário e toda sua atenção é vol- tada ao conforto. Além disto, tem ele o péssimo hábito da mentira e arrogância, e com apóstolo nesses moldes não terás êxito; enquanto o hospedeiro é dotado de espírito lúcido, entendendo melhor que Teus apóstolos os Teus Ensinamentos mais velados.”
Digo Eu: “Ficarei até à Festa dos Tabernáculos na Galileia e chegada tal época ainda resolverei Minha ida para Jerusalém, tendo pois oportunidade de sobra para fazer-nos acompanhar pelo hos- pedeiro Mathias (Mai ou Moi diaz — meu trabalhador, servo ou empregado), e ele poderá se inteirar de muitos assuntos externos e psíquicos. A seguir, tornar-se-á um bom disseminador de Minha Doutrina para esta zona, cujos habitantes Me foram entregues para renascerem e não para a morte.
Quanto a Judas, poderá vir quando quiser — ou deixar de comparecer; pois cada criatura, boa ou má, porta-se espiritualmente para Comigo como o corpo em relação ao Sol. Querendo deixar-se iluminar e aquecer pelos raios solares, o homem poderá assim agir
independentemente de ser bom ou mau; não o querendo, Deus não o obrigará para tanto. Por isto também consta: Deus deixa irradiar o Seu Sol sobre bons e maus! — O mesmo acontece em sentido espi- ritual: quem quiser seguir-Me poderá fazê-lo sem que Eu o repudie, ainda que fosse o maior pecador. Vim apenas ao mundo em virtude dos perdidos e psiquicamente enfermos; os sadios não necessitam de médico.
Deste modo, Judas poderá acompanhar-Me de acordo com sua vontade, assim como não repudiei os judeus; afastando-se eles de modo próprio, não os impedi e tampouco os convidei para ficarem. Também não falei tão enigmaticamente a fim de afastá-los, e sim o Pai assim Me obrigou a falar. Eles se aborreceram e se afastaram, e nisto nem Eu nem eles são culpados, e foi bom que tal acontecesse. Poderão voltar e ficar, se quiserem; assim não sendo, Minha Missão e Doutrina não deixarão de ser menos verdadeiras, como a luz e o calor do Sol não enfraquecem pelo simples motivo de muitos ignorantes não se deixarem iluminar e aquecer por ele. Compreendestes?”
Respondem os judeus: “Muito bem, Senhor! Tudo que falas contém verdade, força e vida! Como seria bom se isto fosse compre- endido por todas as criaturas!”
Respondo: “Isto será difícil neste mundo, de modo comple- to; entretanto, muitas haverá que o assimilarão e viverão de acordo, colhendo a Vida Eterna.”
50.AABUNDANTE PESCA
(O Senhor): “Agora está na hora de nos aprontarmos para a pesca, pois o momento é propício!”
Obtempera o hospedeiro: “Deve ser assim por Tu o afirma- res, Senhor; pelo critério dos pescadores seria precisamente o con- trário, porquanto os peixes descem ao fundo do mar quando o Sol desaparece.”
Insisto: “Justamente por isto iremos pescar, para provar en- tendermos mais deste ofício que os pescadores. Qualquer um pode
pescar de dia em mar sereno; à noite e com mar revolto, só Eu sei fazê-lo. Vamos à obra!” Em seguida tomamos várias redes e soltamos os botes, navegando uns três estádios para dentro do mar.
Eis que digo: “Atirai as redes bem estendidas e os marujos poderão remar calmamente em direção à praia, onde veremos se o desaparecimento do Sol se nos tornou um impedimento!” Tudo é feito conforme mando; quando chegamos à margem, as redes se acham tão repletas de peixes especiais, a quase romperem os apetre- chos. Os depósitos não comportam tudo, de sorte que um terço é guardado na rede, dentro da água.
Exclama o taverneiro: “Eis um fato inédito, Mestre! Se Tu, durante dez anos, morasses com outros tantos discípulos em minha casa — não poderia recompensar-Te o lucro facultado com esta re- dada. Toda a minha posse, incluindo a sólida casa, as dependências agrícolas, os campos, pastos, hortas e vinhas, nem de longe repre- sentam o valor desses inúmeros peixes grandes e de especial qua- lidade, que raramente são pescados no inverno. Se em uma feliz oportunidade se consegue pegar dez, já a pessoa se torna rica; pois essa qualidade é comprada por cem moedas de prata cada um, por gregos e romanos, que os salgam e revendem nas cortes por umas trezentas pratas. Se o permitires, Senhor, poderia mandar meus ser- vos com alguns exemplares à cidade e nos certificaríamos da grande importância que trariam.”
Digo Eu: “Pois não; apenas orienta teu pessoal para não Me denunciar! Em tal caso teríamos aqui, em breve, romanos e gregos importantes. Além disto, manda preparar alguns desses peixes para o jantar e tu mesmo irás saboreá-los, pois até hoje só ouviste comentar seu paladar especial. Então saberás por que se paga preço tão elevado por eles. Tira alguns das redes tanto para nós quanto para a venda, sem tocares nos guardados em depósitos.”
O hospedeiro manda cada um dos cinquenta empregados levar dois peixes, porquanto não são capazes de carregar um ter- ceiro. Quando são demonstrados aos gregos e romanos, faz-se um leilão, de sorte que cada exemplar dá quarenta a cem quilos, dan-
do um lucro de cerca de duzentas libras de prata. Os compradores, incluindo alguns judeus, indagam de sua procedência excepcional para tal época.
Os empregados respondem terem sido informados dum segre- do por um pescador estranho, no sentido de conseguirem tais exem- plares nesta temporada. O bom resultado prova a eficácia da informa- ção. Ninguém mais faz perguntas, e os servos dentro em pouco trazem tanto dinheiro aos cofres de Mathias, que mal sabe como guardá-lo. Entrementes o jantar está pronto e nos sentamos à grande mesa.
Ao depararem com o farto ágape, os neojudeus dizem: “Durante nossa vida saboreamos somente uma vez peixes tão for- midáveis — e agora se acha uma grande quantidade deles à nossa frente! Mestre, eis também uma prova de Tua Carne e Teu Sangue, conforme explicou Mathias, pois sem Tua Palavra e Vontade jamais teríamos desfrutado deste luxo! Por aí se vê o que podem Amor, Sabedoria e Onipotência Divinos! Quão ínfimo é o homem perto de Ti, Senhor!”
Digo Eu: “Não é bem isto; pois a Vontade de Deus quer que cada um se torne tão perfeito como o Pai no Céu! E os tempos demonstrarão que os Meus verdadeiros discípulos farão coisas mais grandiosas que Eu atualmente. Por ora ainda não é possível, mas dentro em breve sê-lo-á! Deixemos este assunto para entregarmo-
-nos ao jantar.
Enquanto os convivas estiverem em companhia do noivo, não deverão passar privações; pois quando Ele subir de onde veio, ainda passarão por atribulações diversas. Eu sou o Verdadeiro Noi- vo, e os que em Mim creem, as noivas e convivas ao mesmo tempo! Por isto, sejamos alegres e felizes!” Todos se servem à vontade, de- monstrando verdadeiro bem-estar.
Nisto um neojudeu Me diz: “Em casa de Kisjonah sabo- reamos peixes especiais de bom paladar; não podem, todavia, ser comparados com os daqui, conquanto a água seja a mesma.”
Digo Eu: “Sim, mas não o mesmo solo. Estes só aparecem nesta zona, nas profundezas marítimas, onde encontram seu alimen-
to em determinadas plantas aquáticas. Tais plantas só se dão aqui em uma extensão de mil acres.”
51.JEJUMEPENITÊNCIA.APARÁBOLADOFARISEUEDOPUBLICANO(EV.LUCAS18, 9–14)
Peixes e vinho são mui saborosos e Eu Mesmo como com muito apetite, de sorte que alguns convertidos estranham Minha Atitude, porquanto sabem ser Eu compenetrado do Espírito Divino. Percebendo tais observações, digo: “Tanto o corpo quanto o espírito necessitam de nutrição; no momento, nos compete alimentarmos o físico, sem desconsiderar mais tarde o espírito.
É erro pensar-se ser útil a Deus através do jejum e a penitên- cia externa pelos pecados cometidos, pois aquele somente é agradá- vel a Deus quando a pessoa se alimenta com gratidão daquilo que o Pai lhe faculta, a fim de fortificar suas forças físicas para o trabalho em benefício do próximo; e caso haja cometido algum pecado, o reconheça, se arrependendo, enojado, e não mais caindo em tal erro.
Infelizmente muitos há que se entregam a vida toda à gula e ao conforto. Desconhecem o amor ao próximo, e sentem asco dos pobres, não os deixando entrar pela porta; pois sua intemperança impede que sintam a dor de fome e sede. Tais pessoas são verda- deiros comilões, beberrões e devassos, que deste modo prontificam seu corpo a toda sorte de impudicícia, perversidade, lascividade e adultério, jamais podendo ingressar no Reino de Deus.
Na mesma situação se acham os fingidos que jejuam, se pe- nitenciam em vestes de crina e fazem consideráveis oferendas no Templo como resgate de suas falhas, a fim de que sejam justificados e considerados pelo povo; eles mesmos, porém, desconsideram o próximo, desprezando-o como possível pecador, e desviando-se-lhe de longe por não terem visto ele jejuar em vestes de penitência, tam- pouco ter feito sacrifícios.
Eu, porém, vos afirmo: tais pessoas são igualmente um hor- ror para Deus, pois seu coração, sentimento e intelecto estão en-
durecidos. Criticam o semelhante sem dó nem piedade; varrem a soleira do vizinho sem se aperceberem do montão de lixo na sua pró- pria porta. Em verdade vos digo: a medida aplicada por tais santos e justos do Templo ser-lhes-á retribuída no Além! Quem julgar aqui será condenado no Além; quem apenas fizer crítica de si mesmo lá não será julgado, e sim imediatamente aceito no Meu Reino!
Dar-vos-ei, através duma parábola, um exemplo de como deve ser considerada a justificação humana em sua pureza e dentro da aceitação de Deus. Dois homens subiram ao Templo a fim de orar: um era judeu rico que vivia dentro do rigor da Lei; o outro, um publicano. Quando lá chegaram, o primeiro se dirigiu ao Altar e disse: Ó Deus, rendo-Te graças por não ser igual a muitos outros! Pois Tu, ó Senhor, deste-me uma vontade boa e firme, e além disto os bens terrenos, pelos quais unicamente me foi possível cumprir integralmente os Teus Mandamentos; quão feliz se sente minha alma por se encontrar totalmente justificada diante de Ti, no fim da vida! — Após ter dado expressão a quantidade de ações justas, ele depositou uma rica oferenda no Altar para em seguida voltar a casa, satisfeito consigo mesmo e de consciência tranquila; encontra o seu pessoal, porém, não muito alegre com sua chegada, em virtude de sua organização severa e justiça equilibrada, descobrindo somente pecados e erros nos serviçais.
O publicano pecador arrependeu-se dentro do Templo, per- manecendo na retaguarda, sem se atrever a erguer os olhos ao Altar e dizendo, intimamente: Ó Senhor, Deus de Justiça, Santo e Po- deroso, sou demasiado pecador e não mereço levantar os olhos ao Santíssimo; sê, porém, Misericordioso para comigo! — Qual dos dois teria seguido ao lar plenamente justificado?”
Os greco-judeus se entreolham sem saber que resposta dar; pois aos seus olhos apenas seria justificado quem cumprisse a Lei até a última vírgula, e o publicano jamais poderia ser considera- do como tal.
Digo-lhes, entretanto: “Errado é o vosso critério! De modo algum o judeu teve mérito de justiça, porquanto exaltou sua pes-
soa diante do povo, atraindo atenção, admiração e elogio, com que já recebeu o seu prêmio. Acaso tal convicção não é a pior espécie de orgulho?! Seu efeito é, no final, altivez, desprezo e constante perseguição de todos que não lhe rendam consideração adequada. Seria tal homem justificado perante Deus? Absolutamente! Longe estará disto!
O publicano, porém, é justificado diante do Pai; pois é cheio de humildade e se considera pior que os outros. Não despreza nem odeia quem quer que seja, e se dá por satisfeito em não ser persegui- do e evitado ainda mais. — Que Me dizeis, Meu Critério é justo?”
Respondem todos: “Ó Senhor, apenas Tu tens razão em to- das as coisas, enquanto somos criaturas ignorantes e pecadoras, e nosso parecer só pode traduzir nossa índole. Tua parábola é real e verdadeira; muitas vezes tivemos oportunidade de observar tais jus- tos, que sabiam apresentar-se tão puros quanto o Sol, e não era pos- sível afirmar-se terem eles simulado dentro do Templo, pois consi- deravam conscientemente todas as Leis. Precisamente por isto eram intragáveis; seu cumprimento não tinha por base o reconhecimento da Vontade e Ordem Divinas, e sim aplicavam-no como se fosse a Lei obra sua, a fim de que pudessem influenciar seus domésticos, condenando seus defeitos e pecados. Nossa observação feita nesse sentido nos facilita a compreensão de Tuas Palavras, pelo que Te agradecemos com sinceridade.”
Acrescento: “Muito bem; sede, pois, alegres e servi-vos caso tiverdes vontade! Eu Mesmo ainda fá-lo-ei!” Todos seguem o Meu exemplo.
52.TENTAÇÕESEFRAQUEZAS.O PENSAMENTO
Em seguida o hospedeiro Me pergunta se queremos repousar, porquanto já é alta noite. Respondo: “Quem quiser dormir, que o faça; Eu para tanto não tenho vontade. Além disto, não é salu- tar deitar-se imediatamente após a refeição; assim, continuaremos
acordados por mais algum tempo. Quem, todavia, estiver cansado poderá recolher-se!”
Protestam todos: “Não, não, ó Senhor, ficaremos Contigo até amanhã, se o quiseres! Estamos convictos ter tudo que dizes uma importância interna e impenetrável!”
Digo Eu: “Tendes razão, vigiai e orai para que nenhum de vós venha a cair em tentação!”
Obtemperam Meus discípulos antigos: “Senhor, qual tenta- ção poderíamos sofrer ao Teu lado?! Já assistimos a muitos fatos em Tua Companhia, e poucos foram os momentos de tentação!”
Digo Eu: “Não vos vanglorieis por isto; pois o espírito da tentação é qual leão esfaimado, procurando tragar os homens! Pre- ciso é uma constante vigilância a todos os sinais de tentação, por mais fracos que sejam! Se ela conseguir atrair a alma por um átimo, necessário é a criatura aplicar uma grande força de vontade para vol- tar ao estado anterior. Considerai bem isto; pois enquanto o homem viver, pensar, querer e agir neste mundo, sua carne pesará mais que sua alma.”
Diz Philippe: “Isto é verdade e já o percebi pessoalmente; mas em minha idade avançada não haverá tentação que me pertur- be! Tenho apenas umdefeito, que consiste numa temporária falta de fé; isto é, creio em tudo que proferes, Senhor. Se meu intelecto vez por outra não consegue assimilar tudo, minha fé enfraquece. Pron- tamente sou levado a consideráveis indagações, que não recebem respostas, começando eu a cair em pequenas dúvidas. Eis a única tentação que às vezes me aflige. Com facilidade Tu me poderias li- vrar disto, Senhor, fazendo-me o homem mais feliz!”
Digo Eu: “Se assim fizesse através de Minha Onipotência, não mais serias criatura livre, caindo numa preguiça acentuada, e em breve estarias no término, quanto ao exercício pela conquista da verdadeira força vital de tua alma.
Por isto deve cada qual carregar o seu fardo e exercitar-se constantemente em todas as boas inclinações psíquicas! Em tempo
oportuno sua medida vital se completará, e só então sentir-se-á feliz pelo pão ganho com o suor do rosto.
Imagina um homem fraco e negativo que jamais fora incenti- vado ao trabalho; alimentava-se do bom e do melhor, mal aprenden- do a falar, e além do peso da roupa nunca suportou outro. Quando for obrigado a carregar um fardo de algumas libras durante pouco tempo, quase não poderá fazê-lo, porquanto nunca exercitou as for- ças físicas. Se, entretanto, iniciar o exercício, em alguns anos conse- guirá suspender e carregar pesos maiores. Acaso teria alcançado tal força se tivesse deixado que outros trabalhassem por ele?!
O mesmo acontece com tua força intelectual: desde infân- cia a aplicaste de modo reduzido, começando a fazê-lo em idade mais avançada, e não deves admirar-te de não seres capaz de com- preender e assimilar certas coisas tão rápido como fazem os outros.
Eu sou um bom Professor e Guia, e não carrego os Meus discípulos por cima de trilhas e caminhos pedregosos e escarpados, mas deixo-os caminharem sozinhos para que se tornem aptos e for- tes em todas as estradas penosas.
Caso se apresente um empecilho demasiado difícil a ser su- perado, dar-lhes-ei conhecimento e força para vencê-lo. Antes de tudo, porém, cada um terá que aplicar suas energias; o que além disto necessitar ser-lhe-á dado em tempo. Compreendeste?”
Responde Philippe: “Sim, Senhor, e me esforçarei por au- mentar minha inteligência e fé!”
53.DESTINODAS CRIATURAS
Diz a seguir o hospedeiro: “Tenho a mesma fraqueza que este discípulo e sei, portanto, o que fazer. Não quero referir-me a todos os profetas e ao Cântico de Salomon, porque pouco deles assimilei; ainda assim cheguei à conclusão, durante aquela leitura, terem eles obrigado, através de sua linguagem mística, os homens a meditar e aplicar a introspecção; o que aceito de grande benefício. Só des- te modo se consegue um conhecimento após outro, esclarecendo
aquilo que anteriormente parecia enigma. Mas, como já disse, não quero mencionar a incompreensão da Escritura, e sim refiro-me às coisas naturais.
Haja vista a verdadeira finalidade de qualquer ser nesta Terra, por exemplo, esses peixes excepcionais. Inventou o homem de pe- gá-los, levado pela fome. Seria esse seu verdadeiro destino? E nesse caso, qual foi sua finalidade antes do homem ter tido a ideia de pescá-los?!
Semelhantes perguntas poderia fazer aos milhares e quanto mais penso a respeito, tanto mais me embaraço, distanciando-me da luz ao invés dela me aproximar, sem jamais chegar a uma conclusão satisfatória acerca das sábias intenções do Criador com Sua Cria- ção. Talvez nem fosse útil ao homem tal conhecimento. Possuindo a inclinação para a pesquisa, ele não descansa até que consiga uma elucidação maior. O mesmo acontece comigo: embora ciente de que todas as lucubrações de nada adiantam, continuo a fazê-las e deseja- va de Tua parte um meio para delas me livrar.”
Digo Eu: “Meu caro amigo, será difícil ajudar-te; pois seria preciso estender-Me por muito tempo, a fim de te esclarecer a ver- dadeira finalidade de todos os espécimens. De modo geral, posso dizer-te que toda Criação visível e palpável contém elementos espi- rituais em julgamento e se destina a passar para uma existência livre e independente através de séries de formas variadas.
As formações se iniciam na pedra, passando por todos os mi- nerais até o reino vegetal, de lá ingressando ao animal e, finalmente, ao homem; todas essas formas são receptáculos da Vida provinda de Deus. Cada forma corresponde a certa inteligência; quanto mais simples, tanto mais reduzida a capacidade intelectiva. Ao deparares com uma forma mais desenvolvida e condensada por diversos ele- mentos, tanto maior será a inteligência nela encerrada.
Observa uma simples minhoca: através de sua ação saberás corresponder sua ínfima inteligência à sua forma; fazendo estudos com a forma complicada duma abelha, por certo descobrirás uma bem maior! Deste modo chega-se até ao homem!
Sendo todas as formas apenas acumuladoras e portadoras temporárias duma existência mais condensada e de inteligência pro- gressiva, e esta existência em sua evolução abandonando as ante- riores formações à medida e condição duma concatenação recente
pouca importância tem aquilo que sucede à forma desvitalizada, pois é apenas invólucro bem estruturado de função mecânica. Não altera, portanto, os Desígnios do Criador se esses peixes são ingeri- dos por nós ou por outros animais, pois a finalidade vital é incontes- tavelmente alcançada.
É conhecimento geral encontrarem-se partes nutritivas den- tro dos invólucros desvitalizados, e através da absorção recíproca da- quelas formas a parte mais nobre passa a outra existência; assim ob- servarás nesta Terra uma constante luta e intercâmbio de vida dentro do grande ciclo dos seres, até chegares ao homem.
A forma humana, ou seja, o corpo, também só é importante enquanto habitada pela alma, possuidora da vida; tão logo estiver amadurecida, ela abandonará o físico que então será absorvido, e não interessa saber por que meio. O que nele for elemento substan- cial e parte integrante da alma será devolvido a ela; o restante passa como nutrição a milhares de outras formas. Eis em poucas palavras uma definição básica daquilo que te provocou tanto desgaste men- tal. Assimilaste tudo?”
54.ARESSURREIÇÃODA CARNE
Responde o hospedeiro: “Mais ou menos, e tenho que con- fessar ser tal assunto completamente novo e inédito; pois em tal caso, não haverá ressurreição da carne, crença de todos os judeus, razão por que enterram os defuntos em determinado cemitério, na expectativa de serem ressuscitados pelos anjos no Dia Final, unin- do-se às suas almas. Dificilmente os judeus dar-Te-ão crédito! Eu o aceito por Tu nos teres esclarecido; nunca o faria se algum outro o tivesse dito. Qual o parecer dos Teus adeptos?”
Manifesta-se um greco-judeu: “Quanto a nós, concordamos contigo reconhecendo a veracidade do ensino, mas também a difi- culdade enorme de sua aceitação.”
Intervenho: “Este ensinamento não vos foi dado a fim de que o passásseis aos judeus! Querendo podereis fazê-lo, e sua aceitação não virá ao caso. Com o tempo Meus genuínos confessores serão le- vados a toda Sabedoria e Verdade através de Meu Espírito espargido sobre eles.
É lógico que o corpo físico, após o afastamento da alma, não pode ressuscitar; pois em tal hipótese, deveriam ressurgir e ser vivi- ficadas todas as partes que durante o transcurso prolongado da vida foram despidas, como sejam: cabelos, unhas, dentes, epiderme mais grosseira gasta pelos banhos, sangue perdido através de ferimentos, suor e tantas outras coisas. Imaginai tal figura humana vivificada no Dia Final — que aspecto ridículo não teria!
A criatura tem um corpo correspondente à sua idade; o de uma criança é diferente dum garoto, dum adolescente, dum adul- to e dum ancião. Numa completa revivificação dos defuntos no Dia Final, seria interessante saber se as formas diversas da infância até a velhice deveriam passar por tal estado de uma só vez ou su- cessivamente.
Além disto, surge a seguinte questão de grande importância: romanos, gregos, egípcios e outros povos desta Terra costumam in- cinerar os corpos. Noutra parte atiram-se eles ao mar, onde são in- geridos pelos monstros marinhos, tornando-se parte deles; quando tal monstro morre, é tragado por outros animais aquáticos. O que, pois, poderia ressurgir de corpos tais no Dia Final? Durante a cre- mação é a maior parte vital do corpo dissolvida em vapor e fumaça, unindo-se ao ar; nos que foram atirados à água, a carne ingressou na substância física dos peixes, aceitando uma individualidade com- pletamente diversa. A quem caberia selecionar e reunir as anteriores partes físicas de inúmeros animais da terra, da água, do ar, dos mi- nerais, das plantas e vermes?!
Ainda que não fosse impossível para Deus, resta saber que utilidade teria isto para a alma livre; pois uma vez liberta do corpo pesado, teria que sentir-se muito infeliz caso obrigada a voltar a ele para toda Eternidade!
Além disto, seria algo jamais admissível dentro da eterna Or- dem de Deus, por ser Ele Mesmo Espírito Puríssimo, e no final as criaturas têm a exclusiva finalidade de se tornarem espíritos livres de semelhança divina. Para que então lhes seriam úteis os corpos?!
Serão revestidos, no Além, de corpos, não pesados e terrenos, e sim de novos, espirituais, que surgirão das boas obras praticadas dentro de Minha Doutrina. Assim sendo, como admitir-se na res- surreição da carne a futura revivificação do corpo físico?! A ressur- reição da carne representa as boas obras praticadas ao próximo, que unicamente facultam a Vida Eterna e Verdadeira à alma.
Quem, portanto, ouvir a Minha Doutrina, crer em Mim e agir de acordo será despertado por Mim no Dia Final, isto é, no imediato desprendimento da alma da matéria, de sorte que ninguém observará a rapidez da transformação. Julgo estardes todos bem in- formados; caso houver alguma dúvida, podereis externar-vos!”
55.MOLÉSTIASEMORTES PREMATURAS
Diz um greco-judeu: “Senhor e Mestre, tudo isto nos é claro; existe apenas um ponto que não consigo explicar. Por que é preci- so morrerem tantas crianças na idade mais tenra, e qual o motivo preceder à morte quase sempre uma moléstia grave, que enfraquece e extermina o corpo? Uma vez a criatura alcançando a maturidade, sua alma poderia deixar o físico sem sofrimento, e as crianças jamais deveriam morrer antes dum certo discernimento. Entretanto, elas morrem em todas as idades, e as moléstias graves continuam sendo uma constante praga para o homem. Por que isto?”
Respondo: “Não seria preciso e também não o foi na antigui- dade; acaso encontraste na Crônica menção de enfermidades perni- ciosas entre as criaturas devotas a Deus e cumpridoras de Suas Leis?!
Alcançavam idade avançada e sua morte era apenas um adormecer suave e sem dor! Não havia criança que morresse; pois era gerada por pais sadios, alimentada e criada de acordo com a Natureza simples.
Quando mais tarde manifestou-se toda sorte de orgulho, e com ele um exército dos piores pecados contra os Mandamentos de Deus e as Leis da Natureza, surgiram por culpa própria moléstias va- riadas entre os homens. Deste modo enfraquecidos, não podiam ge- rar filhos sadios; pois tais rebentos, já atrofiados no ventre materno, forçosamente tinham que passar por várias enfermidades, morrendo em todas as épocas.
Não deveis pensar ser isto determinado por Deus, em virtude de Seu Desígnio impenetrável; Ele o permitiu, a fim de que as cria- turas fossem impedidas a pecar através das moléstias, afastando-se do mundo pelo sofrimento e refletindo até reconhecerem seus peca- dos e desprezá-los; pela paciência e conformação na Vontade Divina alcançariam sua felicidade.
O mesmo acontece às crianças! Que esperar duma criança completamente atrofiada, mormente os pais tendo sido gerados dentro do pecado? Quem as educaria e curaria de seus males?! Não seria melhor afastá-las deste mundo, a fim de que fossem criadas pelos anjos, num reino expressamente instituído para elas?!
Afirmo-vos: Deus sabe de tudo e cuida de todos! Como nesta época, porém, a maioria desconhece a Deus e nada quer saber do Pai, como poderá estar orientada daquilo que Ele faz e determina para sua possível salvação?!
Caso Ele não tivesse permitido as moléstias corresponden- tes aos pecados, mais que metade do Gênero Humano sucumbi- ria e a Terra se transformaria em inferno; seria preciso destruí-la, e seus destroços sem vida vagueariam pelo Espaço Infinito, onde já se acham exemplos semelhantes, dos quais Meus discípulos vos pode- rão informar. Compreendestes isto?”
Respondem os greco-judeus: “Sim, Senhor e Mestre, e não mais nos lastimaremos das enfermidades havidas, e talvez seremos transportados ao Além em consequência de moléstia grave, pois
muito pecamos em vida! Desejava apenas ouvir de Ti quais os peca- dos a proporcionarem as piores enfermidades, porquanto deve haver diferenciações!”
56.PRINCIPAISCAUSASDAS MOLÉSTIAS
Digo Eu: “Entre todos os vícios os piores são: prostituição, impudicícia e lascividade de todos os matizes. As criaturas são tenta- das para tanto através do ócio, orgulho e altivez; pois ao orgulhoso nada é santificado, procurando satisfazer suas tendências sensuais com todos os meios disponíveis. Se tais pessoas geram filhos — só podem vir ao mundo rebentos miseráveis, assolados por várias mo- léstias; portanto, é este pecado uma fonte principal das piores en- fermidades.
Além deste, existem intemperança, raiva e irascibilidade como provocadores de vários males, que muito martirizam as criatu- ras. Não disse Eu ao enfermo em Jerusalém que durante trinta e oito anos esperava se curar no Lago Bethesda: Vai e não peques mais, a fim de que não te suceda coisa pior!? Seu reumatismo infeccioso era apenas consequência de seus pecados. Fato idêntico sucedeu com quase todos os curados por Mim, e caso não tivessem adoecido em virtude de múltiplos pecados, suas almas estariam perdidas, pois so- mente uma enfermidade grave conseguiu que ficassem mais sóbrios, demonstrando-lhes a maneira pela qual o mundo recompensa seus aduladores. Perderam através das moléstias seu amor à matéria e al- mejavam sua breve libertação; isto fez com que sua alma se tornasse mais liberta, e em tempo oportuno seu corpo se curou.
Ao lado dessas causas principais que provocam a maioria das enfermidades em pessoas fracas de nascença, existem outras pelas quais os fracos podem adoecer gravemente — mas repito: isto só sucede aos debilitados desde o nascimento! Em resumo, os motivos são em primeira linha: alimentos nocivos, impuros, mal preparados e estragados e bebidas prejudiciais; além disto, o hábito de comer frutas verdes e o péssimo costume de refrescar-se com bebidas frias.
Há os que desconhecem sua fraqueza inata, expondo-se a muitos perigos, onde perecem ou se prejudicam para o resto da vida. Nisto não cabe culpa a Deus, porquanto deu ao homem o raciocínio, o livre arbítrio e as melhores Leis para a vida.
Contra a preguiça não existe recurso mais eficiente do que males variados, que imprescindivelmente seguem ao não cumpri- mento da Vontade Divina; eles despertam a alma profundamente adormecida na sua carne, e lhe demonstram as consequências in- cômodas do ócio. Assim ela se torna mais prudente, alerta, ativa e submissa à Vontade de Deus, tornando-se as moléstias um bene- fício real.
De modo idêntico, não deixam de ser uma espécie de julga- mento que obriga a alma ao bem; ainda assim, a livre vontade não é inteiramente tolhida, podendo ela purificar-se durante e após a en- fermidade, muito embora só consiga seu aperfeiçoamento no Além.
Existem pessoas que nascem enfermas em virtude das molés- tias de pais e avós; suas almas são geralmente do Alto e só passam por uma encarnação temporária. Além disto, têm elas seu cuidado garantido no Além e todos os que lhes dedicam amor e paciência serão por elas recebidas com a mesma dedicação em sua morada ce- leste. Deste modo dei um esclarecimento total neste assunto; quan- do vosso espírito despertar inteiramente, ele vos conduzirá à plena sabedoria. Tereis compreendido também isto?”
Respondem todos: “Senhor e Mestre, compreendemo-lo in- teiramente e Te agradecemos por tudo. Pois como futuros doutrina- dores por certo teremos que lidar com muitos enfermos, portanto é necessário inspirarmos fé, coragem e paciência totais para produ- zirmos, se necessário, alívio dos seus sofrimentos, porquanto sofrerá menos quem tiver paciência. Por isto achamos essa Tua Orientação formidável, pois ninguém merece maior consolo que um enfermo e consideramos obra realmente caridosa quem socorra física e espiri- tualmente. Não é isto, Senhor?”
Aduzo: “Sem dúvida; pois o amor ao próximo só deve ser aplicado a quem necessita, para ter valor diante de Deus. Por isto
acrescento: caso algum dê um jantar convidando vizinhos e amigos ricos, não terá pecado; todavia, não deve esperar paga no Céu, por- quanto aquelas pessoas lhe poderão retribuí-lo. Razão por que deveis convidar aos pobres, garantindo-vos pagamento no Céu, pois eles não vos podem retribuir!
O mesmo acontece com aqueles que emprestam dinheiro a juros, recebendo-o de volta após certo tempo. Não pecaram, caso não tenham praticado usura; no Céu não poderão aguardar juros, a não ser que o tenham feito aos pobres sem considerar juros, e a própria devolução do capital. A verdadeira obra de caridade se faz aos pobres, de qualquer forma. — Para hoje fizemos o bastante, po- dendo recolher-nos; o dia de amanhã trará seus problemas.” A estas Minhas Palavras todos agradecem e se retiram.
57.A RESSACA
Levantamo-nos cedo, e Eu vou — como sempre — acom- panhado de alguns discípulos, ao ar livre. A manhã primaveril é fresca e radiosa, e causa estranheza a agitação do mar, embora não houvesse ventania. Em breve junta-se a nós o hospedeiro, pergun- tando pela causa desse fenômeno. Então lhe digo: “Crê-me, todo Poder no Céu e na Terra Me foi dado, de sorte a se tratar aqui duma ressaca motivada pela Minha Vontade! Mais tarde certificar-te-ás de seus motivos!”
Ainda mais surpreendido, ele diz: “Senhor, sei que todas as forças da Natureza estão sob Teu Poder; ignorava ter a agitação do mar uma razão oculta, mormente numa manhã tão serena. As ondas crescem constantemente! Talvez fosse preciso proteção para os na- vios e depósitos de peixes!”
Digo Eu: “Deixa estar; não haverá prejuízo para coisa algu- ma, enquanto não passarão bem aqueles que se acham em alto mar, com intenção maldosa. Não serão tragados; mas sua coragem per- versa estará abrandada após a difícil chegada à margem!”
Indaga o hospedeiro: “Quem serão e quais suas intenções?”
Respondo: “Recordas-te ter Eu, há vários meses, passado a Festa dos Tabernáculos em Jerusalém, onde doutrinei o povo dentro do Templo, após curar um homem enfermo há trinta e oito anos, e além disto socorri grande número de pessoas nos arrabaldes de Jeru- salém e Bethlehem. Muitas se tornaram crentes e Me seguiram, fato conhecido dos templários. Por isto resolveram novamente Minha captura e morte. Meu Tempo ainda não chegou, de sorte Eu lhes preparar um empecilho para suas intenções tenebrosas. Eis o motivo da ressaca, compreendeste?”
Diz ele: “Oh, sim! Neste caso o mar deveria agitar-se ainda mais através duma forte ventania, a fim de sentirem como Deus lhes paga sua maldade!”
Esclareço: “Um furacão seria de grande utilidade para eles, por terem navio resistente, que em breve chegaria ao porto; enquan- to que essa ressaca os faz desesperar: não conseguem mudar de posi- ção, não obstante os fortes remos, porquanto cada onda atira o navio ao ponto anterior, sucedendo-lhes o mesmo que a um excursionista que pretenda subir o morro por cima de entulho. A cada passo, as pedras cedem e ele volta de onde partiu. Assim é essa ressaca o maior empecilho para os Meus perseguidores! Deixemo-los e vejamos se o desjejum está preparado!” Diz o hospedeiro: “Aí vem o empregado, a fim de nos chamar!”
Digo Eu: “Enganas-te, ele vem trazer o recado terem os discípulos perguntado por Mim. Deu-se entre eles uma pequena controvérsia e Me esperam como Juiz. Deixá-los-emos questionar mais um pouco, e em seguida haverá tempo de conduzi-los ao jus- to caminho.”
Diz Mathias: “Qual seria o motivo de sua discussão?”
Respondo: “Oh, uma bagatela! Alguns dos discípulos an- tigos foram inquiridos pelos vinte novatos da causa da agitação marítima, e aqueles informaram ter sido isto causado por Mim por motivo oculto. Os outros, porém, não aceitaram tal sugestão, dizendo: Sabemos ter tudo que existe origem no Senhor; ainda as- sim, Ele determinou forças ocultas dentro da Natureza, acionadas
através de Sua Vontade. Em tal caso elas agem diretamente e Deus, por elas, indiretamente. Ele ordenou desde início que todo peso caísse no abismo e tal força age independentemente sobre a maté- ria. Assim, fez com que a água fosse pesada e líquida; tal faculdade é a força oculta da água que a impele às profundezas, sem que Deus viesse pôr Mãos à obra, sendo obrigado a conduzir o líquido aos riachos e rios. O mesmo deve suceder aqui com o mar agitado, sem haver ventania; este fato é apenas mais surpreendente do que ocasionado por tufão.
Os discípulos antigos continuavam afirmando que tal mo- vimentação da água não é indireta, mas diretamente provocada pelo Poder de Minha Vontade. Acontece que ambos os partidos têm ra- zão, por isto Me esperam como Juiz. Vamos até lá para unificá-los na Justiça e Verdade!” Incontinenti voltamos a casa onde todos Me abordam no mesmo assunto.
Eu os fito com amabilidade e digo: “Disputais por coisa de somenos importância! De modo geral vós, novatos, tendes razão; no caso em si, os antigos estão certos. Pois esta agitação marítima, estranha, não deriva duma força indireta, mas diretamente de Mi- nha Vontade.
A fim de vos certificardes, observai o mar numa constante agitação! Darei ordem a uma pequena parte, próxima à praia, para aquietar-se e vereis que a Minha Vontade pode efetuar algo direta- mente.” Acalmo — apenas pela Vontade — uns duzentos acres do mar, de sorte que se apresentam qual espelho, enquanto fora deste limite o mar se agita mais fortemente. Quando os novatos o perce- bem, caem de joelhos para adorar-Me.
Digo-lhes, porém: “Não façais isto! Não vim a este mundo para deixar-Me honrar e adorar, mas simplesmente para demonstrar às criaturas os Caminhos da Verdade e da Vida e socorrer a todos que sofrem e se acham cansados e sobrecarregados por provações.
Pretendendo adorar a Deus — em Si Espírito Puríssimo — tereis que fazê-lo pelo amor no coração, em espírito e verdade, pelas boas obras. Tudo que fizerdes aos pobres por amor a Deus tereis
feito a Ele, e além disto acreditardes em Mim, Enviado pelo Pai para junto de vós — eis no que consiste a verdadeira adoração a Deus. Toda prece de boca é um horror para Ele e sem valor algum. Quem adorar a Deus com os lábios, deixando o seu coração frio e inativo, fará de Deus um ídolo, praticando uma verdadeira prostituição es- piritual. Isto se lê no profeta, que diz: Este povo Me honra com os lábios, enquanto seu coração está longe de Mim!
Em verdade vos digo: onde o coração não adorar a Deus pelo amor verdadeiro, puro e desinteressado, toda prece terá o efeito dum eco vazio, que se perde e aniquila no éter. Sou vosso Mestre, e vós, Meus discípulos. Crede o que vos digo e fazei o que vos exijo, seguindo-Me! Entre nós, é quanto basta!” Com isto os novatos de- sistem da adoração e nos dirigimos ao desjejum.
58.PEDROEORICONEGOCIANTEDE CAPERNAUM
Durante a refeição falamos pouco; tanto mais, porém, termi- nada, em virtude da chegada de muitos hóspedes da cidade ansiosos por ver a ressaca e, em parte, para almoçarem, pois Mathias goza de boa reputação em toda parte. Como alguns deparam com vários discípulos conhecidos, presumem estar Eu presente.
Um distinto capernauense, que conhece Simon Pedro, cha- ma-o de lado e diz: “Caro amigo, sabes ter eu sempre comprado os teus peixes, ajudando a tua família no que possível; acontece que tu e vários outros homens honestos perambulais há mais de um ano em companhia do nazareno, conseguindo deste modo fazer grande número de inimigos entre os judeus. Além disto desleixais vosso lar e famílias, o que não pode estar de acordo com as Leis de Moysés! O nazareno tem feito milagres extraordinários, levando a crer ser ele profeta ungido por Deus! Quando se ouve suas prédicas, duvida-se até mesmo de suas faculdades mentais, ou talvez pretenda dizer to- lices que pessoa alguma suporte ouvir, como por exemplo ontem, na sinagoga. Todo mundo estava ansioso por ouvi-lo por causa de sua fama; o discurso, tão absurdo foi a ponto de provocar abor-
recimentos! Se nada de melhor aprendeis, sois dignos de piedade. Tenho razão?”
Responde Pedro, algo irritado: “Amigo, pretendendo for- mar juízo válido acerca de nosso Mestre, terás de conhecê-Lo mais de perto! Há mais de um ano privo com Ele e sei algo mais que tu. Não sou mentecapto, conheço a Escritura e posso julgar acertada- mente; jamais ouvi de Sua Boca algo que não traduzisse a Sabedo- ria mais profunda e divina, incluindo o discurso de ontem, pleno do Espírito de Deus! Ele Se revelando abertamente, entretanto ninguém Lhe acreditando — como poderiam Suas Palavras serem assimiladas?!
Observa o mar em sua fúria! Vê o trecho considerável que se estende à margem, cujo espelho é tão liso que não se altera com as ondas a se projetarem sobre ele! Há meia hora atrás a ressaca era total; Ele ordenou silêncio sobre a margem — e ela obedeceu! Quem seria Aquele a Quem os elementos obedecem instantaneamente?!
Ontem Ele vos disse sem restrição Quem é! Por que não Lhe destes crédito, diante Dele curvando joelhos e coração?! Acaso foi mais inteligente declará-Lo tolo do que dizer-Lhe: Ó Senhor, que nos transmitiste Palavras de Vida, sendo Tu a Própria Vida de Deus, sê Misericordioso para conosco, pecadores ignorantes e pobres!? — Conheço-O e vejo Quem Ele é; por isto fico em Sua Companhia e Dele receberei a Vida Eterna, da qual tenho maior certeza do que desta, atual! E se assim não fosse, de há muito não mais seria Seu apóstolo; pois também sou inteligente como qualquer cidadão!
Verifiquei pela concordância entre todos os profetas que so- mente Ele pode ser o Messias Prometido, o Ungido de Deus desde toda Eternidade, de sorte que permaneço com Ele chamado como apóstolo. Pergunta à minha família se durante minha ausência pas- sou necessidades! Quem, além Dele, teria zelado pelos meus?! Têm pão e vinho de sobra! Ele não cultiva os seus campos e pesca os seus peixes; isto tudo é feito pela Sua Onipotência, pela qual todo solo terráqueo é cultivado! E tu ainda alegas não ser justo abandonar-se lar e família por causa do Nazareno?! Cego que és! Dispenso de es-
clarecimentos de ti e de qualquer pessoa; pois estou suprido pelo Ensinamento Dele! Se não fosses tão obtuso, indagarias acerca de Sua Doutrina e Ações, tornando-te mais inteligente! Sei que os de- mais apóstolos, e também todos nós, somos testemunhas do grande Amor e da Verdade de Deus, o Pai, que veio a nós em Jesus, o Ungi- do, para a salvação de todos que Nele creem, e para julgamento dos que não O querem aceitar, aconselhando e agindo contra Ele.
Não nos arrogamos o direito de declarar-vos de tolos, igno- rantes e volúveis, enquanto isto fazeis de nós, classificando-nos de vadios e aventureiros, sem que para tanto tivéssemos dado motivo. Dize-nos sinceramente, tal é justo perante Deus e o homem?!”
Responde o negociante: “Ora, ora, Simon Pedro, não foi mi- nha intenção aborrecer-te! Não sou culpado de tu conheceres me- lhor o nazareno milagroso que eu, pois não tive oportunidade de privar com ele. Julgo-o apenas por aquilo que vi e o que me conta- ram. Como simples homem só posso julgar humanamente; assim fazendo como teu velho amigo, teria sido mais razoável se tu me tivesses apontado o meu engano com palavras cordatas, uma vez que és mais experimentado e inteligente! Não estou zangado, porque sempre gostei de ti.
Até mesmo a Sabedoria Divina deve convir não ser possível exigir-se de alguém além de suas capacidades; portanto, te pergunto se agiste sabiamente com tua exigência acima de minhas forças espi- rituais, enquanto me asseguras o julgamento em virtude de minha fé e conhecimento frágeis.
A força espiritual está evidentemente acima da natural. Quem não a possuir não poderá compreender conhecimentos mais profundos e ocultos. Entretanto julgo conseguir-se muito mais com amor e paciência do que com rigor, conforme o aplicaste sem neces- sidade. Tenho razão?”
Responde Pedro, algo encabulado: “Sim, não tenho argu- mentos para contradizer-te; deves, no entanto, compreender não ter sido justo me considerares homem volúvel porque abandonei lar, família e profissão para seguir ao Santo de Nazareth!
Bem sei careceres — como muitos outros — da força es- piritual para assimilares de relance os profundos Segredos de Deus; existe, porém, um meio termo! Caso ouça ou veja fatos extraordi- nários, retenho minha opinião com modéstia, até que consiga co- nhecimento maior; se porventura ainda não compreender bem o as- sunto, prossigo no estudo. Se no final nenhuma luz se me faz, estou justificado a dizer: Nada disto entendo, e deixo a critério de outrem formar juízo! Condenar uma situação incompreendida é mais tolo que meu zelo contra ti!
Por certo leste o Cântico de Salomon, compreendendo tan- to quanto eu! Acaso seria prudente condená-lo por isto?! Dedica- mos-lhe grande respeito, muito embora nada entendermos e jamais conseguirmos tal evolução. Caso tivéssemos vivido na época daquele Rei, dotado de tão elevada sabedoria, certamente teríamos a mesma opinião acerca do Cântico, que vós do Discurso feito ontem pelo Se- nhor e Mestre; a obra de Salomon sendo mui antiga, é considerada, não obstante ninguém a entender.
Nosso Senhor e Mestre opera Milagres jamais sonhados por Salomon. Sua Sabedoria e Onisciência são, comparadas às de Salomon, como o Infinito perto dum pontinho no Universo. Não contando mil anos, e sim agindo diante de vossos olhos, são por vós consideradas mera tolice. Reflete um pouco se isto é prudente por parte de homens criteriosos!
Sei ter-me exaltado contigo; mas tal irritação foi justa, por- quanto tinha que demonstrar não sermos, eu e os demais, tolos pre- guiçosos, por termos abandonado tudo para segui-Lo; enquanto isto se dá convosco por não compreenderdes e aceitardes nosso proceder. Pois chegou a época em que todos que o quiserem poderão ser en- sinados por Deus! Afirmo-te como teu velho amigo: Neste, por vós cognominado Profeta de Nazareth, não só habita um espírito pro- fético, mas a Plenitude da Divindade! Vós, porém, sois cegos, não podendo percebê-lo, muito menos acreditá-lo, para o vosso maior prejuízo.”
Diz o rico negociante de Capernaum: “Mas, caro amigo, falas sempre o mesmo! Considera, de mente calma, que jamais um sábio desceu do Céu à Terra — muito menos poderia suceder com pessoas semelhantes a nós! De onde deveríamos saber ocultar-Se a Plenitude Divina no filho do carpinteiro, que por várias vezes traba- lhou conosco, em companhia de seu pai e irmãos?!
Se tivesse vindo do Egito ou da Pérsia, sua pessoa teria tido maior influência e atração; conhecemo-lo desde infância, sem ter dado demonstração excepcional além de ser homem de bons costu- mes! De repente surgiu como doutrinador e salvador extraordinário para enfermos e letárgicos. Qual a conclusão de nosso raciocínio? Foi certamente inspirado pelo Espírito Divino, que o dotou de faculda- des proféticas, e nós não erramos em declará-lo como tal. Somente agora ouço de ti coisa diversa e estranha aos meus ouvidos; mas não importa, porque é preciso ouvir-se algo a respeito dum assunto antes de poder julgá-lo e aceitá-lo como plena verdade. Tudo que disseste é a meu ver merecedor duma reflexão, e caso as condições forem aceitáveis, poder-se-á aquilatar tuas explicações. O fato de ele jamais ter frequentado escola de ocultismo é a favor de sua pessoa; pela afirmação de seu pai nem aprendeu a escrever e ler. Assim sendo, sua faculdade repentina merece maior admiração, inclusive a sua vontade, diante da qual até as pedras se desfazem. De tudo isto fui testemunha ocular; e tu não deves aborrecer-te por eu ter falado de modo humano contigo!”
Diz Pedro: “Não cogito de suscetibilidades; jamais, porém, deixarei de falar a verdade a um amigo. Até aqui passa bem, em Nome do Senhor e Divino Mestre! Tenho que procurá-Lo no recin- to contíguo, pois ouvi Sua Chamada dentro de mim!”
59.ÍNDOLEDASCRIATURAS MUNDANAS
Aproximando-se de Mim, Pedro diz: “Senhor, ouvi Tua Cha- mada! Transmite-me Tua Santa Vontade!”
Digo Eu: “Nada mais do que já disseste bastante àquele ve- lho ricaço! Se tuas palavras não lhe trouxerem melhor compreensão, nada mais poderá consegui-lo; já falaste o suficiente e difícil é levar-
-se os conterrâneos à verdade. Sempre se ouve a mesma indagação: Como chegou esse homem a tal noção, pois conhecemo-lo desde in- fância. — Nesse caso nada mais se conseguirá. Se a Doutrina já cau- sa estranheza, muito mais fá-lo-á sua explicação. Levar tais criaturas, que no fundo não são maldosas, à fé através de milagres e provas extraordinárias seria idêntico a roubar de um só golpe a liberdade e vontade de suas almas; por isto é melhor deixá-las até que venham a pedir maior elucidação.
Caso vierem durante a nossa permanência aqui alguns de- sejosos de informações sobre Minha Pessoa, fazei-lhes apenas ligei- ras alusões aos Meus Milagres, mormente sobre os que devem ficar ocultos; antes de mais nada transmiti-lhes o que devem fazer para alcançar a Vida Eterna. Se isto não os satisfizer, deixai-os seguir ca- minho; pois não convém atirar-se pérolas como alimento de porcos. Quem não considerar uma pequena dádiva não merece maior!
Existem aqui pessoas que apreciam, em certas épocas, pales- trar horas a fio acerca de assuntos espirituais, enchendo-se de bons propósitos; tão logo voltem aos seus afazeres tudo está como que interceptado! E se algo lhes acontece, afligem-se, não obstante todo consolo espiritual, não querendo recordar-se dos momentos de ele- vação. Que utilidade tiveram?!
De modo idêntico foram tuas explicações dadas ao teu velho amigo! Nem sequer pensa nelas, porquanto um negociante de Caná dele se aproximou para combinar uma compra de artigos diversos. Ele bem sabe de Minha Presença e poderia ter entrado a fim de se orientar acerca de Minhas Faculdades excepcionais, e Eu de modo algum tê-lo-ia expulsado! Mas não — o negociante de Caná me- rece mais consideração, e não precisas temer que ele te aborde a Meu respeito!
Tais pessoas longe estão das aptidões necessárias ao Reino do Céu. Assemelham-se aos lavradores que, ao ararem o campo, não
olham para frente, e sim para trás, portanto não veem se o animal traça os sulcos retos. É melhor deixar-se de lado tais criaturas, por não ser possível afastá-las de suas preocupações mundanas, não obs- tante as maiores provas e ensinamentos profundos.
Digo-vos o seguinte: se no futuro fordes transmitir Minha Doutrina como apóstolos aperfeiçoados, considerai o seguinte: caso sejais bem recebidos, ficai, ensinai às criaturas e batizai-as em Meu Nome com água como fez João — e Eu os batizarei com o Meu Espírito, do Alto!
Não sendo, porém, acolhidos, ou apenas como fez o teu ami- go, sacudi de vossos pés até mesmo a poeira existente no local ou na casa, a fim de que nada se vos agarre de mundanismo! Sabeis não ser o Meu Reino deste mundo, porquanto terá que ser criado no íntimo da criatura, pelo conhecimento e o cumprimento de Meu Verbo. A obtenção dessa esfera interna e espiritual da vida celeste será difícil enquanto existir qualquer coisa de mundano no homem.
Falando da poeira que deveis sacudir de vossos pés, não Me refiro ao pó material de aposentos e ruas, pois ele representa as con- trovérsias inteligentes de pessoas idênticas ao teu amigo. São gentis, amáveis e adequadas ao intelecto do mundo; entretanto, nada mais são que simples pó, porque são apenas a favor das coisas materiais, não havendo nem vestígio de uma verdade rigorosa. Do mesmo modo que a poeira das estradas não tem utilidade ao viandante, as palestras mundanas e fúteis de cidadãos inteligentes e ricos de nada valem.
Muito embora não tenha serventia tal poeira, pode tornar-
-se prejudicial; caso se levante um vento impelindo-a, é preciso ta- par-se olhos e boca para não ficar cego e sufocado. Além disto, con- vém ficar parado ou talvez deitado de bruços até que o vento tenha carregado o pó. Com isto o viandante perdeu tempo, atrasando-se em chegar ao seu destino.
A poeira prejudicial ao viajante é idêntica à de conversas fúteis e interessantes, no conceito do mundo, com referência aos peregrinos que caminham pela Estrada da Vida. Com facilidade
ela turva a visão interna, podendo até mesmo provocar a sufocação da Vida Verdadeira, psicoespiritual. No mínimo retarda o progres- so espiritual, não obstante o maior cuidado! Por isto vos disse que deveríeis sacudir o pó agarrado aos vossos pés, para que nada de mundanismo se apresente em vossa pessoa. Em verdade vos digo: enquanto houver umátomo mundano agarrado à alma, ela não po- derá ingressar no Meu Reino; pois todo mundanismo é para a alma idêntico ao veneno para o corpo. A menor gota dum forte veneno pode provocar a morte física; igualmente a menor partícula de mun- danismo consegue aniquilar ou, no mínimo, prejudicar a alma de tal forma, que levará tempo para ressurgir à Vida Eterna, completa- mente curada. A própria experiência vos dará a confirmação plena!”
Diz Pedro: “Senhor, então não será fácil transmitirmos Tua Doutrina, pois como saberemos se alguém está apto para aceitá-la? Meu velho amigo se teria prestado para tanto por ter boa índole e apreciar palestras espiritualistas, e pelo que me consta, também faz caridade. Se pessoas tais são consideradas duvidosas para nosso pro- gresso, não sei a quem deva achar prestável.”
Digo Eu: “Acaso também ainda sois cegos, não compreen- dendo o que digo?! Não te recordas do jovem rico que Me per- guntou o que fazer para alcançar a Vida Eterna? Quando lhe disse dever ele considerar os Mandamentos, amar a Deus acima de tudo e ao próximo como a si mesmo — afirmou tê-lo feito desde criança. Em seguida aconselhei vender os bens terrenos, dividir a fortuna entre os pobres e acompanhar-Me, e deste modo conseguiria pre- parar um grande tesouro no Céu. Com isto, o jovem se entristeceu, voltou-nos as costas e seguiu caminho. Nessa altura, fiz a observação ser mais fácil um cordame passar pelo fundo de uma agulha, que um rico entrar no Reino do Céu. Naquela ocasião vos admirastes, achando que somente poucos teriam tal êxito. Ao que acrescentei que para o homem muita coisa parecia impossível, mas para Deus tudo é realizável.
Não fostes capazes de compreendê-lo inteiramente; agora presumo estardes em tal situação. Que teríamos lucrado caso tivés-
semos procurado convencer aquele jovem, a fim de que pudesse pôr em prática as Minhas Palavras? Nada! Durante vários dias nos teria exposto seus motivos mundanos, pelos quais nem com a melhor boa vontade seria capaz de seguir o Meu Conselho, e nós estaríamos no mesmo ponto de partida. Assim, prosseguimos nossa peregrinação, achando, em breve, oportunidade de fazermos o bem. Deste modo sacudimos a poeira produzida por ele, sem contaminar-nos!
Os que se acham na antessala são em si homens justos e inteligentes, qualidades que lhes proporcionaram riqueza material; longe estão, porém, da necessária maturação para o Evangelho, e neste mundo dificilmente chegarão a esse estado. Por isto não de- veis, no futuro, pregar a Minha Doutrina a pessoas de tal índole; ela jamais deitará raízes, e muito menos frutos.
Tu, Pedro, disseste umas boas verdades ao rico negociante, como se Eu as tivesse proferido! Qual foi o efeito? Nulo! Palestra com seu colega, dando impressão de jamais ter ouvido falar a Meu respeito. Está ciente de Minha Presença, e ao menos a curiosidade deveria trazê-lo junto de Mim, para certificar-se daquilo que disses- te! Entretanto, tudo isto é tão indiferente ao rico, qual inseto atingi- do pelo seu pé. Não cogita de nosso socorro tão desnecessário, a seu ver, por ser rico e inteligente — e assim há muitos.
Vede, trata-se de verdadeiros suínos a fuçarem o mundo e aos quais não deveis atirar as Minhas Pérolas; pois lhes interessa ape- nas a possibilidade dum lucro material. Por isto aquele negociante te repreendeu por teres abandonado teu ofício rendoso, seguindo-Me por coisa alguma.
Tais pessoas são bem educadas e finas; tudo isto, porém, é semelhante ao reboco artístico dum sepulcro, apresentando aspecto agradável — no interior, todavia, está cheio de mofo mortal e odor pestilento. Enquanto tal homem puder embolsar seus lucros e não havendo prejuízo em seus negócios, estará sempre de bom humor e até mesmo generoso; basta uma especulação lhe trazer um desas- tre financeiro, experimenta falar-lhe acerca de verdades espirituais e garanto que te despedirá antes mesmo de teres aberto a boca! Eis
a razão por que te afastei de teu zelo bem intencionado, pois toda palavra espiritual é quase que inútil!
Revelaste-lhe ter sido a ressaca motivada unicamente atra- vés de Minha Vontade, e bastava Eu querer, para todos os elementos Me obedecerem. Isto, por certo, não é pouco! Observa-o, porém, e te certificarás da impressão nula que tuas palavras produziram! Ele nem ao menos foi verificar o fato real!
Além disto, informaste-o do julgamento que atingiria aos descrentes! Ele somente esboçou um sorriso, pensando: Pobre coi- tado, vê lá se não serás atingido pelo julgamento da fome e do frio!
Dize-Me se é possível pregar-se o Evangelho a tais pessoas!”
Diz Pedro, aborrecido: “Ah, preferiria ser tratador de suínos dum grego! Só agora compreendo a Tua Reação no Templo, no ano passado! É preciso pregar-lhes um Evangelho com açoites e paula- das! Essa gente ainda é pior de que o mais invejoso fariseu no Tem- plo, pois tem ao menos aparência espiritual — se bem que de nada vale — mas essa gentalha só considera o mundo essencialmente ma- terialista! Foi ótimo Tu nos chamares a atenção desse fato, Senhor! Jamais tal poeira se agarrará a nós! Que faremos agora?!”
Respondo: “Vamos lá fora, a fim de vos certificardes da in- diferença desses homens; em seguida voltaremos. Mais tarde farei cair forte chuva que nos libertará deles.”
60.INDIFERENÇADOSNEGOCIANTESQUANTOÀESFERA ESPIRITUAL
Faltam ainda três horas para meio dia quando, a Meu con- vite, passamos por grande número de hóspedes para nos dirigirmos à praia, e o hospedeiro pede desculpas por não ter tempo para se dedicar a nós. Eu lhe asseguro: “Não importa! Quem estiver com o coração junto a Mim poderá exercer sua profissão como ela o exige, e ao mesmo tempo Me dedica a maior atenção. Toda e qualquer outra não tem valor para Mim. Ficaremos até meio dia ao ar livre, para analisar a agitação do mar. Antes de voltarmos, virá uma forte
chuva encomendada por Mim, enxotando os negociantes incômo- dos, como já disse há pouco; pois tais pessoas mundanas têm grande pavor duma trovoada. Tão logo deparem sua aproximação, voltarão à cidade. Tem cuidado que nenhum te venha a lograr!”
Diz o hospedeiro: “Ó Senhor, agradeço-Te pelo conse- lho e principalmente pelo temporal; pois aqueles homens já estão me importunando!” Seguimos nosso passeio, enquanto ele atende os hóspedes.
Virando-Me para Pedro, digo: “Observaste o teu ve- lho amigo?”
Responde ele, irritado: “Ah, isto é demais! Se aquela gente ao menos nos tivesse achado merecedores dum olhar! Mas..., nada disto fizeram, muito embora Te conhecendo! Jamais deparei com pessoas tão indiferentes. Caso nos aproximássemos duma vara de porcos, olhar-nos-iam começando a grunhir; enquanto para aqueles materialistas nada representamos! Senhor, faze cair um forte tempo- ral, para acabar com essa indiferença!”
Digo Eu: “Já te preveni que tais comerciantes só cogitam de sua mercadoria e fortuna, não lhes interessando quem não estiver à altura. Quanto a nós, merecemos apenas calcularem o nosso valor como escravos! E nesse caso representamos somente refugo humano. Entre eles há muitos que secretamente exercem tal profissão, e teu velho amigo é um dos mais fortes nesse negócio, realizado anual- mente no Egito, Roma, Grécia e Pérsia. Qual é teu parecer de um judeu chegar a tal ponto?”
Responde Pedro: “Deveria ser apedrejado! Eu, aliás todos nós, não compreendemos como podes, Senhor, ter tanta paciência e indulgência com homens tais; isto ultrapassa o que foi feito em So- doma e Gomorra. Os pagãos assim agindo, são desculpáveis — um judeu, jamais!”
61.A REENCARNAÇÃO. A TERRA, UMA ESCOLA PARA OSFILHOSDE DEUS
Digo Eu: “Não te irrites, pois longe estás de saber dos va- riados hóspedes nesta Terra, e o que é preciso para levá-los pouco a pouco à esfera dos filhos de Deus! Quando estiverdes completamen- te fortificados através de Meu Espírito que enviarei após Minha As- censão — compreendereis também isto, dando-Me a devida Honra por ser tão Paciente e Magnânimo.
Quem de vós for capaz de assimilar algo mais, saiba que aqui também encarnam almas de outros mundos, inclusive filhos da ser- pente desta Terra. Muitos já morreram e alguns já por várias vezes reencarnaram para o seu aperfeiçoamento.
Já ouvistes falar da transmigração das almas (metempsicose), na qual o Oriente acredita até hoje. Tal crença se acha mui deturpa- da naquela raça, porquanto afirma voltar a alma à encarnação ani- mal. Nem de longe isto é verdade.
Já vos foi explicada e demonstrada a maneira pela qual a alma humana deste mundo se agrega aos reinos mineral, vegetal e animal até evoluir à psique humana. Jamais pode retrogradar a alma mais imperfeita, a não ser na esfera espiritual e intermediária na aparência exterior, para sua humilhação e possível melhoria. Alcançado des- te modo certo grau de adiantamento, onde não há mais progresso devido à carência de capacidades mais elevadas, ela pode imigrar no plano espiritual dum outro planeta para desfrutar duma simples felicidade; ou então, encarnar de novo neste orbe, caso for de sua vontade, podendo adquirir faculdades maiores e com auxílio destas, alcançar a Filiação Divina.
De modo idêntico transmigram nesta Terra almas de outros mundos, a fim de conquistarem os inúmeros dons espirituais neces- sários para a Filiação de Deus. Precisamente por ser este mundo uma escola, é ele por Mim tratado com tanta paciência e indulgência. Compreenda quem puder, guardando-o para si, pois não é dado a todos a assimilação dos Segredos do Reino de Deus. Encontrando
algum de espírito justo, podereis individualmente revelar-lhe pou- co a pouco algum mistério, porquanto é de Minha Vontade que a criatura merecedora faça tal conquista pelo próprio zelo, dentro de Minha Doutrina.
Tão logo souber o necessário a ser feito para alcançar a Vida Eterna e seus tesouros, deverá agir dentro dos princípios conhecidos
que a plena realização de Minha Promessa se fará sentir.
Transmitir importantes fatores dos Segredos de Deus tem pouco ou nenhum valor; primeiro, por não poder a criatura assimi- lá-los; segundo, um assunto inacreditável lhe perturba sua fé por- ventura já conquistada. Pois, a fim de aproveitá-los em sua profun- deza verdadeiramente espiritual, é preciso mais que a letra morta da Lei e dos profetas.”
62.A SERPENTE MARINHA
(O Senhor): “Agora já nos afastamos de tal forma da cidade, que nada mais dela se percebe, e as ondas do mar se atiram com fragor contra a margem pedregosa. Eis uma cabana de pescador; en- tremos para aguardar a tempestade. Olhai em direção a Leste! De lá surgirá com violência e não haverá falta de coriscos. Que se levante e se encaminhe rápido para Capernaum!”
Nem bem assim falo, levantam-se pesadas nuvens do mar e acima da serra, fato prontamente descoberto pelos hóspedes na casa de Mathias. Quando o temporal se aproxima com forte trovoada, eles pagam sua despesa, correndo desabaladamente para seus lares. Todas as combinações comerciais estavam terminadas, e o hospedei- ro livre das pessoas indesejáveis. No momento em que a fúria dos elementos passa sobre a cabana, os judeus também se amedrontam, em virtude dum pavor inato de tais fenômenos.
Eu os encorajo, dizendo: “Não percebeis que os elementos deste temporal também são sujeitos à Minha Vontade?! Nada te- mais, pois coisa alguma vos sucederá! Não o determinei somente por causa dos capernauenses, e sim para os enviados de Jerusalém, a
fim de saberem como Deus recompensa e protege os servos fiéis ao dinheiro.” Enquanto ainda falo, um forte raio cai com estrondo no solo diante de nós. Os greco-judeus recuam apavorados, e um den- tre eles diz: “Senhor, afasta este monstro, do contrário pereceremos!”
Então ameaço a tempestade que se afasta, deixando-nos sob um Céu azulado. Os judeus muito se alegram por isto, começando a louvar-Me. Ao nos aproximarmos do mar, um deles percebe ha- ver, a uma distância duns duzentos pés, um monstro marinho a se movimentar violentamente, enquanto grande número de pássaros aquáticos o ataca. Ele Me pergunta a respeito de tal bicho.
Eu lhe digo: “Trata-se de uma enorme serpente marinha em busca de alimento durante a tempestade, porquanto costuma viver no fundo do mar. Assim que tiver saciado sua fome, voltará para lá, onde fica durante semanas, subindo apenas para tal fim. A água não lhe proporcionando o suficiente, o ofídio invade as margens roubando carneiros, cabras, porcos, bezerros e mulas. Pode até mes- mo tornar-se um perigo para os navios, pois não vacila em tragar homens. Vistes portanto um espécimen raro.”
Diz Pedro: “Senhor, como pescador tive oportunidades de ver tais monstros, pensando tratar-se de enorme enguia, possível de pescar-se com anzol. Nunca obtive êxito, porque o ofídio se desviava e desaparecia. Como poderia capturá-lo?”
Digo Eu: “Na época de hoje tal não é possível! Primeiro, por ser tal serpente mui astuta e sabe desviar-se de todos os perigos ame- açadores; segundo, é mui ligeira, de sorte não poder ser alcançada pelo melhor veleiro, e além disto é inacreditavelmente forte. Caso fosse encurralada, atirar-se-ia sobre o inimigo, sufocando-o instanta- neamente, razão por que não é aconselhável persegui-la. Neste mar só existem dois exemplares, pertencentes à era pré-histórica, muito embora tenham apenas a idade de Noé, quer dizer, contando do nascimento deste até hoje.
Tais ofídios pertencem ao grande mar; na época do Dilúvio foram atirados para esta enseada e ainda terão alguns séculos pela frente. Nesses gigantes se acumula a matéria mais grosseira dos ele-
mentos psíquicos do planeta, onde é abrandada e de certo modo preparada para uma transformação. Quando morrem, seus elemen- tos concatenados passam a muitos milhões de formas mais elevadas, alcançando em curto espaço maior maturação na água, no ar ou so- bre a terra, ingressando por todas as formas de vida, até ao homem. As almas humanas surgidas por este meio acham-se num grau muito inferior e foram cognominadas pelos sábios da antiguidade de ‘filhos de serpentes e dragões’; pois os sábios daquela época entendiam em sua simplicidade mais de psicogenia que os de hoje! São pois filhos deste mundo, muito inteligentes, ricos e importantes — longe, po- rém, da capacidade assimiladora da Vida espiritual.
De semelhante origem psíquica derivam os negociantes de Capernaum. Continuam no assalto às mercadorias e sua maior satis- fação consiste em terem alcançado lucro gigantesco, manifestando pelo ajuntamento de tesouros a inclinação voraz de tal serpente ma- rinha, que também procura acumular substâncias de vida.
Do mesmo modo que ao ofídio, tudo é tirado pela morte e distribuído em formas superiores — os ricos e egoístas quando morrem perdem tudo, e no Além serão purificados de sua natureza ofídica através de grande miséria, fome e sede. Tal fato é deprimente e penoso, todavia não pode haver outro recurso evolutivo para tais formas de vida primitiva.”
63.OMOTIVODAENCARNAÇÃODE DEUS
(O Senhor): “Fácil é criar-se; levar os seres projetados a uma existência livre, inculpável e independente — não é coisa simples até mesmo à Onipotência Divina. Com paciência e indulgência, fi- nalmente, tudo é alcançável, e quando a finalidade útil for atingida, não importa o tempo que necessitou para sua realização.
Dá-se o mesmo com a mulher que passa por medo e dores durante a gravidez; tão logo a criança tiver nascido, temor e sofri- mentos terminaram, e ela deles nem mais se lembra quando depara com o fruto vivo que surgiu num ser livre e independente.
Caso a emancipação duma criatura fosse ocorrência simples, Eu, Criador de todas as coisas e seres, não teria necessitado de vir Pessoalmente como Homem a esta Terra, para conseguir a indepen- dência da criatura através de Doutrina e Ação.
Porventura algum outro vos dissesse tal coisa, teríeis respon- dido: Que absurdo acabas de proferir?! — Eu Mesmo o fazendo po- dereis aceitá-lo, pois por simples bagatela não teria aceito corpo desta Terra e até mesmo a sua morte, tratando Minhas criaturas como Pai.
Afirmo-vos a veracidade e a razão deste fato justamente nesta época; o que sucedeu durante as eras passadas, nas quais Deus exis- tiu tão infinitamente Perfeito quanto agora; o que ocorreu àqueles seres que não alcançaram a atual perfeição individual, uma vez que jamais tinha Eu aceito anteriormente o corpo físico do homem — eis uma questão muito importante! Em parte já vos expliquei o fato na cabana do velho Marcus, em Cesareia Philippi; entretanto, igno- rais por que precisamente este período foi escolhido entre as épocas infinitas, a fim de proporcionar às criaturas, para sempre, a plena Semelhança de Deus.
Vede, em toda Criação Infinita Deus considera a Ordem mais Sábia quanto ao Espaço e Tempo. Talvez Lhe fosse impossível criar um homem munido de toda Sabedoria e Força sem gerá-lo pelo ato fecundante, assim como consegue produzir o raio instan- taneamente?! Por certo que não, e para tanto vos dei provas cabais!
Se tal, pois, é possível à Divindade — por que Ela permite que o homem seja gerado num corpo feminino, lá crescendo e se formando de período em período? Após ter alcançado sua matura- ção dentro de determinado tempo, chega ao difícil nascimento, fal- tando-lhe ainda muita coisa para sua perfeição física; pouco a pouco esta vai-se completando, a língua se adapta a balbuciar palavras, os órgãos alcançam maior ordem e a alma, mais forte e positiva, deles se serve; assim continua o progresso até que o homem após trinta a quarenta anos se apresente forte, rico em experiências e compre- ensão. Foi obrigado a assenhorear-se de todos os conhecimentos e experiências de próprio esforço e ação, para se tornar cidadão útil
para o próximo. Por que isto tudo, sendo Deus Onipotente e poden- do fazer surgir criaturas inteligentes e fortes do ar ou do nada, sem nascimento e educação?
Bem que o poderia; mas que criaturas seriam essas? Digo-vos: simples máquinas que jamais teriam vontade própria, livre cons- ciência individual e ação independente no pensar, sentir e agir. A Vontade Poderosa de Deus teria que vivificá-las a cada momento, pensando e querendo por elas, acionando seus membros para qual- quer atividade. Se Deus assim não fizesse, tal homem seria comple- tamente morto e teria que desaparecer do palco da vida.
A fim de que o ser criado exista individualmente, se forme e positive, tornando-se de modo próprio livre no pensar, querer e agir, Deus desde eternidades instituiu uma Ordem pela qual as Ideias por Ele projetadas, pouco a pouco, Dele se isolam; finalmente, têm que se dar conta de sua existência individual, sentindo e agindo li- vremente para serem, quais futuros deuses, conduzidas por Deus, inteiramente firmes dentro da vida, através duma Doutrina externa e guiadas à perfeição vital, como se esta fora obra e base própria.
Para tanto é preciso longo tempo, bem calculado por Deus e dividido em muitos períodos, cada qual destinado ao progresso. Sendo imprescindível para cada indivíduo em evolução surgir o momento em que possa assimilar saber mais elevado — tal ocasião apresenta-se para a Criação total calculada por Deus, dando oportu- nidade a todas as criaturas amadurecidas a se transportarem de seus antigos túmulos do julgamento, à plena Semelhança Divina; por isto se lê nas Escrituras que todos que se acharem no sepulcro ouvi- rão a Voz do Filho do Homem, e caso estiverem preparados poderão surgir pelo próprio esforço à Vida Eterna, Verdadeira e Perfeita.
Tendo, pois, chegado o momento por Deus previsto e cal- culado de todo sempre, em que todos os seres alcançarão a matura- ção individual, manifestada principalmente pela completa ignorân- cia de Deus e pelo isolamento — Eu, como Deus, estou Presente para conduzir as criaturas não pela Onipotência, mas unicamente através da Doutrina, que Eu lhes dou como se fora seu Semelhante.
Posso Pessoalmente tratá-las qual estranho, dando término ao con- ceito de ninguém poder ver Deus e continuar vivo; podeis, portan- to, ver-Me, permanecendo com vida!”
64.ADESCRENÇACOMOPROVADEMATURIDADEPARAUMANOVAREVELAÇÃO. COMPARAÇÃOENTRE AS
CRIATURASDAÉPOCADENOÉEASDE JESUS
(O Senhor): “Neste momento constato a seguinte indagação, singular, nos adeptos: ‘Sendo a carência quase total de fé em Deus Verdadeiro a base de maturidade dos homens quanto a Deus, não compreendemos por que Ele em época de Noé, em que a fé também era nula — não Se aproximou dos homens, a fim de trazer-lhes uma Doutrina para a conquista da Vida Eterna?! Por que preferiu o Di- lúvio, matando a Humanidade ateia?’ Digo-vos ser esta indagação muito inteligente, e sua resposta trará grande elucidação quanto à relação entre Deus e Suas criaturas. Prestai atenção!
A Humanidade em tempos de Noé não era tão ateísta como julgais; era apenas orgulhosa e altiva contra Deus, a Quem bem co- nhecia, querendo elevar-se e reduzir Sua Majestade. Fazia o que lhe agradava, e ainda que lhe fossem dadas pelo Céu as Leis mais sábias, não as considerava, fazendo o contrário. Odiava a Deus e desafiava tudo que se originava na Onipotência e Sabedoria Divina, impre- cando a Própria Criação, inclusive a Terra, e finalmente resolveu destruí-la com pólvora. Por muitas vezes foi advertida pelos habitan- tes das montanhas, e castigada pelo ultraje.
Certos povos foram conduzidos a países distantes, cujos des- cendentes ainda hoje vivem e possuem a velha Doutrina, infelizmen- te deturpada. Tudo isto de nada adiantou. Novamente se tornaram poderosos, mormente os habitantes de Hanoch, cidade esta mais vasta que toda Terra Prometida. Conseguiram dominar os filhos das alturas, com exceção da família de Noé, fiel a Deus.
Naquela era começaram por insolência a destruir monta- nhas, muito embora fossem advertidos, pelos sábios das alturas, da
existência de enormes comportas de água no solo; bastaria demo- lir apenas um grande monte até a raiz e enterrar suas massas nas profundezas do mar, para se abrirem várias represas pelas quais em breve seria levada tanta água à superfície, que subiria acima da serra, afogando a todos. Esses avisos todos nada frutificaram, e sim esti- mularam ainda mais no prosseguimento da destruição com energia inacreditável.
Noé, percebendo terem sido baldadas todas as advertências e instruções, pediu a Deus um meio de salvação pelo menos para algumas pessoas de boa índole, animais e víveres; pois previu as consequências fatais da obra maldosa daquelas criaturas mundanas. Eis que foi instruído pelo Espírito de Deus no sentido de construir uma arca, dentro do plano e medidas vindos do Alto.
Nem bem os tolos teimosos haviam demolido a maior parte de um considerável monte, apresentou-se o resultado de seu tra- balho: o enorme peso da serra, destituída de seu apoio, começou a afundar, impelindo as tremendas massas d’água em torrentes po- derosas por cima do solo. Isto naturalmente encheu o ar, principal- mente os muitos rios de água quente, de vapor e nuvens, e as chuvas principiaram a cair torrencialmente, provocando a inundação até às montanhas. Mais que um terço da Ásia se achava dentro do Dilúvio e todos os habitantes de Hanoch, que se consideravam a Humani- dade total do orbe, sucumbiram, inclusive sua cidade.
Deste breve relato se destaca que as criaturas antes de Noé não ignoravam a Deus, e sim pretendiam elevar-se acima Dele, e este fato prova seu conhecimento. O ódio derivava apenas de sua morte prematura, pois não passavam dos trinta a quarenta anos, enquanto julgavam os habitantes das alturas imortais, por atingirem idade avançada. Este foi o motivo de quererem aniquilar tudo como vingança contra Deus.
Assim sendo, acaso podeis afirmar terem aquelas criaturas a mesma maturação das de hoje?! Quantas existem entre os judeus realmente crentes em Deus, confiando Nele em verdade? Na maio- ria só possuem fé habitual, enquanto nos corações são ateus e nem
cogitam da Existência Divina, e caso houvesse, Deus nem sequer Se preocupa com os mortais, suas preces e sacrifícios. Ele as criou so- mente para cultivarem a terra — eis a crença dos judeus intelectuais
pois os outros nada creem.
Os judeus enraizados — como os há na Samaria — alegam: As Leis de Moysés são boas; é preciso respeitá-las e não vem ao caso sua origem, divina ou mosaica. Quem as cumpre não erra, indepen- dentemente da Existência de Deus. Deve-se fazer o bem pelo bem, e evitar o mal porque prejudica.
De tal conceito se conclui ser a fé verdadeira em Deus problemática. Quanto à crença no Templo, estais informados; pois onde não se vacila em riscar as Leis de Deus e suplantá-las por dita- mes mundanos, que devem ser considerados de santos e vindos por Ele — a fé verdadeira chegou ao término. Nisto consiste a crença judaica! Indagai de vós mesmos de vossa crença anterior em Deus! Antes de Minha Vinda procurastes algo divino dentro do Templo, cumprindo possivelmente suas leis, enquanto duvidastes da Ver- dadeira Existência de Deus, pois vossa fé era um hábito contraído desde berço, que se tornara parte de vossa natureza e teria sido difícil dela desistirdes, por não haver equivalente. Portanto vossa fé de nada valeu.
Igualmente não existe fé entre os judeus, como povo esco- lhido por Jehovah; assim sendo, como esperar-se fé entre pagãos? Em épocas passadas acreditavam em ídolos e oráculos; hoje nada mais creem, não obstante acompanharem os rituais.
Somente no Egito existem alguns discípulos de Platon, Só- crates e Aristóteles que admitem a existência de um Ser Supremo, desconhecido de todos; opinam poder o homem sentir o Espírito Divino e prever o futuro, caso leve vida abstêmia. Não existe mor- tal capaz de maior evolução. O que sucede após a morte é enigma jamais decifrável. Há quantidade de contos e opiniões a respeito, despertando no homem uma leve esperança — nunca, porém, have- rá certeza! Tal é a opinião dos pagãos instruídos. Assim sendo, claro é ter agora chegado a maturação entre Criador e criatura, pela qual
ela pode ser ensinada por Deus, independentemente de seu livre arbítrio, para atingir no final a Perfeição Divina. Compreendestes?”
65.EVOLUÇÃODEALMASDOALÉMENCARNADASANTESDE JESUS
Diz Pedro: “Senhor, isto tudo compreendemos bem; resta saber o destino daqueles que viveram antes de Ti, contando desde Adam. Poderão igualmente atingir a perfeição da Vida Eterna?”
Digo Eu: “Por certo. Abri as portas da vida não somente para os encarnados desta época, e sim para todos que já viveram. Muitos dos antigos pecadores terão que passar por certa provação, conforme vos demonstrei.
No Além existe quantidade de escolas onde as almas poderão ser orientadas praticamente. Lá, todavia, tal fato não se dá tão fa- cilmente como aqui, porque cada alma só tem vida e ambiente sur- gidos de seus pensamentos, sentimentos e vontade, oferecendo-lhe tudo o que ela ama e deseja.
É, pois, em tal circunstância mais difícil influenciar bene- ficamente uma alma cheia de falsas concepções do que aqui, onde se encontra em solo firme e estranho, contando com grandes opor- tunidades. Ainda assim, lá haverá meios suficientes pelos quais se poderá influir sobre ela. Em outra ocasião ser-vos-ão dadas maiores explicações.
Tal fato não deve constituir especial consolo; pois se no Além uma alma no seu íntimo, portanto, em seu mundo, ao invés de me- lhorar se tornar pior e mais maldosa, claro é piorar na mesma pro- porção seu aparente mundo e companhia. À medida que se torne menos verdadeira e inspirada, seu ambiente se obscurece provocan- do grande aflição. Com o aumento desta, cresce sua ira e tendência vingativa; eis o início do inferno, a segunda morte psíquica, de onde dificilmente a alma se salvará.
Muito embora sejam apenas recursos pelos quais ela poderá ser salva no decorrer de épocas prolongadas — são eles realmente pe-
nosos! Poderá levar bilhões de anos terráqueos, até que uma psique maldosa consiga pequena melhoria por meios dolorosos. Eis por que um dia aqui vale mais do que no Além cem anos! Compreendestes?”
Respondem todos: “Sim, Senhor e Mestre; no íntimo surge, porém, a seguinte indagação: Se uma alma desencarna imperfeita e habita em um mundo apenas aparente correspondente ao seu pen- samento, sentimento e vontade, o que também se poderia chamar de mundo de fantasia — no que consiste o mundo das almas per- feitas? Que aspecto tem o Reino do Céu e com que poderia ser comparado?”
Digo Eu: “Como esteja na hora de voltarmos, darei a cami- nho a explicação, por ser de grande importância. Vamos andando. Vede, com o Reino do Céu, ou seja, o Reino da Verdade, da Luz e do Amor, conforme vos demonstrei em outra ocasião, dá-se o seguinte: este Reino não se constitui em aparato externo e não penetra no homem com sinais e atributos superficiais, pois se desenvolve no vosso íntimo, onde cresce e vos penetra, tornando-se vosso mundo pleno de felicidade.
Aqui, o Reino do Céu se assemelha a um lavrador que se- meou o bom trigo. Alguns grãos caíram pelo caminho, sendo uma parte comida pelos pássaros, e outra pisada pelos viandantes. Deste modo, a semente não germinou nem produziu frutos. Outra par- te caiu em solo pedregoso; enquanto as pedras continham alguma umidade, conseguiu germinar; não pôde criar raízes, pois a umidade não foi suficiente para alimentar a haste, que em breve secou e nada produziu. Ainda outra caiu em espinhos e arbustos; no começo ger- minou bem, mas quando deveria desenvolver-se, foi sufocada pelos cardos e abrolhos, pereceu e não deu frutos. Apenas uma parte caiu em bom solo, germinou e deu frutos abundantes.
Eis a situação do Reino do Céu nesta Terra. Eu Mesmo sou o Semeador e Meu Verbo é a Boa Semente, da qual deverá surgir o Reino Celeste como resultado. Caindo em bom terreno, trará fruto centuplicado; se cair nos caminhos mundanos, sobre pedras ou en- tre cardos e abrolhos, nada produzirá.
Os caminhos do mundo são comparáveis às criaturas mun- danas, conforme observamos várias com nosso hospedeiro. Os vian- dantes na estrada, a pisarem a semente, são os interesses de negócios e lucros; e os pensamentos comerciais dirigidos em todas as direções apontam os pássaros, que absorvem a semente não pisada a fim de evitar o surgimento de um fruto. Tais criaturas são, como já dis- se, verdadeiros suínos, aos quais não se deve atirar Minhas Pérolas como alimento.
Nas pedras se entende os intelectuais, que tudo aceitam com certa ansiedade, positivando-se, porém, em seu íntimo em várias con- cepções errôneas, tornando-os de certo modo de sentimento endure- cido; nesse caso, a semente nova não encontra a necessária umidade vivificante, tampouco o solo macio e arável para receber as raízes ali- mentadoras. Surgindo ventania e seca, a pequena haste fenece em bre- ve e como ainda não possui raízes, o vento a carrega. Sobrevindo uma tentação para tal criatura, ela diz: Sabia de antemão ser este assunto duvidoso. Fala-se em promessa que deveria se realizar — e eis que sofro! Por isto, longe de mim tais ensinamentos novos! Eis a pedra!
E que vêm a ser cardos e abrolhos? São os cidadãos benevo- lentes que muito prazerosamente recebem o Meu Verbo, cultivan- do-o por certo tempo. Surgem, porém, toda sorte de preocupações, tristezas e receios fúteis que abafam a Palavra Viva em seus corações, impedindo sua germinação.
Deste modo só contamos com poucas pessoas comparáveis ao solo realmente bom; elas aceitam a Palavra e põem-na imedia- tamente em ação. E a semente produz abundante fruto, que é o Próprio Reino do Céu dentro da criatura, sem aparato externo. Este Reino se estenderá acima daquele que o criou, através de Minhas Palavras, dando-lhe toda felicidade, luz, verdade, sabedoria e poder sobre todos os seres.
Daí podereis igualmente deduzir aonde tereis de semear o Meu Verbo, porquanto deve produzir fruto! Antes de mais nada deve cair em bom solo. Tão logo der juros abundantes, os comer- ciantes, intelectuais e cidadãos preocupados virão por si, a fim de
comprarem convosco a semente para as suas terras. Tereis bem com- preendido isto?”
Respondem todos: “Perfeitamente, Senhor, e seguiremos o Teu Conselho, pois jamais semearemos esta Semente da Vida em ca- minhos, pedras e entre abrolhos. Eis que nosso hospedeiro se apro- xima correndo! Que teria acontecido?”
66.OGANANCIOSOREITORDE CAPERNAUM
Digo Eu: “Nada de grande importância. Mas que venha pes- soalmente contar-vos.” E o hospedeiro relata: “O reitor da sinagoga de Capernaum mandou fazer o recolhimento do dízimo de peixes, pois ouvira ter eu feito pesca excepcional, sem informá-lo a respeito; por isto condenou-me à multa três vezes maior. Sorte ele ignorar ter sido a pesca efetuada na noite de sábado, pois seria capaz de açam- barcar todos os peixes. É de se lastimar ter sido afastado o antigo reitor! O atual é uma verdadeira praga e trata o semelhante como se fosse escravo. Senhor, não seria possível modificá-lo?”
Respondo: “Como não? E de modo peculiar! Manda-lhe um mensageiro com o recado de dever o reitor contar primeiro os peixes em teu depósito, a fim de evitar que lhe venhas pagar em excesso ou a menos da multa prescrita. Ele aparecerá prontamente com seus empregados para começar a contagem dos peixes — sem encon- trar um sequer! Foram por Mim criados, e posso fazê-los desapa- recer e surgir à Minha Vontade! Caso te acuse de haveres desviado os peixes sabendo de sua exigência, pede-lhe testemunha ou então entregar-te-ás à proteção romana. Ciente disto, ele se afastará e nun- ca mais exigirá um dízimo! Age deste modo que tudo correrá bem!”
Opõe o hospedeiro: “Acontece já estar pronto o almoço. Não conviria tomá-lo primeiro, para não sermos interrompidos pelo reitor?”
Digo Eu: “Almoçaremos imperturbáveis, ainda que estivessem lá fora, ocupados, cem reitores com a contagem! Ele poderá entrar se quiser, e com prazer procurará voltar a casa.” Satisfeito, o hospedeiro
envia o mensageiro enquanto nos dirigimos ao refeitório, entregan- do-nos contentes à refeição, mormente pela fuga dos hóspedes. Após terminarmos, digo ao hospedeiro: “Aí vem ele; vai primeiro ao depó- sito e verás que peixe o reitor irá encontrar!” Mathias dirige-se rápido até lá — e se assusta, não pouco, quando depara com o monstro marinho, ao invés dos peixes de qualidade excepcional.
Quando depara com ele, o reitor nada quer saber da conta- gem e compreende-se haver solução breve quanto ao dízimo, por- quanto não exige nem simples, nem triplicado, reclamando: “Esse monstro adiantou-se naquilo que me assistia de direito. Com prazer teria provado alguns de teus peixes formidáveis; mas onde nada exis- te, não há lei nem direito, e continuamos bons amigos. Caso faças outra pesca semelhante, manda-me alguns à venda e se apanhares menos de dez, estarás isento do tributo. Agora tratemos de nos afas- tar para longe do mar, pois essa serpente poderia subir até aqui e tragar-nos!” Assim ele volta rápido ao lar e por muito tempo deixa de aparecer nessa zona. Quando a boa distância, o monstro também se afasta nadando para alto mar, onde desaparece.
Em seguida, Mathias analisa o depósito — novamente cheio de bons peixes. Satisfeito, ele retorna à nossa mesa e relata o ocorri- do. Ao mesmo tempo indaga onde costumam viver tais serpentes do mar, querendo desviar-se delas.
Digo Eu: “Não te preocupes! Tais espécimens habitam as pro- fundezas do mar e sobem de século em século, por ocasião de ressa- cas violentas que se originam no subsolo, fato mui raro em enseadas. Levadas pela fome sobem à tona, à cata de pequenos animais, não costumam atacar homens. A partir de agora não mais surgirão, pois sua existência findou. Daqui a alguns dias mandarás destes peixes ao reitor, que se dará por satisfeito. Agora poderá cada um de vós formu- lar perguntas, caso deseje esclarecimento, pois de amanhã em diante repousaremos por poucos dias sem tocar em assuntos espirituais.”
Respondem todos: “Senhor, não há o que indagarmos, pois já recebemos ensinamentos profundos acerca de tudo!” Digo Eu: “Pois bem, repousai e meditai sobre o que vos disse!”
Diz o hospedeiro: “Muito embora tivesse recebido muitos Ensinamentos de Tua Boca Divina, teria importantes indagações a fazer, e caso fosse de Teu Agrado, pedir-Te-ia resposta a respeito.”
Digo Eu: “Qual é tua dúvida?” Diz ele: “Através de Tua Doutrina sabe o homem ser sua alma imortal, não obstante não se ter noção precisa de sua individualidade; ainda que dotado de fé segura, vez por outra é ela mesclada com a sensação da morte e o completo desaparecimento entre as criaturas conscientes. Não é possível a pessoa familiarizar-se com a ideia da sobrevivência da alma, de tal forma a proporcionar satisfação íntima, pois o coração novamente sente temor, porque não se lhe faz a luz neste assunto importante.
Sendo, pois, morte e sepulcro os pensamentos mais tristes do homem e não podendo orientar-se de modo seguro, não se pode repreendê-lo caso se atire aos prazeres do mundo. Seria por isto de grande valia uma orientação mais precisa, Senhor! Pois de que adian- tam todas as filosofias, se o homem não possui a convicção plena da vida da alma após a morte?! Além disto, segue às Leis e religiões, mas apenas em virtude de uma ordem externa e não pela conquista certa da Vida Eterna além-túmulo.
Sou um dos mais fiéis seguidores das Leis de Moysés e sem- pre procurei contato com sábios de todas as nacionalidades — que neste ponto sabiam tanto quanto eu. Romanos e gregos afirmam ser tal problema o véu de Ísis, que até então não foi desvendado por mortal. Isto soa bem e não deixa de ser verdade; mas qual seu benefício? O morto nada sente, ouve e vê, e nós, ainda presos à vida, qual verme num pau apodrecido, nada mais vemos, sentimos e ou- vimos dele senão sua matéria putrefata, reduzida, em poucos anos, a pó e cinza. Por isto Senhor, peço-Te — porquanto representas a Própria Vida — uma orientação certa neste ponto, pois não me agrada continuar com pensamentos na morte, na tumba e completa desintegração do meu físico!”
Digo Eu: “Caro amigo, tua dúvida foi bem exposta e apre- senta necessidade premente dum homem; fornecer-te um ensina- mento que te proporcione consciência plena da Vida Eterna de tua alma — é coisa dificílima! Vim justamente a esta Terra para facultar aos homens tal noção completa, através de Minha Doutrina. Não a conhecendo ou não a aplicando, impossível chegar-se a tal cons- ciência interna, porquanto somente Eu sou o Caminho e a Porta para esse fim.
Observas, por exemplo, a flor de uma árvore; pouco ou nada, porém, do fruto em formação. Somente após a queda da flor apre- senta-se um pequeno início do fruto. Nele, porém, tem que surgir a semente dentro do gérmen; acaso poderá ser observado no simples início?! Tudo tem aparência de uma só coisa: a capacidade já existe; tu, porém, não consegues discerni-la entre as demais partes desvita- lizadas, onde não amadurece o gérmen. Tão logo o fruto tiver alcan- çado a completa maturação, com facilidade descobrirás a semente.
Fato quase idêntico se dá com a completa consciência psíqui- ca do homem: enquanto ele não a possuir dentro de si, a alma não amadurece, independentemente, no corpo. Ainda se acha demasia- damente vinculada à matéria e não pode perceber e sentir coisa di- versa do que o destino de seu corpo — e os melhores ensinamentos não poderão proporcionar à alma não evoluída a consciência íntima, plenamente amadurecida.
Se, através da atividade própria dentro de Minha Doutrina, uma alma conseguiu a mencionada maturação da Vida, dispensável se torna qualquer prova subsequente. Acaso necessitas de prova de tua existência corpórea? Certo que não, e terias motivo de gargalha- das se alguém o pretendesse fazer. Se te encontras profundamente adormecido, porventura seria de utilidade uma prova concludente de estares vivo, uma vez que nada consegues ouvir?!
Vê, até mesmo todo animal possui alma, cuja existência tem que ser psicossubstancial, portanto indestrutível, do contrário não poderia movimentar-se. Experimenta explicar a um irracional o que seja sua alma, vivendo apenas por ela. Entenderia tua explicação?
Tão pouco se tivesses falado a uma pedra! Por que não entende e não tem palavras para transmitir suas sensações aos demais seres? Uma alma animal acha-se profundamente enterrada em sua carne e nada sente além de suas necessidades físicas. Alguém pretendendo adestrar um irracional para um serviço mui simples, tem que se dar ao trabalho de despertar a psique em sua carne a ponto de entender o que o homem quer.
Sabes existirem pessoas cujas almas não se acham muito aci- ma de irracionais, e às vezes até mesmo as ultrapassam? Levar tais psiques pela palavra a uma consciência interna da vida seria trabalho baldado. Para elas basta uma fé cega e muda da existência de suas al- mas após a morte, onde as espera prêmio ou castigo, a fim de que se submetam a uma ordem legislativa, qual boi aceita sua canga. Todo resto terá de ser guardado para outra oportunidade de vida.
A um animal só se consegue obrigar a uma atividade inte- ligente através de educação dolorosa — e o mesmo acontece a um simples homem do mundo, cuja alma somente almeja satisfazer suas necessidades da vida, sem apresentar fator mais sublimado diante da psique irracional, com exceção da fala.”
68. RAZÃO DO PAVOR DA MORTE
(O Senhor): “Terás com isto assimilado o motivo pelo qual criaturas como tu até hoje não conseguiram consciência plena da sobrevivência da alma; o pavor da morte não se baseia propria- mente neste fator, e sim no amor ao mundo e no amor-próprio. Por essas duas manifestações de amor, a alma é cada vez mais inte- grada ao corpo e a consequência disto é que a sensação da morte e desintegração se torna sua propriedade, trazendo-lhe toda sorte de medo e pavor.
Os habitantes primitivos desta Terra não temiam a morte fí- sica, e sim a desejavam para se libertar do corpo alquebrado. Através de uma vida dentro da Ordem de Deus obtinham visões do Além, e estavam portanto orientados da sobrevivência da alma após a morte.
Na época atual quase que não existe fé em Deus. De onde deveriam os homens receber tal noção de sua alma?! Afirmo-te: onde se põe em dúvida a base de toda Vida, não é de se estranhar a incre- dulidade quanto à vida psíquica.
Ao palestrares com saduceus, verás serem pessoas materia- listas que amam o mundo e a si mesmas; não creem em Deus e negam por isto a imortalidade da alma, classificando de tolo a quem pretenda prová-la, porquanto aquilo é simples fantasmagoria de um cérebro fraco.
Analisa os verdadeiros cínicos, discípulos do filósofo Dióge- nes. São verdadeiros inimigos da Vida, e imprecam contra uma força que os fez surgir sem consentimento próprio. Vivem dentro de mo- ral elevada, sobriamente, desprezando todo luxo, inclusive o menor conforto. O maior benefício lhes é a morte, pois dela esperam o completo extermínio de sua existência.
Em compensação encontrarás na Índia criaturas a lidarem com almas desencarnadas tais quais estivessem vivas, recebendo orientação de coisas ocultas. Tais pessoas não têm o menor receio da morte — pelo contrário, tal dia lhes é motivo de festa e o nascimen- to, de profunda tristeza.
Vês, portanto, quão diversas são as criaturas no assunto ex- posto. Aquilo que para certo povo constitui motivo de pavor, um outro isto desconhece, não obstante ensinamentos mais diversos. Os judeus são os que mais temem a morte, em virtude de seu grande amor ao mundo e de sua sensualidade. Quem como eles se dedicar a tais tendências perderá com o tempo toda inspiração do Alto; pois nada prejudica tanto a luz viva e justa da fé quanto a impudicícia, lascividade e depravação carnal, que de há muito grassam entre ju- deus, piores que os pagãos. A sensualidade sufoca a alma no lodo da carne e aniquila até mesmo o corpo. Assim sendo, de onde deveria ela buscar a consciência lúcida da vida?!
És uma criatura simpática e com o justo tempo depositarei novamente a consciência da Vida Eterna em tua alma; mas quando ainda eras mais moço também te entregaste à volúpia carnal, no
que consiste o motivo preponderante de não teres chegado a uma noção verdadeira e lúcida, não obstante todas as tuas pesquisas. Em teu estado atual mais casto, em breve alcançarás maior luz interna, não necessitando fazeres perguntas idênticas. Ter-Me-ás compre- endido bem?”
Responde o taverneiro: “De modo completo, Senhor! Con- fesso terem meus pecados na mocidade gasto grande quantidade de minhas forças psíquicas e agora, mais idoso, sua carência se torna sensível. Resta saber como recuperá-las.”
Digo Eu: “Enquanto o homem viver nesta Terra e possuir vontade firme e rigorosa, a recuperação é bem possível, e David nos deu exemplo vivo e insofismável, pois também ele muito pecou na esfera da volúpia carnal. Mas conteve-se em tempo, deixou de pe- car por amor a Deus, tornando-se assim um homem justo perante Jehovah. Em verdade te digo: No Céu existe maior alegria por um pecador que reconhece seus pecados, os despreza e se arrepende, pratica penitência justa e razoável, modificando-se totalmente — do que com noventa e nove justos que jamais necessitaram de penitên- cia! Acaso não se dá o mesmo entre as criaturas, que sentem maior satisfação ao encontrarem um objeto perdido, ainda que de pouca valia, do que ao depararem seus grandes tesouros, jamais extravia- dos?! Fato idêntico ocorre com Deus, e se assim não fosse não Me contarias entre os teus hóspedes!
É bem verdade terem teus pecados produzido alguns danos, tanto para o corpo como para tua alma; reconhecendo e te desvian- do do pecado, levou-Me a vir à tua casa para te curar completamente de todos os teus males. Onde Eu entrar, terá ingressado também o pleno perdão de todos os erros, a Luz e a Vida Eterna! Posso, por- tanto, afirmar-te ter sucedido uma grande Graça ao teu lar e a ti mesmo, e o futuro elucidar-te-á melhor a respeito que Eu; pois Eu te dei apenas o Ensinamento e a Promessa. No seu cumprimento depararás em ti a plenitude da Verdade.”
(O Senhor): “Em verdade te digo: Quem ouvir o Meu Verbo, aceitá-Lo como Verdade e aplicá-Lo, fielmente, não sentirá a morte! Mas quem Me aceitar apenas qual boa conquista, ao lado do mun- do, pouco efeito ou consolo espiritual sentirá até o fim da vida, e no Além se demonstrará sua tendência preponderante. Pois se apre- sentar maior inclinação para o mundo do que para Mim, muito terá que lutar para o seu equilíbrio, e Minha Visita a sua casa, a fim de lá repousar, será protelada à longa distância.
Assim orientado, sê alegre e saiba não ser possível abater-se uma árvore frondosa de um só golpe — e tua alma terá sossego! Precisas, de agora em diante, apenas viver e agir pelo Meu Verbo, e o resto que procurares ser-te-á dado em tempo.
Não te preocupes tanto pelo teu lar e a manutenção de tua família; pois tal hábito é das criaturas mundanas e dos pagãos, que nada sabem de Deus, isto é, de Mim! Procura somente o Reino de Deus e Sua Justiça Luminosa, que consiste antes de mais nada no amor a Deus e ao próximo — e todo resto ser-te-á dado livremente!
Observa as flores do campo; não trabalham e nada colhem, entretanto o Pai no Céu cuida de seu sustento e finalmente se trajam de modo mais régio que Salomon, em suas vestes reais!
Se Deus zela pela erva que hoje nasce e amanhã é cortada e, de acordo com hábito antigo, secada em molhos e no fogão reduzida a cinzas — muito mais Ele cuidará daqueles que O amem e cum- pram Seus Mandamentos!
As criaturas, geralmente maldosas, amam aos seus filhos e procuram lhes proporcionar todos os benefícios — muito mais fá-
-lo-á o Pai Celeste aos que Ele achou dignos de serem Seus filhos! Já ouviste falar de um homem dotado de grande sabedoria, cruel e inclemente contra seu semelhante ou sua prole?!
É conhecimento comum que um homem sábio também é bom e procura fazer o bem a todos. Somente a Sabedoria podia formular as Leis aos homens e seu cumprimento lhes traria plena
felicidade; ela sancionou as Leis apenas por causa das criaturas mal- dosas e desobedientes, a fim de dar um meio aos bons de obrigarem aos tolos a fazerem o bem, caso as advertências nada frutificassem. Assim também é a sanção das leis da ordem um ato de amor e mise- ricórdia, provindos da Sabedoria.
É fácil compreender-se não poder ela agir contra sua própria ordem, porque em tal hipótese estariam em perigo existência e fe- licidade de todos os seres bons e felizes. É da vontade da máxima Sabedoria levar igualmente renitentes espíritos e seres ao Bem e à Verdade, e para tal fim instituiu os meios adequados, que natural- mente não têm sabor agradável aos maldosos — todavia depende de sua vontade transformá-los.
Tudo resulta da firme vontade do homem; caso se modifique e peça a Deus, cheio de confiança, algo justo e bom em Meu Nome, recebê-lo-á à medida de sua verdadeira regeneração, sua fé e confian- ça. Com tal promessa real poderás estar satisfeito.
Quem meditar acerca disto e assim agir será feliz em tudo, não mais necessitando ter pavor da morte física, muito embora ti- vesse sido grande pecador. Deus, o Pai no Céu, enviou-Me a este mundo em virtude dos pecadores e não dos justos; de igual modo enviar-vos-ei aos pecadores, pois somente os enfermos necessitam de médico. Estás orientado?”
Responde o taverneiro: “Oh, como não? Mas já está se fa- zendo noite, que faremos agora?” Acrescento: “Depende de ti, pois nada determinei até depois de amanhã. Se tiveres um pedido a fazer, externa-o e verei se te posso ajudar.”
70.O TERRENO SUBMERSO
Diz Mathias: “Teria algo a Te pedir; mas talvez não merecesse importunar-Te.” Digo Eu: “Podes falar, pois nada no mundo é por Mim considerado sem importância.” Prossegue o hospedeiro: “Eis a questão: além desta propriedade, tenho outras, não longe daqui, onde pasta o meu melhor gado sob os cuidados de camponeses. Nes-
se enorme pasto bem cultivado há alguns meses afundou um vasto terreno formando uma cratera, cuja profundidade não é possível calcular-se, e talvez ainda venha a aumentar de circunferência.
Um velho entendido em tais coisas perguntou se os animais se aproximavam da cratera. Para tal experiência mandei trazer alguns bem próximos dali; quanto mais perto, mais excitados ficavam e, a dez passos de distância, debandaram. Até as cabras não se consegue levar até ali, muito embora costumem trepar em rochas escarpadas. Em seguida, o velho afirmou ser isto prova certa de que afundaria ainda mais. Nessa situação angustiosa, como proprietário, pergunto-Te qual a razão desse fenômeno e se não existe possibilidade de saná-lo.”
Digo Eu: “Vamos até lá para analisar a valentia dos espíritos brutos da terra que isto fizeram, estimulados pelas almas desencar- nadas de teus inimigos, porquanto adquiriste aquelas terras pela pe- nhora jurídica para saldar a dívida enorme que os prendia a ti.”
Rápido nos encaminhamos ao malogrado sítio, lá chegando após meia hora. A cratera era realmente medonha, e além de Mim e do hospedeiro, ninguém se aproxima e ele confessa ser esta a primei- ra vez que a vê de perto.
Digo-lhe então: “Traze-Me uma pedra enorme para saber se é possível tapar a cratera!” Em poucos instantes ele volta com uma pe- dra de dez libras, que Eu atiro com violência para dentro do buraco
e não demora em surgir uma coluna de fumaça exalando cheiro pestilento. Ameaço a coluna, dizendo: “Eu, o Senhor, ordeno-vos, maus espíritos, a preencherdes a cratera para todos os tempos!”
Eis que se ouvem vozes, exclamando: “Jesus de Nazareth, Filho de Deus Vivo, conhecemos-Te! Por que nos afliges antes do tempo? Achávamo-nos aqui oprimidos e procuramos nos libertar. Por que não nos permites tal liberdade? Fizeram-nos grande injus- tiça que nos trouxe a morte. Perdemos tudo. Por que o comprador não deveria igualmente algo perder? Por que não podemos guardar para nós este terreno nas profundezas?”
Retruco: “Fazei o que disse, do contrário vos sucederá coisa pior!” No mesmo instante a fumaça desaparece no fundo, onde se
ouve um forte rugir, e em seguida percebe-se subir o terreno afun- dado; dentro em pouco está plano como se nunca houvesse havido depressão. Chamo então todos os discípulos e lhes digo: “Como sois fracos! Observai o solo que surgiu e reconhecei não ser possível algo opor-se à Força da Vontade Divina!”
71.AÇÃODOSMAUS ESPÍRITOS
O taverneiro, então, pergunta qual era o sentido das palavras dos espíritos contidos na fumaça, dizendo que Eu não os afligisse antes do tempo. Digo-lhe, pois: “Todos os espíritos rebeldes consi- deram penoso quando advertidos à obediência para com Deus; pois o orgulho desconhece obediência, porque quer dominar e ordenar. E eles achavam encontrar-se pouco tempo no mundo espiritual, para se submeterem à Minha Vontade Divina. Teriam preferido per- manecer uma eternidade em suas inclinações maldosas e vingativas, sendo que qualquer espírito que os advertisse à ordem e submissão, ou até mesmo os compelisse a tanto, seria seu inimigo e algoz!
Por isto, os ameacei imediatamente e eles cederam, não obs- tante contrariados. Tal não importa para semelhantes espíritos pre- sos ao julgamento e à morte, porquanto sua liberdade obstinada não é liberdade, mas simples prisão e julgamento tenebroso, de onde só poderão ser libertos paulatinamente, caso uma vontade mais forte se aposse da sua, obrigando-os a uma boa ação.
Assemelham-se aos que no sono se entregam a sonhos fantás- ticos como se fossem monarcas, falando coisas desconexas, e muito se cansam. Todo mundo sabe serem tais sonhos prejudiciais à saúde e convém despertar a pessoa assim envolvida em suas fantasias. Nem bem acorda, aborrece-se cheia de raiva e só com completo despertar fica satisfeita de ter sido chamada à realidade da vida presente. Viu-
-se lograda em sua posse principesca e de rainha voltou a ser criatura comum; como tal, porém, chegou à convicção clara ter sido seu reinado nada mais que um pesadelo.
O mesmo acontece com tais espíritos, apenas com a diferen- ça de passarem, às vezes, longo tempo em tais fantasias, sendo tam- bém mais difícil para acordar. Em semelhante sonho se encontram todos os aventureiros de vários matizes nesta Terra; são felizes e ai daquele que se atreva a despertá-los para o rigor da vida, através de palavras e ações! Conseguindo-o com um ou outro, o despertado alegra-se muito, porque somente no estado de consciência consegue reconhecer mais e mais o perigo de seu sono desconexo.
Por tal razão também podereis tentar levar uma criatura de- sorientada à consciência; pois tal atitude será de grande benefício para os seus afins, e poderá influenciar melhor do que Eu. Não que- rendo despertar, deixai dormir tal burro preguiçoso! Serão precisos outros meios para despertá-lo, tais como: moléstias de toda espécie, guerra, fome e peste! Entendeste?”
Responde o hospedeiro: “Deve ser assim, Senhor e Mestre; mas não deixa de ser penoso, pois quando Deus inflige grandes ma- les sobre os homens, são atingidos muitos inocentes.”
Digo Eu: “Esses já sofrem como despertados entre tantos dorminhocos, portanto pouco ou nada perdem. Acaso é agradável encontrar-se em um quarto entre adormecidos, e ser obrigado ao silêncio?”
Concorda Mathias: “É verdade, deve causar aflição a um sá- bio achar-se entre tolos, surdos e mudos, não podendo trocar uma palavra razoável. Nesse caso é preferível uma doença que leva ao des- pertar. Ah, Senhor, nem sei expressar minha felicidade em Tua Pre- sença Divina! Acompanhar-Te-ei quando partires, pois sem Ti tudo me seria estranho e desagradável. Agora desejava saber a profundi- dade daquela cratera.” Respondo: “Bastante profunda, porquanto atingia cerca de mil varas.”
72.INFLUÊNCIAESPIRITUALCOMPERMISSÃODADIVINA PROVIDÊNCIA
Prossegue o hospedeiro: “Então os espíritos atrasados pos- suem força suficiente para fazer submergir, em tal profundidade, terreno tão vasto?”
Digo Eu: “Têm propriamente tão pouco poder qual herói adormecido; vez por outra é permitido realizarem algo pela vontade de um poder mais elevado e consciente, a fim de despertá-los e no que empreendiam esforços inúteis. Tão logo tal acontece, acordam de súbito e reconhecem sua miséria. Deste modo alguns são trans- portados de sua vida fantástica a outra, mais real, pela própria von- tade, prevenindo-se não cair em tais fantasmagorias maldosas, para evitarem suceder-lhes algo prejudicial à sua suposta liberdade.
Aqui deu-se apenas um encontro há muito tempo marcado, cujas circunstâncias visavam uma boa finalidade. No subsolo desse terreno existia, desde os primórdios desta Terra, uma enorme gruta completando uma continuação subterrânea do mar. Com o tempo, o lodo entupiu a entrada um tanto estreita, que ligava o Oceano à essa bacia. A infiltração da água salgada secando no decorrer das épocas, formou-se uma grande cratera e pelos repetidos terremo- tos se deslocaram partes soltas do terreno, caindo no abismo. Deste modo o solo se tornou cada vez mais fino e fraco.
Quando nesta época foi provocado um leve tremor de ter- ra pelos espíritos brutos, em consequência de uma reação de almas maldosas que, devido à sua inclinação materialista se encontram ge- ralmente nas furnas do subsolo — o terreno todo despencou-se para lá. Eis a explicação natural, em si, não somente natural, porquanto prevista e permitida por Deus desde tempos incalculáveis, a fim de despertar os maus espíritos do sono.
Assim, nada nesta Terra acontece puramente natural, mas sempre em plena ligação com finalidade elevada; pois em todo pla- neta o elemento espiritual está rigorosamente ligado à Natureza, em constante ação recíproca, fato que ireis assimilar completamente
quando fordes renascidos em espírito pela ação praticada dentro do Evangelho. Agora podemos voltar, pois em casa haverá novidades.”
Indaga o hospedeiro: “Senhor, não conviria chamar os cam- poneses para orientá-los do grande milagre ocorrido?”
Digo Eu: “Deixa isto por enquanto; amanhã ainda haverá tempo de sobra. É claro admitir-se a estupefação de teu pessoal; entretanto, pouco lucrará com isto para suas almas sensuais, por serem na maior parte gregos, portanto ignorantes e supersticiosos, e atribuirão o efeito a um tal semideus. Mais fácil é eles quererem orientar-te acerca do motivo de tal fenômeno, do que tu consegui- res fazê-lo; e caso digas ter Eu, o filho do carpinteiro de Nazareth, operado o milagre, ridicularizar-te-ão ou dirão estar Eu em contato com semideus.
Tais pessoas ainda não se acham aptas para a aceitação do Rei- no do Céu; têm que ser preparadas com cuidado e capacitadas a julgar todos os fenômenos da Natureza de modo mais razoável, pois fazem depender tudo da vontade dos deuses, cuja presença alegam sentir até mesmo pelo olfato — e em tal caso, nada feito com a plena Verdade dos Céus de Deus. Por isto deixemo-los e voltemos para casa.”
73.AFILHADOHOSPEDEIRO,AFOGADA,ESUA RESSURREIÇÃO
Quando lá chegamos, ao pôr-do-sol, o hospedeiro observa a ressaca no auge e, à distância de cem varas, um navio sujeito a soço- brar, e que talvez fosse conveniente socorrê-lo.
Respondo: “A outro qualquer, sim — mas este, não! A ven- tania matutina o impeliu muito próximo; mas outra o fará recuar. Trata-se da embarcação com os esbirros de Jerusalém, incumbidos de Me prender e matar. Agora estão em Meu Poder, onde ficarão mais alguns dias e noites — para em seguida serem levados à costa de Tiberíades, livrando-os da aflição. Só então voltarão a casa mais cordatos, e jamais tentarão perseguir-Me. Vê, o vento já afasta a em- barcação. Vamos, pois em casa nos espera outro assunto!”
Todos estão ansiosos por ver o que há e levam forte susto ao depararem com a filha mais velha de Mathias morta, em cima do leito. Tinha ido sozinha ao grande depósito de peixes a fim de su- prir-nos para o jantar; não conseguiu dominar um exemplar enorme que a atirara para dentro do tanque. Aos seus gritos se aproximaram várias pessoas para socorrê-la, mas quando conseguiram retirá-la, já estava sem vida. Não é preciso mencionar o grande alvoroço dentro de casa, enviando-se rápido um mensageiro à cidade para trazer o médico, que tudo fez a fim de salvá-la. Não obstante o desespero da família e os esforços do esculápio, ela não dava sinal de vida. O hospedeiro, de coração oprimido, dirige-se a Mim com as palavras: “Senhor, sei que tudo Te é possível!”
Interrompendo-o, advirto: “Nada digas a respeito; não quero fazer alarde! O médico, fariseu, dirá em breve: Não consigo socorrer a moça, pois está morta! — Então lhe pagarás depressa para que se afaste, e Eu farei o que Me cabe. Quando puser Minhas Mãos na afogada, ninguém deverá estar presente!”
Nessa altura o médico declara ter a moça falecido; convi- ria, porém, envolvê-la em toalhas aquecidas, pois talvez despertasse em algumas horas. Esta afirmação deveria constituir consolo para os pais. O hospedeiro indeniza o médico, que promete mandar as carpideiras; ao que Mathias aduz haver tempo para isso até o dia seguinte, e ele mesmo se incumbiria do caso.
Quando o quarto está vazio das pessoas desnecessárias, aproximo-Me da afogada, ponho-lhe Minha Mão e digo: “Filha, desperta de teu sono!” No mesmo instante ela se ergue e pergunta o que havia sucedido. Lembra-se de ter caído no tanque, mas não sabe explicar como chegara ao leito.
Digo Eu: “Estavas morta, Minha filha, mas Eu, a Própria Vida, restituo-te a existência. No futuro, sê mais prudente e exe- cuta somente aqueles trabalhos para os quais te assistem forças su- ficientes, do contrário sofrerás outro desastre. A atitude laboriosa é sempre louvável; mas quando excede as forças, torna-se tolice. Não
esqueças disto e transmite-o à tua mãe e irmãos! Mostra-te a eles, todos aflitos, e tratai do jantar!”
Ela Me agradece pela grande Graça e procura os familiares, que não se contêm de alegria. Ela, então, testemunha de viva voz: “Isto foi obra do Grande Mestre de Nazareth, que nos recomenda uma farta refeição!” Alegres, todos começam a ajudar e o hospedeiro não tem palavras para agradecer-Me. Os discípulos novos não param de admirar-se e dizem: “Este milagre convenceria o Templo todo!”
Eu, porém, respondo: “Uma prova maior e idêntica revoltará os templários contra Mim, a ponto de empreenderem tudo para o Meu extermínio! Nada mais necessito dizer. Basta deste assunto, e estejamos alegres.” Em seguida ceamos e os apóstolos se entretêm com relatos de sua vida.
74.ONAVIOFARISEUEMALTO MAR
A família de Mathias, inclusive a filha ressuscitada, se aproxi- ma para ouvir histórias de maus espíritos e demônios por parte dos discípulos, que também afirmam não ser possível a algumas pessoas se protegerem contra as perseguições desses seres invisíveis. Tal per- missão partindo de Deus é um enigma, e os obsedados deveriam ser considerados particularmente, tanto mais quanto se dava o fenôme- no em crianças pequenas.
Manifesta-se também Mathias: “Eis um assunto estranho e incompreensível! Eu mesmo já observei tais ocorrências em crianças de cinco anos, muito castigadas pelos espíritos obsessores, e nin- guém conseguia aliviá-las.”
Digo Eu: “Meus apóstolos já estão orientados e te poderão elucidar, mormente Pedro, Jacob e João, e também sabem tanto quanto Eu afastar esse mal. Nada mais direi a respeito, pois havia avisado que descansaria durante esses dias, em Doutrina e ação. Po- deis fazer e falar à vontade; apenas não Me denuncieis aqui e muito menos na cidade!”
Os discípulos prosseguem nos relatos e João explica aos outros o fenômeno da obsessão; quando termina, por volta de meia-noite, recolhemo-nos. De manhã cedo Me dirijo com os três apóstolos mencionados ao ar livre, acompanhados pelo hospedeiro, enquan- to os outros se entretêm com anotações. Palestramos, entretanto, a respeito do navio farisaico em luta com as ondas furiosas; e Mathias opina que o vento o tenha impelido para Tiberíades.
Ao que respondo: “Ainda não; isto acontecerá em alguns dias, isto é, caso mudem sua intenção — do contrário, deixá-los-ei por muito tempo em meio do mar, remando baldadamente!”
Mathias então percebe não ser possível brincar-se Comigo; também é inimigo dos templários e está satisfeito com a Minha rea- ção. Assim ficamos observando grande quantidade de aves aquáticas que procuram seu alimento durante a maré; Mathias pergunta onde ficam na calmaria.
Pedro, exímio pescador, explica: “Trata-se de uma espécie de aves de rapina do mar, que apenas é vista quando há possibilidade de caça; do contrário, acha-se à beira-mar, inalcançável por parte da terra e da água, onde se encontra grande número de insetos e ver- mes. Durante as ressacas tais bichinhos se escondem, obrigando-as à caça de pequenos peixes. Eis a explicação, em si não mui importan- te, mas convém saber de tudo.” Satisfeito, o hospedeiro pergunta se queremos voltar para o desjejum.
75.AJUSTAOBSERVAÇÃODA NATUREZA
Digo, pois: “Ainda temos uma hora para tanto; aqui estamos bem e podemos observar como se realizam os Pensamentos de Deus.”
Indaga nosso anfitrião: “Senhor, como se poderá ver isto?”
Respondo: “Tudo que vês, ouves e percebes através dos senti- dos é apenas realização de Pensamentos Divinos. Vês as ondas agita- das. Quem faz a água elevar-se a semelhante altura e não deixa que descanse? Eis o Pensamento de Deus, vivificado pela Sua Vontade. Observa as aves a brincarem com as ondas. Que mais seriam, se-
não simples Pensamentos fixados de Deus? O mar, as montanhas, os animais, ervas, arbustos e árvores, as criaturas, o Sol, a Lua e as incontáveis estrelas traduzem Seus Pensamentos. Sua existência depende unicamente da Imutabilidade da Vontade Divina, ainda incompreensível para o teu entendimento.
Admitamos a possibilidade, pois a liberdade da Vontade Di- vina é Infinita, de que Deus sustasse Sua Vontade de um dos Pen- samentos realizados à nossa frente — e sua existência seria nula. O Pensamento continuaria em Deus, mas a matéria se dissolveria em nada. Aqui temos diante de nós o surgir, a formação e transformação dos Pensamentos de Deus, tão importantes para o verdadeiro amigo do Pai! Não consiste em verdadeira felicidade observá-los e neles conhecer dia a dia o Amor, Sabedoria e Onipotência de Jehovah?!
Vede em direção a Leste as pequenas nuvens, ora aumen- tando, ora diminuindo e de repente — desfazendo-se! Também são Pensamentos de Deus, que apenas levemente concentrados no ar, passam para uma materialização sutil, apresentando-se em formas constantemente mutáveis. Tais formas estão evidentemente mais próximas do elemento de origem espiritual do que as montanhas concretas e todas as demais formações que nos circundam por todos os lados; entretanto, sua existência é mais imperfeita, pois necessi- tam passar por outras formas, por exemplo, gotas de chuva. De lá ingressam ao alimento de algumas plantas, onde aceitam forma algo definida e consistente até chegarem ao homem, podendo transfor- mar-se, como seres completamente livres e independentes na vonta- de e ação, em elementos espirituais imutáveis e semelhantes a Deus. Quem observar as criações de Deus deste modo sentirá muita satis- fação e alegria, pois proporciona ao homem maior energia do que um desjejum tomado fora de hora. Concordas?”
Responde o hospedeiro: “Oh, sim, Mestre e Senhor, mas para tal observação cheia de vida é preciso se possuir Tua Sabedoria; poderia fazê-lo durante um século, sem encontrar o que revelaste. De agora em diante isto modificará, pois sou amigo da Natureza e sinto prazer em suas manifestações. Apenas deparando aberrações,
procuro afastar-me; por exemplo, por ocasião de tempestades, quan- do nuvens nos tentam aniquilar com raios e trovões — minha sim- patia chega a um fim. Essa ressaca não é propriamente uma ação de calma em a Natureza, todavia é inofensiva, podendo ser observada com serenidade; mas se viesse um furação, não seria a observação oportuna para descobrir o Pensamento imponente de Deus, vivifi- cado pela Sua Vontade.”
Digo Eu: “É isto mesmo; o que te disse não é ordem, mas apenas conselho; do contrário, as criaturas teriam que descer às profundidades marítimas para poder estudar as materializações dos grandes Pensamentos de Deus. Sempre que o homem puder fazê-lo sem perigo e dano para sua vida, haverá grande benefício para alma e corpo, despertando cada vez mais o espírito do verdadeiro amor a Deus e ao próximo.
A fim de poder amar a Deus em verdade, preciso é procu- rar conhecê-Lo melhor. Quem não se esforçar neste sentido será responsável, continuando sua noção e consciência da sobrevivên- cia eterna da alma excessivamente fracas; pois tal real sensação é justamente a consequência do amor verdadeiro e ativo a Deus e ao semelhante.
Deus, o Pai, é, em Sua Natureza Intrínseca, o Amor e em Si a Própria Vida, porquanto Amor e Vida são uma só coisa. Quem tiver o Amor a Deus, único elemento da existência, possuirá a Vida Real, Eterna e Divina. Quem não o possuir estará espiritualmente morto; sua vida é apenas aparente, portanto um julgamento, até que tenha despertado, de modo próprio, o Amor a Deus através da ação. Por isto é benefício para o homem verdadeiro quando, vez por outra, medita acerca daquilo que se apresenta aos seus sentidos. Compre- endes o que te disse?”
Responde ele: “Sim, Senhor e Mestre, apenas é de lastimar que a maioria das criaturas ignore tais ensinamentos importantís- simos. Não deixarei de passar adiante o pouco que sei às de boa assimilação. Qual será o motivo principal de se terem tornado, nesta época, tão ignorantes?”
76.MOTIVODADECADÊNCIAHUMANA.TEOCRACIAE IMPERIALISMO
Digo Eu: “Reflete acerca daquilo que já te falei; antes de tudo são orgulho, ócio, amor-próprio e o domínio consequente moti- vos da decadência humana. Já em épocas de Samuel os homens se tornaram mais preguiçosos, pois começaram a se envergonhar de certos trabalhos, mandando executá-los por empregados. Os pro- prietários descansavam e mandavam outros trabalharem por eles, e quem mais trabalhasse recebia maior pagamento, o que não deixava de ser justo; mas desse modo se formou, aos poucos, uma espécie de pequenos soberanos, que de modo algum queria executar o menor trabalho manual.
Os filhos, naturalmente, imitavam os pais, tornando-se pre- guiçosos, egoístas e dominadores. Aprendiam a mandar, sem que- rerem sujar as delicadas mãos com serviços vulgares. Tal vício au- mentou de ano para ano, e em breve alcançou aquele grau, onde o excessivo orgulho não mais encontrava satisfação. Ele, o judeu, fitava com melancolia o brilho dos grandes potentados pagãos, con- siderando um rei a figura de maior elevação e dignidade. Em suma, também quis um regente mundano, pois o Regime puro de Deus através de Seus Visionários e Juízes não o satisfazia.
Quando o povo, contrário a todas as advertências, continua- va exigindo de Samuel um rei, este fiel servo de Jehovah expôs-Lhe tal incoerência, porquanto não sabia o que fazer. E Jehovah lhe disse: A todos os pecados que este povo cometeu diante de Mim, acrescen- ta o maior, exigindo um rei! Vai ungir o homem mais importante do povo! Ele o castigará pelo ultraje a Mim feito!
Eis em poucas palavras a resposta de Deus. As consequências do orgulho cada vez mais alimentado poderás ler no Livro dos Reis e da Crônica, onde encontrarás a História do povo judaico, e na maior parte tens tal situação diante de ti.
Amigo, somente na verdadeira humildade se acha o caminho para a vida interna da alma! Mas quem a possui? Nem um simples
servo, pois calcula seu valor pela honra e o conceito do patrão. Caso forem mais elevados de que de um colega, este será menosprezado, não havendo motivo para troca de palavras.
Afirmo-te: enquanto o amor verdadeiro e puro e a correspon- dente humildade não organizarem o regímen dos povos existirá, de modo geral, a treva sobre a Terra. É certo que sempre haverá alguns bafejados pela luz; mas serão poucos. Enquanto houver soberanos excessivamente orgulhosos e dominadores, a semente do orgulho se alastrará em todas as camadas da Humanidade e o obscurecimento, treva, egoísmo, inveja, cobiça, perseguição e traição como elementos do inferno não desaparecerão do solo terráqueo, até a época do gran- de julgamento, em que novamente purificarei o planeta pelo fogo. Em seguida, não haverá mais rei regendo os povos, mas somente a Luz Divina. Não assistireis tal época na carne, mas clara e nitida- mente em espírito, no Meu Reino.”
Pergunta o hospedeiro: “Em que ano virá tal era feliz?”
Respondo: “Isto somente o Pai sabe, e além Dele apenas aquele a quem Ele quiser revelar. A Mim o Pai ainda não o revelou, a não ser que venha a suceder. Uma coisa podeis aceitar como plena verdade, que sempre ocorre uma grande transformação na Terra de dois em dois mil anos. Assim será, a contar de agora. Nada mais se falará a respeito!”
Diz Mathias: “Senhor, se for de Teu Agrado, o desjejum está nos esperando!” Digo Eu: “Pois bem, vamos a casa!” Ao lá chegar- mos, os discípulos perguntam onde andávamos, porquanto não conseguiram nos achar.
Eu lhes digo: “Não nos procurastes onde estávamos, razão por que não nos encontrastes.” Durante a refeição, um judeu obser- va ter sido Minha resposta estranha e não sabia como interpretá-la. Respondo: “Tal qual vos foi dada. Se quiserdes meditar um pouco, nela encontrareis uma grande Verdade espiritual.”
Opõem os discípulos: “Será um tanto difícil, pois parece nada mais que reação merecida para nossa indiscrição!”
Digo Eu: “De modo algum! Dir-vos-ei o sentido de Minhas Palavras: em verdade, quem não Me procurar onde Eu estiver jamais Me encontrará. No decorrer dos tempos, muitos Me procurarão sem Me acharem. E épocas virão em que se levantarão muitos falsos profetas e Messias, dizendo: Eis aqui o Ungido!, ou: Lá está Ele!
Justamente lá onde alegarem Minha Presença, de modo algum estarei. Quem Me procurar onde houver o menor vestígio de mun- danismo não Me achará, mas sim apenas aquele que Me procurar no Amor, humildade e renúncia verdadeiros achar-Me-á sempre e por toda parte.
Procurastes-Me um tanto aborrecidos, porque não vos avi- sei para onde iria. Isto não foi o justo local para Me procurardes es- piritualmente em vosso íntimo, razão por que não Me encontrastes externamente! Não se relaciona à vossa posição quanto a Mim, mas vos demonstrou a situação futura. Por isto deve todo doutrinador formar suas palavras em todas as ocasiões, ainda mesmo em coisas de somenos importância, de modo tal a servirem de base a um en- sinamento novo e importante. No Reino dos espíritos puros diante de Deus, tereis que prestar contas palavra por palavra futilmente pronunciada, sendo desclassificados na luz da Verdade Divina!” Esta advertência não é do agrado dos discípulos, entretanto grava-se pro- fundamente em suas almas.
77.NASREDONDEZASDE CAPERNAUM
Após o desjejum dirigimo-nos a um monte bastante alto, perto de Capernaum. O taverneiro e sua filha ressuscitada também nos acompanham, e ele ordena ao empregado para levar algum pro- vimento, porquanto Eu lhe dissera que ficaríamos lá em cima até à noite. Por outro empregado manda ele entregar dois peixes como regalo ao reitor. Subimos, pois, o monte em poucas horas, de cuja altura se avista parte do Mar Galileu, inclusive o navio ainda a se debater contra as ondas.
Diz o hospedeiro: “Aqueles desvairados por certo não terão mais provimento e passam fome!”
Replico: “Têm algum pão úmido — e é quanto basta para sua maldade! Todavia, já desistiram de seu plano medonho e ten- tarão a volta, no que serão auxiliados por bom vento. Ainda assim, passarão por grande aflição até alcançarem a praia, pois tão facil- mente não devem se salvar!”
Obtempera Mathias: “Não sinto piedade para com os tem- plários tenebrosos; lastimo os marinheiros, que ao invés de paga- mento, receberão castigo, porque os fariseus lhes atribuirão a culpa por não terem podido conduzir a embarcação!”
Digo Eu: “Não te preocupes; são gregos fortes da zona de Tiberíades. Ainda se acham supridos de peixes defumados, carne de porco, também defumada, e pão, duas vezes assado. Na popa guardaram alguns odres de vinho, e como os templários não con- seguem comer seu pão molhado, compram, por muito dinheiro, o provimento dos marujos, de modo que esses nada sofrem, além da situação difícil do barco. Por isto não nos preocupemos com eles; só à noite alcançarão, com dificuldade, a margem. Que assim seja!”
Novamente o hospedeiro faz uma pergunta, dizendo: “Se- nhor, como és Onisciente, por certo saberás onde anda Judas, que nos deixou anteontem.”
Digo Eu: “Também ele não nos interessa! Depois de ama- nhã voltará e não o impedirei nisto. Vamos apreciar o panorama e podeis entrementes meditar sobre os ensinamentos dados pela ma- nhã. Procurai instruir quem os desconhece, que sentireis verdadeira alegria.” Todos assim fazem, palestrando até ao anoitecer, de sorte a esquecerem-se do provimento. A filha de Mathias, sentindo fome, lembra-lhes.
78.PALESTRAENTREOHOSPEDEIROEO REITOR
À noite voltamos para casa onde nos aguarda a ceia, e um mensageiro do reitor entrega a Mathias um cesto de ovos frescos como agradecimento pela dádiva. O hospedeiro agradece e promete lembrar-se do reitor na próxima pesca.
Diz o mensageiro: “Será motivo de regozijo para meu patrão. Ele foi informado da presença do profeta de Nazareth e gostaria de palestrar contigo a seu respeito. Quando poderias visitá-lo?”
Responde Mathias: “Espera um momento. Tenho que falar a um amigo com o qual pretendo combinar um negócio por esses dias, em seguida darei ao reitor os esclarecimentos que deseja acerca do homem milagroso, que bem conheço.” Após ter assim falado, ele entra no refeitório para saber de Mim o que fazer. E Eu aconselho: “Embora já esteja anoitecendo, dize-lhe estar Eu aqui e que ficarei o tempo que Me aprouver. Quem tiver algo contra Mim, que venha pessoalmente para resolver o assunto; pois responsabilizo-Me por Minha Pessoa, e ninguém mais no mundo. Transmite-lhe isto, que ele ficará satisfeito. É só o que deves falar!”
Rápido, o hospedeiro vai, em companhia do empregado, à casa do reitor, ansioso por saber algo acerca de Minha Pessoa. Quan- do recebe o Meu recado, ele se irrita, dizendo: “Como podes acolher um homem perseguido por todos?”
Responde Mathias: “Tal é meu dever de hospedeiro, pois não posso fechar minha porta seja a quem for. Nem tenho direito de expulsar ladrões e assaltantes, ou perguntar-lhes o que desejam, por- quanto também respeitam a taverna. A minha é inteiramente livre, e um criminoso lá não poderia ser preso e levado à justiça durante sete dias, pelas leis de Roma. Se assim é, por que não deveria hospedar o homem mais célebre do mundo, que nunca ficou devendo algo, e além disto é a criatura mais amável que já vi?!
Além do mais fez ele um discurso na sinagoga; se tinhas algo contra ele, perdeste a oportunidade de chamá-lo à razão. Eu, como hospedeiro, não tenho direito a tanto. Ainda se acha em minha casa,
e se quiseres poderás, como qualquer um, procurar entendimento com ele. Sei de experiência própria não temer quem quer que seja, pois me disse expressamente não haver no mundo quem por ele se responsabilize. Ao passo que as criaturas têm motivos para tal, pois o poder de sua vontade é ilimitado.”
Diz o reitor: “Sei estares no teu direito e ninguém poderá obstar-te. Não deixes, porém, levar-te a crer ser ele o Messias Pro- metido aos judeus! Ele divulga essa heresia entre o povo, que lhe dá crédito porque positiva sua doutrina através de milagres, na maior parte realizados com ajuda de Beelzebub. Era apenas isto que queria dizer-te, e me agradou tua chegada até aqui ainda hoje.”
Diz Mathias: “Por isto não me precisavas chamar; sou ho- mem de vastas experiências e sei diferenciar entre o falso e o ge- nuíno. Todos nós conhecemos esse homem quase desde infância, inclusive seus pais, devotos e obedientes a Deus e Seus Ditames. Como poderia seu filho estar de conivência com Satanás e realizar Suas Obras Divinas com ajuda do mesmo?!
Quem quiser formar juízo acertado terá que se dar ao tra- balho de conhecê-lo em todos os aspectos. Condenar alguém sem saber quem é, não acho adequado à prudência sacerdotal. Vai pesso- almente falar-lhe — e depois poderás julgá-lo!”
Após certo tempo, o reitor se expressa: “Tens razão, e se não fosse meu posto, certamente pensaria como tu. Sou reitor e tenho que agir como manda o dever; entretanto, também sou humano, do contrário teria, a mando do Templo, feito prender aquele homem para enviá-lo a Jerusalém. Por isto não assisti à prédica na escola, para dar impressão de ignorá-lo. Pois bem, se me for possível, irei procurá-lo amanhã ou depois; ao menos quero vê-lo!”
Aduz o hospedeiro: “Não te arrependerás!” Em seguida, ele volta junto de Mim e relata o encontro. Eu lhe digo: “Falaste muito bem, porque Eu Mesmo te inspirei; não obstante, o reitor é templário e caso recebesse nova ordem para Minha captura, fá-
-lo-ia, com presteza. Não é impulsivo, mas grande amigo da co- modidade, e assim deixa-nos agir a gosto. Será difícil positivar-se
sua vinda aqui; pois ao despertar amanhã, nem se lembrará do que disseste. Agora vamos repousar, que a montanha nos deixou cansa- dos!” Todos seguem o Meu conselho. Demorei ainda dois dias em casa do hospedeiro sem que algo de maior sucedesse. No terceiro, dirijo-Me com os discípulos e Mathias à praia, e mando que o mar serene. Imediatamente as ondas se acalmam e os pescadores se en- tregam à sua tarefa, que há cinco dias descansavam sem, contudo, causar-lhes prejuízo.
79. O SENHOR AO NORTE DA GALILEIA. A VOZ INTERNACOMOSEGREDODEDEUSNOCORAÇÃODACRIATURA(EV.JOÃO7, 1)
Nessa manhã, Judas se une a nós e faz menção de contar seus atos feitos em Meu Nome. Eu, porém, lhe digo: “Deixa disto; pois nada Me é desconhecido. É melhor calares para evitar mentiras; pois a metade de tuas palavras é mentira!” Ele se contém e procura algo para comer. Dirijo-Me ao taverneiro, dizendo: “Amigo, aqui nada mais há que fazer e partirei depois do almoço. Hoje à noite virão aqui muitos estranhos, entre eles alguns de Jerusalém, com os quais quero evitar contato. Manda preparar o almoço; poderás nos apre- sentar a conta, se bem que não para Mim e Meus apóstolos, e sim para os vinte novatos, providos de dinheiro!”
Opõe Mathias: “Não, Senhor e Mestre, ainda que Teus dis- cípulos fossem meus hóspedes durante dez anos, nenhum teria que pagar-me. Sou Teu grande devedor a tal ponto de não poder resgatar minha dívida com montes de ouro maciço! Imagine a pesca, a mila- grosa supressão da cratera e finalmente a ressurreição de minha filha! Como poderei recompensar-Te à altura?!”
Digo Eu: “Está bem; manda então aprontar um bom almo- ço.” Entrementes os discípulos se aproximam, dizendo: “Senhor, para onde irás? Galileia já foi minuciosamente percorrida; ao passo que Judeia, Samaria, Mesopotâmia e o trajeto que leva a Damasco ainda não procuramos. Que tal se fôssemos até lá?”
Digo Eu: “Sei que aqueles países necessitam de luz, mormen- te a Judeia pervertida; entretanto, não a procurarei, porque lá sou muito visado. Se bem que ninguém Me possa prender antes do tem- po, de que já vos dei provas de sobejo — não quero fazer com que o povo se torne pior com Minha Presença. Os demais países ainda não têm a devida maturação, razão pela qual ficaremos na Galileia para aumentar a luz.”
Minha Determinação é do agrado dos discípulos, sem grande inclinação para com os judeus, que desprezavam quase tudo que se originava da Galileia. Os novatos opinam serem Mesopotâmia e Syria os países mais adequados para se difundir a luz do Céu.
Retruco: “Acaso julgais não conhecer Eu aqueles países? Lá se pode contar, por um péssimo judeu, no mínimo dez romanos e gre- gos, genuínos pagãos e cheios de superstições. Como receberiam a Luz verdadeira e celeste?! Na Samaria ela já foi divulgada e aumenta consideravelmente. Damasco, porém, é metrópole comercial e seus moradores só se preocupam na venda de seus produtos a bom preço, portanto nada se conseguiria com a Doutrina. Mais tarde ela será implantada até mesmo lá. E assim ficaremos na Galileia para visitar e soerguer os nossos amigos da Luz!
Quando um soberano pretende reger um povo, preciso é primeiro construir um castelo sólido, invencível aos seus inimigos. Os súditos observando sua invulnerabilidade, submetem-se às suas ordens. Deste modo a Galileia será para nós uma fortaleza sólida, cuja queda não será coisa fácil para o inimigo da Luz. Eu, como galileu, sou a Pedra Fundamental, e vossa fé é a rocha sobre a qual edifico a fortaleza de Deus. — Eis o hospedeiro para nos convidar à refeição. Vamos!”
Após o almoço, Mathias pergunta se nos pode acompanhar até ao próximo lugarejo. Eu lhe digo: “Também te tornaste Meu dis- cípulo por Me teres reconhecido. Permanece aqui, onde poder-Me-ás ser mais útil do que Me acompanhando. Hoje ainda virão muitas pessoas ao teu albergue e terás oportunidade de representar-Me. Tal fato repetir-se-á. Em poucas semanas voltarei para ficar aqui por
alguns dias, quando poderás te inteirar melhor de Minha Doutrina. Ao falares em Meu Nome não precisas refletir, pois Eu Mesmo te inspirarei!”
Diz ele: “Senhor, como perceberei tal fenômeno?!”
Respondo: “Sentirás no coração pensamentos tão nítidos quais palavras pronunciadas, e basta proferi-las. Nisto consiste o Se- gredo de Deus no coração humano. Acrescento mais: ao encontrares um enfermo, apõe-lhe tuas mãos em Meu Nome que ele melhorará! Não te deixes pagar pela cura e dize-lhe apenas: Dá Graças a Deus, ao Onipotente, em Seu Filho Jesus! Vai e não peques mais! Cumpre os Mandamentos e faze o bem! — Deste modo conseguirás mui- tos crentes em Meu Nome!” Em seguida, ponho-lhe Minhas Mãos, transmitindo-lhe as forças para agir em Meu Nome.
80.VISITAAOHOSPEDEIROEMCANÁ.CURADEUMACRIANÇA.UMEVANGELHOPARA MÃES
Em seguida partimos rápidos e à tardinha chegamos a Caná, na Galileia, onde havia Eu transformado água em vinho. Pernoita- mos na mesma casa, pois também é albergue e não é preciso men- cionar que fomos bem acolhidos. O jovem casal já tem um filho de poucas semanas que sofria de convulsões, em virtude de um susto que a mãe passara durante o resguardo. O motivo fora um incêndio na vizinhança, rapidamente debelado. Tanto os pais quanto os avós tudo fizeram para curar o menino — mas em vão.
Quando entro em sua casa, o jovem casal se atira a Meus Pés, dizendo: “Ó Mestre, foi Deus que Te mandou aqui para curares nosso garotinho!”
Digo Eu: “Levantai-vos, pois não se deve ajoelhar diante de um homem!”
Contestam eles: “Mestre, sabemos seres mais que simples mortal, portanto justifica-se nossa atitude! Socorre nosso filho!”
Respondo: “Está bem, trazei-Me a criancinha!” Eles obede- cem e Eu aponho-lhe as Mãos, abençoando-a — e no mesmo ins-
tante ela se cura e sorri como se nunca estivesse doente. Em seguida digo à jovem mãe: “Sê mais prudente no futuro! Quando estiveres irritada, não dês de mamar à criança até que tua alma se tenha acal- mado! Através do leite materno podem surgir muitas moléstias fí- sicas e até psíquicas nos filhos. Lembrai-vos todos deste fato! Agora tratai de uma ceia!” Os pais Me agradecem contentíssimos e vão satisfazer o Meu pedido. Dentro de uma hora tudo está preparado e nos conduzem a um refeitório novo; quando terminamos, indago do anfitrião quando e por quem havia sido feito o grande salão de jantar. Ele responde: “Senhor, esse trabalho não se deu de modo na- tural. Joses e Joel, Teus irmãos, foram os construtores. Dispunham apenas de dois ajudantes, e quando começaram a preparar os cedros, o trabalho levou um dia, ao passo que necessitariam, no mínimo, de uma semana para tanto. O ajuste das pilastras, do assoalho, o levan- tamento do telhado e tudo que se acha no interior da sala — durou o mesmo tempo que Deus empregou para a Criação do Universo. Em suma, pelo critério de qualquer entendido, a construção de sala idêntica levaria meio ano, com ajudantes laboriosos — e esta foi realizada por quatro homens, em seis dias, portanto é milagre evi- dente! Joses e Joel estavam certos de Tua Ajuda e a própria Maria, Tua Mãe dedicada, dizia o mesmo! Não é isto, Senhor e Mestre de todo Ser e Vida?”
Respondo: “Está bem, foi tal qual. Agora vamos dormir e amanhã falaremos a respeito!”
81.OSENHORNONORTEDA GALILEIA
Durante sete dias fiquei em Caná, e Meus apóstolos prega- vam o Evangelho ao povo. De lá seguimos para o Norte após termos feito muita caridade; inúmeras pessoas nos acompanham por certo trajeto e voltam aos lares confortados. Nessas zonas encontramos quantidade de pagãos, muito supersticiosos, dando grande valor a amuletos. Por isto nos fitam admirados, não compreendendo como podíamos viajar sem tais meios de proteção. Quando começamos a
lhes dar provas de nosso poder interno, jogam-se de bruços contra a terra temerosos de nos fitar, porquanto nos consideram deuses do Olimpo. Somente após prolongadas explicações e provas voltaram a nos tomar por criaturas humanas, dando oportunidade de nos externarmos.
Demoramos cerca de três semanas e convertemos grande número de pagãos ao puro judaísmo. No fundo eram pessoas bon- dosas que tudo faziam para bem servir-nos. Muito se chorou ao dei- xarmos a zona; confortei-os, porém, de sorte a nos deixarem partir com calma.
A fim de que o leitor se oriente com mais facilidade quanto à zona dessa raça pagã presa aos talismãs, pode procurar em um mapa antigo que encontrará na Ásia Menor uma região chamada “Capadócio” (Cai pa dou ceio: Que querem esses aqui). Na fronteira Sul havia uma cidade com o nome de Melita (Mei liete: é preciso ter idade). Tal denominação resultou de um jovem rei inteligente e destemido, que quis subir ao trono quando da morte do velho sobe- rano. O conselho de patriarcas descobriu que o filho ainda não tinha alcançado a idade necessária, por isto lhe disse: Mei liete! — Preci- sas ter idade! Enraivecido, o jovem dirigiu-se com alguns guerreiros para Este, conquistou a mencionada região da Capadócia, anexan- do-a à Cilicea (Ci lei cia — Tão logo ela queira), onde construiu uma cidade e deu-lhe o nome triunfante de Mei liete nei (em grego, Militene — Não tenho idade), com que pretendia provar aos an- ciãos sua capacidade. Tal fato não faz parte de nosso Evangelho, entretanto não prejudica, a fim de se poder orientar melhor.
Dessa cidade, em direção a Leste, existia uma importante cordilheira na fronteira da Syria, onde precisamente viviam aqueles pagãos. De lá caminhamos para Sudoeste e alcançamos uma cida- de chamada Chotinodora — (No canto não se pode arar). Habita- vam aí muitos judeus de Bethlehem, negociantes de vários artigos e igualmente entregues a negócios de câmbio. Mas também havia gregos da Armênia que se dedicavam ao comércio de madeira do Euphrates como a metrópole vizinha denominada Samosata.
Ao depararmos a azáfama dessa gente, os apóstolos opinam ser tal ambiente não muito propício para nossa causa e um discípulo novato diz: “Senhor, essa região não faz parte da Galileia, que unica- mente pretendias percorrer. Como entendermos isto?”
Digo Eu: “Muito natural, porque pela divisa romana tudo isto até a fronteira da Ásia Menor faz parte da Galileia, portanto não liguemos à demarcação antiga. Esse país, que em épocas de Jacob e mais tarde sob o regímen dos juízes era o da tristeza e dos proscritos, tornou-se uma região de alegria e muito embora fosse anteriormente pequena, é agora maior que todos os países da Terra Prometida em conjunto. Se bem que estejamos na antiga Syria, encontramo-nos na nova Galileia (G — pronunciado como ch, soa Schalileia — zona da tristeza), não mais país de tristeza, e sim da alegria e ressurreição espiritual. Compreendestes?”
Dizem todos: “Como não, Senhor, pois é a Verdade! Agora resta saber o que faremos aqui; o dia está findando e estamos sem abrigo e provimento. Pedimos-Te que soluciones nossas dificulda- des. Talvez devêssemos pernoitar ao ar livre, ou queres que procure- mos comprar algum pão na cidade?”
Digo Eu: “Oh, temerosos! Ide, pois, à procura de provimen- to. Entretanto não necessitais preocupar-vos com o abrigo, que se apresentará quando quiser. Caso não venha, ficaremos aqui e nin- guém será prejudicado. Amanhã trataremos do indispensável.”
82.OSAPÓSTOLOSEOZELOSO PUBLICANO
Em seguida levantam-se alguns dos apóstolos a fim de procu- rarem provimento na cidade e encontram uma padaria, onde com- pram pão por dez moedas e peixes fritos por quatro moedas. Ao saírem da cidade com as compras, são abordados por um publicano que indaga quem necessitava de provimento tão grande. Os apósto- los dizem: “Fazemos o que é da Vontade de nosso Senhor e Mestre!” Continua o outro: “Quem é ele e qual sua profissão?” Respondem os discípulos: “Vai e informa-te com Ele pessoalmente; dir-te-á caso
queira. Acontece não responder a qualquer um! Está descansando à margem do rio; dirige-te, pois, a Ele!”
Prossegue o publicano: “Por que não ides a um albergue? Existem vários nesta cidade importante!” Repetem os apóstolos: “Procura sabê-lo com Ele, pois ignoramos Suas intenções.” Diz ele: “Está bem, vou fazê-lo. Aqui se respeita uma ordem severa e temos que estar orientados acerca de todo forasteiro que se aproxime.”
Em seguida o publicano se dirige a Mim, dizendo rispidamente: “Quem dentre vós é Mestre e Senhor?” Respondo: “Sou Eu! Que que- res de Mim e Meus discípulos?” Diz ele: “Sois estrangeiros, não admi- tidos nas proximidades de nossa rica cidade caso não se identifiquem.”
Digo Eu: “Conheço vossas leis e penalidades melhor do que tu, que como simples publicano, não tens direito de indagar de nos- sa procedência! Vê, ainda nos encontramos a setecentos passos dis- tantes da entrada da cidade e o local que ora pisamos se destina des- de eras remotas aos estrangeiros, de sorte que pelas vossas próprias leis estamos livres de qualquer inquérito. É preferível correres à tua casa, do contrário morrerá, antes de chegares, teu filho mais velho, enfermo há sete anos!”
Sumamente confundido, o publicano pergunta de onde Eu tenho tal conhecimento, e se talvez sabia de um meio para curá-lo.
Respondo: “Oh, como não?! Poderia socorrê-lo ainda que morto; mas para tal fim seria preciso fé mais forte no Deus Único e Verdadeiro, de ti e dos teus!”
Diz ele, amável: “Mestre e Senhor — conforme te chamam os teus acompanhantes! Vinde todos ao meu albergue, que nada vos faltará, mesmo querendo ficar durante um ano. E caso cures o meu filho, dar-vos-ei tanto ouro e prata quanto pedirdes; pois sou muito rico em bens terrenos e cederia mais da metade em benefício de meu filho. Não queres aceitar o meu convite?”
Digo Eu: “Se tivesses fé, poderias também vislumbrar algo do Poder e da Glória de Deus! Vai tu na frente, que seguirei com os Meus; faremos um ligeiro repasto, porquanto nada comemos duran- te o dia em nossa marcha cansativa.”
Insiste o publicano: “Mas, Senhor e Mestre, em casa sereis servidos muito melhor do que com essa refeição simples; além disto, recompensar-vos-ei mil vezes o custo da mesma!”
Acrescento: “Vai como te disse, porque assim o quero e teu filho viverá! Dentro de uma hora seguiremos!”
83.OSENHORRESSUSCITAOFILHODO PUBLICANO
Rápido, o publicano se dirige ao lar onde indaga do estado do seu amado filho. Os três médicos que o assistem dizem: “Senhor, o teu filho está passando mal e não há recurso! Empregamos todos os meios da ciência e prática — mas em vão. Se conseguirmos pro- longar sua vida por mais uma hora, teremos alcançado um milagre!”
Eis que o pai se aproxima do leito do moribundo, dirigindo-
-lhe as seguintes palavras: “Meu filho, esses médicos nada farão por ti; dentro em breve, todavia, virá outro para socorrer-te, porquanto deposito nele confiança plena e fé integral.”
O enfermo ergue um pouco a cabeça e diz com voz fraca: “Sim, a morte me socorrerá, ninguém mais!”
Com os olhos cheios de lágrimas, o pai responde: “Não, não, não a morte, e sim a vida! O médico estranho a quem falei sabia te encontrares doente há sete anos, afirmando poder ajudar-te ainda que tivesses morrido, razão por que creio em suas palavras.” O filho se cala, enquanto os médicos opinam: “Deixemo-lo em paz, pois a menor alteração matá-lo-ia! Sua expressão já apresenta os sinais da morte!” Assim se passa meia hora; em seguida o enfermo exala o último suspiro. Então os facultativos perguntam: “Onde está o ho- mem capaz de socorrer o teu filho, mesmo morto?” Nesse instante penetro no quarto e digo em alta voz: “Aqui estou! Não sou palrador como vós, pois o que digo é a Verdade plena, jamais enganadora, dos Céus de Deus!”
Irritados, os três reagem: “Olha aqui o corpo, palrador! Aju- da-lhe se te é possível, que nos curvaremos até o solo, confessando sermos apenas tagarelas!”
Digo Eu: “Dispenso vossas reverências e confissões, pois tudo que faço está dentro de Meu Poder e Vontade, portanto não cometo atrevimento; ao passo que vós declarais diante de todo mundo ser- des os primeiros mestres em vossa ciência — mas qual é o resultado de vossa fanfarronice?
Eis o morto! Foi acometido de ligeira febre, e uma colher de sal queimado adicionada a sete colheradas de vinho tê-lo-iam sal- vo para sempre! Não obstante tivésseis conhecimento do remédio, conjecturastes o seguinte: Esse moço é filho de pai rico e pode su- portar a febre durante anos, trazendo-nos muito dinheiro. Quando for adulto, ela o deixará automaticamente. — Malvados, afirmo-vos que a moléstia de há muito teria terminado, mas vós a alimentastes em virtude de vosso ganho, transformando-a em febre tísica, impos- sível de curardes. Deste modo, sois os assassinos deste jovem!
Classificastes-Me de palrador, sem jamais Me terdes visto e conhecido! Eu conheço-vos de há muito e disse, como ‘palrador’, a plena verdade a vosso respeito, poupando-vos a confissão! Esta ressur- reição dará testemunho pleno serem Minhas Palavras verdadeiras!”
Respondem eles com escárnio: “Em tal caso estaremos livres de quaisquer acusações!”
Digo Eu: “Veremos!” Em seguida Me aproximo do leito e digo: “Jorabe, desperta de teu sono e dá testemunho da grande men- tira desses três que Me chamaram de palrador!” No mesmo instante, ele se ergue do leito, tão cheio de saúde como se nunca tivesse ado- ecido. O pai, contentíssimo, não sabe se deve atirar-se primeiro ao Meu Peito, ou aos braços do filho. Por isto lhe digo: “Não faças isto, mas trata de alimentá-lo e em seguida dá-lhe um pouco de vinho!” Assim se faz, enquanto prepara-se uma refeição suculenta para nós.
84.AFASTAMENTODOSTRÊS MÉDICOS
Os três médicos, estarrecidos, não conseguem dizer palavra. Eis que o publicano se vira para o filho, perguntando qual o atestado que daria a eles, e o moço responde: “O mesmo dado pelo salvador
milagroso! Eles não cogitam da cura dos enfermos, mas apenas que tomem bastante dos seus remedinhos, trazendo-lhes dinheiro. Toda redondeza é ciente terem eles jamais socorrido alguém. Seu auxílio redunda naquilo que fizeram a mim, isto é — despacharam-me para o outro mundo.
Há um ponto a considerar: conforme alegam, são judeus de Jerusalém e se gabam de Jehovah. Além disto, só poderiam ajudar a quem cresse em seu deus, fazendo grandes oferendas em ouro, prata e pedras preciosas, que deveriam ser depositadas em suas mãos, pois tudo isso seria enviado àquela cidade, onde o sumo sacerdote faria preces no Santíssimo, conseguindo a cura do enfermo. Qual seria nossa situação como gregos, politeístas? Porventura deveríamos acrescentar mais um deus aos outros, que igualmente não nos ajudaria, pois todos trazem apenas benefício aos sacerdotes, esbanjadores das ricas oferendas?!
Testemunho aqui de viva voz ser este Salvador milagroso um Deus verdadeiro para mim! É Jehovah para os judeus, e Zeus para os gregos, romanos e egípcios. Deve unir todos os deuses em si. Já nos contaram muitas histórias de ter alguma divindade, em épocas remotas, realizado milagres pela simples vontade; nunca, porém, conseguimos certificar-nos de tais ocorrências. Aqui, todavia, está um homem capaz disto, razão por que é Deus para mim e esta fé conservarei por toda vida. Que dizeis?”
Responde o publicano: “Meu filho, toda nossa família com- partilhará de tua crença, pois somente um deus poderia fazer voltar à vida um morto. Agora, estranho Mestre e — Deus, dize-me o que fazer aos três médicos! Sua maneira de socorrer enfermos é eviden- temente a pior possível!”
Digo Eu: “Deixa-os seguir, pois ainda encontrarão justo cas- tigo de sobra! Primeiro, ninguém os quererá como facultativos, tão logo for do conhecimento o que aqui sucedeu; segundo, afastar-
-se-ão o quanto antes. Terão apenas que devolver-te a importância integral que lhes pagaste para a cura negativa!”
Os três médicos expressam mau humor à vista dessa exigên- cia. O publicano, porém, nela insiste, dizendo: “De modo algum
preciso desse dinheiro; pretendo entregá-lo aos pobres, mais neces- sitados que vós! Devolvei-me a importância dentro de uma hora; do contrário far-vos-ei entregar à justiça!” Eles fazem menção de se afastar.
Impedindo-os nisto, digo: “É bastante que um de vós o faça, os outros ficarão como reféns; se fossem todos, jamais voltariam! Irá o mais jovem e honesto; pois os outros não vacilariam em fu- gir, deixando o colega à espera. Que assim seja!” E tal aconteceu. Ao receber a importância, o publicano diz ao portador: “Sendo tu honesto pelo testemunho do Mestre divino, poderás aqui ficar; os outros terão que se afastar imediatamente.”
Diz o jovem médico: “Ficarei com prazer e sei o que faço. Não continuarei em companhia dos colegas; sempre foram senho- res e eu, apenas empregado, obrigado a agir como queriam, contra minha própria vontade. Muito sofri por isto. Mas que fazer? In- compatibilizar-me com eles seria o mesmo que me tornar inimigo do Templo de Jerusalém, e tal animosidade é a pior do mundo. En- contrando-me independente e convidado por ti, como prefeito da cidade, não ligarei ao sinédrio.”
Diz o publicano: “Está bem, podes ficar; enquanto eles te- rão de partir!” Isto já havia acontecido, porquanto ambos compre- enderam não haver possibilidade para sua permanência, caso Eu aqui ficasse.
85.AARTEDA VIDA
A seguir somos convidados para o almoço e penetramos no salão de refeição, não havendo idêntico em toda Jerusalém. No cen- tro está uma grande mesa de cedro, coberta de saborosos pratos e vinhos escolhidos. Com satisfação sentamo-nos, pois pães e peixes há pouco adquiridos não foram de especial qualidade nem tamanho! Quase não falamos durante a refeição; mas quando o vinho começa a soltar as línguas, as palestras são animadas. Eu Mesmo silencio, sentado entre pai e filho, ambos respeitando Minha Atitude. So-
mente após ter finalizado o publicano pergunta como Me fora pos- sível ressuscitar o filho, porquanto jamais tal coisa se dera na Terra.
Respondo: “Amigo, quando o espírito começa a despertar, descobre muitos segredos e tão logo estiver na Luz plena, concebe também o grande segredo da Vida, reconhecendo ser ele seu causa- dor. A maior arte da vida consiste em a criatura fazer tal descoberta!
Tu vives, pensas e ages de acordo com tua vontade; no en- tanto, ignoras o que seja a vida da alma, seu modo de pensar e agir, pondo todos os seus membros em ação correspondente. Quem isto tudo tiver descoberto dentro de si será verdadeiro mestre de sua exis- tência e de seu semelhante, podendo fazer aquilo que fiz ao teu filho. Poderá ainda mais, quer dizer, tornar-se plenamente imortal!
Se devido à atual cegueira, egoísmo, cobiça, inveja, ciúme e orgulho humanos Eu for preso e até morto — de nada adiantará; pois antes de se passarem três dias Eu Me ressuscitarei, continuando eternamente vivo e fazendo coisa mais sublime que agora. Isto que acabo de dizer-te é tão certo e verdadeiro como o fato de ter ressus- citado teu filho. Acreditas?”
Responde o publicano: “Estou plenamente convicto de me transmitires a Verdade; primeiro, porque meu filho é vivo pelo po- der de tua arte oculta da vida, consequência de teu saber; segundo, tais axiomas já foram criados pelos gregos da antiguidade. Desco- nheço se como tu conseguiram penetrar com seu espírito no grande segredo da Vida, pois jamais tal fato chegou aos meus ouvidos.
As fábulas de nossos deuses e semideuses relatam diversos milagres; quem poderia dar-lhes crédito, sendo dotado de alguma inteligência? Nas Escrituras místicas fala-se muito de um Deus Onipotente, rodeado de inúmeras falanges de espíritos poderosos, a executarem constantemente suas ordens em todo Universo. Tanto eles quanto a Divindade seriam invisíveis; mas há muitos séculos passados se apresentaram a pessoas beatas, tais quais os deuses o fizeram aos gregos primitivos. Refletindo acerca de tais fatos, chega-
-se à conclusão de serem idênticos às doutrinas de gregos e judeus. Tudo é encoberto por mística impenetrável e muito embora os mais
sábios de todos os tempos tivessem se esforçado, jamais conseguiram levantar o véu de Ísis, e os mortais se encontram no mesmo ponto de partida que os primitivos habitantes do orbe.
Serias, portanto, o único que desatasse esse nó górdio, razão por que te peço, como Mestre da Vida, nos demonstrares a elevada arte de se penetrar em seu segredo, a fim de chegarmos à perfeição. Deves conhecer os meios, e sua demonstração seria grande caridade de tua parte. Meu pedido é bastante ousado, pois todo real artista considera sua arte propriedade mais valiosa, e não ignoro que sua di- vulgação traria diminuição considerável. Sendo tua perícia questão vital, ao menos para as criaturas bem intencionadas, podendo facul- tar-lhes a maior felicidade, estou disposto a te entregar três quartas partes de meus tesouros, em troca de tua orientação. Que me dizes, grande mestre, à minha proposta?”
86.JESUS,PROFESSOR DAARTE DA VIDA
Digo Eu: “Apenas o seguinte: vim expressamente a este mun- do, como Homem, a fim de ensinar às criaturas, sem retribuição, essa arte mais elevada e importante. Meus discípulos provam ter fei- to Eu tal ensino em muitos países, pois já são iniciados neste segredo e poderão demonstrar-te caminho e meios.
Quem aceitá-los, acreditar e viver com rigor dentro de tais normas infalivelmente penetrará no segredo da vida, e após o for- mal renascimento de seu próprio espírito, tornar-se-á mestre de sua existência e igualmente da vida do próximo, porquanto lhe poderá demonstrar os caminhos e, através de sua maestria da vida, propor- cionar os maiores benefícios.
Afirmo-te, porém, não ser possível alguém se tornar mestre da noite para o dia, tampouco terão utilidade os conhecimentos mais profundos à conquista dessa arte vital caso não sejam aplicados. A teoria por si só nada adianta, mas unicamente a prática.
Fato semelhante ocorre na aprendizagem das demais artes. Caso pretendas aprender a tocar magistralmente qualquer instru-
mento, digamos, a lira dos gregos ou a harpa melodiosa dos judeus, preciso seria tomares um professor à altura. Ensinar-te-ia as regras indispensáveis para tal fim, a ponto de saberes ao certo como estu- dar para chegares a exímio mestre. Acaso ser-te-ia possível te torna- res harpista apenas pelo conhecimento preciso de todas as regras e exercícios? Certo que não! Terias pela constante prática dos dedos e ouvido alcançado a capacidade para atingires a meta desejada. O mesmo sucede na aquisição da maestria da vida.
Somente pela prática alguém se torna mestre, e o grau mais ou menos elevado da proficiência depende do exercício das regras correspondentes. Quanto maior aplicação, maior proficiência! Por isto não deves supor que pelo simples conhecimento das regras da vida já estejas apto a operar algo, ou levantar com isto o véu de Ísis! Apenas através da prática, sem esmorecimento, chegarás à convicção maior de serem as regras determinadas certas e reais, levando à meta. Tão logo tiveres atingido a perfeição, o segredo de Ísis estará des- vendado. Eis o preâmbulo às regras subsequentes, cujo exercício e prática levarão o homem à verdadeira maestria. Qual é tua opinião?”
Responde o publicano: “Acho tudo isto muito certo. A expe- riência nos ensina o que acabas de explicar; entretanto, já é de gran- de valia saber-se os meios e caminhos para finalidade tão elevada. O que não concebo é o fato de seres tu o primeiro a descobri-los, pois nem egípcios, gregos, romanos, persas e hindus poderiam apontar um sábio que tivesse alcançado tal grau. Não o aprendeste, mas é tua própria criação! Como te foi possível?
Em minha mocidade muito viajei e procurei. Conheço as maquinações essênias, todas as feitiçarias e adivinhações, cujas esco- las também frequentei. Aqui, não há combinação prévia, nem ma- gias nem filtros encantados, mas a verdade simples e despretensiosa! Falas e queres — e o efeito se apresenta! Mestre, quem te deu as diretrizes para tal?”
87.DESENVOLVIMENTOINTERNODACRIATURA ESPIRITUAL
Digo Eu: “Amigo, por enquanto isto não vem ao caso. Basta termos encontrado as regras, cuja genuinidade e verdade plena não podes contestar. Quem as conhecer e aplicar despertará dentro de si a força da vida e por ela poderá viver e agir, enquanto Eu o desperta- rei pela Força do Espírito da Minha Palavra no primeiro dia de seu renascimento espiritual. Em verdade te digo: Eu sou — aqui e em toda parte — a Verdade e a Vida. Quem crer em Mim e agir dentro de Minha Doutrina jamais verá e sentirá a morte!”
Opõe o publicano: “Mestre, tuas palavras soam estranhas! Tenho impressão de seres uma entidade de origem divina; se bem que caminhando na carne, és espírito puro, capaz de se encobrir na matéria tão logo queira. Estarei certo?”
Respondo: “Mais ou menos. Não assimilas aquilo que supões e ao mesmo tempo não é bem o que assimilas. Eu não posso, tão pouco quanto tu, deixar o Meu Corpo, e quando quiser fazê-lo ele terá que passar pela morte. O Meu Espírito, porém, em plena ação dentro de Mim, jamais poderá ser aniquilado, porquanto viverá eternamente