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O GRANDE EVANGELHO DE JOÃO
Volume VII
O GRANDE EVANGELHO DE JOÃO — 11 volumes
Recebido pela Voz Interna por Jacob Lorber
Traduzido por Yolanda Linau
Revisado por Paulo G. Juergensen
Direitos de tradução reservados
CopyrightbyYolanda Linau
UNIÃO NEOTEOSÓFICA
Edição 2020
ÍNDICE
O TRABALHO DOS ESPÍRITOS DA NATUREZA NA FORMAÇÃO DOS METAIS 42
A CRÍTICA. O SENHOR ACONSELHA A EXTERNAÇÃO TOTAL DAS DÚVIDAS .78
O JUSTO CONHECIMENTO DA SABEDORIA DIVINA ATRAVÉS DO RENASCIMENTO 112
A NATUREZA DOS ANJOS. AMOR E SABEDORIA, CORAÇÃO E INTELECTO 115
O VALOR DO LIVRE ARBÍTRIO. EXPERIÊNCIAS DE PROFETAS NO ALÉM 129
GARANTIA DO SUSTENTO MATERIAL PELA SUBMISSÃO AO SENHOR. O DILÚVIO MATERIAL E O ESPIRITUAL 182
O DESENVOLVIMENTO DA TERRA. A IMIGRAÇÃO DOS MARES 222
EXPEDIÇÃO DE SETENTA MENSAGEIROS DO SALVADOR (EV. LUCAS 10) 323
CONSELHOS DO SENHOR PARA AGRÍCOLA. FORTALECIMENTO DE FÉ E CONFIANÇA PELO TREINO.
AMADURECIMENTO À RECEPTIVIDADE DAS DÁDIVAS 326
OS ANJOS. CÉU E INFERNO. A VISÃO INTERNA 329
JOSÉ NEGA SEUS PRÉSTIMOS A UM GREGO 410
S
eria ilógico admitirmos que a Bíblia fosse a cristalização de todas as Revelações. Só os que se apegam à letra e desconhecem as Suas Promessas alimentam tal compreensão. Não é Ele
sempre o Mesmo? “E a Palavra do Senhor veio a mim”, dizia o profeta. Hoje, o Senhor diz: “Quem quiser falar Comigo, que venha a Mim, e Eu lhe darei, no seu coração, a resposta.”
Qual traço luminoso, projeta-se o conhecimento da Voz Interna, e a revelação mais importante foi transmitida no idioma alemão durante os anos de 1840 a 1864 a um homem simples chamado Jacob Lorber. A Obra Principal, a coroação de todas as demais, é “O Grande Evangelho de João” em 11 volumes. São narrativas profundas de todas as Palavras de Jesus, os segredos de Sua Pessoa e sua Doutrina de Amor e de Fé! A Criação surge diante dos nossos olhos como um acontecimento relevante e metas de Evolução. Perguntas com relação à vida são esclarecidas neste Verbo Divino, de maneira clara e compreensível. AoladodaBíblia omundojamaisconheceuObraSemelhante,sendona Alemanha considerada “Obra Cultural”.
ObrasdaNova Revelação
O Grande Evangelho de João – 11 volumes A Criação de Deus – 3 volumes
A Infância de Jesus
O Menino Jesus no Templo
O Decálogo (Os Dez Mandamentos de Deus) Bispo Martim
Roberto Blum – 2 volumes A Terra e a Lua
A Mosca
Sexta-Feira da Paixão e A Caminho de Emaús Os Sete Sacramentos e Prédicas de Advertência Correspondência entre Jesus e Abgarus Explicações de Textos da Escritura Sagrada Palavras do Verbo
(incluindo: A Redenção e Epístola de Paulo à Comunidade em Laodiceia)
Mensagens do Pai
As Sete Palavras de Jesus na Cruz (incluindo: O Ressurrecto e Judas Iscariotes) Prédicas do Senhor
OGRANDEEVANGELHODEJOÃOVOL. VII
O SENHOR NO MONTE DAS OLIVEIRAS
AAURORAESUA INTERPRETAÇÃO
Todos dirigem o olhar para o Nascente e admiram a mara- vilhosa aurora. Primeiro aparecem graciosos grupos de neblina no horizonte que se tornam mais luminosos e todos afirmam não terem visto, há tempos, manhã tão radiante.
Eis que Me dirijo a eles: “Tal aurora tem grande semelhança com a manhã espiritual do homem, do aparecimento do Sol espiri- tual dos Céus em sua alma!
Ao ouvir o Verbo Divino, faz-se a aurora em sua alma. Quan- do acredita nas Palavras de Deus e tem confiança, a claridade se manifesta mais intensa: começa a sentir prazer na Doutrina e a põe em ação. As ações se tornam rosadas pelo amor, conforme acontece àquelas nuvens graciosas, dando mais expansão de luz no íntimo da criatura. Através de tal satisfação ao Bem e à Verdade, o homem alcança maior conhecimento de Deus e seu coração se inflama para com Ele, comparável à aurora resplandecente. Os conhecimentos acerca de Deus, de sua própria pessoa e a sua grande finalidade au- mentam de forma tal, como neste momento todas as zonas da Terra se tornam perceptíveis pela grande claridade.
A luz se projeta mais intensa. As nuvens mais próximas do Sol se transformam em ouro, quais ações derivantes do amor ao Pai. Finalmente se inflama o Nascente, o Sol surge no horizonte em toda glória de luz e majestade e, assim como o novo dia nasce da noite pela força luminosa do astro, também o homem renasce pelo poder do Verbo Divino, pelo crescente amor a Deus e ao próximo.
Quando o seu coração se torna verdadeira chama, seu íntimo se aclara mais e mais; a chama se transforma em labareda e o Espí- rito Divino surge qual Sol nascente, dando-se um dia perfeito no homem. Não se trata de um dia terreno que finda com a noite, e sim de um dia eterno da Vida, o completo Renascimento do Espírito Divino na alma humana.
Em verdade vos digo: a criatura que realizou tal dia em sua alma não verá nem sentirá a morte, e quando abandonar o corpo será semelhante ao prisioneiro no cárcere cujo guarda lhe abre a por- ta com expressão amável, dizendo: Ergue-te, foste perdoado e estás livre! Cobre-te com esta vestimenta de honra e caminha livremente diante de Quem te agraciou!
Igual ou talvez maior será a alegria de um renascido quando
o Meu anjo lhe disser: Irmão imortal, levanta-te de tua prisão e veste
o traje luminoso da Honra de Deus e caminha livre e independen- temente na plenitude da Vida Eterna diante do Semblante do Se- nhor, cujo Amor Imenso te faculta tamanha Graça; a partir de agora, jamais terás que suportar teu físico, pesado e perecível! — Julgais sentir a alma tristeza com a visita do Meu anjo?”
Responde o romano ao Meu lado: “Tal só seria possível às criaturas mundanas, que vivem no amor-próprio, egoísmo e na pior ignorância de Deus e de sua alma; nunca souberam de uma vida além-túmulo — e ainda que tivessem ouvido a respeito, não creem, conforme conheço muitos. Sou simples pagão, todavia acredito na vida da alma desde menino, e pelas provas obtidas tornou-se-me plena certeza.
Para pessoas sem fé e muito presas à vida material, a morte física deve ser um horror; para nós, mormente após recebida a con- vicção total acerca da alma, pelo Próprio Doador da Vida, a morte não causa pavor, caso não seja precedida de grandes sofrimentos. Ainda assim, o aparecimento do guarda a abrir a porta do cárcere deve ser bem-vindo!”
Afirmam todos: “Pensamos da mesma forma, pois quem pode- ria sentir prazer no mundo, de certo modo o inferno em plena função?”
Acrescento: “Quem ama a vida deste mundo perderá a ver- dadeira vida da alma; quem não a apreciar e dela fugir ganhá-la-á, isto é, a vida eterna da alma.
Não vos deixeis ofuscar pelo mundo e não presteis ouvidos às suas tentações; todos os seus bens são fúteis e perecíveis! Se qui- serdes ajuntar tesouros, escolhei os inatingíveis pela ferrugem e as traças! São os tesouros para o espírito, para a vida eterna e em cuja conquista tereis que aplicar todos os esforços para o Céu. Pois quem tiver muito que dê muito; quem tiver pouco dará de acordo!
Quem oferecer ao sedento simplesmente um copo d’água por amor terá sua recompensa no Além; pois quem pratica amor ao semelhante garantirá o mesmo no Céu. Não vem ao caso o quanto é dado, mas principalmente como é feito. Um doador amoroso dá duplamente, e será recompensado de modo idêntico.
Como já disse: se tiveres fartura, poderás dar muito, e fa- zendo-o com alegria e amor, terás dado duplamente. Se não tiveres grandes posses, todavia compartilhaste com teu irmão necessitado, terás dado dez vezes mais, e teu prêmio será correspondente.
O que fizerdes aos pobres em Meu Nome tereis feito a Mim. Querendo saber do Meu Agrado Pessoal, observai a fisiono- mia daquele que beneficiastes conforme expliquei, e sabereis o grau de Minha Satisfação.
Somente o que é feito pelo verdadeiro amor agrada a Deus; aplicado dentro do intelecto, pouco vale para quem recebe e menos para quem deu. É melhor dar do que receber. — Agora vamos cami- nhar um pouco e observar a zona de Bethânia! Veremos grandes ca- ravanas comerciais, porquanto começa hoje o grande mercado que durará cinco dias.”
OS MERCADORES
Em seguida nos encaminhamos ao local de onde se avista toda a zona de Bethânia e muitas estradas e ruas que dão para Jeru- salém. Estavam ali organizadas as alfândegas, cujos fiscais, na maior
parte, desde a véspera achavam-se conosco, inclusive seus emprega- dos. O escriba dirige-se a eles perguntando se não prefeririam estar lá embaixo, a fim de negociarem.
Responde um publicano: “Meu caro, perdeste por falar! Se visássemos lucro material em vez do espiritual, cada um de nós es- taria no seu lugar. Por isto não nos interessam as caravanas. Dentro em breve começarão as negociatas em vosso templo. Acaso seria do teu agrado eu te chamar a atenção para as vantagens esperadas, mor- mente o dízimo?!
A vosso critério somos publicanos e pecadores e sabemos terdes renegado o Templo, portanto foi tua pergunta mui tola. De nossa parte tomamos a firme resolução de restituirmos a todos, dez vezes mais, por amor a Jesus, de tudo o que porventura tenhamos lesado a alguém, de sorte que os comerciantes podem passar livre- mente em nossas divisas e com isto não iremos passar fome!”
A tal resposta enérgica, o escriba se cala, profundamente ad- mirado da generosidade do publicano e seus colegas. Nisto se mani- festa Lázaro: “À noite, aqueles viajores certamente virão aqui e terei que tratar de alimentos e acomodações.”
Digo Eu: “Deixa disso; enquanto Eu estiver aqui, serás provi- do de tudo e do melhor, ainda que viessem inúmeras pessoas! Obser- vemos o interessante movimento! Quantos camelos, cavalos, burros e bois estão trotando, carregados de todas as riquezas que os donos irão vender!
Lá, na estrada larga que leva da Galileia a Jerusalém, vemos carros e carroças puxadas a bois, trazendo escravos das zonas do Pontus. Trata-se de jovens de ambos os sexos entre quatorze e dezoi- to anos, de belos físicos: 120 rapazes e 170 moças. Tal venda será por nós impedida e cuidaremos da liberdade e educação desses coitados. O tráfico de escravos não pode ser efetuado dentro da cidade. Esse monte se acha fora da muralha do centro, entretanto está perto dele. Deste modo vereis como os donos das carroças irão levantar suas barracas ao pé do monte, para em seguida enviarem os vendedores para todos os cantos. Então será chegado o momento de nos apre-
sentarmos, tirando-lhes a mercadoria e fazendo-lhes um sermão em boas condições!”
Propõe Agrícola: “Senhor, não seria possível eu comprar tais escravos pela importância exigida e levá-los para Roma, a fim de dar-lhes educação, plena liberdade e cidadania romana?”
Digo Eu: “Tua ideia e vontade são boas — as Minhas serão melhores! Por que gastar dinheiro por algo que se possa adquirir sem ele?! Concordas? Proporcionar lucro a tais pessoas seria positivá-las em sua maldade; após várias experiências como essas, terão cuidado em usar de meios lucrativos dessa espécie!”
Diz Agrícola: “Existe um ponto a considerar. Segundo me pa- rece, há uma lei em Roma válida para todos os países no tocante à ven- da de escravos, pela qual nenhum pode ser introduzido nas províncias romanas sem consentimento do prefeito, autorização esta de grande valor monetário. Por isto, acontece não raro que tais mercadores con- trabandeiam os escravos, por vias secretas e falsa documentação. Se este for o caso em apreço, fácil será impedir a negociata; caso contrá- rio, só nos resta pagar a importância, pois estão sob proteção jurídica.”
Digo Eu: “Teu critério é certo. Sabes ser Eu Quem pres- creve Leis à Eternidade e ao Infinito, portanto compreenderás que não Me venha prender às leis romanas quando o contrário se torna imprescindível, muito embora não deixe de Me submeter.
Os homens que ora pretendem vender sua mercadoria são mui gananciosos, todavia supersticiosos em alto grau. Tal ignorância constitui o maior inimigo deles, e já sei o que fazer para castigá-los a ponto de não somente entregarem os escravos, como se prontifica- rão a algo mais, apenas para se salvarem. Todos vós assistireis o que podem Sabedoria e Poder Divinos.
Vamos agora nos fortificar com bom almoço; entrementes, chegarão os mercadores e nós lhes faremos uma visita!” Diz o escri- ba: “Senhor — por certo não irás visitar o Templo?! Hoje a confusão é tremenda!”
Digo Eu: “Que Me importa aquele antro de assassinos do inferno! O justo Templo de Jehovah se acha no coração de quem
ama a Deus acima de tudo e ao próximo como a si mesmo! Va- mos à mesa!”
14. A grande fartura, as baixelas de prata e os castiçais de ouro são motivo de admiração dos romanos e fariseus! Lázaro recomenda não perderem tempo, pois os peixes ficariam frios, de sorte que todos, inclusive os setenta pobres com a mulher, não se cansam de agradecer.
OSUPERSTICIOSO TANGANHÃO
Enquanto ainda sentados à mesa, um forte raio rasga o céu claro e sem nuvens, seguido pelo estrondo de um trovão. Todos se assustam e Me perguntam qual o motivo. E Eu lhes respondo: “Ve- reis em breve! O fenômeno fez a introdução para os tanganhões; pois, enquanto almoçamos, chegaram ao pé do monte e teriam des- carregado a mercadoria, não fosse o raio.
Os habitantes do Pontus setentrional possuem uma espécie de doutrina, naturalmente mui imperfeita. Está de posse de certos adivinhos que vivem isolados, são proprietários de terras e manadas, localizadas em planaltos de difícil acesso. Na maioria descendem de hindus, peritos em magias e feitiçaria, e mui raro procuram os povos das planícies; estes, todavia, têm conhecimento deles e os pro- curam para predizerem o futuro mediante grandes somas. Em tais ocasiões, os sábios dos planaltos falam de seres elevados, invisíveis e poderosos, que dominam homens e elementos, sendo os adivinhos seus servos mais achegados e senhores de elementos inferiores. Tais informações estonteiam os consulentes ignorantes, mormente quan- do assistem a alguma feitiçaria.
Esses tanganhões vêm de lá pela sétima vez, conquanto visi- tem Jerusalém pela primeira vez, pois costumam fazer negócios na Lydia, Capadócia, Tyro e Sidon. Hoje se arriscaram até aqui, e isto porque foram atraídos pela Minha Vontade.
Antes de sua partida, perguntaram ao adivinho se iriam ser bem sucedidos. E ele lhes respondeu: Caso não vejais raio, tam- pouco ouçais trovão, o sucesso será garantido. — Eles tomaram tal
resposta por bom agouro, julgando nesta época não haver trovoada. O forte raio e trovão muito os assustaram e agora não sabem que fa- zer. Antes de descermos virão mais alguns coriscos, atemorizando-os bastante e facilitando nossa tarefa!”
Diz um dos apóstolos: “Qual será seu idioma?!” Respondo: “Não é de tua conta; não há linguagem no mundo que Eu desco- nheça! Esses homens falam, na maioria, hindustani, semelhante ao hebraico original.” Eis que se seguem mais dois raios que caem na terra, sem prejuízo.
Após o terceiro, entra de repente um jovem maravilhoso na sala, curva-se diante de Mim e diz com voz melodiosa, porém firme: “Senhor, aqui estou para cumprir Tuas Ordens!”
Digo Eu: “Vens de Cirenius e Yarah?” Responde ele: “Sim, Senhor, de acordo com Tua Santa Vontade!” Nisto, os apóstolos re- conhecem Raphael e o cercam para cumprimentá-lo.
O anjo então diz: “Felizes vós, por estardes sempre juntos do Senhor, em Sua Personalidade Altíssima! Antes de pormos mãos à obra de tão grande importância, dai-me algum alimento!”
Todos se desdobram nesse sentido, pois não se cansam de admirar a formosura do arcanjo. Os romanos o consideram filho de origem terrestre de rara beleza, que Me seguira por motivo qualquer. Despertando grande admiração sua fome voraz, ele sorri, dizendo: “Meus caros, quem muito trabalha necessita alimentar-se de acordo! Não é isto?”
Diz Agrícola: “Certo! Mas dize-me quem são teus pais e onde nasceste?”
Responde Raphael: “Calma! Ficarei aqui por alguns dias e terás oportunidade de me conheceres melhor. Temos uma grande tarefa a resolver; urge, portanto, concentração de nossas forças!”
Obtempera o romano: “Jovem e lindo amigo — que pode- rás tu fazer com tuas mãos delicadas? Certamente jamais executaste trabalho pesado!”
Responde Raphael: “...pelo simples motivo de ser facílimo todo e qualquer trabalho. Terás prova disto!”
Interrompo: “Está na hora de libertarmos os prisioneiros! Vamos! Quem quiser, que fique!” Todos Me acompanham e dentro em pouco chegamos junto dos tanganhões, rodeados por grande multidão. Dou um sinal a Raphael para dispersá-la — e todos tra- tam de fugir de vários leões, que súbito aparecem entre eles!
CONVERSÃODOS TRAFICANTES
Somente após o afastamento de todos Eu Me dirijo, em com- panhia de Raphael, Agrícola e Lázaro, ao principal mercador e digo em seu idioma: “Quem vos deu direito de venderdes criaturas hu- manas qual reles mercadoria, fazendo delas escravas de um compra- dor tirânico e lascivo?”
Responde ele: “Demonstrar-te-ei direito para tal, caso pre- tendas fazer negócio; não sendo esta a intenção, farei uso do mesmo somente perante o prefeito. Também fui vendido como escravo; meu senhor, ao qual servi fielmente, deu-me liberdade e muito dinheiro. Voltei à pátria e negocio com idêntica mercadoria que se fez de mim; pois, em nosso país, nunca fomos chamados à responsabilidade, por ser costume antigo.”
Digo Eu: “Há trinta dias atrás, estiveste no planalto e ofe- receste ao adivinho cento e trinta carneiros, dez vacas e dez vitelos, e ele te disse: Serás feliz caso não vejas raio e trovão! — Julgaste a época propícia para tanto e resolveste fazer a viagem. Todavia, re- lampagueou e trovejou. Que farás?”
De olhos arregalados, ele diz: “Se fores humano igual a mim, não podes estar ciente disto! Nunca estiveste na minha pátria e, além disso, pessoa alguma conhece o local onde mora o mais célebre adi- vinho. Como podes conhecer tal segredo? Se mo informares, todos os escravos serão teus!”
Digo Eu: “Porventura não vos foi dito por ele existir um grande Deus, do Qual somente se inteirara por antigos escritos? Ca- bia aos mortais não darem importância, por ser incompreensível! Não se expressou desse modo?”
Completamente estonteado, o mercador retruca: “Repito: não és humano, e sim Deus! Como poderia reagir contra ti, cujo hálito seria capaz de me exterminar?! Sei que meu meio de vida é condenável; mas a subsistência em nosso país é difícil. Se te for pos- sível ajudar-nos, esses e mais outros escravos serão teus!”
Dirigindo-Me aos que nos circundam, digo: “Vede que exem- plo: são tanganhões da pior espécie e prontamente Me reconhece- ram! Lá em cima está o Templo que David e Salomon mandaram construir com enormes gastos em Minha Honra, e quão sensível é a diferença entre esses traficantes a venderem seres humanos, e os vendedores de almas para o inferno!
Os primeiros são verdadeiros representantes de Elias com- parados aos miseráveis assassinos de almas! Por isto terão melhor sorte Sodoma e Gomorra, do que aquela raça infernal. Se naquelas cidades tivesse sucedido o que ocorre aqui, seus moradores teriam feito penitência, tornando-se felizes. Atualmente estou Presente em Pessoa — e eles procuram matar-Me!
Vede, ao Meu lado, Meu arcanjo predileto, Raphael; há mais semelhança entre ele e esses tanganhões, do que com os sacerdotes do Templo! Este mercador já é um anjo; os lá em cima — demô- nios!” E virando-Me para ele, digo: “Amigo, quanto exiges por esses escravos?”
Responde ele: “Meu Deus, que poderia eu, fraco mortal, exigir de Ti? Tanto esses, quanto mil vezes mais eu Te dou, caso me aches com mérito de me apontares os meus defeitos!”
Digo Eu: “Então liberta-os e Eu vos darei a liberdade plena de vossas almas e a Vida Eterna!”
Retruca ele: “Está resolvido, pois é fácil se negociar com deuses. Vós outros, soltai os jovens, pois fizemos o melhor negócio. Estou certo de eles não passarem mal — e nós ganhamos a Vida Eterna. Concordais?”
Respondem eles: “Sim, Hibram; entretanto, o adivinho se enganou, pois raio e trovão nos proporcionaram a maior felicidade. Resolvamos esse assunto para voltarmos à pátria!”
Digo Eu: “De modo algum, tereis de ficar mais uns três dias sem despesas, pois serei vosso Pagador, agora e sempre!”
LIBERTAÇÃODOS ESCRAVOS
Novamente dou um aceno a Raphael para libertar os escra- vos, que no mesmo instante são soltos e vestidos, pois andavam todos nus. A sensação é enorme, e o principal mercador deles se aproxima, para averiguar o fato. Em seguida, exclama: “Agora reconheço que estais sob a proteção de deuses, aos quais deveis pedir misericórdia. Quando fordes felizes, não esqueçais dos genitores, obrigados a tra- balhar em terras áridas, vivendo em cabanas de barro e junco. Procu- rai colher conhecimentos para mais tarde, voltando à pátria, levardes aos outros e assim ninguém mais será vendido como escravo!”
Virando-se para Raphael, ele prossegue: “Jovem, de beleza excepcional! Por certo és um deus, porquanto desataste tão rapida- mente as cordas dessas criaturas todas! E onde foste buscar tantas vestes ricas?”
Responde Raphael: “Não sou Deus, mas apenas servo Dele! Por mim mesmo, nada faço; quando compenetrado pela Vontade Divina, tudo me é possível. — Dize-me, que farás com os restantes duzentos escravos, ainda não suficientemente preparados à venda?”
Diz Hibram: “Também estás ciente disso?! Que mais poderia fazer senão educá-los como filhos, e pedir-te roupas para levar-lhes?”
Diz o anjo: “Ainda é cedo; quando partires dentro de alguns dias e continuares de bons sentimentos, encontrarás tudo em ordem, inclusive para teus companheiros.” Todos agradecem a Raphael e a Mim, pois reconhecem ser Eu o Senhor. Em seguida se lembram das carroças e animais, e Hibram indaga do anjo onde acomodá-los e buscar forragem.
E Raphael diz: “Atrás dessa muralha que circunda o monte, propriedade do homem que ora palestra com o Senhor, encontrarás o necessário.” Após tudo arrumado, digo Eu: “Vamos subir o monte
e tratai de suprirdes os escravos. Isto feito poderás, Hibram, juntar-
-te a nós com teus camaradas e considerar-vos Meus hóspedes.”
Os jovens libertos são incapazes de agradecer de emoção e devido à escassez de espaço; por isto, fazem um círculo ao Meu Re- dor e pedem Minha atenção. Fito-os com simpatia e os convido a falar, e eles exclamam em uníssono: “Bom pai! Agradecemos-te pela libertação. Nada temos para recompensar-te; vamos, todavia, servir-te como se fôssemos teus pés e mãos. Continua sendo nosso pai, na bondade e no amor!” Abraçando um por um, digo: “A paz seja contigo, Meu filho, Minha filha!” Comovidos, todos vertem lágrimas, umedecendo Meus Pés e Minhas Mãos.
COMÉRCIOE USURA
Após cena tão comovedora, digo a Raphael: “Leva-os lá para cima e trata deles; em seguida, almoçaremos.” Os jovens se nutrem quais crianças alegres, enquanto ainda observamos os comerciantes a se dirigirem à cidade com mercadorias, animais e frutos. E o romano diz: “Senhor, quantos judeus! Que estranho passarem tão indiferen- tes de nossas pessoas!”
Digo Eu: “Assim como esses, muitos passarão ao largo, não Me olharão, continuando em seu mundanismo, até que a morte os atire à sepultura e sua alma ingresse no inferno. Tais comerciantes, lojistas e corretores longe estão de tudo que tenha vestígio espiritual e podem ser comparados aos parasitas nos galhos de árvores fru- tíferas e ao joio entre o trigo. Deixemo-los seguir caminho para a sepultura e a morte psíquica.”
Conjectura Agrícola: “Senhor, é preciso haver comércio entre as criaturas, do contrário a subsistência de países improdutivos seria impossível. Na Europa conheço vários, onde apenas existem rochas e montanhas, de sorte que os habitantes têm de ser supridos através do intercâmbio comercial. Admiro-me Tu o condenares, não obs- tante Tua Sabedoria Divina.”
Digo Eu: “Amigo, vais Me desculpar! Mas aquilo que sabes e entendes, Eu já o sabia antes que um Sol Central iluminasse um enxame globular! Em verdade te digo: não Me altero com as relações benéficas entre os homens, pois Eu Mesmo quero a dependência recíproca, que se enquadra na máxima ordem do amor ao próximo. Espero compreenderes não poder Eu elogiar a agiotagem inescru- pulosa! Deve o comerciante ter o lucro correspondente ao esfor- ço dispendido; nunca, porém, querer ganhar cem talentos por dez! Condeno apenas a agiotagem e não o intercâmbio necessário. Vê se o compreendes, para que não sejas tentado!” — O romano confessa seu erro e Me pede perdão.
Nisto se aproxima Lázaro e diz: “Senhor, já não havendo ser- viço a fazer, poderíamos subir o monte e a caminho desejava saber de Ti a origem desse jovem cativante. Parece não contar mais que dezesseis anos, entretanto ultrapassa Teus apóstolos!”
Digo Eu: “Acaso não se lê nas Escrituras: Em tal época vereis descer à Terra os anjos de Deus para servirem aos homens?! Deves, portanto, saber qual a descendência dele. Não faças comentários a respeito, pois os outros devem descobri-lo por si mesmos. Os após- tolos o conhecem e também não devem denunciá-lo. Vamos ficar mais algum tempo nesta estrada, pois em breve surgirá um fato que exigirá nossa presença.” Ele indaga se viria coisa desagradável, e Eu prossigo: “Meu caro, neste mundo e entre tais criaturas, nada de bom se deve aguardar. Vê, o acúmulo de comerciantes já está dimi- nuindo, e dentro em breve os servos dos fariseus trarão um pobre pecador, que há uma hora furtou um dos pães no Templo, a fim de apedrejá-lo na praça pública. Isto será por nós impedido; eis a razão por que aqui permaneceremos.”
Agrícola, que ouvira Minhas Palavras, se aproxima, dizendo: “Senhor, acaso possuem os judeus direito sobre vida e morte? Co- nheço todos os privilégios dados por Roma aos povos; nunca ouvi falar de um neste sentido. Que há de verdade nisto?”
Digo Eu: “Quando os romanos se tornaram senhores dos países judaicos, analisaram minuciosamente a religião e as leis dos
profetas, achando assistir ao Templo direito de apedrejamento de criminosos inveterados. Os sacerdotes não têm justificativa da sen- tença de morte, pois são obrigados a entregar o réu ao juiz, que por sua vez terá que lavrar a sentença dentro do fiel testemunho apresentado pelos responsáveis. Neste caso, nada disto foi feito e os sacerdotes agem por conta própria, pagando a Herodes um imposto que justifique sua ação arbitrária, com a qual praticam os piores abusos. Urge estarmos prevenidos — pois já vêm se aproximando!”
AGRÍCOLAINTERROGAUMCHEFEDO TEMPLO
Nem bem termino, aproxima-se vasto grupo arrastando o infeliz. Digo, pois, a Agrícola: “Vamos ao encontro desses esbirros, chefiados por um maioral do Templo.” E assim topamos com eles à saída do grande portão e Eu inspiro o romano para pronunciar as seguintes palavras enérgicas: “Que se passa?”
Responde o chefe do Templo: “Possuímos, como privilégio antigo dado por Moysés, o jusgladii, podendo executá-lo contra criminosos!”
Diz o romano: “Vim, como embaixador imperial de Roma, a fim de examinar vossos abusos contra os direitos romanos! Onde estão vossas credenciais jurídicas?”
Tal pergunta é de sumo desagrado do templário, que diz: “Prova tu primeiro seres embaixador romano, pois facilmente al- guém se poderia vestir como tal e querer prescrever novas leis, em nome do imperador.”
Agrícola, de pronto, tira de um estojo de ouro um rolo de per- gaminho com todas as insígnias, não deixando dúvida de sua legitimi- dade. Em seguida, diz ao judeu: “Onde está teu comprovante jurídico?”
Diz o outro: “Já te expliquei ter o Templo direito, desde Moysés, de castigar com a morte um vilipendiador do Santíssimo, privilégio sancionado por Roma, de sorte assistir-nos tal ação!”
Indaga o romano: “Acaso esse Templo já existia em épocas de Moysés?”
Responde o chefe: “Isso não; Moysés era profeta e seu espíri- to certamente sabia que Salomon, o grande e sábio rei, iria construir um templo para Deus; portanto, um ultraje contra esse e suas santas organizações é tão condenável quanto feito a Deus Mesmo!”
Inquire Agrícola: “Mas, por que teria Moysés nomeado juízes especiais para tais casos, em vez de entregá-los às mãos dos sacer- dotes? Ele apenas vos instituiu para sacerdotes, e Roma vos con- feriu igualmente jurisprudência terrena, sob condição expressa de que criminosos, mormente os condenados à morte, deveriam ser entregues ao juiz da comarca, sem vossa interferência. Jamais vos compete condenar alguém, muito menos fazer justiça pelas próprias mãos! Soltai este homem! Eu mesmo farei o interrogatório para ave- riguar se merece a morte — e ai de vós se encontrar injustiça de vossa parte!”
A esta ameaça o criminoso é solto, enquanto o chefe diz: “Eis o malvado! Todos nós somos testemunhas competentes para enfrentarmos suas negativas!”
Diz Agrícola: “Muito bem; de minha parte tenho uma tes- temunha verdadeira e declaro antecipadamente que castigarei qual- quer mentira! Muito mais severo agirei contra quem tiver formado julgamento maldoso, portanto punível!” A essas palavras do roma- no, o templário e seus asseclas começam a tremer; ele faz menção de se retirar, enquanto eles dizem: “Que temos nós a ver com isto?! O chefe que se entenda contigo, senhor! Somos apenas executo- res da sentença e dela somente sabemos o motivo principal. Como poderíamos atestar, contra ou a favor desse criminoso? Deixa-nos, portanto, seguir caminho!” Diz Agrícola: “De modo algum! Tereis de ficar por causa do chefe, que igualmente não se afastará até que eu tenha inquirido o réu!”
INSTITUIÇÕESCRIMINOSASDO TEMPLO
Com tal ordem, todos quedam no local e Agrícola diz ao chefe: “Qual é o crime de morte desse infeliz?”
Responde ele: “Ousou tocar e até mesmo comer alguns pães da proposição no Templo, fato que apenas é permitido ao sumo sa- cerdote, com preces e declamações de salmos! Foi preso em flagrante e condenado à morte pela Lei, portanto dispensa interrogatório!”
Diz Agrícola: “Realmente, que justiça louvável! Porventura as nossas leis não exigem que se analise em todos os crimes a que ponto o réu é responsável?! Se um louco cometer o pior crime que para um normal mereceria a morte, o primeiro deve ser preso como medida preventiva e, tão logo se regenere, ser solto. Caso contrário, será apro- veitado como escravo de galeras para penitenciar-se e se tornar útil.
Além disto, deve-se considerar quais as circunstâncias que não raro levam o homem a cometer um crime, atenuando-o. Há grande diferença no caso de alguém matar uma pessoa pela queda do telhado, ou se o fez premeditadamente. Entre tais extremos, existem muitas reconsiderações que um juiz consciencioso deve ponderar, pois podem atenuar ou pesar!
Se, por exemplo, condenásseis à morte um homem por uma simples acusação — que juízes infames seríeis! Não consta expres- samente em nosso código penal dever o juiz informar-se de todas as circunstâncias? Acaso agistes dentro de tais normas?”
Responde o chefe: “No Templo apenas existe a Lei Mosaica, que soa diferente!”
Protesta o romano: “Se Moysés tivesse elaborado leis confor- me são efetuadas no sinédrio, teria sido ele o mais ignorante e cruel legislador, e os romanos — verdadeiros deuses! Conheço muito bem as leis suaves do profeta, e nós formamos nossa jurisprudência den- tro de seus princípios, de sorte que, diante de Deus e de todos, sois os mais infames mentirosos!”
Diz o chefe: “Não fui eu o inventor das mesmas! Elas existem e temos que respeitá-las!”
Diz Agrícola: “Bem, os romanos saberão impedir tais abusos! Vamos ouvir a outra parte!” E virando-se para o acusado: “Fala com sinceridade, pois posso salvar-te, mas também condenar-te à morte, caso faças jus a tanto!”
O condenado se levanta e diz sem receio: “Venerável senhor e juiz! Sou tão pouco criminoso quanto tu e aqueles que te acompa- nham! Sou simples operário e sustento meus pais, enfermos e inap- tos a qualquer trabalho. Tenho uma irmã de dezessete anos, que igualmente vive às minhas expensas, pois cuida dos velhos. É muito bonita e, não obstante honesta, os templários já se cansaram para seduzi-la. Por isto, certa feita ameaçaram meus pais e a mim, pois haveriam de nos fazer mais condescendentes e humildes!
Quando no dia seguinte procurei trabalho, fui informado de que o Templo me declarara criminoso perverso, pois praticara incesto com a própria irmã! Fui enxotado e não sabia o que fazer. Por isto, procurei alguns pagãos e expus o meu caso. Deram-me umas poucas moedas para poder suprir-nos de pão. O dinhei- ro foi rapidamente gasto, de sorte que há dois dias nada havia para comermos.
Não consegui trabalho por causa dos feriados. Assim, pensei: Se como judeu impune fizeres o que fez David quando teve fome, Deus certamente não te consideraria pecador!
Por isto fui ontem ao Templo e me apossei do primeiro pão para saciar a nossa fome. Os guardas, porém, logo me descobriram e arrastaram diante dos sacerdotes; ao me reconhecerem, esbraveja- ram: Ah! Eis o mendigo orgulhoso, incestuoso e vilipendiador do Templo! Amanhã cedo deverá ser apedrejado!
Em seguida, me atiraram a um cubículo escuro; quanto ao meu transporte para cá, foste pessoalmente testemunha. Somente Jehovah sabe o que passam os meus! Eis tudo que tenho a dizer. Não me condenes como fez esse chefe do Templo. Foi precisamente ele quem quis seduzir minha irmã. Juro perante Deus e todos, e posso apontar as testemunhas necessárias!”
Revoltado com a atitude do fariseu, Agrícola diz: “Quem fala como tu dispensa comprovantes. Dentro em breve virá alguém que trará a tua família — e mais outro, indispensável para o chefe!”
À Minha Chamada interna, Raphael se apresenta e Eu lhe digo no coração: “Presta atenção às exigências do romano: sou Eu Mesmo Quem lhe insufla pensamentos, palavras e vontade.”
Ao notar a presença do arcanjo, Agrícola diz: “Sabia que não demorarias!” Responde Raphael: “Sei o que desejas, e tudo estará em ordem dentro de alguns instantes, pois as pessoas desejadas não moram longe.”
Interrompe o chefe: “Para que isto?” Diz Agrícola: “Falarás quando inquirido!”
O anjo se afasta e, rápido, traz os dois velhos e a moça, muito pobre, porém de rara beleza; além disto, seguem dez soldados ro- manos e um juiz destacado por Pilatus. Virando-se para Agrícola, o anjo diz: “Amigo, assim está bem?” Responde aquele: “Claro, pois foi este o meu desejo!” Em seguida Raphael recua, aguardando qual- quer aceno de Minha parte.
Então o romano se dirige aos três recém-vindos, perguntan- do se conhecem o maltratado. Responde a moça: “Ó Jehovah, que aconteceu ao meu pobre irmão? Foi ontem em busca de pão e não voltou. Passamos por grande aflição, pedindo que nada de mal lhe sucedesse. E agora vemo-lo em estado lastimável!”
Agrícola interrompe a jovem com amabilidade: “Deixa de indagações; teu mano está em boas mãos! Apresentar-te-ei aquele chefe do Templo e me dirás se o conheces.”
Diz ela: “Poupa-te o trabalho. Já de longe reconheci esse mi- serável!” Então o romano chama o fariseu, que havia virado as cos- tas: “Fala sem rodeios: que tens a dizer contra tal assertiva? Confessa a verdade, senão te levarei para tanto na cruz em chamas, a fim de conheceres a justiça de Roma!”
De voz trêmula, o outro diz: “Senhor plenipotenciário! Que poderia dizer? Infelizmente a situação é tal qual fora explanada pelo infeliz e mereço o castigo que quiseres aplicar-me! Se algum dia conseguir ser solto, tudo farei para a felicidade dessa família.
Duvido, porém, ficar isento de punidade; portanto, nada poderei fazer por ela!”
Diz Agrícola: “Não sou juiz como vós, na medida da pai- xão, e sim dentro do direito; no caso em apreço, declaro serem teus principais juízes esses quatro, ofendidos de modo tão desumano! A sentença deles será a minha. Quanto ao pecado desse pobre — Deus fará justiça! Ele lhe perdoando, nós também o faremos; pois nada desabona sua conduta contra Roma!”
Em seguida, Agrícola se vira para a família do réu, dizendo: “Determinai o que devo fazer a esse malfeitor! Não somente vos pre- judicou pela perseguição à vossa filha e, não conseguindo seu inten- to, difamou-a, a ponto de seu irmão não achar trabalho, assim como condenou-o à morte, por se ter apossado de um pão da proposição. Não fora este nosso Maior Benfeitor, vosso filho já estaria morto!
Vede ali os esbirros do Templo, e esse é o chefe responsável por tal delito! Conheço a Lei com referência aos pães da proposição. A pena de morte foi por Moysés instituída somente em casos de maldade e teimosia, e não na fome extrema, onde todo judeu tem direito de se saciar. Assim agiu o próprio David, que entendia me- lhor a Lei que o sumo sacerdote daqueles tempos. Com isto declaro inocente o vosso filho, e cabe-vos pronunciar a sentença do verda- deiro criminoso!”
Responde o pai do prejudicado: “Venerável juiz! Agrade- cemos a Deus, a ti e ao teu amigo por nos terdes salvo tão milagro- samente! Deus protegendo o Bem e a Justiça, igualmente pune a maldade do pecador renitente. Caso se regenere, Jehovah lhe perdoa seus erros, por maiores que fossem. Por isto, não julgo esse homem, entregando-o à Vontade de Deus, Único Juiz Competente. Eis nossa sentença quanto ao pior inimigo. Perdoamos-lhe todo mal praticado à nossa família.”
Ao ouvir as palavras do pobre velho, o chefe do Templo de- sata a chorar e diz: “Meu Deus, como são bons Teus verdadeiros filhos, e quão maldosos somos nós, raça de serpentes do inferno! Castiga-me de acordo com minha culpabilidade!”
Intervém Agrícola: “Se os que têm direito para julgar-te não o fazem, muito menos eu; mandei vir o juiz a fim de que proibisse a ti e aos demais colegas no Templo de jamais pronunciardes uma sentença de morte — do contrário, fareis jus ao castigo. Os esbirros devem receber cem chicotadas, a fim de sentirem a dor da maldade. O pelotão deve agora mesmo executar tal ordem!”
Eis que os carrascos começam a implorar e chorar. Mas Agrí- cola prossegue: “Porventura esse coitado não vos pediu misericór- dia, pois vos competia somente vigiá-lo? Como fizestes no que nem direito aparente vos assistia, nenhuma chibatada vos será poupada, mas o executor terá ordem de aplicar toda energia. Ide! Para homens de vossa espécie, não há misericórdia para Deus, nem para mim!”
Trêmulo de respeito, o chefe do Templo diz: “Senhor pode- roso! Qual será minha combinação com o juiz?”
Responde Agrícola: “Já te falei; se não o compreendeste, re- pito: irás com ele à delegacia, onde receberás ordem pela qual o Templo terá diretrizes formais diante das punições mosaicas. Qual- quer abuso será severamente castigado por Roma. Pilatus elaborará o documento, que farás notificar no sinédrio!”
Diz o chefe: “Que direi ao governador caso deseje informa- ções de tua pessoa?” Responde Agrícola: “Nada disto ele fará, pois vim há dias de Roma, e além disto me conhece e sabe o motivo de minhas inspeções nessas terras, com ordem do imperador! Podes retirar-te!”
Novamente o chefe pede a palavra: “Nobre plenipotenciário de Roma! Sou mui rico e sinto repugnância de meus tesouros! Em virtude de ter feito injustiça gritante contra essa família, desejaria
apagá-la, passando-lhe tudo que possuo. Seria possível fazer um do- cumento de doação, para evitar futuras investigações a respeito?”
Diz o romano: “Encontrarás muitas famílias merecedoras do teu amor ao próximo; esta já está provida de tudo. Age futuramente com justiça e teme a Deus, que impedirás cenas idênticas a essa. Ide!” Curvando-se com respeito, o juiz e o chefe se afastam.
Em seguida, retornamos ao nosso grupo em companhia da mencionada família, e todos estão curiosos por saber dos aconteci- mentos, inclusive Hibram e os amigos. Todavia Me dirijo a Lázaro e digo: “Amigo, antes de tudo é preciso tratar de suprir esses pobres, há dias sem alimentação. Os velhos eram mui fracos e enfermos, mas já se curaram. Este jovem forte, porém maltratado, deveria ser apedrejado, e a moça é irmã dele. Estás, pois, orientado a respeito.”
Diz Agrícola: “As despesas correrão por minha conta e tam- bém desejo que tomem parte na minha mesa. Posteriormente me acompanharão para Roma. Além disto, me responsabilizarei pelos escravos, tanto física quanto espiritualmente.”
Obsta Lázaro: “Amigo, desejava ficar com alguns; sou solteiro e poderia adotá-los!” Responde o romano: “Poderás dispor de quantos quiseres!” Satisfeitos, todos nós seguimos caminho ao monte.
AREFEIÇÃONO ALBERGUE
Quando lá chegamos, os escravos estavam bem organizados e Me recebem, exclamando: “Salve, querido e bondoso Pai! Foste tu quem nos libertou de todas as algemas. Além disto, deste-nos rou- pas novas e saciaste nossa fome e sede! Permita expressarmos nossa gratidão!” Achegando-se a Mim, abraçam-Me com todo carinho. Os apóstolos, todavia, advertem-nos não serem tão impetuosos.
Então lhes digo: “Consenti-lhes sua alegria inocente! Em ver- dade vos digo: quem não Me amar como esses filhos verdadeiros não chegará junto de Mim! Pois quem não for atraído pelo Pai (em Mim) não chegará ao Filho (a Sabedoria Divina). Estes são atraí- dos pelo Pai, por isto se sentem impelidos para Mim. Desconhecem
Quem sou, entretanto já descobriram o Pai melhor do que vós. Que Me dizeis?”
Os apóstolos silenciam e sentem não Me terem até hoje acei- to com tanto amor no coração, como esses jovens provindos das zonas frias do norte. Satisfeita a expansão amorosa, eles recuam e nós nos dirigimos a casa. A ordem à mesa é semelhante à de ontem, apenas acresce na de Agrícola o grupo da família pobre. Os trafican- tes de escravos se acomodam ao lado dos sete fariseus, e Raphael se posta ao Meu lado para qualquer emergência.
A família está com vestes mui rotas, fato que condói Lázaro. Por isto Me diz: “Senhor, em casa tenho roupas em quantidade. Não seria possível mandar-se alguém apanhar vestimenta apropriada para essa gente? Talvez também viesse Maria, minha irmã, podendo com- partilhar de nossa alegria.”
Digo Eu: “Amigo, é sempre de Meu Agrado teu zelo para com os pobres, razão pela qual convivo contigo; desta vez, Eu tra- tarei deles como fiz aos jovens. Tuas irmãs andam muito ocupadas; quando partir daqui, irei a Bethânia para Me despedir delas. Dentro em breve verás essa família em vestes romanas. Antes, porém, deve fortificar-se. Estás satisfeito?”
Responde Lázaro: “Perfeitamente, Senhor; tudo que ordenas é bom e justo!” Em seguida, todos se entregam à refeição e os pró- prios traficantes não se cansam em elogiar o bom paladar. E um fa- riseu aparteia: “É isto mesmo, na casa paterna muitas vezes os filhos mal-educados vivem melhor que no estrangeiro.”
Indaga Hibram: “Como entendê-lo?” Responde ele: “Ora, eis aí o Pai eternamente verdadeiro entre nós, Seus filhos perverti- dos! Os que Dele se aproximam, reconhecem e amam são os melho- res. Ele sempre cuida deles pela Sabedoria e Onipotência, a ponto de passarem bem já na Terra, e ainda melhor no Além, no Reino dos espíritos. Compreendes?”
Diz Hibram: “Sim, e falaste certo. Mas aquele Homem é Deus e demasiado Sublime para ser Pai das criaturas maldosas! Acho tal ideia até um ultraje!”
Aduz o outro: “Não estás de todo errado. Ele, todavia, nos ensina isto e até mesmo ameaça todos que não acreditam, excluin- do-os da Vida Eterna, e demonstra ser Ele unicamente Criador e Pai de todas as criaturas; assim temos que crer, mas também aplicar a Sua Santa Vontade, para nos tornarmos dignos de Sua Filiação.”
Este bom ensinamento satisfaz os traficantes, que prosse- guem na palestra com os fariseus, à medida das possibilidades de seu idioma. Um deles, conhecendo o hebraico original, facilita a troca de ideias, porquanto tal idioma é usado pelos habitantes do norte da Índia.
AGRÍCOLAAPONTAO SENHOR
Nas demais mesas reina silêncio, pois todos esperam que Me expresse. Como nada falo, os romanos procuram contato com a fa- mília de pobres e Agrícola pergunta à atraente moça se eles todos não tinham melhores vestes. E ela responde: “Nobre senhor, possuo em nossa cabana uma túnica de lã; entretanto, é pior que esta de linho. Nossa situação não era tão precária quando meus pais ainda gozavam saúde e podiam trabalhar. Sua moléstia se agravou desde alguns anos e a miséria bateu à nossa porta. Meu mano não conse- guia o suficiente para compras de emergência, de sorte que teríamos morrido de inanição se não fosse nosso salvamento por parte da- quele amigo. Ainda não compreendo como o tal jovem conseguiu descobrir nossa choupana; parecia ambientado em todos os recantos da cidade. Não me poderias informar quem são aquele homem sim- pático e o moço tão atraente?”
Responde Agrícola: “Jovem e bela filha de Zion! Isto não de- pende de mim. Por certo sou algo importante no império romano, entretanto uma nulidade perto daqueles dois! Se eu hoje mandasse um mensageiro credenciado à capital, o imperador prontamente en- viaria uma legião de soldados, prontos a invadirem a Ásia. Mas que representa isto perto do Poder Infinito daquele Personagem? Basta querer — e Sua Vontade é realizada! Podes assimilar isto?
Conforme dizias, teus pais andavam enfermos durante dois anos. A simples Vontade Dele os curou num instante e também sou- be indicar ao jovem vossa morada. Além disto, Ele há três horas atrás revelou o que sucederia ao teu irmão, possibilitando-me vos salvar pela Sua Graça — e assim fui simples instrumento do Seu Amor.
Já deves ter notado lá fora o grande número de jovens. Deve- riam ser vendidos. Eis que Ele entrou em cena, libertou-os de mo- mento e vestiu-os tão rápido, de sorte a chamarem-No de Pai! Por isto deveis dirigir a atenção à Sua Pessoa; pois jamais alguém sonhou o que consegue a Sua Vontade. Eis a plena verdade.”
Responde a família: “Em tal caso deve ser ele profeta. Os judeus aguardam o Messias, Poderoso na Palavra e Ação. Antes da Vinda Dele, virá o grande profeta Elias e, segundo parecer de mui- tos, também seu discípulo Eliseu!”
Opina Agrícola: “Não estou bem informado neste ponto; sei efetivamente da Vinda do Messias, razão que me trouxe aqui. Por- ventura nada ouvistes a respeito do célebre Salvador de Nazareth?”
Diz o velho: “Venerável senhor, operários como nós vão, se muito, dez vezes por ano ao Templo. Lá depositamos nosso óbolo e assistimos um sermão, incompreensível. Mesmo havendo novidades extraordinárias, não chegam até nossa cabana.
Além do mais, estivemos acamados por muito tempo. Nosso filho trabalhava, inclusive aos sábados, pois os pagãos não conside- ram tal dia feriado. Por aí vês que uma família pobre, muito embora vivendo na metrópole, pouco chega a saber de fatos excepcionais. Há um ano atrás soubemos que um profeta chamado João pregava no deserto, dizendo algumas verdades aos fariseus. Talvez seja aquele homem o referido profeta?”
Diz Agrícola: “Não é bem isto; ainda assim tereis oportuni- dade para conhecê-Lo de perto. Para tanto é preciso fortificar-vos primeiro.”
Nisto, vira-se a moça para o romano: “Senhor, essas baixelas são realmente de ouro e prata? Por certo as mandaste transportar de Roma, o que deveria ter custado uma fortuna.”
Responde Agrícola: “Oh, sim, seria tanto quanto bastaria para se comprar ouro e prata, e deles fundir tais travessas. Todavia, nada me custaram, tampouco para Aquele que as criou milagrosa- mente, pois nada Lhe é impossível.”
Diz ela: “Acaso Jehovah esteve aqui ou mandou um anjo para tal fim? Tais fatos surgem sempre no povo judeu.”
Concorda o romano: “Sim, minha filha! Deus esteve aqui e ainda Se encontra em nosso meio e Se dá a conhecer àqueles que O amam! Se encheres o teu coração de amor, Ele Se manifestará para vós. Acreditas?”
Diz ela, radiante de emoção: “Deus é Espírito e jamais po- deria ser visto por alguém.” Aduz Agrícola: “Tens razão; todavia, consta nos profetas que Ele Mesmo tomaria carne e palmilharia qual Homem entre os homens, ensinando-lhes os justos caminhos da Vida. Deste modo pode o homem justo ver e ouvir Deus, sem perder sua existência; assim como conquistar a Vida Eterna da alma, impedindo que venha a ver e sentir a morte. Agrada-te isto?”
Diz a bela judia: “Como não? Todavia, não merecemos ta- manha Graça! De há muito não consideramos o sábado, portanto fazemos parte dos pecadores, e além disto não nos podíamos purifi- car pela falta de recursos. Assim Deus, caso venha junto das criatu- ras, não nos olhará. Achegou-Se de Abraham, Isaac e Jacob, homens sumamente beatos. Mas, nós?! Poderei amá-Lo acima de tudo; Sua Sublimidade não permite aceitar o amor de um pecador!”
Nisto digo do outro lado da mesa: “Minha filha, Deus não condena os pecados de criaturas de tua espécie, mas considera uni- camente os corações. Quem realmente ama Deus será remido de seus pecados, ainda que fossem em número idêntico à erva na terra e à areia do mar. Teus erros consistem apenas na imaginação. Para Deus, é um horror tudo o que no mundo é considerado grande; tu és pequenina, portanto não és um horror para Ele. Procure amá-Lo com todas as forças de tua alma, que Ele fará o mesmo contigo, dando-te a Vida Eterna! Compreendes?” Diz ela: “Sim; leva-me, pois, junto Dele para vê-Lo e amá-Lo!”
Nisto, os empregados de Lázaro entram na sala informan- do que, no momento, grande número de pessoas está subindo o monte. O primeiro se vira para Mim e diz: “Senhor, que farei? Con- fio em Ti!”
Digo Eu: “Quantas costumam vir, de modo geral?” Respon- de ele: “No ano passado foram cerca de setecentas pessoas; hoje a aglomeração será evidentemente maior.”
Digo Eu: “Muito bem, acompanha Raphael, que dará provi- dências para acomodar lá fora os que estão chegando. Manda entrar os jovens na sala pequena, para não serem expostos à curiosidade indiscreta dos estranhos.” Após isto feito, o anjo indaga de Lázaro se tem mesas e bancos suficientes. E ele retruca: “Eis a dificuldade! Em Bethânia os tenho de sobra, mas não será possível transportá-los, sem mais nem menos!”
Diz Raphael: “Não te incomodes! Como amas ao Senhor acima de tudo e Nele confias, serás ajudado. Em Nome Dele sou bom carpinteiro e marceneiro e será fácil arrumar o necessário!” Nem bem termina de falar, vê-se quantidade de bancos e mesas, e cada uma coberta de lona, dando aspecto agradável. Entrementes, se aproximam os novos hóspedes perguntando se há acolhimento, e Lázaro afirma que os empregados haveriam de satisfazer a todos.
Vira-se Raphael para ele: “Terás empregados suficientes para tanta gente?” Responde ele: “Presumo que sim, mas terão muito que fazer!” Propõe o anjo: “Bem, se houver dificuldades, ajudar-lhes-ei!”
Diz Lázaro: “Adorável mensageiro de Deus, o que acabaste de fazer em Nome do Senhor é verdadeiro milagre; mas já não me admiro de coisa alguma, pois conheço o Senhor e fui testemunha de milagres grandiosos!”
Aduz Raphael: “Tudo que vês, sentes e pensas ainda é milagre Dele, e todas as criaturas representam Obra Dele. Dentro da Sabe- doria e Onipotência de Deus, tanto faz criar um raio que se projeta
ao solo ou um Sol que ilumina a Terra durante bilhões de anos, portanto tens razão de não te impressionares tanto com o atual mila- gre. Além do mais, tal não seria prudente em virtude dos estranhos. Trata agora de servi-los, do contrário reclamarão.”
Opina Lázaro: “É mesmo, mas como começaremos?”
Diz Raphael: “Ora, ajudaremos aos teus empregados, senão o serviço levará tempo!” O anjo se afasta por alguns instantes, du- rante os quais todas as mesas são supridas de vinho, pão, sal e pratos saborosos.
Alguns dos recém-vindos estranham o fato; julgam, porém, não terem prestado grande atenção durante a palestra; apenas se ad- miram da boa qualidade do vinho, a ponto de alguns se dirigirem a Lázaro para saber da procedência e se é possível adquirir quanti- dade maior.
Lázaro responde: “Este vinho recebi simplesmente pela Graça de Deus. Podeis tomá-lo à vontade, todavia não está à venda!” Muito embora assim informados, os interessados não se afastam; pelo contrário, outros tantos se aproximam do grupo, de sorte que Lázaro se aflige e diz a Raphael: “Caro amigo, pleno da Salvação de Deus, se isto continuar, as acomodações serão deficientes!” Diz o anjo: “Neste caso, arranjaremos mais algumas.” Imediatamente se veem mais bancos e mesas cobertas; entretanto, nenhuma das centenas de pessoas percebe como apareceram; os hóspedes chegam e são servidos.
Quando, após algumas horas, todos foram devidamente su- pridos, incluindo os que noutros anos costumavam almoçar neste albergue, Lázaro se vira para Raphael: “Dize-me como pudeste efe- tuá-lo, de momento? Não menciono as acomodações! Onde foste buscar louças, vinho, sal, os pratos diversos, de sorte que tanto o persa quanto o grego etc. encontraram o seu prato nacional?”
Responde o anjo: “Caro amigo, ainda que te explicasse mi- nuciosamente tal possibilidade, pouco ou mesmo nada entenderias; por enquanto apenas posso dizer-te que para Deus todas as coisas são possíveis.”
(Raphael): “Eu, por mim, sou tão incapaz de algo fazer como tu; sou puro espírito e tenho um corpo somente concatenado dos elementos do ar. Como espírito, posso me tornar pleno da Vontade de Deus e assim agir como Ele Mesmo. Em tal caso, tenho apenas a Vontade do Senhor e jamais poderia fazer outra coisa, senão o que Ele quiser. Aquilo que Deus quer — se torna evidência!
Tudo que existe nos planetas, incluindo-os, é igualmente milagre da Vontade do Senhor; apenas há por parte de Deus cer- ta consideração quanto à necessária evolução gradativa, em virtude da formação intelectual dos seres, de sorte que um surge do outro. Ainda que o Senhor assim não fizesse, poderia criar igualmente um mundo, através de Sua Onipotência, do mesmo modo com que faz surgir um raio!
Na atmosfera telúrica se encontram todas as substâncias do planeta em estado dissolvido. Não consegues percebê-las com os sentidos físicos; para um espírito perfeito é tão fácil, como tu apa- nhares uma pedra, percebendo prontamente não se tratar de um peixe ou de um pedaço de pão. Assim é fácil ao espírito concate- nar do ar elementos necessários para qualquer objeto e apresentá-lo num instante naquilo que teria chegado paulatinamente.
O fato em si é algo incompreensível, enquanto o homem não tiver renascido em espírito. Ainda assim, dar-te-ei um exemplo em a Natureza. Vê, em todos os gérmens vegetais reside, num tênue invólucro, uma inteligência individual em forma de fagulha imper- ceptível à tua visão. Tal fagulha é a própria vida original do gérmen e posterior vegetal. Calcula as inúmeras plantas e árvores, todas porta- doras de gérmens variados, em cujos invólucros habitam elementos inteligenciados de toda espécie.
No momento em que deitares no solo várias sementes, elas são amolecidas pela tepidez e a umidade do ar, absorvidas pelo solo, e a fagulha espiritual se torna ativa e percebe os elementos que a cir- cundam; começa a atraí-los pela própria vontade, desenvolve forma
e fruto daquele vegetal, para o qual Deus lhe facultou inteligência apropriada e vontade correspondente.
Acaso poderias descobrir os elementos afins do ar que envol- vem a semente através do teu intelecto, sentido e vontade? Certo que não; pois tu mesmo te alimentas e não tens ideia da maneira pela qual teu espírito — até então completamente desconhecido, habitando no coração de tua alma como Vontade e Amor de Deus
— extrai, através de sua inteligência e vontade, os elementos da ali- mentação indispensáveis à formação de teus órgãos diversos, a fim de atraí-los onde são precisos.
Se meditares a respeito, encontrarás em toda parte os mesmos milagres que operei momentaneamente pela Vontade do Senhor, por ser eu espírito puro, enquanto um imperfeito somente o pode- ria pouco a pouco, dentro de sua inteligência e vontade limitadas.”
O TRABALHO DOS ESPÍRITOS DA NATUREZA NA FORMAÇÃO DOS METAIS
(Raphael): “Tu, certamente, não percebes a matéria de que consiste o ouro puro, flutuando no ar; eu o vejo e posso diferen- ciá-lo dos demais elementos. Sendo-me igualmente possível esten- der em todas as direções minha vontade, à medida da capacidade perceptível ao espírito — posso concentrar, num montão visível, os elementos contidos no ar; poderia também ajuntá-los numa for- ma qualquer, por exemplo, numa taça. O ouro empregado seria tão natural, quanto aquele encontrado pelos homens nas minas, que o purificam, fundem e, em seguida, confeccionam objetos preciosos.
Determinados espíritos da Natureza dentro das montanhas, mais afins com os elementos livres do ouro contidos no ar, atraem-
-nos, devido à sua inteligência e força de vontade diminutas, duran- te séculos, até surgir quantidade de ouro.
O fato de ser lento o acumular do ouro na Natureza se baseia na reduzida capacidade de inteligência e força de tais elementos, durante seu estado de prisão indispensável.
Eu — como espírito elevadíssimo e perfeito, dotado das maiores potências inteligenciadas, sem número e limite, e igualmen- te da plenitude do Poder da Vontade de Deus — posso efetuar, num instante, aquilo que os espíritos da Natureza de capacidade reduzida só conseguem pouco a pouco.
Presta atenção como ajo em tal ocasião! Fá-lo-ei devagar, para poderes perceber como o ouro se concatena na palma de tua mão. Assim o quero — e já notas um leve vestígio na mesma! Observa com atenção como se acumula e agora vês uma considerável lâmina. Nela se forma uma beira bem feita que cresce constantemente; em poucos instantes terás um cântaro de ouro pelo poder de um espírito perfeito. Poderás guardá-lo para teu uso, ou então mandar modifi- cá-lo por um ourives.
Viste, portanto, como operei um milagre de modo lento! Es- tende a outra mão e darei prova de um instantâneo! Assim o quero
— e já tens igual vasilha na mão esquerda!
Meu poder interno foi causador destes, como dos outros mi- lagres que operei para os hóspedes. Não deves, por isso, gratificar-
-lhes a refeição; tratam-se de comerciantes ricos e podem pagar sua despesa. Deixa que teus empregados façam a cobrança, pois dentro em breve irão às barracas para atrair por gritos os compradores!”
Lázaro dá ordem de exigirem apenas uma moeda. Os hóspe- des pagam com prazer e agradecem pelo bom trato, pedindo licença de voltar. Após seu afastamento, os servos fazem menção de tirar as mesas. Raphael lhes indica pouparem o trabalho; pois se à noite os estrangeiros voltassem, ninguém precisaria preocupar-se com eles, bastaria fazer cobrança. E assim foi: nos dois dias seguintes todos fo- ram servidos, sem que Lázaro tivesse gasto algo do seu provimento.
ELEMENTOSBÁSICOSNA CRIAÇÃO
Após todos se terem afastado, Lázaro se dirige a Raphael: “Afirmaste há pouco existir no ar enorme quantidade de substân- cias e elementos básicos, que pela sabedoria e vontade de um espí-
rito perfeito, por ele são descobertos e atraídos a um corpo sólido. Através do exemplo, a questão se tornou compreensível. Todavia, deparou-se-me um ponto importante! Onde se originam tais ele- mentos? De que forma surgem na atmosfera telúrica e talvez em nú- mero ainda maior na esfera de outros mundos, demonstrados pelo Senhor a mim e a outros discípulos?”
Diz Raphael: “Ora, como ainda não o assimilaste?! Acaso exis- te algo fora de Deus que Nele não tivesse origem?! Porventura não é tudo que preenche o Espaço Infinito, desde Eternidades, apenas a projeção de Seus Pensamentos, Ideias, Sua Sabedoria e Vontade?!
Justamente Seus Pensamentos na projeção inesgotável de uma Eternidade a outra são as substâncias primitivas e os elemen- tos básicos dos quais tudo consiste na Terra e nos Céus, através do Poder Íntegro e Eterno da Vontade Divina. Não há pensamento e ideia que até mesmo em Deus poderiam surgir e existir sem a Von- tade Dele. Pelo fato de todo Pensamento e Ideia surgirem de Sua Vontade e também conterem, como inteligência isolada, a parte cor- respondente da Vontade Divina — nenhum Pensamento ou Ideia mais grandiosa poderão jamais ter um fim, assim como Deus Mes- mo, porquanto nada pode desaparecer da Esfera Luminosa de Sua Consciência. Sendo, pois, inteiramente impossível Deus esquecer um Pensamento ou uma Ideia, todos, por menores que sejam, são eternamente indestrutíveis em sua consistência básica!
Como, além disto — conforme afirmei — todos os Pensa- mentos e Ideias de Deus comportam a Vontade Divina, pois sem ela jamais poderiam ser elaborados, podem, isolados ou unificados, desenvolver sua espécie e esfera e, como tal, multiplicar-se até o In- finito e, através de ligações inteligenciadas com outros elementos e substâncias básicos, tornarem-se mais evoluídos e perfeitos.
Deste modo é um Sol, no início, simples éter luminoso ou a concatenação de inúmeros Pensamentos e Ideias de Deus, em virtude da parte integrante da Vontade Divina. Através dela, eles atraem constantemente seus afins do Espaço infinito, de sorte que o anterior éter luminoso se condensa e, pouco a pouco, alcança a
consistência do ar telúrico. Este processo continua até surgir água; no decorrer dos tempos ela se solidifica apresentando lama, barro e pedras, portanto solo mais firme.
As substâncias e elementos anteriormente espirituais e ora mais solidamente unificados começam a se sentir oprimidos; por isto se põem em atividade para libertar-se, o que redunda no incen- diar das partes mais consistentes de tal corpo cósmico. Através des- se ímpeto furioso dos elementos oprimidos, as zonas atingidas são dilaceradas, a às vezes o interior se exterioriza e vice-versa. Somente após muitas lutas semelhantes o planeta atinge ordem equilibrada, e os Pensamentos e Ideias primitivos de Deus encontram outros ca- minhos para se libertarem da grande pressão.
Eis que surgem flora e fauna até o aparecimento do homem, no qual muitos Pensamentos e Ideias de Deus alcançam plena li- bertação do julgamento remoto. Só então reconhecem Deus como Base de todo ser e vida, retornando a Ele como seres independentes e livres — isto é, caso tenham vivido dentro da Vontade Dele.
Existe, porém, em tal retorno puramente livre e espiritual dos inúmeros e variados corpos cósmicos, variações idênticas à sua cons- trução física. O mais perfeito retorno a Deus só é possível nesta Terra, porque aqui cada criatura pode se tornar semelhante a Deus na alma e no espírito. Quem se esforçar chegará a Deus. Compreendeste?”
Responde Lázaro: “Sim, pois em relação à constelação cós- mica possuo conhecimentos importantes dados pelo Senhor; ainda assim, perduram muitos problemas e perguntas.”
Diz Raphael: “Oh, meu caro, tal acontece até comigo! Em Deus se ocultam problemas infinitos, dos quais nós, os espíritos mais elevados e puros, nada sabemos; pois Ele tem para os espíritos puros e bons um tesouro eterno, a ponto de poder surpreendê-los com criações jamais imaginadas, surgidas do Seu Amor e Sabedoria, aumentando a felicidade deles. Por isso, poderia acontecer tu me perguntares algo impossível eu te esclarecer.”
Insiste Lázaro: “Não duvido; no entanto, poderás fazê-lo em se tratando de dúvidas provindas do meu intelecto. Li certa vez
um antigo livro chamado ‘Guerras de Jehovah’, no qual se fala de modo místico da queda dos arcanjos!
No início, teria Deus — naturalmente em épocas remotas
— criado sete espíritos correspondentes aos de Deus, dando-lhes poder e sabedoria, pelos quais poderiam igualmente criar inúmeros espíritos mais simples, porém semelhantes a eles, e assim o Espaço Eterno se encheu de incontáveis falanges.
O maior e mais poderoso foi Lúcifer. Vangloriou-se de seu poder e força, não querendo semelhar-se a Deus, mas sim estar acima Dele e dominá-Lo. Deus irou-Se e o expulsou ao eterno julgamen- to. Os seis restantes grandes espíritos e suas criações permaneceram com Deus, servindo-O de eternidades em eternidades, enquanto os súditos de Lúcifer ardem quais infames demônios, em companhia dele, no fogo eterno da Ira Divina, sofrendo atrozes padecimentos, sem alívio qualquer. Que dizes a isso como próprio arcanjo?”
OSSETEESPÍRITOSORIGINAISDE DEUS
Diz Raphael: “É apenas um quadro correspondente àquilo que te esclareci da criação e sucessiva formação de um corpo cósmi- co. Os grandes espíritos originais são justamente os Pensamentos em Deus e as Ideias subsequentes.
No místico número sete se baseia a Perfeição Divina em cada Pensamento elaborado e em cada Ideia fixada e projetada.
A causa primária em Deus é o Amor. Acha-se em todas as coisas, pois sem ele, nada seria possível.
O segundo espírito é a Sabedoria, como Luz surgida do Amor. Encontrá-la-ás na forma de todos os seres; pois quanto mais acessível à Luz, tanto mais desenvolvida, perfeita e bela será a forma.
O terceiro, provindo de Amor e Sabedoria, é a Vontade Ativa de Deus (Onipotência). Por ela, os seres imaginados recebem reali- dade, do contrário todos os Pensamentos e Ideias de Deus seriam como os do homem, jamais postos em ação.
O quarto, como emanação dos três, é a Ordem. Sem ela, ser algum teria forma constante, nem determinada finalidade. Se, por exemplo, fosses emparelhar um boi no arado e ele mudasse de forma
— atingirias alguma finalidade? Que benefício teria o fruto que em tua boca se transformasse em pedra? Ao caminhares pela estrada, se ela se tornasse água — que utilidade teria? Tudo isto é impedido pela Ordem Divina, como quarto Espírito de Deus.
O quinto chama-se Rigor, sem o qual não seria possível a consistência de coisa alguma, porque é semelhante à eterna Verdade em Deus, dando a todos os seres estabilidade real, poder de procria- ção, germinação e aperfeiçoamento final. Sem tal espírito em Deus, a situação de todos os seres seria insustentável: seriam visíveis quais fantasmagorias que dão impressão de existirem; dentro em breve se modificam as condições que lhe deram origem e as formações mara- vilhosas e belas se desvanecem.
Prossigamos: onde existem Amor e Sabedoria, elevadíssimos, Onipotência, Ordem perfeita e Rigor imutável, forçosamente se apre- senta a Paciência mais perfeita e jamais atingível; pois sem ela, tudo se precipitaria, passando à pior confusão dos sábios da antiguidade.
Se um engenheiro pretende construir um edifício, não pode prescindir da paciência, além de outras qualidades; esta lhe faltando, jamais terminará a construção.
Afirmo-te: se Deus não tivesse este espírito, de há muito não mais haveria Sol para iluminar a Terra, e o mundo dos espíritos teria aspecto estranho. A Paciência é Mãe da Misericórdia, eterna e imutável de Deus, e caso não existisse — onde e o que seriam todos os seres em face de Deus Onipotente?
Se, pois, falirmos e nos expusermos deste modo à maldição aniquiladora de Amor, Sabedoria, Onipotência, seguidos pelo Rigor em virtude da Ordem precedida, infringimos a divina Paciência que, todavia, no devido tempo, tudo leva ao equilíbrio; sem ela, todos os seres, por mais perfeitos que fossem, estariam sujeitos à eterna condenação.
12. A Paciência Divina poderia, em conjunto com os cinco es- píritos precedentes, criar inúmeras criaturas nos planetas e conservá-
-las constantemente; teriam, porém, que viver épocas infinitas num corpo pesado, sem poderem cogitar da final libertação da alma dos laços da matéria. Além disto, a procriação e germinação não teriam fim, e no final, estabeleceriam tamanho acúmulo a impossibilitar uma se desviar da outra. Subentende-se, no caso, que um corpo cós- mico amadurecesse pela Paciência Divina, a ponto de manter flora, fauna e seres humanos. A Criação de um planeta apenas com ajuda dos seis espíritos seria muitíssimo lenta e até mesmo duvidosa.
Mas, como já disse, é a Paciência Mãe da Misericórdia Di- vina, o sétimo espírito, que igualmente chamaremos de Brandura. Ela tudo ajusta: organiza os espíritos precedentes e efetua a matura- ção oportuna de um corpo cósmico, bem como dos seus habitantes. Fixa para tudo determinada época, e os espíritos evoluídos podem aguardar seguramente sua libertação, para ingressarem na emanci- pação completa.
Justamente o sétimo espírito fez com que Deus Mesmo en- carnasse, a fim de libertar todos os espíritos algemados ao julgamen- to necessário da matéria no mais breve tempo, de sorte que se pode classificar Sua Obra — a Salvação — a Reformação dos Céus e dos mundos, portanto a Maior Obra de Deus, porque nela agem os sete espíritos perfeitamente uníssonos, fato anteriormente impossível em virtude do espírito da Ordem em Deus. Pois anteriormente, este espírito somente colaborava com os demais na realização dos Pensa- mentos e Ideias de Deus; de agora em diante age mais poderosamen- te e a consequência disto será a completa Salvação.
Eis os sete Espíritos Divinos, e toda a Criação deles cor- responde às Sete Tendências Individuais do Criador. Sua Projeção eterna e constante é justamente o que os sábios da antiguidade cha- mavam de ‘Guerras de Jehovah’!”
(Raphael): “A luta constante dos sete Espíritos ou Virtudes de Deus, pela simples razão de um estimular outro à ação — tam- bém se apresenta mais ou menos em todas as criaturas.
O Amor em si é cego, o seu empenho se concretiza em atrair tudo ao seu redor. Nesta inclinação, o Amor se inflama, fazendo-se Luz, compreensão e conhecimento dentro dele. Não percebes como a luz se debate contra a aspiração isolada do puro amor, levando-o à ordem e reflexão?!
Dessa luta, ou guerra, desperta igualmente a Vontade como braço ativo do amor e de sua luz, pondo em ação aquilo que por ela fora sabiamente organizado.
Eis que se manifesta a Ordem através do conhecimento do amor pela luz e sua força, a ponto que a ordem combate a desordem pela luz e a vontade do amor, dando-se a eterna Guerra de Jehovah, tanto Nele quanto nas criaturas.
Tudo isso faria o equilíbrio, caso fosse possível garantir que aquilo posto em ação pelos quatro espíritos já tivesse estabilidade. Todas as suas obras, porém, tão maravilhosas, semelham-se às dis- trações de crianças, que com imensa alegria realizam seus trabalhos, entretanto dentro em breve não sentem mais prazer, destruindo-os com afinco maior do que aquele empregado na realização. Em tal caso, a estabilidade da criação seria problemática!
A fim de evitar essa possibilidade, surge dos quatro espíritos, em virtude da enorme satisfação com o resultado final das obras, o Rigor, como quinto Espírito em Deus e em Suas criaturas, lutando permanentemente contra a destruição e o aniquilamento das obras, assim como um homem compreensivo, após ter construído casa e vinha, tudo fará para mantê-las e não procurará sua destruição. Eis outra Guerra de Jehovah!
A casa, no entanto, apresenta com o tempo certos defeitos e a vinha custa a dar a colheita esperada, de sorte que o construtor se arrepende do trabalho e rigor dispendidos, e deseja destruir tudo e
iniciar outra obra. Então surge o sexto espírito, chamado Paciência, que conserva casa e vinha! Eis outra Guerra de Jehovah!
Ela, muito embora ligada aos demais espíritos, não empreen- deria especiais melhoramentos, deixando tudo correr conforme está; eis que se apresenta o sétimo espírito, a Misericórdia, que contém meiguice, dedicação, diligência, ação amorosa e generosidade. A criatura começa a restaurar sua casa, até desaparecerem os menores defeitos, lavra e estruma a vinha, de sorte a lhe dar em breve farta colheita. Tens aí outra luta, ou Guerra de Jehovah, no homem, em Deus e no anjo!
Assim, é a Vida verdadeira e perfeita em Deus, no anjo e na criatura luta constante dos sete espíritos. Ela, todavia, tanto em Deus quanto no anjo, não é tendência de domínio ou desautoriza- ção dos outros espíritos, e sim colaboração com os demais, à medida de seu poder e força, a ponto de cada qual se achar dentro do outro. Deste modo, está o Amor em todos os demais espíritos, a Luz ou a Sabedoria dentro do Amor e nos cinco subsequentes, até que todos estejam em equilíbrio recíproco, numa atividade constante.”
DESARMONIADOSSETEESPÍRITOSNO HOMEM
(Raphael): “A mesma situação deveria existir no homem; mas infelizmente não se dá. Se bem que lhe seja dada capacidade para tanto, ela jamais foi plenamente exercitada e desenvolvida. São pou- cos os que conseguem levar os sete espíritos à atividade completa para se tornarem idênticos a Deus e aos anjos; outros se desviam, pouca importância lhes ligam, não descobrindo o verdadeiro segre- do da Vida em si. Tais criaturas cegas e semimortas não podem per- ceber a finalidade da Vida dentro delas, porque se deixam apenas conduzir por um ou outro dos sete espíritos.
Deste modo, um só vive no espírito do amor e não toma conhecimento dos outros. Que mais poderia ser tal criatura, senão uma fera voraz e insaciável?! Manifesta amor-próprio, inveja, avareza e inclemência para com o próximo.
Outras há dotadas de amor esclarecido, portanto são sábias e podem transmitir boas noções; sua vontade, porém, é fraca, não podendo concluir uma obra.
Existem aqueles cujos espíritos de amor, conhecimento e vontade estão em plena ação; todavia, são fracos os da ordem e do rigor. Tal categoria se torna inteligente, fala com inspiração e até mesmo consegue realizar coisas isoladas; quem, entretanto, for sábio pelos sete espíritos em breve reconhecerá, pelas palavras e ações, não estarem em conexão com a ordem.
Outros, donos de amor, conhecimento, vontade e ordem, carecem do espírito do rigor; por isto, são receosos e medrosos e raramente conseguem dar efeito final às suas obras.
Ainda outros, possuem rigor e coragem; sua paciência, no entanto, é fraca. Tais criaturas geralmente são precipitadas e estra- gam muito mais com seu zelo impaciente, do que jamais seriam capazes de refazer. Meu amigo, nada existe sem justa paciência, e quem não a tiver pronunciará sua própria condenação de morte! É preciso o homem esperar que a uva amadureça completamente caso pretenda colhê-la. Não estando disposto para tanto, será culpado se recolher vinagre intolerável em vez de vinho especial.
É, pois, a paciência em tudo uma tendência imprescindível: primeiro, à conquista e reajuste do espírito do rigor, muitas vezes inclinado a se perder no Infinito — pois ele, em união com amor, sabedoria e vontade se desvirtua no pior orgulho, comumente ili- mitado. Segundo, por ser a paciência, como já demonstrei, mãe da misericórdia, espírito este que, pela ação retroativa, proporciona aos precedentes a perfeição divina, ajudando a alma ao renascimento verdadeiro e completo.
Eis por que o Próprio Senhor recomenda a todos o amor a Deus e ao próximo, acrescentando: Sede misericordiosos como vos- so Pai no Céu; meigos e humildes de coração, como Eu!
O Senhor incita os homens a desenvolverem o sétimo espírito, pelo fato de nele se encontrarem os precedentes para serem aperfeiço- ados. Quem, pois, desenvolver e fortificar este último fá-lo-á com os
primeiros, alcançando mais rapidamente seu aperfeiçoamento. Quem começar sua evolução com um ou outro espírito dificilmente ou de modo algum chegará à perfeição vital, por não conterem em si, isola- damente, o sétimo espírito, enquanto ele abarca a todos.
Nisto se baseia a constante queda dos anjos, ou dos Pensa- mentos em Deus, que também poderíamos denominar as perma- nentes forças projetadas por Ele, enquanto não tiverem, em sua to- talidade, levado à perfeição verdadeira e sublime o sétimo espírito à alma do homem. Todos os precedentes espíritos são dados a todas as criaturas, mais ou menos livremente; o último tem que ser conquis- tado pelo próprio esforço e zelo.
E, como por tal aquisição, os seis primeiros atingem im- portância e finalidade verdadeiras, o homem consegue somente por ele a plena liberdade da vida e independência. Agora te pergunto se compreendeste tudo isto.”
Responde Lázaro: “Sim, mensageiro de Deus pleno do Seu Espírito! Jamais poderei expressar minha gratidão pela tua grande bondade e paciência. Agora entendo a sabedoria dos Livros da an- tiguidade. Lastimo não ter capacidade para anotar ensinamento tão importante. Seria aconselhável transmitires o mesmo aos apóstolos, entendidos na escrita; por certo ainda desconhecem tal assunto.”
Diz Raphael: “Não te preocupes; pois enquanto te dei a explanação, o Senhor explicou na sala o mesmo problema, e João e Matheus anotaram os pontos principais. Se tiveres um caderno sem uso, posso prestar-te o mesmo serviço.”
Diz Lázaro: “Tenho, sim. Devo apanhá-lo?” Responde o ar- canjo: “Vamos entrar e já encontrarás tudo feito!” Assim, ambos se dirigem ao grande refeitório.
MILAGRESSOBRE MILAGRES
Quando Lázaro e Raphael se juntam a nós, ouvem ainda ex- clamações de surpresa quanto à Minha Doutrina, os Milagres, as Guerras de Jehovah, os sete Espíritos em Deus e a referida queda dos
anjos. Agrícola lastima não ter Lázaro assistido a tudo. Este, porém, diz: “Agradeço-te a atenção. Todavia, recebi os mesmos Ensinamen- tos pela Vontade do Senhor, através do jovem poderoso.
Vê, por exemplo, essas duas taças de puro ouro, das quais uma foi feita vagarosamente para demonstrar com maior evidência a ação de um espírito perfeito; outra, de modo instantâneo! Moti- vo disto foi a súbita confecção de bancos, mesas, barracas, louças e alimentos. Cerca de novecentas pessoas de todos os países foram individualmente servidas, entretanto nada foi gasto do meu estoque.
Em seguida, falamos do antigo Livro das Guerras de Jehovah, os sete Espíritos de Deus e a queda dos anjos, inclusive Lúcifer. E este jovem não só explicou-me tudo, e sim fez com que tais assuntos im- portantes fossem anotados em um caderno, o que posso te provar!”
Diz Agrícola: “Fizeste bem em persuadi-lo para tanto, num tema tão transcendental. Aqui dois apóstolos fizeram o mesmo com os pontos principais. Vai apanhar o teu livro para podermos fazer comparações.”
Após o Meu consentimento, Lázaro vai ao quarto onde en- contra, com estupefação, o Livro. Leva-o, pois, junto do romano e diz: “Ei-lo! Podes fazer a leitura em voz alta, para que todos possam ouvir novamente as Revelações do Senhor a Raphael!” Agrícola apa- nha o Livro escrito em grego e lê do começo ao fim, o que leva quase uma hora e os entendidos no idioma não se cansam em expressar sua admiração.
CURIOSIDADEDAJUDIACOMRELAÇÃOAO SENHOR
Nisto, a bela judia começa a insistir junto de Agrícola quanto à Minha Pessoa e a de Raphael, e por que todos Me chamavam de “Senhor e Mestre”. E o romano lhe responde: “Minha filha, é preci- so que tu e teus familiares estejais atentos ao que se passa, a fim de descobrirdes a Identidade de ambos.”
Diz ela: “Acaso ignorais quem são? Sabendo-o, por que não dizê-lo?”
Responde o romano: “Querida, vosso sábio rei Salomon dis- se certa vez: Tudo neste mundo terá seu tempo e é preciso o homem ter paciência; enquanto a uva não estiver madura, não deve ser co- lhida! — O mesmo acontece contigo: tão logo estiveres em con- dições, receberás orientação certa. Todavia, presta atenção ao que diz e faz aquele Homem excepcional, e teu coração dirá Quem é! Compreendeste?”
Diz ela: “Sim, perfeitamente! Ao pobre sempre é aconselhada a paciência, enquanto o rico e conceituado pode suprir-se com deriva- tivos. Ainda assim, farei o que disseste; duvido, porém, do resultado!”
Nisto o pai da jovem se dirige ao romano, dizendo: “Senhor, perdoa a minha filha; muito embora de bom coração, irrita-se quan- do não se satisfaz a curiosidade.”
Diz Agrícola: “Mas, por quê? Alegro-me justamente de sua sinceridade, que aumenta minha simpatia para com ela; pode pros- seguir em suas explanações.”
Deste modo animada, a judia continua: “Caro amigo, tan- to tu quanto teus companheiros dais testemunho de bondade; en- tretanto, não podeis avaliar o que sentem os pobres. Quando uma moça atraente não satisfaz os apetites dos ricos, pode considerar-se perdida. Calúnias e injustiças lhe são atiradas em rosto, e caso ela venha a pedir ajuda, aponta-se-lhe a porta. Tais fatos fazem com que se perca a fé na Humanidade. Somos todos humanos e dotados de fraquezas e imperfeições. Não é isto?”
Diz o romano: “Falaste certo; entretanto, esqueceste um ponto: Deus experimenta os que Ele ama antes de ajudá-los. E me parece ser o vosso caso: quando vossa miséria chegou ao auge, Seu socorro foi patente. Em Nome do Senhor, empenhei minha palavra de ajuda por simples amor para com Ele, e não por uma atração para contigo. Meu amor a Deus é muito maior do que qualquer beleza do mundo. Não deves, pois, temer o futuro; quanto ao conhecimen- to daquele Personagem, deveis ter paciência e não nos julgar cruéis.
Com facilidade podes supor Nele algo excepcional; no que se baseia tal fato, irás descobrir por ti mesma. Foste testemunha do
aparecimento dos móveis, das duas taças criadas por Ele durante a explicação dos milagres, idênticas às trazidas por Lázaro, que as rece- beu do mesmo modo pelo jovem! Se considerares tudo isto a fundo, receberás a intuição da Sua Individualidade verdadeira!”
Diz ela: “Não resta dúvida! Entretanto, há uma dificuldade intransponível, pois ainda que fosse um profeta sem par, sua manei- ra de expressão é por demais elevada. Os romanos se adaptam com maior facilidade, pois aceitam qualquer personagem excepcional como deus. Nós só cremos em Deus Único, impossível de ser visto sem se perder a vida. A Sabedoria desse homem ultrapassa todos os conceitos humanos, por isto deve possuir alto grau do Espírito Divino, todavia não podemos aceitá-lo como Deus! Que me dizes?!”
AGRÍCOLAABORDAAQUESTÃODO MESSIAS
Responde Agrícola: “Minha filha por ora é difícil opor-se algo à tua assertiva; tempo virá em que modificarás tua opinião acer- ca daquele Personagem.
Acaso nunca ouviste falar — como judia — de um Messias que viria libertar o Seu povo das mãos férreas da tirania e do pecado, que ameaçam todo o mundo com a eterna perdição? Não achas ad- missível ser Aquele a Quem me refiro?”
Responde ela: “Tal promessa não deixa de ser consoladora, todavia todas elas eram de molde a não serem compreendidas pelos sacerdotes, muito menos pelos leigos. Ora é Ele uma criança, ora um cordeiro, o Leão de Judá, um Sumo Sacerdote desde eternida- des, descendente de David, Rei dos judeus, sem fim — de sorte a se tornar difícil saber-se de que forma propriamente Se apresentará.
Aliás, nada tenho a opor caso aquele Homem seja o Messias, apenas não entendo que precisamente os sacerdotes nada disto sai- bam, pois o chefe se encontrava contigo no portal quando estavas tomando a defesa de meu irmão. Como é possível?”
Diz Agrícola: “Baseia-se no fato de terem eles somente a preocupação do bem-estar. A fim de alcançá-lo, veem-se obrigados
a toda sorte de mentiras e mistificações, portanto são inimigos da verdade. Repetem constantemente os nomes dos profetas, sem con- sideração pelas suas leis, suplantando-as pelos próprios princípios, e além disso martirizam o povo com impostos desnecessários.
Aquele Homem, porém, é o Amor, a Verdade e a Máxima Sabedoria em Pessoa, e dá testemunho da grande maldade dos fa- riseus e escribas que se dizem representantes de Deus, no Qual não creem. Não O conhecem e não querem conhecê-Lo, portanto são Seus inimigos.
Eu mesmo assisti como há dias queriam apedrejá-Lo no Templo, só porque lhes disse a verdade. Assim orientada, saberás o motivo pelo qual não querem aceitá-Lo como Messias e Salvador do mundo; todavia, não importa, porquanto será Aquele Que é. Compreendeste?”
Diz a judia: “Sim e tens razão. Para eles não importa se por- ventura aparecessem Moysés e Elias para apontar-lhes suas traficân- cias e incitá-los à contrição! Isto é fato conhecido. Deixemos nosso assunto, pois vejo alguém querendo se externar!”
RAPHAELEOS POBRES
Nisto, faço um aceno a Raphael e lhe recomendo tratar de vestimenta apropriada para a família pobre. Ele se dirige àquelas pessoas e diz: “Que roupa tendes em casa?”
Diz a moça: “Maravilhoso mensageiro daquele homem su- blime! Julgo poderes ficar sem resposta, porquanto já demonstramos a nossa miséria total.”
Diz Raphael: “Não foi este o motivo de minha pergunta, pois sei de tudo. Inclusive um pormenor que desejas ocultar, devido a um sentimento de honra impróprio. Em nossa presença impossível é ocultar-se um fato. Por amor aos teus, penhoraste teus vestidos bons e até mesmo ricos por cem talentos, durante um ano, e guardaste o recibo em casa. Não ficarias satisfeita em possuí-los agora, enquanto para teus pais e irmãos acharíamos algo adequado aqui?!”
Responde ela, um tanto encabulada: “Falaste a verdade; mas o que adianta?! Aqueles vestidos eram herança única de um rico parente; o resto de suas posses ficou com os três filhos, que se en- vergonham de nossa pobreza. Eu nunca os usei, primeiro por não estarem de acordo com a nossa situação, e além disto eram muito grandes. Não quis vendê-los por serem uma recordação e tive a ideia da penhora; talvez conseguisse reavê-los antes de expirar o prazo. Nada disse a respeito, porquanto a penhora não constitui ato hon- roso. Agora sabes de tudo. Mas que fazer?”
Diz o anjo, amavelmente: “Ora, convém resgatá-los! Como isto representaria muitas caminhadas e aborrecimentos, fá-lo-ei em teu lugar. Estás satisfeita?”
Diz ela: “Como não? Acontece não ter aqui o recibo, e além do mais o prestamista, que mora em Tyro, só vai uma vez por mês a Jerusalém, e certamente irá lá na Páscoa a negócios.”
Diz Raphael: “Não importa. Saberei encontrá-lo e farei o resgate. Quando queres que te faça entrega?” Diz ela: “Ora, levarás alguns dias de modo natural; mas como és capaz de fazer milagres, quiçá serás mais rápido!”
Diz Raphael: “Então conta os instantes que precisarei para tal. Já começaste?” Diz ela: “Como posso, se não te afastas?” Res- ponde Raphael, sorrindo: “Já fui apanhar o recibo; vê se é exato!” Todos se admiram do fato e Agrícola, inclusive alguns romanos, di- zem: “Como é possível, pois nem te ausentaste!? Certamente apa- nhaste o talão quando foste buscar a família; pois não é admissível teres feito o trajeto de outra forma!”
Diz o anjo: “No mundo material muita coisa deixa de ser possível, quando para Deus e Seu Poder não o é! Sabes, pela judia, encontrar-se o prestamista em Tyro, enquanto seu empregado aqui resolve seus negócios. A loja dele está localizada a caminho de Be- thlehem numa distância de duas horas, e eu apanharei os vestidos tão rapidamente como fiz com o recibo — e não serás capaz de alegar eu os ter apanhado anteriormente. Conta os instantes que necessitarei para tal! Já estás pronto?”
Diz Agrícola: “Como, se ainda não foste?” Protesta Raphael: “Vê, lá em cima do banco, perto da porta, estão os vestidos embru- lhados num pano; deve a moça verificar se são dela!” A judia assim faz e constata serem suas as roupas. Achando-se sua progenitora em estado mais precário, ela se vira para Raphael, dizendo: “Não te per- gunto como conseguiste trazê-las; como servem para uma pessoa só e não para duas, minha mãe as receberá, enquanto eu me sirvo das que ela usa, até que a bondade do romano me supra de outras. Per- mita que mudemos de roupa num recinto qualquer.
Além do mais, desejo saber se podem ser consideradas lim- pas por serem posse de um pagão, e preferiria que minha genitora continuasse com a sua veste rota caso fosse vilipendiada pela troca.”
Diz Raphael: “Minha filha, faze o que manda o teu coração. Quanto à pureza das vestes, não te preocupes, pois aquilo que passar pelas minhas mãos é totalmente limpo. Lázaro vos indicará onde mudardes de roupa.” Muito se alegra a moça ao ver a mãe ricamente trajada, sem considerar sua pobreza. Mas quando ambas penetram na sala — a filha está igualmente bem vestida! Sua admiração não cessa ao ver, à mesa do romano, pai e irmão de roupas novas.
SUPOSIÇÃODAJUDIACOMREFERÊNCIAAO SENHOR
Nisto, a jovem pressente algo incomum na Minha Pessoa, de sorte a Me abordar, em companhia da progenitora, com as seguintes palavras: “Senhor e Mestre, o meu coração me diz seres somente Tu Causador de tudo aquilo, impossível aos homens, profetas e anjos, a não ser levados pela Tua Vontade. Por isto Te reconheço como Deus, devotando-Te todo respeito e amor!”
Digo Eu: “Quem crê e age de acordo com Meus Ensinos será feliz! Todavia acreditais por terdes visto milagres, e se assim não fora, não Me aceitaríeis como Deus! Como pode ser isto?
Digo-vos: pelo simples fato de não existir verdade dentro de vós, porquanto até hoje jamais vos foi dirigida. Por isto vos aconse- lho: dedicai-vos à Verdade pura; somente ela vos fará livres de corpo
e alma. Fisicamente, porque vos dirá a razão do vosso corpo; e na alma, porque ela mesma vos dirá, pela verdade que possui em si, ser inclinada à liberdade plena e emancipação eterna!
Não teria dito isto, Minha filha, se não soubesse de tua boa inclinação. Confesso preferir criaturas um pouco difíceis na aceita- ção de um conhecimento do que outras que, após algumas provas e milagres, se viram rápidas, de acordo com a insinuação do próximo, qual vara ao vento, provando não terem vontade própria. Quem não tiver vontade própria, tampouco bom critério racional, presta-
-se para o Reino do Céu como aquele que, ao arar o campo, se vira constantemente para trás.
O mesmo ocorre contigo, jovem atraente! Chamaste-Me de Deus levada pelos sinais e testemunhos; mas, no mesmo momento, relegaste Deus de Abraham, Isaac e Jacob. Teu raciocínio te disse: Só pode ser Deus quem fala e age como ele! Ao mesmo tempo te arrependeste pela recordação das Leis de Moysés, e sentes medo de, em virtude de um entusiasmo espontâneo, teres te esquecido de Jehovah, dando-Me a honra apenas por Ele merecida. Isto se chama ‘arar o campo e olhar para trás’!
Se pretendes aceitar-Me como Deus, deves reconhecer-Me como Tal e não considerar outro ao Meu lado; do contrário, em nada és melhor que uma pagã, crente no Deus de Moysés, mas igualmente considerando Júpiter, Apollo, Mercúrio etc.
Quando te aproximaste de Mim, julgaste ser Eu um desses deuses pagãos e Me honraste em virtude dos romanos conceituados. Na mesma hora te lembraste do Deus de Moysés que diz: Deves crer em Um só Deus e não considerar outros ao Meu lado! — O arrepen- dimento se apoderou de ti, o que não foi justo. Pois se acreditas em Deus de Abraham, Isaac e Jacob, não Me podes saudar como Deus. Se realmente Me aceitas como um Deus, deves desistir do antigo, pois só pode haver Um, e não vários, assim como só existe um Es- paço Infinito e uma só Era Eterna, nos quais tudo existe e sucede.
Se fores capaz de crer ser Eu e o antigo Deus uma Só Entida- de — muito embora conste ninguém continuar vivo após ter visto
Deus — ao menos tua consciência continuaria calma, e teu pavor do antigo Deus seria evidentemente menor! Dize-Me o que farás!”
ESQUIVADA JUDIA
Sumamente atingida, a moça não sabe o que responder. Sua progenitora, querendo salvá-la do embaraço, lhe diz: “Ora, como podes vacilar para expressar-te?! Acaso alguém já viu Jehovah? Só se sabe Dele o que consta das Escrituras. Os sacerdotes, com maior obrigação de conhecê-Lo e seguir as Suas Leis, fazem precisamente o contrário, provando ser o Deus dos judeus pura fantasia, assim como os deuses pagãos! Este aqui estamos vendo e ouvimos Sua Pa- lestra tão sábia; portanto, o que nos impede de reconhecê-Lo como Deus Verdadeiro e dar-Lhe a devida honra?!”
Diz a filha: “Sim, estaria tudo bem, caso pudéssemos afir- mar seguramente jamais terem existido Moysés e os profetas e serem seus escritos apenas fantasia. Isto não sendo possível, e além do mais havendo nas Escrituras verdades e ensinos elevados, contrários aos conceitos dos fariseus — não se admite ter sido a Santa Escritura elaborada por eles, e sim por homens empolgados pela Divindade; portanto, é o Próprio Verbo, muito embora jamais tivessem visto o Criador. É, por isto, mui arriscado considerar-se alguém deus pelo fato de falar com ênfase e saber fazer milagres.
Confesso ter agido deste modo, sem considerar ter adotado um segundo deus. Aquele homem extraordinário levou-me ao justo caminho, demonstrando não ser deus, mas um grande profeta entu- siasmado pela Divindade.
Porventura ignoramos ser o Messias precedido por Elias?! Não costumo me enganar, portanto afirmo ser aquele personagem Elias, e o jovem, Eliseu. E não demorará a aparecer o Próprio Messias! Eis minha opinião; e como ele mencionou ser eu qual vara ao vento, demonstrarei o inverso. Nem tudo que brilha no mundo é ouro.
Só há um Deus; profetas pode haver muitos. Presumo ter respondido da melhor maneira possível. Agradeço-lhe até mesmo
por me ter advertido neste ponto! Sou tudo, menos vara ao vento!” Eis que a mãe aconselha à jovem não ser tão vaidosa e teimosa.
Responde a moça: “Nada disto sou; sigo apenas o ensina- mento recebido do Mestre e lhe agradeço por tudo. Que mais pode- ria fazer? Além do mais, não me oponho a considerá-Lo verdadeiro Messias e Salvador da Humanidade; pois, de certo modo, o foram todos os profetas que traziam a luz do conhecimento às trevas hu- manas, elevando as criaturas do lodo dos sentidos a uma vida pura e verdadeira. Isto é feito por ele, cheio do poder e forças divinos.
Considero meu parecer acertado, pois é efeito daquilo que assisti. Pode ser diferente; por certo não erramos na aceitação do ocorrido. Que o Espírito Divino, Seu Poder e Força estejam com ele, em prol da Humanidade!”
Diz a mãe: “Preferiria não fosses tão inteligente. O velho rabi encheu-te a cabeça com tudo que se possa saber neste mundo; com isto te julgas melhor que teus pais, razão por que eras insuportável. Pelo que vejo, também perdeste a simpatia daquele homem. Acho aconselhável pedir-lhe perdão e depois recuaremos!”
Digo Eu: “De modo algum; pois nada pude falar com Hé- lias, requisitada por ti! Deixa-Me palestrar com ela, a fim de que se capacite a transmitir a Verdade de Minha Pessoa àqueles que a pro- curarem. Por ora nada sabe, e tu, sua mãe — ainda menos! Falarás apenas quando te convidar.”
OSENHORAPONTAPROFECIAS MESSIÂNICAS
Novamente Me viro para Hélias e digo: “Disseste há pouco Eu bem poder ser um Messias, por ser grande profeta, pois segun- do teu critério aceitável, é Messias e Salvador aquele que libertar as criaturas do lodo tenebroso da mentira, da fraude e da superstição, através da luz da Verdade perfeita. Sendo esta a Minha Ação, sou re- almente Messias para os que Me ouvem e seguem Minha Doutrina! Quanto à tua fé em um só Deus, continuas — com justiça — com o Deus de Abraham, Isaac e Jacob.
Todavia, tenho de te apontar várias passagens dos profetas referindo-se à Minha Pessoa, e ser-te-á fácil chegares a uma conclu- são clara. Consta, por exemplo, em Isaías: Uma virgem conceberá e dará à luz um filho, que receberá o nome de Emanuel — ‘Deus está conosco’. Nasceu um menino, um filho nos foi dado, em cujos om- bros pousa a Glória; seu nome se chama Maravilhoso, Conselheiro, Deus forte, Pai da Eternidade, Príncipe da paz. Naquele dia se dirá: Vede, Este é o nosso Deus, a Quem esperávamos que nos salvas- se! É Jehovah que aguardávamos. Regozijemo-nos com Sua Glória. Ouvi a voz do clamador no deserto dizendo: Preparai o Caminho de Jehovah, e aplainai no deserto uma trilha para nosso Deus, e todos serão testemunhas. Jehovah vem no forte e Seu Braço o sustentará! Vede Seu prêmio com Ele. Apascentará o rebanho qual pastor. E Jehovah falou: Exulta e alegra-te, filha de Zion! Eu vim para morar em teu meio, e muitos povos seguirão a Jehovah em Seu dia. Eu, Jehovah, chamei-te com justiça e dar-te-ei em união do povo; Eu, Jehovah — pois este é Meu Nome — não transmitirei Minha Glória a outrem. Vê os dias futuros em que despertarei um justo rebento para David, que reinará como rei e fará julgamento e justiça sobre a Terra! Eis o Seu Nome: Jehovah, nossa Justiça!
Vê, Hélias, deste modo os profetas Me anunciaram em épo- cas passadas no deserto, aplainando-Me os caminhos e dizendo de Mim: Eis o Cordeiro Divino, que apagará os pecados do mundo!
Se julgas ser preciso vir ainda Elias, a fim de preparar as criaturas à grande Chegada do Messias que será chamado Jehovah, afirmo-te: Elias já veio em João Baptista — e Eu agora estou Pre- sente. Vim junto dos Meus, e eles não Me reconheceram! Que Me dizes a isto?”
EXPLICAÇÃODOSTRÊSPRIMEIROS MANDAMENTOS
Responde Hélias: “Senhor e Mestre começo a ficar tonta diante de Tuas Palavras! Se realmente és o Anunciado pelos profetas
— que faremos, pobres pecadores?!”
Digo Eu: “Nada mais que ouvir Meus Ensinos, guardá-los e aplicá-los, amar a Deus acima de todas as coisas e ao próximo como a si mesmo — e tereis despertado os sete espíritos de Deus dentro de vós, atingindo a Vida Eterna. Estás satisfeita?”
Diz Hélias: “Como não, Senhor?! Resta apenas saber se Tu, com as duas leis de Amor, não revogas os dez Mandamentos e os profetas, pois afirmaste conterem eles toda a Lei, inclusive os profetas.”
Digo Eu: “Querida, como podes perguntar tal coisa? Como podem a Lei mosaica e todos os profetas serem sustados quando se encontram nas Leis do Amor?! Assim como o sétimo espírito divino dentro do homem penetra, comporta e assimila os seis precedentes, o verdadeiro amor a Deus e ao próximo preenche as Leis anteriores de Moysés e todas as regras e advertências dos profetas!
Se diz Moysés: Deves amar a um só Deus e não considerar, ao lado Dele, outros deuses pagãos!, porás em prática o Primeiro Mandamento através do amor a Deus acima de tudo. Porventura poderias amá-Lo se Nele não acreditasses?! Se pelo amor para Ele evidencias tua fé — acaso serias capaz de ultrajar o Nome Dele? Por certo que não! Pois aquilo que alguém ama com intensidade é considerado acima de tudo, e até mesmo reagirá com todos que pretendam reduzi-lo ou desonrá-lo. Não te irritarias se alguém des- classificasse o teu pai?! Se, pois, amares a Deus acima de tudo, serias capaz de ultrajar o Nome Dele?!
Sob este ponto de vista convirás estarem incluídas as duas Leis de Moysés no Primeiro Mandamento de amor para com Deus. Se, portanto, O amas e honras, não será um prazer te afastares o quanto possível dos prazeres mundanos, a fim de te dedicares ao objetivo de teu amor?! Vê, nisto consiste a consideração do Sábado, verdadeira e justa perante Deus, recomendada por Moysés! O dia em si não tem valor, mas simplesmente na tua meditação diurna ou noturna, no amor e na calma psíquica dedicada a Deus, com o Qual poderás palestrar. Por aí vês acharem-se os três Mandamentos de Moysés dentro da Lei do Amor para com Deus.
Quem, pois, amar a Deus acima de tudo tê-Lo-á reconhecido e possuirá fé viva, dando-Lhe Honra e dedicando-Lhe a maior parte dos pensamentos. Quem assim agir não poderá pecar. Poderia uma noiva ofender o eleito, a quem ama com todo fervor e de quem recebe afeto ainda mais forte? Impossível, pois ambos se uniram no coração pelo amor! Quem se unir a Deus pelo amor amará ao próxi- mo, como filho do Pai, tanto quanto a si mesmo, fazendo-lhe o que de plena justiça espera que ele lhe faça.”
OQUARTO MANDAMENTO
(O Senhor): “No Quarto Mandamento ordena-se aos filhos o amor aos genitores, como as primeiras criaturas mais achegadas: são supridores, protetores, educadores e merecem todo amor e hon- ra da prole.
Uma criança bem educada que ame e honre seus pais tudo fará para alegrá-los; deste modo, terá como recompensa vida longa e saudável, isto é, todo conforto possível. É claro dedicar tal adoles- cente afeto e respeito aos irmãos, estando sempre pronto para fazer-
-lhes tudo que é bom.
A criatura que verdadeiramente ama pais e irmãos fá-lo-á também a outras pessoas, sabendo serem todos filhos de um só Pai no Céu. Através do verdadeiro amor filial chega ao conhecimento de Deus, de si mesma e do seu semelhante, compreendendo por que Ele criou a todos e qual sua finalidade. Assim sendo, aumenta o amor a Deus, alcançando o aperfeiçoamento da vida interior, ver- dadeira e espiritual.
Seria possível tal criatura cometer pecado? Não, digo Eu! Ja- mais será invejosa, não odiará, não amaldiçoará, nem matará física ou psiquicamente, através de aborrecimentos. Portar-se-á casta e discreta, não se interessará pela posse alheia, não mentirá nem enga- nará; caso se tenha tornado esposa — não terá desejo pelo marido de outrem, nem ele pela esposa do seu semelhante e poderás, logica- mente, deduzir de que modo a Lei e todos os profetas se enquadram
nos dois Mandamentos de amor, pelo estrito cumprimento dos mes- mos. Compreendeste?”
Responde Hélias: “Senhor, Criador sábio e bondoso, Pai de todas as criaturas — agora entendo as Leis mosaicas! Confesso ja- mais ter compreendido seu teor e quanto mais discutia a respeito com meus progenitores, mais se me deparavam falhas e lacunas, a ponto de pensar não serem de origem divina, ou talvez os posterio- res sacerdotes as tivessem revogado completamente, suplantando-as por obra humana, útil aos seus interesses. Meu velho rabi se via mal comigo, porque lhe apontava as imperfeições na Escritura. Após Tua Explicação, Senhor, não há quem não a entenda e possa segui-la!”
Digo Eu com afabilidade: “Então deixa-Me ouvir tua crítica!”
Diz Hélias, tornando-se ponto de atenção dos presentes: “Que poderia dizer perante Ti, Senhor, que conheces meus pen- samentos antes de os ter elaborado? Aquele jovem poderoso cer- tamente os percebe de igual modo, de sorte que podeis desistir de minha crítica.”
Digo Eu: “Querida Hélias, o caso é bem diverso! Eu e aquele jovem estamos cientes de que consiste tua crítica, inclusive os teus. Os outros, porém, curiosos pelas tuas próprias palavras, fizeram com que Eu te convidasse a te externares. Fala, pois, sem receio, dos de- feitos encontrados na Escritura.”
CRÍTICADEHÉLIASQUANTOAOQUARTO MANDAMENTO
Diz a moça: “Senhor, fazendo o que exiges, certamente não pecarei em externar minhas dúvidas. A primeira falha percebi no Quarto Mandamento, onde Moysés inculca aos filhos, de compre- ensão e físico fracos, amor, obediência e respeito aos pais, enquanto esses nenhuma obrigação têm para com aqueles. Isto é estranho, porque não raro os responsáveis são piores que seus filhos.
Geralmente terá a criança índole boa e nobre e poderia ser educada para um ser de valor. Eis que é obrigada a obedecer aos pais maldosos, sem exceção razoável, até finalmente a eles se igualar. Nes-
se ponto, o profeta poderia ter incluído um parágrafo que obrigasse aos pais a agirem de tal modo a levarem seus filhos a imitá-los.
Porventura seriam os rebentos de salteadores obrigados a obedecerem seus pais, amá-los, honrá-los e seguir-lhes as pegadas? Se, como acontece muitas vezes, filhos ajuizados de pais perversos negavam amor e obediência, abandonando-os e procurando me- lhorar em companhia de pessoas criteriosas — acaso teriam pecado contra a Lei de Moysés?
Se ele e os demais profetas determinam castigo para tais ca- sos — são mais ignorantes que eu, não representando honra para a Sabedoria Divina! Senhor, sou eu maldosa com este meu critério?”
Digo Eu: “De modo algum! Todavia, esta apreciação está fora da ordem, porque através do Meu Espírito compreendia Moysés ser desnecessário incutir aos pais o amor para com a prole, pois foi por Mim implantado de certo modo instintivamente, fato que não ocor- re com os filhos, por terem ingressado apenas na vida terrena, onde têm que receber a educação para o amor.
Por isto nascem todos tão fracos, sem conhecimento e amor, a fim de que se desenvolvam sem coação, como se estivessem com- pletamente abandonados por Deus, através de ensinos, leis e obe- diência voluntária! Eis o motivo por que leis e ensinamentos são destinados principalmente aos filhos e não tanto aos pais, que iguais à prole, se tornaram adultos por este meio!
Quanto aos deveres dos pais para com os filhos, foram eles determinados por Moysés e os profetas em leis de Estado que ainda desconheces. Duas criaturas não podem se casar antes de exporem ao sacerdote estarem bem orientadas nas leis necessárias ao casamento.
Por aí vês não ter sido ordenada tua observação quanto ao Quarto Mandamento, e Eu dissipei as tuas dúvidas. Podes prosse- guir em tua censura e Eu te direi se estás certa ou não!”
Diz Hélias: “Ó Senhor, por que deveria continuar na minha tolice? Prevejo Tua Explanação minuciosa!”
Digo Eu: “Quem levaria prejuízo com isto? Vim justamente a este mundo para libertar-vos dos múltiplos erros através da Luz
Viva da Verdade. Caso não externares tuas observações aparente- mente justificáveis, elas continuarão em teu íntimo, podendo atro- fiar a vida de tua alma. Ao passo que, te desfazendo delas, a Luz da Verdade habitará em teu coração. Além disto, é até necessário que o faças, por aqui se encontrarem muitos que fizeram o mesmo que tu com relação aos profetas!”
OQUINTO MANDAMENTO
Diz Hélias: “Ó Senhor, novamente repito: quem fizer o que é de Tua Vontade não pecará! Por isto analisarei o Quinto Man- damento. Consta: Não matarás! Farei minha explanação à simples lei sem considerar o que foi dito pelos profetas a esse respeito; um mandamento realmente divino deve conter, em sua simplicidade, o que a razão humana pode aceitar. Todavia isso não acontece com tal lei, e uma criatura racional só pode chegar à conclusão de ser obra humana, ou talvez houvesse sido omitido algum ponto.
Não matarás! Quem não deve matar? Vale isso para todos, indistintamente de sexo, idade e posição social? Não se deve matar somente ao semelhante ou aos animais? Segundo meu parecer, não se refere nem a um, nem a outro.
Não pode ser relacionado às criaturas, porque Josué destruiu Jericó e matou o povo, a mando de Jehovah. A matança dos sa- cerdotes pagãos pela mão de Elias é conhecida. Lembremo-nos do rei David, o homem de acordo com o Coração de Deus, sem con- siderarmos outros! Quantos não foram mortos e anualmente são sacrificados?! Os potentados da Terra têm por Deus pleno direito de matar o semelhante, sem consideração à lei categórica; portanto, ela só atinge os pobres e oprimidos! Não é possível medir o efeito da lei quanto ao sexo feminino, muito embora a Crônica prove que as mulheres também manobraram a espada!
Nem vale a pena conjecturar se não devemos matar animais, pois a natureza humana ensina, sem distinção de classe, sexo e idade, a nos defendermos contra as feras, caso não queiramos ser devorados.
Não matarás! Se porventura for assaltada por um malfeitor e eu, em defesa própria, conseguir matá-lo antes que ele o faça a mim, tal caso deveria constar no Mandamento! Onde, pois, se acham amor e sabedoria divinos, cientes das ocasiões difíceis por que pas- sam os homens na Terra?!
Por que elaborou Deus tal lei, quando Ele Mesmo ordena a David exterminar os filisteus e moabitas? Por que pôde Judith ma- tar Holofernes e eu não posso assassinar a quem quero? Quem deu direito aos egípcios, gregos e romanos a matarem todos os que se opuseram às suas leis?!”
Com isto Hélias vira-se para a assembleia, a fim de ver a re- ação às suas palavras; o apoio é quase total, e um escriba diz: “Pelo critério humano, a moça não deixa de ter razão, não obstante pos- teriormente ser demonstrado no Livro de Moysés como deve ser considerado o Mandamento. Uma Lei básica deveria expressar o es- sencial, ao menos nas circunstâncias mais prementes; pois todo adi- tamento subsequente dá a entender que o legislador não ponderou todos os prós e contras.
Que isso aconteça entre os homens, admite-se; mas um Man- damento Divino não deveria permitir qualquer lacuna que exigisse explicações e aditamentos. Chega-se a pensar não ter ele origem di- vina, ou então foi deturpado pela má vontade do homem. Não que- ro expressar um julgamento pelo meu simples critério.”
Digo Eu: “Exatamente, pois se fordes julgar as Minhas Leis pelo raciocínio humano, forçosamente ireis descobrir falhas e la- cunas. Se amares ao teu próximo como a ti mesmo, não o odiarás nem o malquererás ou prejudicarás; em tal caso, tampouco estarias disposta a matá-lo física ou psiquicamente, com aborrecimentos.
Não matarás, assim consta literalmente na Lei! Mas por quê? Por subentender-se, desde épocas remotas, no ‘matar’ — in- veja, ira, ódio e vingança. Deve, pois, ser interpretado do seguinte modo: a ninguém deves invejar, nem encher-te de ira contra o teu próximo; da ira surge o ódio e deste, a vingança destruidora!
Consta, porém: A Ira e Vingança são Minhas, diz o Senhor! As criaturas devem respeitar-se com amor, sendo úteis ao semelhan- te, pois tendes em Mim um Pai, portanto sois iguais perante Mim! Não deveis vos aborrecer, nem injuriar ou difamar o vosso próximo; quem isto fizer matará a alma do irmão!
Eis o que expressa o quadro ‘Não matarás’! Os primitivos judeus, ainda em tempo de Salomon, assim o entendiam e os sa- maritanos ainda hoje o fazem. Como, portanto, supor-se ter sido proibida a matança de animais ferozes e criaturas maldosas?”
Responde Hélias: “Senhor, agora compreendemo-lo perfei- tamente por Tu o teres explicado; sem esta ajuda não nos teria sido possível. Por que Moysés não junta a explicação à lei? Como profeta deveria prever a posterior incompreensão dos judeus.”
Digo Eu: “Cara observadora, bem que ele o previu, razão por que anotou grande número de explanações; a culpa de tu até hoje não as teres lido não cabe nem a Mim nem a Moysés. Todavia, foi tua objeção mui boa, porque expuseste as falhas não da lei, mas da vossa compreensão, e a fim de corrigi-las permito tua crítica. Passemos, pois, ao Sexto Mandamento.”
OSEXTO MANDAMENTO
Diz Hélias: “Senhor e Mestre, sou virgem e não seria decente fosse eu fazer observações a respeito do Sexto Mandamento.”
Digo Eu: “Minha filha, caso não tivesses conhecimen- to do mesmo, não permitiria te expressares. Assim, podes falar a teu modo!”
Diz ela: “Pois bem, repito: com Tua Vontade ninguém peca! E me expressarei condignamente. ‘Não adulterarás’. Pelo que me ensinou meu rabi, o Mandamento diz igualmente o seguinte: De- ves manter-te casta e pura perante Deus e os homens, pois quem viver inversamente é tanto pecador quanto um adúltero, impudico e perverso!
Só tenho a obstar que Moysés, primeiro, proíbe em poucas palavras o adultério no segundo Livro, capítulo vinte; enquanto no terceiro Livro, capítulo dezoito, se estende em minúcias; não os li por advertência de meu rabi. Segundo, foi tal Mandamento, como outros, dado apenas ao sexo masculino.
Quem não deve adulterar? Prende-se a lei ao homem e não à mulher? Naturalmente pode se afirmar o seguinte: ele não poden- do pecar, exclui o erro da mulher. A meu ver é ela precisamente o elemento tentador a levar o homem ao adultério e a lei deveria ser dirigida a ela; pois se for fiel, não se pode falar em adultério. Na lei original, a mulher constitui exceção e só é posteriormente mencio- nada. Desejava saber qual o motivo disto? Acaso é ela menos impor- tante que o homem?”
Digo Eu: “Essa tua crítica é razoável, muito embora caminhe apenas ao lado da verdade. Nesse Mandamento se baseia o amor ao próximo, puro e verdadeiro, tanto para o homem quanto para a mulher. Se por acaso fosses esposa de um homem bom, seria de teu agrado se a mulher do vizinho procurasse conquistá-lo? Não o de- sejando, deves igualmente respeitar a união de tua amiga; portanto, aplica-se a Lei para homem e mulher.
Deu Jehovah a Lei aparentemente apenas ao homem, assim como deu à cabeça os principais sentidos, e por eles o intelecto. Dirigindo-se primeiro à razão humana, isto é, ao intelecto do ho- mem, é ele cabeça da mulher, assim como esta é, de certo modo, o corpo dele. Quando a cabeça estiver esclarecida e compreensiva — não estará o físico todo nas mesmas proporções?
O intelecto esclarecido, em breve sê-lo-á o coração da cria- tura, que de bom grado se submeterá. A mulher corresponde igual- mente ao coração do homem, e se ele, como cabeça, estiver ilumina- do, a mulher, como coração dele, também o será.
Consta desde sempre serem homem e mulher um só corpo. O que, portanto, for dito a ele serve também para ela. Deste modo pro- vei-te a improcedência de tua dúvida, demonstrando o justo sentido do Mandamento, que por certo compreendeste. Por isto podes continuar.”
(O Senhor): “Qual é a falha ou dúvida que deparas no Sé- timo Mandamento? Fala sem receio, porque muitos com isto serão esclarecidos.”
Diz Hélias: “Senhor, após ter recebido o justo entendimento de Tua parte, não vejo defeito em tal Mandamento! ‘Não furtarás!’, eis a recomendação anterior do amor ao próximo. Pois não queren- do que se me faça prejuízo, não poderei aplicá-lo ao semelhante e novamente constato enquadrarem-se todas as Leis dos profetas nos dois Mandamentos do Amor. Além disto, surge o amor ao próximo da Misericórdia, o Espírito mais potente no coração humano, pe- netrando e vivificando os precedentes, tornando o homem bom e realmente sábio. Tal criatura jamais se apoderará dos bens alheios.”
Digo Eu: “Muito bem, estás te tornando mais simpática aos Meus Olhos, pois tua observação acerca dessa Lei de Moysés, pura- mente divina e de saber sem mácula em benefício dos homens — é para Mim muito mais valiosa que tuas críticas anteriores. Nada, porém, impedir-nos-á no estudo rigoroso das restantes leis. Como soa o Oitavo Mandamento? Fala sem susto, que Me proporcionarás grande alegria.”
OITAVO MANDAMENTO
Enchendo-se de coragem e com expressão confiante, ela prossegue: “Se fosse possível não ofender-Te, Senhor, de Quem meu coração já se apossou, teria ensejo de me expressar a respeito; mas diante de Ti — Jehovah em Pessoa — preciso é a criatura se cuidar para não cometer agravo contra Tua Santidade!”
Digo Eu: “Alma querida e amorosa, nada disto precisas recear e podes falar sem recalques!”
Diz Hélias, radiante: “Pois bem! O Oitavo Mandamento soa: Não darás falso testemunho — e como não se explica na Escritura sobre quem não se deva prestar falso testemunho, subentende-se in-
cluir-se a própria pessoa. Meu velho professor sempre me dizia ser a mentira pecado infernal, pois dela derivam toda astúcia, traição, discussão, contendas, guerras e assassínios. Deve-se falar sempre a verdade do que se sente, ainda que constituísse prejuízo próprio. Uma palavra honesta tem para Deus valor muito maior do que um mundo cheio de ouro e pedras preciosas. É, portanto, toda inverda- de pronunciada de si mesma falso testemunho proibido por Deus.
Assim sendo, Senhor, não receio em dizer-Te diretamente que Te amo acima de tudo! Isto, por certo, não é falso testemunho! Se pudesse abraçar-Te como desejo, tal êxtase me daria vontade de morrer! Isto, por certo, não é falso testemunho! Assim como não o faço de minha pessoa, jamais o fiz do próximo e penso agir com justiça neste Mandamento, no qual o sétimo espírito de Deus deve estar ativo como nos demais. Senhor, acaso Te ofendi?”
Digo Eu: “De modo algum! Pois não obstante teu grande amor para Comigo, é ele sobrepujado pelo Meu! Nosso afeto recí- proco acha-se equilibrado. No Oitavo Mandamento — ainda não! Por isto, esclarecer-te-ei!
Suponhamos seres inquirida por um juiz a respeito de um crime cometido por um teu parente muito querido, a fim de que a justiça o possa prender. Qual seria tua resposta na hipótese de estares informada de tudo?”
Diz ela, confiante: “Senhor, o Mandamento baseado no puro amor do próximo, pelo qual não se deve dar falso testemunho para não prejudicá-lo, não deve, inversamente, estabelecer condições pe- las quais se traria prejuízo por uma verdade inconveniente. Em tal caso, eu jamais diria a verdade! Quem por ela seria beneficiado? O juiz, claro que não, pois nada lucra caso o criminoso lhe caia nas mãos, e muito menos o réu arrependido! Se porventura o denuncias- se, estaria perdido, fato que não desejaria a quem tivesse cometido crime contra mim. Viraria as costas à verdade e não denunciaria o culpado, com risco da própria vida!
Se, a julgar por Tua Explanação, o amor ao próximo consiste em se fazer tudo aquilo que se deseja para si, Deus de Justiça não
poderá se irritar que eu não faça ao pior inimigo o que inversamente não haveria de querer para mim. Além disto, não necessita Deus de juiz terreno ou de um delator a fim de que castigue pecador invete- rado. Ele, Onisciente e Onipotente, saberá fazê-lo Sozinho!
Desejava perguntar-Te, Senhor, se a mulher de Isaac, cego, pe- cou quando lhe apresentou Jacob em vez de Esaú, primogênito, para receber a bênção paternal? Considero-o evidente fraude, entretanto diz a Escritura ter sido a Vontade de Jehovah. Neste caso, julgo ser justo perante Ti eu reter a verdade quando trouxer prejuízo ao seme- lhante que jamais me fez algum mal! Se Deus e Moysés não abriram exceção no Oitavo Mandamento, ele contém uma grande falha que só poderá ser completada pela Lei do Amor ao próximo. Tenho razão?”
Digo Eu: “Não inteiramente! Pois o criminoso não se teria regenerado após a fuga, e sim cometido outros delitos, piores! Se, porém, informasses o paradeiro dele, salvarias muitos da desgraça, por uma ação dentro do amor ao próximo. Que Me dizes a tal pos- sibilidade?”
Perplexa, Hélias não sabe o que responder; após alguma re- flexão ela prossegue: “Bem, se muitos haveriam de sofrer por causa de um homem mau e incorrigível, a razão me diz ser melhor que um apenas sofra merecidamente. Se em tal caso se deve fazer papel de traidor — somente Tu poderás determinar!”
Concluo: “Está no livre arbítrio de cada um! Passemos ago- ra ao Nono Mandamento. Como soa?”
NONOEDÉCIMO MANDAMENTOS
Diz Hélias: “Senhor e Mestre, tenho que objetar considera- rem os judeus Nono e Décimo, enquanto Moysés finalizou as Leis com o Nono, apenas. Consta: Não cobiçarás a casa do teu próximo, nem a mulher, nem o servo e a serva, nem seu boi e seu jumento, nem coisa alguma do que possui.
Aí terminava a Lei; pois em seguida o povo debandou de medo dos raios, trovões, do fragor das trombetas e diante da forte
fumaça da montanha, pedindo a Moysés para falar sozinho com Deus; pois se obrigados a assistirem à Palavra abaladora de Jehovah, todos haveriam de morrer. O profeta os acalmou e nada mais disse de um Décimo Mandamento.
Para os judeus exclui-se a cobiça da mulher do próximo, fazendo um Décimo Mandamento; outros, classificam-no como Nono e o restante, como Décimo. Quantos Mandamentos teria Moysés recebido realmente?”
Respondo: “No início, somente nove; quando mais tarde teve que restituir as primeiras pedras escritas, ele mesmo dividiu o último Mandamento em dois, a fim de exemplificar a cobiça pela mulher do próximo — erro contraído pelos judeus no Egito, ra- zão por que viviam em constantes arengas e inimizades mortais — como pecado, e no final instituiu a pena de morte para o adultério, porquanto a sábia Lei nada frutificara entre os judeus enterrados no sensualismo. Sabes, pois, o motivo da alteração do Decálogo. O número não vem ao caso, interessa somente o sentido e podes fazer tua crítica à vontade.”
Diz Hélias: “Senhor e Mestre sem par! Nunca tive dificulda- de para falar, mas prevejo que falarei em vão. Pois quem poderia, em sua tolice, apresentar algo que não fosses capaz de contestar?”
Digo Eu: “Querida filha, queres ter razão, conforme acon- tece na maior parte das mulheres; todavia, não se trata de simples polêmica, mas do maior rigor na vida, e preciso é que externeis vos- sos enganos para poderdes reconhecê-los pelo Meu Conhecimento, verdadeiro e vivo! Por isto deixo que fales por todos, pois sei que possuis boa memória e facilidade de expressão, e além disto apren- deste as falhas da Lei e dos profetas através do teu rabi. Fala, pois, quais tuas observações?”
Diz ela: “Não podendo pecar pela obediência, confesso não concordar de modo algum com o Nono Mandamento porque iro- niza todo e qualquer raciocínio; primeiro, por encontrar-se o con- teúdo total no Sexto e Sétimo Mandamentos; e segundo, proíbe o pensar, sentir e desejar!
Que importa se um pobre condenado a serviços pesados, em troca de miserável pagamento e alimento precário, vez por outra sente desejo de possuir casa própria, mulher ou animais domésti- cos?! De qualquer maneira, seu sonho jamais se realizará — e ainda deve cair em erro caso almeje tais coisas?!
Esse Mandamento ridículo dá impressão de ter Moysés proi- bido o uso de mãos, pés e dos próprios sentidos, o que seria ain- da mais moderado do que a proibição das funções biológicas, pelas quais ninguém é responsável.
Não quero apontar ter sido o Mandamento dado especial- mente ao homem, pois já foi ventilado atingir o mesmo à responsa- bilidade da mulher! Mas, não poder pensar, sentir e desejar — isto é forte demais! É bem verdade que pode ser motivo de anseios e atitudes, boas ou más; excluindo-se pensamentos e desejos, nada de efetivo poderá surgir. Quanto à proibição de ações maldosas, a Lei é justa, entretanto supérflua, por se encontrar no Sexto e Sétimo Mandamentos.
Vejamos a situação de minha família: perdeu fortuna e pos- se sem culpa própria; nada mais tem que a existência e, através de Tua Graça, os bons amigos. Se nessa situação observávamos o esban- jar dos ricos — acaso pecamos ao sentir o desejo de possuir parte diminuta? Se não nos for permitido desejar saciar a fome, ao menos em pensamento, com as iguarias deliciosas dos ricos, não sei o que dizer de tal Lei!
Além disto surge a questão: se naquilo que a Terra produz é tudo Posse de Deus, todas as criaturas não teriam o mesmo direi- to para satisfazer suas necessidades?! Por que existem tantas pessoas ricas sob a proteção do Governo, enquanto a maior parte nada tem e, além do mais, tem de suportar o Mandamento que proíbe o de- sejo de posse? Nada se lhes tira com isto; não podendo ter desejo, também não se poderia mendigar. O mendigo expressa a cobiça por uma parte dos bens do rico.
Nesse caso, os pobres só podem pedir emprego e se satisfa- zer com péssimo ordenado, pois qualquer outra exigência seria cobi-
ça imperdoável. Senhor e Mestre, jamais tal podia ter sido Vontade do Criador, e sim é obra de criaturas gananciosas, a fim de que a pobreza não as importunasse com seus pensamentos de posse.
Dá-nos, Senhor, esclarecimentos justos; pois presumo ter essa Lei insustentável levado os homens aos pecados e crimes, pois não é respeitada pelos judeus como provinda de Jehovah!”
AIMPORTÂNCIADOCONTROLE MENTAL
Digo Eu: “És realmente uma criatura de raciocínio mui agu- çado e fizeste um forte ataque à última Lei de Moysés. Às vezes são os filhos do mundo mais inteligentes que os da luz, pois desco- brem com maior facilidade os percalços de um Mandamento. Toda- via, falhaste como anteriormente, não obstante o grande potencial de lógica.
Poderás pensar o que quiseres, que não pecarás enquanto teu coração não sentir agrado em pensamentos desordenados. Se, porém, sentires prazer num pensamento mau, ligá-lo-ás à tua von- tade e não demorarás em praticá-lo, caso as circunstâncias sejam favoráveis e sem risco externo. Por isto, é de máxima importância o sábio controle dos pensamentos surgidos no coração através da luz purificada da razão e do puro intelecto, por serem os pensamentos a semente para a ação, e seu controle não poderia ser expresso mais acertadamente do que com as palavras de Moysés: Não cobices isto ou aquilo! Pois uma vez fortemente insuflado, o pensamento foi estimulado pelo agrado e pela vontade, e será difícil abafá-lo. Pen- samento e ideia são, como já disse, o gérmen para a ação, fruto do mesmo, e um corresponde ao outro.
Podes, portanto, pensar o que quiseres, mas não vivifiques pensamentos ou ideias para a ação antes de os teres devidamente analisado, diante do julgamento de razão e intelecto. Caso haja o pensamento passado pela prova de luz e fogo, poderás estimulá-lo à ação e dar expansão a algo de bom e útil; jamais, porém, por algo de- sordenado e evidentemente contra o amor ao próximo. Eis o sentido
do último Mandamento de Moysés, no qual não há o contrassenso nas funções biológicas do homem, que pretendes ter encontrado com auxílio de teu rabi. Que seria do homem caso não aprendesse desde cedo a analisar e organizar seus pensamentos, para deles ex- cluir toda impureza, maldade e erro? Seria pior que um animal feroz!
Justamente na ordem boa e sábia dos pensamentos se baseia todo valor da criatura. Se deu Moysés um Mandamento para tal fim — poderia um rabi inteligente (ao menos se julgando como tal) lançar suspeitas, no sentido de não ter vosso profeta recebido a mais importante Lei do Espírito Verdadeiro de Deus? Vê, Minha filha, a que ponto teu professor se excedeu?!”
POBREZAE ABASTANÇA
(O Senhor): “O fato de serem os bens terrenos distribuídos de modo desigual, havendo pobres e ricos, se baseia na sábia Von- tade de Deus, pois sem tal desproporção, dificilmente poderiam as criaturas subsistir.
Basta imaginares que todos os habitantes da Terra fossem, desde o nascimento, providos de tudo, a ponto de nenhum necessi- tar do próximo, para concluíres que, em breve, viveriam como ani- mais e aves. Não necessitariam construir moradias, nem preparar campos e vinhas, tampouco se veriam obrigados a cuidar de roupas. E caso tivessem alimento suficiente em cavernas e ninhos, jamais os deixariam, repousando e comendo quais pólipos no fundo do mar. Como os irracionais são obrigados a procurarem alimento, tornam-
-se ativos e só descansam após satisfeita a fome.
Por isto, Deus agiu com grande Sabedoria ao distribuir os bens desproporcionadamente, dotando os homens de talento e ca- pacidade mui variados. Deste modo, um se torna indispensável ao outro. O rico não se dispõe a trabalhos pesados, agrada-lhe organizar tudo de acordo com seu conhecimento e experiências, determinan- do aos serviçais como executarem suas obrigações. Satisfeitos, estes servem aos ricos mediante pagamento combinado; a fim de que não
se atrevam a querer se apossar dos bens alheios, existem leis terrenas e divinas, que entretanto protegem ambas as partes.
O proprietário abastado necessita de profissionais: ferreiros, carpinteiros, pedreiros, marceneiros, oleiros, fiandeiros, alfaiates etc., de sorte que um vive do outro pelo serviço prestado. Somente deste modo pode o Gênero Humano subsistir na Terra, e muito bem poderia se manter caso não houvessem aqueles que se entregaram ao excessivo amor-próprio e ganância. Todavia, são severamente puni- dos por Deus e sua fortuna ajuntada com tanta avidez só chega à terceira geração.
Vês, portanto, serem necessários ricos e pobres, e convirás não ter Moysés dado o último Mandamento com falhas, mas de modo completo, aos judeus e, através desses, a todos os homens. Justamente nesta Lei se baseia a perfeição interna e verdadeira do amor ao próximo e do espírito da Misericórdia no coração humano.
Se isto é incontestável, ela também estabelece a condição pela qual cada um deve considerar a fundo tal Lei, para a verdadeira pu- rificação de sua alma. Enquanto o homem não for soberano de seu pensamento, não dominará suas paixões e atitudes subsequentes. Quem não for senhor e mestre de si mesmo longe estará do Reino de Deus, continuando servo do pecado projetado de seus desequi- librados pensamentos e desejos, vilipendiando-o totalmente. Terás compreendido tudo?”
A CRÍTICA. O SENHOR ACONSELHA A EXTERNAÇÃO TOTAL DAS DÚVIDAS
Diz Hélias: “Senhor e Mestre, desde Eternidades! Que po- derei, pobre serva, ainda dizer? Falar-Te de coisas espirituais seria o mesmo que um tolo disposto a colher o mar imenso dentro de um balde. Tudo que dizes é verdade e todo o Gênero Humano nada sabe. Minha análise feita ao último Mandamento me parecia fun- damentalmente certa — e onde ficou? Não somente redundou em nada, mas positivou-se em algo que me leva à vergonha eterna, por
ter externado tanta tolice. Estou profundamente arrependida, por ter ousado entrar em polêmica em Tua Presença! — Qual não será o critério desses homens inteligentes?”
Digo Eu: “Mas, por quê? Fui Eu quem te convidou a falar e tu mesma afirmavas não ser possível pecar quem fizer o que Eu que- ro. Se não pecaste, também não tens motivo para te envergonhares. Teu pronunciamento não só foi muito útil para tua pessoa, mas para todos os que alimentavam as mesmas dúvidas; foi obra eficaz de tua eloquência, e não há motivo para teu embaraço. Não obstante tua pouca idade, possuis raciocínio claro como luz inicial do coração; quem for dono de tal luz em breve encontrará a justa claridade da Vida. Compreendes o sentido de Minhas Palavras?”
Responde ela: “Como não, Senhor! Todavia, tenho plena consciência de minha nulidade perfeita dentro do nada, enquanto és Tu o mais perfeito Todo em tudo! Peço-Te, pois, não mais me convidares para falar; sou muito ignorante!”
Digo-lhe: “Bem que deverias fazê-lo, porquanto duvidaste igualmente dos profetas; havendo, porém, compreendido ser a Lei mosaica puramente divina, sem mácula e falha como as humanas, serás poupada no prosseguimento do assunto. Ao sentires a menor dúvida, poderás te externar para receber orientação.
Em Minha Companhia se acham Meus apóstolos e aquele jovem é Meu servo, como os tenho em grande número. Todos eles poderão esclarecer-te conforme o fiz. Dirigir-Me-ei para perto dos discípulos que se encontram do lado oposto numa sala do albergue. Apenas Lázaro, Agrícola e Hibram poderão acompanhar-Me.
Já sabes o que fazer caso necessites orientação; tenho outras obrigações, porquanto o Sol apenas permanecerá no Céu durante meia hora. Em seguida, virão os hóspedes a fim de tomarem a refei- ção e até lá quero estar de volta, pois não posso passear entre criaturas mundanas. Tão logo tiverem partido iremos ao ar livre, onde assisti- reis a muita coisa maravilhosa. Ficai, pois, e meditai até Eu voltar!”
Diz Hélias, com voz lamuriosa: “Ó Senhor, por que não pos- so acompanhar-Te, quando meu maior desejo é ficar Contigo?”
Respondo Eu: “Tal é digno de louvor; se continuares inti- mamente junto de Mim, poderás usufruir Minha Personalidade Espiritual. Em Genezareth mora também uma menina adorável, chamada Yarah; faz quase um ano que não Me vê, entretanto está mais próxima de Mim do que tu, presentemente! A cada momento posso falar-lhe e ela ouve toda Palavra Minha, obedecendo estrita- mente. Faze o mesmo, que permanecerás em Minha Companhia, como Yarah, até mesmo quando não mais palmilhar em Corpo por este planeta! Compreende e adapta a tua vida de acordo, que terás a Vida eterna dentro de ti!”
PARECERDOJOVEMESCRAVO.FUTURODA RÚSSIA
Em seguida Me levanto. Lázaro, Agrícola e Hibram Me acom- panham junto aos jovens, em animada palestra, pois cada um relata os acontecimentos havidos durante a viagem relacionados à atual sal- vação. Uns tiveram sonhos, outros visões sobre a terra e na abóboda celeste. Desse modo entretidos, não percebem o dia estar findando.
Ao entrarmos no vasto recinto, gritam em altos brados: “Bem-vindo sejas, Pai verdadeiro e justo, pois nos supriste de ali- mentos e vestes. Rendemos-Te todo amor, que de modo algum sentimos pelos pais. Nunca nos fizeram algo de bom, a não ser ali- mentar-nos em excesso, para conseguirem preço mais alto em nossa venda. Nosso desejo se prende à compreensão deles, pois é injusto se vender a prole como se faz aos animais; mas, como encontramos um pai tão bondoso, perdoamos o ultraje recebido e tu, traficante Hibram, poderás dar-lhes tal recado, caso corra em tuas veias uma gota de sangue honesto!”
Lázaro e Agrícola muito se admiram da energia de tais pa- lavras, pois Eu lhes dera o dom de compreender seu idioma, para melhor entendimento. Podia ter feito o mesmo com os jovens, en- tretanto não seria em seu benefício; uma perfeita noção idiomática inclui os erros, expressões impróprias, pecados e vícios. Integran- do-se pouco a pouco no idioma romano com a ajuda de Agrícola,
que os levaria a Roma, orientando-os na Minha Doutrina, teriam proteção contra a deturpação romana.
Após ter Hibram dado promessa formal de cuidar dos compa- nheiros jovens que ficariam na pátria distante, e de ele também não mais se entregar ao tráfico — Eu proponho sairmos ao ar livre. To- dos nos seguem e os adolescentes se extasiam diante do crepúsculo.
Um deles, bastante inteligente, se externa: “Realmente, neste tão belo e quente país, devem as criaturas estar mais próximas do bom Deus do que em nossa pátria. Lá a época de calor é curta e o inverno longo, a água se torna gelo dando cunho de tristeza à pai- sagem; por isto, as criaturas estão mais ligadas ao deus do mal; não se respeitam, nem se amam e cada qual trata de prejudicar o seu semelhante. O mais forte é senhor inclemente do fraco, obrigando-o a fazer serviços pesados sem pagamento. Tu, Hibram, és igualmente pequeno déspota em nossa terra; não permitas a sedução ao deus do mal, não lhe faças oferendas, e sim rende homenagem ao bom Deus daqui, que nosso país se tornará igualmente inundado de luz e calor.
A meu ver, é o bom Deus muito mais poderoso que o outro, capaz de fazer pedra da água, sem poder dissolvê-la. Aqui encontras- te Deus verdadeiro; aceita-O no coração, faze-Lhe tuas oferendas, que Ele abençoará nosso vasto país.”
Profundamente sensibilizado, Hibram promete seguir o seu conselho. Ao mesmo tempo chama a atenção dos demais a fim de procurarem se aproximar mais intensamente de Deus Único, e caso alcançassem conhecimento integral, deveriam levá-lo aos conterrâ- neos. Todos concordam e o jovem orador prossegue: “Tão logo es- tivermos de posse da Bênção do Verdadeiro Deus, conforme sucede aos habitantes daqui, facilmente acharemos o caminho de volta à pátria, pois Seu Espírito nos guiará. Do contrário, isto jamais seria possível, porquanto fomos transportados durante quatro dias, de olhos vendados e ouvidos tapados com barro. Desisti desse hábi- to perverso; é algo horrendo ser-se obrigado a deixar a terra natal, ainda que hostil, como escravo surdo e cego. Não te esqueças disto, Hibram, pois teu domínio se estende por vastos territórios!”
Em seguida, o jovem se dirige a Mim com expressão amo- rosa: “E tu, nosso bondoso pai, dotado de poder e força de Deus, aconselha igualmente Hibram a mudar de tratamento para conosco, pois parece considerar-te muito. Além disso, peço-te misericórdia para com todos os habitantes de nossa pátria, que muitas vezes se alimentam apenas de carne seca de animais ferozes e peixes. Se com isto tiver feito um pedido impróprio, podes castigar-me, pois não te faltam poderes para tanto!”
Digo Eu: “Que absurdo! Jamais castiguei um ser, porquanto cada um se pune a si mesmo — muito menos poderia fazê-lo con- tigo em virtude de teu coração bom e nobre. Afirmo-te: dentro de sete anos voltarás ao teu país e de teu sangue surgirá uma raça que guiará, em Meu Nome, as vastas regiões do Norte durante mais de mil anos. Teus descendentes posteriores não manterão a regência, por se tornarem brutos e dominadores. Não deves por isto afligir-te; saberei escolher chefes úteis ao Meu Regime. O reino sempre será o mesmo, com poucas modificações; em épocas futuras, os soberanos não habitarão a Ásia e sim a Europa. Por isto, sede todos diligentes, aprendei o Bem e a Verdade e implantai a Minha Doutrina nos países nórdicos!
Não importa ser o inverno a estação dominante; se vossos corações se aquecerem pelo amor a Deus e ao próximo, os rios con- gelados derreter-se-ão, trazendo grande benefício ao país. Preciso é vos instruirdes com os que vos levarão a Roma, pois dentro de sete anos voltareis bem orientados. Achando-vos novamente na pátria, fazei o bem aos que vos prejudicaram, compreendestes?” Todos res- pondem afirmativamente, prometendo agirem desse modo.
Digo Eu: “Então, tendo alcançado um bom objetivo, po- demos voltar!” Ao entrarmos na casa, deparamos com Hélias numa controvérsia agitada com o anjo.
Ao Me sentar à mesa, aviso a Raphael e Lázaro estarem os hóspedes a caminho do albergue e deveriam ser acomodados em suas tendas e não nos recintos da hospedaria.
Diz o último: “Senhor, já esta escurecendo — como arranja- remos iluminação apropriada para as tendas? Minhas lâmpadas não dão para supri-la.”
Digo Eu: “Para tal fim terás a ajuda de Raphael, como fez no almoço. Vai, pois eles já estão chegando.” Ao se dirigir com o anjo para as tendas, Lázaro já as encontra iluminadas e as mesas supri- das de tudo. Nisto se aproximam os empregados e perguntam onde Lázaro havia arranjado a boa ceia, pois eles ignoravam tal estoque.
Diz ele: “Por que não vos interessais por aquilo que ocorre em minha casa? Nós sabemos de onde veio tudo isto, enquanto nada percebeis! Quem é Aquele que há quatro dias mora aqui com Seus discípulos?”
Respondem alguns: “Ah — o profeta da Galileia! Nossa fal- ta é perdoável, pois andávamos sempre muito atarefados e também seria importuno fazermos perguntas. A partir de agora, prestaremos mais atenção, já que não te aborreces com isto.”
Diz Lázaro: “Está bem; agora dedicai-vos à vossa tarefa, a fim de que todos recebam uma boa ceia.” Entrementes, um dos hóspedes pergunta a Lázaro como podia prever o número exato de acomodações para todos, pois em outras hospedarias nunca se dava tal fato! Algo surpreendido, Lázaro apenas convida o visitante a sen- tar-se na tenda próxima e, caso ele insista, receberá resposta. Um outro se externa favoravelmente quanto ao bom paladar dos pratos e bebidas. E um grego está pronto a pagar bom preço pelo segredo culinário. Lázaro, receoso quanto à resposta a dar, dirige-se ao anjo nesse sentido.
Diz Raphael: “Deixa o assunto por minha conta, pois fa- cilmente poderias dizer demais ou de menos.” Após terminada a ceia, os comerciantes pagam a despesa e voltam à cidade; somente o
primeiro grupo começa novamente a importunar Lázaro. Resoluta- mente ele diz: “É claro não haver hospedaria igual à minha; todavia, terá todo tavoleiro seus segredos, que por preço algum deseja exter- nar. Esse jovem, porém, poder-vos-á esclarecer o necessário; portan- to, dirigi-vos a ele!”
RAPHAELEOS GREGOS
Deste modo orientado, o grego se vira para Raphael, pedindo que se expresse. O anjo diz: “Meus caros, isto não é tão fácil como julgais. Pois em nossos livros — também de vosso conhecimento — consta: A terra de Canaan é dada aos filhos de Jehovah, onde habita- rão deuses. Assim sendo, encontrai-vos no país dos deuses, portanto o convívio não é de simples criaturas. Caso pretendais algo junto dos deuses, preciso é pedir-lhes, do contrário eles se calam e nada mais transmitem em ensinamentos e conselhos. Compreendestes?”
Um tanto admirado, o grego responde: “Meu jovem judeu, segundo me parece, vossa origem divina não tem boa base, pois do contrário os romanos não vos teriam subjugado! Não importa tu te orgulhares das Escrituras, porquanto como judeu inexperiente pre- tendes ser algum deus. Contudo, posso externar meu pedido pelo segredo culinário!”
Diz o anjo: “Nada disso, meu amigo, pois te tornaste mal-
-educado e nós, deuses, não toleramos a má educação. Vós, huma- nos, tendes que vos orientar conosco e não vice-versa; pois podemos muito bem viver eternamente sem vossa ajuda — vós, não! Com- preendestes?”
Diz o grego: “Oh sim, e concluímos seres tu adolescente pe- culiar! Já que afirmas tua divindade — dá-nos uma prova da menor, e saberemos tratar-te de acordo. Apenas com palavras jamais um ho- mem se poderia manifestar como deus ao semelhante, mas pela ati- tude que poderia ser considerada divina, dentro do testemunho de cientistas e magos. Terias compreendido isto como pretenso deus?”
Responde Raphael: “Com tua retórica grega, nada alcançarás comigo. Possuo poder e força divinos e não tenho medo de pessoa alguma. Quem desejar receber algo terá que me pedir de coração puro e humilde!”
Diz o grego: “Já percebemos seres rapazola intempestivo e nada se consegue com todo raciocínio humano, com referência aos teus segredos! Desempenhas muito bem o papel divino; podes con- tinuar assim, que serás um dia um homem célebre. Se realmente fores dotado de força onipotente como judeu, não podes ser amigo dos romanos. Com facilidade poderias expulsá-los da noite para o dia. Por que suportas suas leis severas?”
Diz Raphael: “As leis romanas são severas, porém justas e servem de proteção aos judeus bem intencionados, contra os que se dizem como tais, entretanto não o são, muito menos filhos de Deus. Deste modo são os romanos nossos amigos e mantêm boa disciplina entre as criaturas pervertidas deste país como de outros; por isto, protegemo-los e não pretendemos expulsá-los. Dar-vos-ei pequena prova que nós, caso fosse necessário, somos capazes de dispersá-los como palha ao vento — atenção, pois!”
UMMILAGREDE RAPHAEL
Nisto, o arcanjo apanha uma pedra de dez libras, dizendo: “Julgo ser esta pedra bastante grande e pesada para vos dar um exemplo convincente!” Diz o grego: “Não resta dúvida, mas que será?” Responde Raphael: “A fim de que não afirmeis ser eu mago excepcional, quero que todos vós analiseis a mesma.”
Após se terem certificado tratar-se de uma pedra real, os gregos a devolvem a Raphael, e o primeiro orador diz: “Que farás, então?” Prossegue o anjo: “Apanhai não só esta, mas várias outras, idênticas, para conhecerdes nosso poder divino. Contudo, nada vos acontecerá!” Eles procuram pedras semelhantes e as seguram nas mãos, como se pretendessem apedrejar o jovem. E o anjo diz: “Não
toco em nenhuma; tão logo disser: Dissolvei-vos em elemento eté- reo e original!, nenhum grão de poeira subsistirá em vossas mãos!”
Diz o grego: “Jovem amigo, estás gracejando! Não restará poeira, mas sim as pedras todas, que passarão ao éter porque as apa- nhamos do solo e as lançamos ao ar. Tenho razão ou não? Permites que as atiremos contra ti quando as tiveres dissolvido pela vontade?”
Responde Raphael: “Como não? Cuidado, porém, que não venham a sumir! Quero que se destruam! Podeis começar a atirá-las contra mim!”
Aparvalhados, os gregos se entreolham, e o primeiro diz: “Meu jovem, entendes mais que nós, homens de vastos conheci- mentos! Como te foi possível a destruição momentânea?”
Responde o anjo: “Estais longe de compreendê-lo; disse-vos antecipadamente estardes lidando com judeus íntegros, portanto com filhos de Deus, dotados de Poder Divino e senhores imortais da Natureza. Assim, não tememos inimigos e soberanos do mundo. Quem algo quiser de nós terá que pedir com humildade.”
Diz o grego: “Como chegastes a tal ponto? Sois humanos como nós!”
Responde Raphael: “Pelo fato de termos procurado apenas os conhecimentos puros e verdadeiros de Deus Único, desprezando as coisas do mundo. Assim recebemos os tesouros reais e vivos do espírito e sua força, jamais destrutíveis e de constante acúmulo, ao invés dos bens perecíveis.
A fim de se conseguir os tesouros vivos do espírito, preciso é receber-se meios e orientação do Deus Verdadeiro, fato ocorrido com os patriarcas, mormente Moysés e os demais profetas e doutri- nadores. Quem aplicava tais recursos e caminhava na estrada indi- cada fazia jus à Filiação Divina e atingia a força interna do espírito. Como isto nunca se deu convosco, desconheceis o Deus Verdadeiro, Seus filhos nesta Terra e o que podem realizar.”
Diz o grego: “Por que não nos demonstrou tais caminhos e meios, pois somos tão humanos quanto vós? Possuímos inteligên- cia, raciocínio e sempre fomos considerados o povo mais culto da
Terra. Não nos cabe culpa de não termos a mesma força espiritual dos judeus.”
Responde Raphael: “Não é bem assim, meu amigo! Gre- gos, romanos e os antigos egípcios se encontravam anteriormente no ponto em que alguns judeus de hoje ainda se acham. Abandonaram o Deus Único, como fazem muitos de nossos conterrâneos, sendo por Ele igualmente abandonados em seus prazeres vãos e fúteis.
Se porventura quiserem retornar a Deus, Ele os aceitará, demonstrando-lhes novamente os antigos meios e caminhos pelos quais poderão se tornar judeus justos e filhos de Deus. Em tempo oportuno serão enviados mensageiros e doutrinadores a todos os po- vos para tal fim — e felizes os que lhes derem atenção!”
Insiste o grego: “Por que não sucede isto agora?” Responde Raphael: “Por vos encontrardes cheios das coisas mundanas. Quan- do delas vos despirdes, amadurecendo pelas aquisições do espírito, merecereis as mesmas atenções. Agora basta sobre o assunto; talvez prossigamos amanhã!”
Conjectura o comerciante: “Pretendíamos partir amanhã, porquanto vendemos toda a mercadoria; em atenção a ti, ficaremos até à tarde, pedindo alguns esclarecimentos espirituais para levá-los à Grécia. Talvez também consigamos orientação acerca do preparo excepcional dos alimentos!”
Diz o anjo: “Vamos ver; julgo, todavia, que por ora enten- dereis tão pouco do assunto, como assimilastes o porquê da destrui- ção das pedras. Contudo, haverá coisas mais importantes a ouvir. Se isto te agrada, poderás voltar, mas não para aprender a arte culinária, pois já disse seu mistério.”
Diz o grego: “Interessa-me o conhecimento e não a matéria. Voltaremos amanhã quando todos os hóspedes tiverem partido, pois à noite será difícil se descer da montanha.”
Diz Raphael: “Ela estará iluminada, de sorte a ser fácil a descida, portanto ide em Nome do Deus Verdadeiro!” Os homens seguem caminho e dentro em breve chegam às barracas; quase não conseguem dormir, em virtude dos fatos ocorridos. De manhã
aprontam tudo para a viagem; todavia, a protelam para o dia se- guinte. Deixemo-los em suas conjecturas e voltemos ao refeitório onde todos se acham à mesa.
ANATUREZADERAPHAEL.OBENEFÍCIODA PACIÊNCIA
Ao entrar no refeitório, Lázaro se apronta para uma descrição minuciosa acerca daquilo que ocorrera com os gregos. Interrom- po-o, porém, dizendo: “Meu irmão, poupa-te o trabalho; sabemos de tudo. Aqueles gregos são uma boa conquista para a causa, mas necessitam de muito preparo. As duras pedras pagãs da dúvida têm de ser dissolvidas, conforme foi feito por Raphael com as da matéria; só então se prestarão como arautos em seu país. Agora sentai-vos à mesa; tão logo estiverdes satisfeitos, iremos ao ar livre onde, até altas horas da noite, ser-vos-á demonstrada muita coisa da Esfera Glorio- sa de Deus; já tendes a necessária maturação para suportar revelações divinas mais elevadas, e esta noite será tão favorável como nenhuma.”
Aproxima-se Agrícola e diz: “Meu Senhor e meu Deus, quei- ra dizer-me quem é esse jovem estranho! Já Te fiz tal pergunta e Tu me asseguraste que eu haveria de descobri-lo. Nada disto aconteceu; ele come e bebe, e isto com maior apetite do que nós, quando adqui- re expressão inteiramente humana; mas ao falar e agir, tudo muda de aspecto; não admite gracejos e realiza coisas estonteantes, muito embora tenha eu vastos conhecimentos e pertença à casta religiosa.
Como alto funcionário do Governo Romano fiscalizo princi- palmente o clero, e adquiri conhecimento total de todas as religiões, de modo a se explicar por que me fiz orientar no judaísmo. Não há segredo que não me fosse revelado e lidei com homens, jovens e idosos que faziam paralisar o meu raciocínio bem formado.
Nada se compara a esse jovem, cujo aspecto feminino, pelo critério romano, não dá prova de um grande espírito. Os tais Adônis e Vênus são considerados os mais ignorantes, e as exceções são raras. Este é o mais belo que já vi e se usasse roupas femininas, seria a moça mais atraente da Terra. Todavia, possui ele um espírito tão elevado,
a ponto de conseguir o mesmo que Tu. Vês, Senhor, não poder eu reprimir a curiosidade e podes usar de franqueza.”
Digo Eu: “Meu caro, se Eu fosse acometido de qualquer fra- queza humana, dir-te-ia sem rodeios a identidade desse jovem; como sei desde eternidades o que seja mais benéfico a cada criatura na es- fera de sua evolução psíquica, jamais pronuncio uma palavra sequer que, dentro de alguns dias, não tencionasse manter; assim sendo, fica estabelecido que irás reconhecer esse adolescente por ti mesmo.
Ouviste ser a paciência uma Virtude de Deus no homem, devendo ser fortalecida e formada ao lado de outras, caso a criatura pretenda chegar à perfeição interna da vida. Quero, pois, que tua paciência temporize rigor e zelo excessivos. Eis o motivo por que não digo o que te aflige, pois a paciência é para o homem como a chuva macia para a Terra. Abranda os desejos ardentes no coração humano, a fim de que não degenerem em paixões intempestivas, arrasando, às vezes, a alma. Compreendendo-o a fundo, equilibra-te na paciência, e a viva sede de teu coração será satisfeita.”
Diz o romano: “Senhor e Mestre, nem o homem mais sábio do mundo poderia contestar-Te, por seres Amor, Sabedoria e Verda- de plenos. Um deus que se deixasse comprar qual fruteiro da Grécia, seria homem fraco e ninguém poderia confiar nele!”
Digo Eu: “Falaste certo; continua deste modo, pratica a pa- ciência, que em breve chegarás à luz interna da vida! Os romanos consideram o velho ditado pelo qual se deve correr devagar, o que nada mais é senão aplicar a paciência. Agora vamos ao ar livre!”
OFENÔMENOLUMINOSODASDEZ COLUNAS
Todos Me acompanham e admiram a organização das inú- meras tendas; entretanto, chama a atenção uma nuvem incandes- cente em forma de coluna a subir sem parar e dando a impressão de tocar as próprias estrelas! Dentro em pouco tem a claridade da Lua, iluminando quase a zona toda. Todos Me perguntam o que vem a ser isso.
Digo, pois: “Paciência, Meus amigos, ainda virão outras! Só então trataremos de sua origem e finalidade. Tende a máxima aten- ção ao que acontece, pois os profetas já disseram que nesta época se dariam fenômenos, não só na Terra como no Céu. Cumprem-se, deste modo, as antigas profecias! Atenção!”
Novamente todos se viram para Leste onde aparece outra co- luna, atingindo igualmente a luz lunar, clareando mais o local. Nem bem se passam alguns instantes, surge a terceira, vista não só por nós, mas por muitos em Jerusalém, no país todo, fazendo-se ouvir um intenso rumor.
Nisto, Lázaro Me diz: “Senhor, se isto demorar, o Monte ficará superlotado dentro em pouco. Seria conveniente fechar-se o portão!”
Digo Eu: “Não te preocupes enquanto Eu estiver contigo, pois sem Minha Vontade, nem uma só mosca entrará neste quintal, muito menos qualquer pessoa! Tem cuidado — surgirão ainda mais sete colunas idênticas!”
Quando termino de falar, aparecem a quarta, quinta, sexta, sétima, oitava, nona e décima colunas, em distâncias regulares, irra- diando tamanha claridade que se projeta às margens do Mar Medi- terrâneo, à Ásia Menor e às terras longínquas do Euphrates.
A confusão na cidade é completa; os pagãos consideram o fenômeno de mau agouro, enquanto os judeus falam do Dia Final. Certos interpretadores determinam dez anos de prosperidade; ou- tros, o contrário, consequência de grande estiagem.
Um velho rabi, porém, grita pelas ruas: “Trata-se da Chegada do Messias, e as dez colunas são símbolos de Seu Poder; o surgi- mento vindo do Levante prova que Ele de lá se encaminhará para Jerusalém!” Este homem, porém, não é ouvido, mas ridicularizado, e alguns fariseus lhe dizem: “Chega de tolices messiânicas, pois de há muito pretendes ver o Messias em cada nuvem iluminada pela Lua. Há poucos dias, por ocasião do eclipse lunar, afirmavas o mesmo absurdo, ao passo que os essênios sabidos o haviam calculado há um ano atrás. Essas colunas têm aspecto deslumbrante e nada mais são
que produto da arte essênica. Procura-os, que saberão dar cabo de teu Messias!”
Não se perturbando com essa explicação racional, o rabi prossegue em voz alta: “Podeis falar o que quiserdes, mas dentro em pouco teremos a prova se disse a verdade! Deus não liga para afir- mativas de pessoas como vós, e sim às Suas Próprias Profecias trans- mitidas pelos Seus eleitos. Tende cuidado em não serdes apanhados por um demônio! Como é possível ridicularizardes um velho rabi?!” Esses fatos são por mim relatados no Monte; Lázaro e os apóstolos opinam ter sido ultraje o que a mocidade fizera ao rabi.
Digo Eu: “Em parte tendes razão; o velho é raposa ladina do Templo e aproveita momentos como esses para anunciar o Mes- sias e extorquir algumas oferendas. No fim, fica satisfeito quando sua predição não se realiza; neste país rico em fenômenos naturais, se aproveita tudo para a política templária. A mocidade de Jerusalém, bastante dissoluta, o enfrenta em tais ocasiões, de sorte que ambos os partidos se equilibram. Digo mais: será mais fácil aos jovens ade- rirem a Mim do que aquele velho, pronto para suas mistificações lucrativas, pois no fundo não tem fé. Deixemos esse assunto; o fe- nômeno terá seu efeito estrondoso! Acaso não ouvis as trombetas das ameias do Templo? Provam estarem acordados os templários, indecisos quanto às medidas a serem tomadas. Por isto fazem cha- mar todos os fariseus e escribas que moram fora do Templo, a fim de resolverem o aproveitamento da aparição. Assim que tiverem dado explicação radical ao povo que se aglomera nos portais, modificarei a aparição, levando os sacerdotes a outras conjecturas e mentiras. A importância da aparição vos será explicada no final. Agora, con- tinuai a observar o cenário. Dentro de um quarto de hora, tudo se modificará e o espetáculo será formidável!”
Exclama Agrícola ao Meu lado: “Que cegueira incompreen- sível a dos judeus! Lá correm eles para o Templo, enquanto nós, pagãos ignorantes, nos encontramos na Fonte Original da Vida, da Luz e da Verdade eternas! Nós, evidentemente os últimos, somos os primeiros — e os filhos de Abraham se portam como suínos a voltarem ao lamaçal! Eis uma Graça imerecida, Senhor! Somente Tu saberás o resultado.”
Digo Eu: “Não será dos piores! Chegou o momento de se le- var a esses agiotas do mundo um grande embaraço através de meios externos, no que perderão no conceito popular. Concluíram, em breves traços, no sentido de representarem as dez colunas os dez troncos de Israel fiéis ao Templo, que extirparam os dois — samari- tanos e galileus — e que todo judeu se vilipendiaria por um ano caso mencionasse um desses troncos. E o povo bate no peito e jura jamais pronunciar os seus nomes. Agora prestai atenção: surgirão mais duas colunas e então vereis o alvoroço!”
Dito e feito: aparecem a Leste duas colunas maravilhosas a um só tempo, e de luz dez vezes mais forte que as anteriores em conjunto. Uma ao lado direito e outra ao lado esquerdo proje- tam sua claridade até a Europa e na retaguarda atinge quatrocen- tas milhas.
A confusão é total entre a multidão e os templários. Nova- mente ouvem-se as trombetas do Templo, a fim de despertarem número maior de conselheiros, não obstante já terem aparecido to- dos os sacerdotes das redondezas de Jerusalém. Ninguém mais se apresenta, entretanto inicia-se novo conselho. O sinédrio, porém, não sabe interpretar a última aparição, por se ter enganado com a primeira.
Agitado, o povo clama: “Eis os dois troncos por vós classifi- cados de desprezíveis! Se não for assim, declarai-nos o porquê, do contrário exigiremos a devolução das oferendas!” Lentamente os sa-
cerdotes são tomados de pavor, e um judeu resoluto dirige-se a eles: “Caso não fordes capazes de nos dar explicação razoável no momen- to de tão grande perturbação, dispensaremos vossa ajuda futura! Só entendeis exigir sacrifícios e expulsar do Templo homens sábios; mas agora que o Julgamento Divino ilumina as vossas atitudes, estais calados quais múmias! Atirai as pedras do Templo e a água maldita contra aquelas colunas luminosas, e veremos se curvar-se-ão diante de vosso poder sacerdotal!”
Eis que se apresenta um chefe templário, dizendo: “Tende um pouco de paciência! O sumo sacerdote já se encontra orando no Santíssimo, de vestes rasgadas, e caso seja preciso, dar-lhe-emos nossa colaboração. É necessário não desesperardes quando Jehovah nos procura com uma praga, certamente merecida por todos. Em vez de nos cumular de ameaças, é preferível orardes a Deus, pois na aflição pode qualquer um pedir com resultado!” Mais calmo, o povo começa a fazer preces, enquanto os sacerdotes se afastam para resol- ver a situação aflitiva. Como nada consigam, seu pavor aumenta; o contraste é estranho entre eles e o povo, e os que se haviam refugiado Comigo; os Meus companheiros se extasiam diante do maravilhoso aspecto das colunas — e no Templo reina a pior confusão.
Nicodemus, que também lá estava, é consultado a respeito e diz: “Nunca levastes em consideração qualquer opinião minha, alegando eu simpatizar com os galileus, de sorte a achar dispensável manifestar-me. Se Jehovah determinou um grande castigo ou o ani- quilamento total, todo parecer humano é fútil e nossa profissão ter- minará. Caso quiser fazer-nos apenas uma última advertência para contrição verdadeira, saberemos por um profeta qual a medida a tomar. Considerai, porém: assassinastes Zacharias, profeta! O pre- gador e batizador do Jordão foi decapitado por vosso intermédio, no cárcere de Herodes. Surgiu outro sábio da Galileia que há três dias doutrinou no Templo, e como sua pregação fosse justa, queríeis apedrejá-lo. Se pretendeis usar de tais recursos com todas as criaturas compenetradas do Espírito de Jehovah, nem Ele vos poderá dar con- selho — muito menos eu — para impedir o aniquilamento certo!”
Diz o sumo sacerdote, presidente do Conselho: “Quem po- deria provar terem sido tais homens verdadeiramente inspirados por Deus?”
Responde Nicodemus: “Igual a ti perguntaram em tempos remotos os maiorais do Alto Conselho, e o resultado foi o apedre- jamento ou sufocamento dos profetas, posteriormente reconheci- dos. Isso sendo fato incontestável, a Paciência do Senhor deve ter chegado ao fim, o que provam as dez colunas, paulatinamente mais luminosas e grandiosas! Que coisa extraordinária! Estamos em plena noite, tão clara como à luz do meio-dia! Voltarei junto dos meus a fim de acalmá-los! Como nada de útil faço aqui, prefiro morrer em casa do que entre paredes tão seguidamente ultrajadas!”
NICODEMUSEMCASADE LÁZARO
Em seguida, Nicodemus procura alcançar secretamente a casa de Lázaro, em virtude da alteração popular, mas, ao lá chegar, depara com grande multidão a rodear o albergue, igualmente espe- rando dele conselho para seu proceder. Por isto ele resolve subir o Monte, a fim de se orientar com Lázaro. Mas, ao passar pelo grande portão, um guarda lhe pergunta qual seu intento, e se sabia dar ex- plicação do fenômeno singular.
Nicodemus, amável, lhe responde: “Eis o motivo por que estou à procura de meu amigo, que nesta época é geralmente encon- trado no grande albergue do Monte. Muito entendido em tais as- suntos, por certo me poderá prestar informações precisas. De qual- quer modo, posso afiançar-te, como decano de Jerusalém, ter essa aparição algo de bom para os bons, e prejuízo para os maus. Por isto tem calma, pois nada de mau sucedera a nós ambos!”
O guarda agradece pelas palavras confortadoras e Nicodemus sobe o Monte e se admira de encontrar grande número de pessoas alegres e satisfeitas com a visão do fenômeno. Entrementes, viro-Me para Lázaro: “Ouve, teu amigo Nicodemus vem aí tomado de pavor,
para consultar-te. Recebe-o, e Eu te inspirarei o que deves dizer, mas não Me denuncies!”
De longe, Nicodemus avista o amigo e lhe diz: “Perdoa-me eu te visitar a essas horas; por certo compreenderás qual o motivo! A confusão na cidade é total; eu mesmo fiquei quase uma hora no Alto Conselho e fui assediado por todos os lados! Falei-lhes às claras, sem conseguir grande efeito! Que se pode fazer? Nada se arranja com os sacerdotes do Templo. Se tiveres tempo, poderias me informar se em tuas viagens pela Pérsia e Arábia viste coisa semelhante. E em caso afirmativo — quais foram as consequências?”
Diz Lázaro: “Não permitas que esse fenômeno maravilhoso venha a produzir um peso em teu coração; pois ele não é portador de efeitos prejudiciais para os que mantêm fé e fidelidade para com Deus, respeitando Suas Leis! Aos apóstatas, representa boa advertên- cia e prova continuar Jehovah Vivo e Poderoso, podendo castigar os pecadores quando quiser. Sob este ponto de vista, a aparição nada tem de temerosa! Vê essa multidão que assim a considera, e sua ati- tude de calma e coragem provam o que digo.”
Responde Nicodemus: “Sim, tens razão e muito confortaste o meu coração; entretanto, nada me disseste se em tuas viagens ob- servaste coisa semelhante!”
Diz Lázaro: “Nunca! Já vi determinados fenômenos, tanto de dia quanto à noite, que à primeira vez tonteiam; de acordo com a repetição, perdem sua impressão especial. O daqui assustaria os árabes mais corajosos; jamais foi vista coisa idêntica, a não ser por um profeta em êxtase, conforme consta de Kenan, Henoch, Moysés, Elias e Daniel. Mas com olhos físicos, jamais. Presumo que o fenô- meno se transformará dentro em pouco.”
Diz Nicodemus: “Achas, realmente?” Responde Lázaro: “Claro, pois conforme as colunas estão aumentando, não ficarão até o desaparecimento!” Opõe Nicodemus: “Então o alvoroço será tre- mendo! Que será de tuas irmãs? Certamente sucumbirão de pavor, assim como a minha família!”
Diz Lázaro: “Não te preocupes! O Senhor não permite que os Seus sucumbam, sejam os acontecimentos quais forem. Tudo que acontece reverte em benefício e salvação das criaturas.”
NICODEMUSEMPALESTRACOM LÁZARO
Diz Nicodemus: “Tens razão, meu amigo; quem confia no Pai nada de prejudicial passa, não obstante às vezes não possamos registrar cuidado especial por parte Dele no tocante às provações. Isto já ocorreu comigo por várias vezes, de sorte que durante fenô- menos sou qual criança temerosa do fogo, porque o conhece por ex- periência. Certa feita fui atingido por um raio que me fez perder os sentidos, deixando dores consideráveis no meu corpo. Noutra oca- sião, fui apanhado por um tufão que me suspendeu a vários metros para depois atirar-me por terra. Por duas vezes naveguei entre vida e morte no Mar Galileu durante cinco horas, e noutra oportunidade, minha mula mansa e adestrada desandou a correr até cair desfaleci- da, e isto porque se assustara com forte temporal.
Esses e outros acidentes me atingiram como efeito de fenô- menos naturais, de sorte que sou tomado de medo quando vejo algo de extraordinário. O mesmo acontece agora, quando as doze colu- nas descomunais de fogo ameaçam destruir a Terra. Tenho fé em Deus, confio Nele e em Sua Proteção, mas não tinha vontade de estar perto do fenômeno.”
Diz Lázaro, inspirado por Mim: “Podes estar certo de que ninguém na zona do Euphrates levará prejuízo. Mas presta atenção: as dez colunas começam a se juntar, enquanto as laterais continuam imutáveis! Neste momento se congregam duas a duas, de sorte a formarem apenas cinco, sem que isto altere sua luz!”
Conjectura Nicodemus: “Essa estranha modificação parece dirigida por um ser inteligente, pois de modo geral costumam tais fenômenos movimentar-se sem orientação. Basta lembrar as forma- ções de nuvens e o projetar sem nexo dos raios. Aqui se poderia acre- ditar tratar-se de magia essênica; essas pessoas têm suas organizações
espalhadas por toda Ásia e dispõem de grandes invenções. Olha só! Agora as cinco também se unem rapidamente, tornando-se uma só! Será motivo de desespero para os templários!”
Diz Lázaro: “Qual nada; muitos começam a responsabilizar magos hindus em virtude do planejamento ordenado do fenômeno.”
Indaga Nicodemus: “Qual teu parecer a respeito? Se bem que poderia ser produção mágica, também poderia se basear na Vontade de Jehovah, como advertência para os judeus ou algum outro pla- no oculto!”
Diz Lázaro: “A quem te referes?”
Responde o amigo: “Ao Salvador milagroso de Nazareth! Se- gundo me parece, Ele esteve por duas vezes no Templo onde proferiu umas boas verdades, a ponto de os fariseus O quererem apedrejar. Ele então Se afastou e talvez não esteja longe do local da aparição. Infelizmente não tive oportunidade de procurá-Lo desta vez, pois sabes das intenções do sinédrio. Mas não importa. Acredito Nele e em Sua Missão, entretanto não posso externar-me em Jerusalém. Que me dizes?”
Responde Lázaro: “Não compreendo teu medo de pronunciá-Lo como Messias, quando isto é tua convicção. Se for o Messias Anunciado pelos profetas, é evidentemente Jehovah em Pessoa. Qual seria o poder do mundo contra Ele? Porventura não poderia dizimá-lo com um simples hálito, tão logo se Lhe esgotas- se a Paciência? Compreendo teres tu, pela primeira vez, procurado contato durante a noite; desde então, aqui esteve seguidamente, sem que Dele te achegasses, nem de dia, nem de noite. Serás desculpado, caso não acredites convictamente ser Ele o Messias Verdadeiro, e podes remediar tua falta!”
Diz Nicodemus: “Tens toda razão; mas que fazer quando se é membro do Templo e não há meios para impedir os seus abusos?! Muitas vezes sou forçado a uivar com os lobos e desviá-los das ove- lhas, para que não sejam estraçalhadas. Por isto não me foi possível ocupar-me do Messias como Ele merece, assim como, há quase dois anos, também não pude procurar-te como amigo a toda prova. O
profeta João Baptista e o Salvador de Nazareth muito preocupam o Templo, e medidas definitivas para seu aniquilamento são tomadas quase todas as semanas, pelo Alto Conselho convocado para tal fim. Até hoje não surtiram efeito devido à crença popular no grande pro- feta e no próprio Messias.
O mais estranho é a forte influência exercida nos romanos, que não lhe impõem restrições na divulgação de Sua Doutrina. Para mim isto representa prova insofismável da genuinidade de Sua Missão. Não me poderias dizer o Seu paradeiro, pois teria ensejo de procurá-Lo?”
Diz Lázaro: “Amigo, observa as três colunas de fogo; as la- terais começam a se movimentar; e, neste instante, a da zona Sul se uniu à do Centro. A outra parou, vendo-se apenas duas, de luz tão forte como as anteriores. Não posso imaginar a luz do dia mais forte que esta; apenas o firmamento é mais escuro e no Poente veem-se algumas estrelas maiores. Vê o movimento na cidade! Os morado- res subiram nos próprios telhados, para observar o fenômeno! Eis que a outra coluna se juntou à maior, restando apenas esta!” Diz Nicodemus: “Que acontecerá agora?”
NICODEMUSDIANTEDO SENHOR
Nem bem Nicodemus acaba de falar, a última coluna se eleva do solo e sobe tão rapidamente, que dentro em poucos minutos de- saparece, fazendo-se noite escura. Ele então diz: “Está vendo? Onde ficou a aparição e qual sua finalidade? Foi evidentemente permitida por Deus, pois não existe poder humano capaz de fazê-la surgir das profundezas. Ó sapiência humana, és tão frágil e inexperiente qual criança recém-nascida. Que me dizes, Lázaro? Se foi um aviso de Deus, temos que aguardar fatos incomuns; como emanação de ele- mentos do ar e da terra, nada de bom nos espera!”
Diz Lázaro: “Sei tanto quanto o amigo! Mas deixemos isto! Observa a grande multidão atrás das tendas; lá haverá certamente al- guns mais entendidos no assunto! Vem comigo, que te apresentarei à pessoa indicada!”
Diz Nicodemus: “Se ao menos pudesse passar despercebido, a fim de não ser denunciado no Templo!”
Diz Lázaro: “Não há motivos para preocupação. Quem está em minha companhia é inimigo do sinédrio, por ter encontrado templo melhor!” Só então Nicodemus resolve acompanhá-lo. Ao Me ver, para assustado, pois não esperava encontrar-Me aí.
Adianto-Me e lhe estendo a Mão, dizendo: “Por que te assustas como se fosse Eu um fantasma?! Pretendias seguir-Me tão logo che- gasses a saber o Meu paradeiro! Acaso não estás satisfeito com isto?”
Responde ele: “Certamente, Senhor; todavia, és o Santo de Deus, e eu pecador do Templo! Isto oprime o meu coração e me tira a coragem para falar-Te!”
Digo Eu: “Caso te demonstre um pecado, podes pedir-Me perdão! Não havendo motivo para tal, podes falar sem receio. Qual teu parecer acerca do fenômeno, pelo qual os templários estão discutindo?”
Diz Nicodemus: “Foi algo inédito desde o começo do mun- do. Naturalmente sabes melhor do que nós a sua significação, por isto desejo perguntar-Te. Segundo me parece, podes ter sido a causa, pois há um ano atrás deu-se fato semelhante em Cesareia durante Tua Presença, ocasionando o incêndio daquela cidade; mas Tu Te encontrando aqui, não há motivo para temores. Todavia, deve haver explicação e ninguém melhor do que Tu poderia dá-la.”
Digo Eu: “Foi Minha Vontade, portanto Minha Obra; pos- teriormente teremos tempo para conjecturas. Não te alteres, pois aquele fenômeno não foi o último a se apresentar nesta noite. Só depois surgirá a explicação. Erguei vossos olhos para verdes o quadro que se segue!”
APARIÇÃODEJERUSALÉM,ANTIGAE NOVA
Ao assim pronunciar, todos veem o Céu tingido de púrpura e, em solo incandescente, a cidade de Jerusalém, sitiada por solda- dos romanos, e dos portais flui sangue. Logo em seguida, ela está
em chamas e grossa fumaça envolve o horizonte. Súbito, não se vê mais a metrópole, e sim um montão de escombros. Esses também desaparecem no final, vislumbrando-se um deserto onde hordas sel- vagens procuram edificar. Em seguida, some a aparição e de Jeru- salém ouvem-se gritos de pavor, e Nicodemus opina ter irrompido uma revolta.
Eu o acalmo dizendo: “Ainda não; mas daqui a quarenta e cinco anos dar-se-á tal fato no país e aquela cidade será arrasada por não querer aceitar a Graça do Alto. Esperemos o final, depois voltaremos a casa!”
Novamente todos observam o firmamento, onde a coluna luminosa vem descendo à terra, porém do lado oposto, quer dizer, no Oeste e com claridade ainda mais intensa. Divide-se em inú- meras partes, as quais formam uma cidade enorme, cujas muralhas consistem em doze espécies de pedras preciosas, emanando brilho multicor por todos os lados. Tem ela igualmente doze portais, por onde afluem inúmeras criaturas de todos os pontos do orbe.
Acima da cidade, no ar, vê-se a seguinte inscrição em he- braico antigo, como se fora feita de rubis e esmeraldas: “Eis a Nova Cidade de Deus, a Nova Jerusalém que descerá um dia, dos Céus, para os homens de corações puros e de boa vontade; lá habitarão com o Senhor para sempre e louvarão o Seu Nome.” Tanto a apari- ção quanto a inscrição celeste são vistas somente por aqueles que se acham Comigo no Monte.
Após terem expressado seu júbilo e querendo adorar-Me, a aparição some e Eu aconselho a todos a adorarem a Deus no silên- cio de seus corações, e não em palavras retumbantes quais fariseus, pois não tinham valor para Ele. Eles então silenciam e se entregam a meditações.
Depois de algum tempo prossigo: “Chegou a meia-noite; vamos entrar para tomar algum pão e vinho. Em seguida darei a explicação de tudo.” Após isto feito, Nicodemus analisa os diversos hóspedes no refeitório e percebe os sete templários em companhia dos traficantes de escravos, e diz, algo encabulado: “Senhor, vejo
sacerdotes do Templo àquela mesa e temo sua denúncia! Como che- garam aqui?”
Digo Eu: “Quem está Comigo não tem mais ligação com o Templo. Se bem que foram enviados por ele a fim de Me obser- varem, disfarçados — reconheceram a Verdade e abandonaram o sinédrio. Dentro de alguns dias partirão para Roma em companhia de outros, e lá serão tratados; por isto não há motivo para receios.”
Diz Nicodemus: “Senhor e Mestre, prometeste esclarecer-
-nos o fenômeno e tomo a liberdade de lembrar-Te!”
Digo Eu: “Assim farei, mas que ninguém prossiga com in- dagações quando tiver terminado, e cada um procure meditar em benefício de sua alma!”
OSENHOREXPLICAOFENÔMENO LUMINOSO
(O Senhor): “As doze colunas de fogo a Leste representam realmente as doze tribos de Israel e o tronco do centro foi Judá, os laterais, Benjamin e Levi. Através dos vários acontecimentos os doze se juntaram ao de Judá, e este é representado por Mim, pois vim para unificá-los em Mim como único tronco verdadeiro de Judá, para torná-los unos, assim como Eu e o Pai no Céu somos Um Só, desde eternidades.
As sete colunas são os sete Espíritos de Deus, que ao se redu- zirem a três, representam em Benjamin, o Filho; em Levi, o Espírito, e em Judá, o Pai. E vede: Pai, Filho e Espírito Santo se tornaram Um, sempre o foram e sempre serão Um Só. Este Um sou Eu Mes- mo, e quem ouvir o Meu Verbo e o aplicar estará Comigo e dentro de Mim. Subirá ao Céu como Eu, e terá a Vida Eterna em Mim. Eis em resumo a significação verdadeira da primeira aparição.
Quanto à segunda, demonstrou o excesso dos pecados hor- rendos desse povo, que muito embora na claridade do Dia surgido entre ele, prefere caminhar em trevas — e assim fará. Por isto, colhe- rá os frutos de suas ações na época por Mim mencionada, quer dizer, daqui a quarenta ou cinquenta anos; então terá chegado o fim desse
povo para todo sempre. Digo-vos: Céu e Terra desaparecerão e se tornarão ocos e rotos quais vestes antigas, Minhas Palavras, porém, cumprir-se-ão para sempre!
Eu Sou o Senhor! Quem se atreverá a discutir Comigo e enfrentar-Me com lanças e espadas?! Até isto farão, e Meu Corpo perecerá na Cruz. Precisamente tal crime completará sua medida e selará seu extermínio. A ignorância pretende dominar e matar Deus. Isto será feito dentro em breve, e tal ato criminoso será permitido para positivar um final para todo sempre. Mas aquilo que para o povo será motivo de aniquilamento reverterá para a salvação e con- quista plena da Vida Eterna.
Não vos impressioneis com esta revelação; pois aquela raça poderá matar o Meu Físico, mas não Aquele que em Mim vive, age, cria e ordena eternamente. Não deixarei o Meu Corpo dentro da tumba, pois será despertado no terceiro dia e assim privarei, até o fim dos tempos, com aqueles que acreditarem em Mim, Me ama- rem e cumprirem o Meu Verbo. E vós, Meus irmãos, podereis ver e falar-Me como agora, onde caminho na Carne não transfigurada.
Refletindo a respeito, concluireis ter a segunda aparição mo- tivo importante. Que nenhum de vós diga: Senhor, poderias modifi- cá-la através de Tua Onipotência!, pois vos afirmo que estou fazendo o máximo, demonstrado pela Minha Sabedoria eterna e divina; en- tretanto, de nada adianta ao povo pervertido. Ele é tão teimoso pela própria maldade inacreditável, não havendo Poder Divino que o salve.
Pensais que Deus possa tudo o que simplesmente quiser! Não resta dúvida. Todavia, não pode agir pela Onipotência, em virtude do livre arbítrio humano; pois se o enfrentasse com o menor impe- dimento, o homem se tornaria boneco dirigido pela Vontade Divina e jamais chegaria a uma determinação própria. Neste caso, não have- ria bem-aventurança para a alma.
Precisa o homem estar de posse de sua plena liberdade que lhe trará vantagem por leis externas e obediência individual, no que a Onipotência Divina nada pode influir, e por isto terá que permitir tudo que deseja, inclusive o assassínio de Minha Carne inocente.
E como as criaturas de Jerusalém derrogaram a Lei Divina suplantando-a pelas instituições provindas de seus interesses mun- danos — contrários às que dei a Moysés e aos profetas — e Eu testificando sua injustiça contra Deus e aos homens, odeiam-Me e querem Me matar a qualquer preço. Ser-lhes-á permitido; com isto a medida de seus crimes estará completa, dando-se com o povo o que vistes na segunda aparição.”
Conjectura Nicodemus: “Senhor e Mestre, creio que os fe- nômenos tenham despertado a consciência dos templários e certa- mente terão receio de qualquer ato violento. Ouvi pessoalmente a reprimenda popular contra os sacerdotes por terem eles assassinado a maioria dos profetas, inclusive Zacharias e João! O próprio sumo sacerdote calou-se e nada disse ao povo, que exigia a devolução das oferendas, considerada como crime. Além disto, recebeu o Templo, por parte do Governo romano, uma advertência severa em virtude do jusgladii, e assim terão perdido a coragem para condenar alguém à morte sem autorização legal de Roma.”
Digo Eu: “Não o farão; entretanto, influenciarão o juiz romano de tal forma, apresentando número considerável de teste- munhas pagas contra o ‘Cordeiro’, que no final o juiz fará o que exigirem. Há muitas pessoas que acreditam em Mim e na Minha Doutrina; mas o Templo tem grande séquito, embora ignorante, com o qual tudo fará. Prova isto a enorme afluência nas festas do sinédrio. Essas peregrinações testemunham o grande número de ig- norantes na Judeia, convictos do Agrado de Deus pela obediência ao Templo. Meditando a respeito, encontrareis reduzida garantia pela Minha Vida entre os judeus.”
FUTURODOS JUDEUS
1. A palestra fora também ouvida pelos romanos, tanto que Agrícola se levanta revoltado e diz: “Senhor de Céus e Terra, caso aquela corja pleiteie algo neste sentido, Tua Onisciência nos po- derá avisar antecipadamente e saberemos como interceptar qual-
quer trama. Amanhã mesmo chamarei a atenção de Pilatos a esse respeito!”
Digo Eu: “Caro amigo, no primeiro dia de tua chegada foste testemunha de Meu Exército e Poder celestes, e seria suficiente um aceno Meu para chamar incontáveis falanges de anjos poderosos, bastando um só para destruir o Cosmos todo! Minha Vinda à Ter- ra não se baseia no seu julgamento e extermínio, mas na salvação. Assim sendo, sou obrigado a permitir o livre arbítrio dos homens, mesmo pretendendo atacar-Me; pois se agisse com o Poder dado pelo Pai, aniquilaria a vida psíquica, impossibilitando a vida eterna da alma após a morte.
As criaturas não são obrigadas a atentar contra o Meu Corpo, recebendo por isto vida eterna de sua alma, como sucederá convos- co, caso permaneçais até o fim da vida na Minha Doutrina.
Entre as pessoas mundanas a situação é diversa. São eviden- tes servos do inferno e do príncipe da mentira, achando-se na sua dependência. Acumulam pecados e atrocidades, cometem impudi- cícia, adultério e incestos, e pleiteiam, constantemente, novos acei- tadores de sua raça com promessas do Céu e da vida eterna. Tão logo alguém adira a eles, quase lhe tiram a roupa, a fim de poder o coitado comprar a felicidade celeste.
Quando conseguem açambarcar a fortuna de tal pagão ig- norante, manifestam-se com expressão hipócrita: Vê, amigo, já te encontras a meio caminho para o Céu e a Vida Eterna! Até então trabalhamos por ti; agora terás que agir pela Lei demonstrada, do contrário nossa ação e teu sacrifício não terão valor!
Deste modo assaltam um a um, sem mais se preocuparem com suas vítimas; e alguém pedindo conselho, indicam-lhe suas prédicas, caso o suplicante não esteja em condições de pagamento. Quem puder remunerar um conselho receberá, além das prédicas, orientação, geralmente mistificação perfeita.
Como esses vendilhões do Céu e da vida eterna lá não ingres- sam, porque não têm fé, não permitem que outros o façam, trancan- do o caminho com mentiras infernais.
Quem isto reconhecer pela compreensão mais lúcida e pro- curar pesquisar a Verdade será condenado imediatamente como he- rege e blasfemo, perseguido com ódio até a última gota de sangue. Foi este o motivo pelo qual mataram os profetas plenos do Espírito Santo, cujos túmulos honram aparentemente, caiando-os em deter- minados dias. Eles mesmos são semelhantes aos sepulcros caiados, externamente de bom aspecto, enquanto no interior estão cheios de podridão e mau cheiro.
Conjecturais o seguinte: Se essa corja nefasta há tanto tempo apresenta maldade tão forte, Deus poderia ter dado ponto final às suas atrocidades! Ele bem que o fez, através de julgamentos diversos, chegando ao ponto de todo o povo judaico cair na prisão babilônica durante quarenta anos, e o Templo de Salomon e grande parte da ci- dade de Jerusalém foram destruídos. Após isto, o povo penitenciou-
-se e voltou a Deus; tornou-se livre, regressando à Terra prometida, onde reconstruiu cidade e Templo, passando a viver por certo tempo dentro da Ordem. Nem bem alcançou brilho e conceito externos, não tardou em desviar-se do justo caminho, e mormente o Templo instituiu novas Leis. O povo teve de respeitá-las em vez das divinas, enquanto os sacerdotes ensinavam abertamente: Para vós é mais útil respeitardes as novas leis do que as antigas! — As advertências e provações amargas pouco frutificaram. Quando o povo, seus reis e sacerdotes não mais se lembravam de Deus Vivo, entregando-se ao aturdimento dos sentidos, Jehovah novamente enviou profetas ameaçando a invasão de inimigo poderoso que subjugaria todos os judeus, faria prisioneiros seus regentes, levando como reféns suas es- posas, filhas e animais, inclusive suas posses e joias. Em suma, tudo foi demonstrado com nitidez aos judeus, caso não desistissem de seus princípios e inclinações mundanos. O efeito foi nulo e as pro- fecias se realizaram, pois os romanos invadiram o país, tornando-se instrumento de provação.
Apresentaram leis mundanas que deviam ser respeitadas sob pena de morte. Por algum tempo o sacerdócio retornou a Deus, mas sem persistência, e dentro de trinta anos perverteu-se num antro de
salteadores e assassinos, piores que qualquer templo pagão, remo- to ou atual.
Não obstante Eu — o Senhor Encarnado — ter doutrinado no Templo tanto para fariseus como para o povo, com provas inéditas, de nada adianta, pois eles exercem sua função de mentira e fraude mais do que nunca, e tramam constantemente Meu aniquilamento. Ser-lhes-á permitido, a fim de que se complete sua medida nefasta. Em seguida, virá o grande julgamento demonstrado pela segunda vi- são, e o final dos judeus, dispersos qual folhas no mundo inteiro. Seu nome, sempre tão considerado, tornar-se-á desprezível e abjeto.
Caso tivessem aceito a época atual de grande Graça, teriam continuado o primeiro povo do Universo; não o querendo, tornar-
-se-ão o mais atrasado da Terra. Disperso entre todos os povos, serão obrigados a procurar, quais aves, seu alimento sob toda sorte de per- seguições, vendo-se obrigados à submissão de leis terrenas.
Ainda que consigam posteriormente acumular montes de dinheiro, não serão capazes de comprar qualquer país, reino ou go- verno; assim será até o fim dos Tempos desta Terra, como prova de Minha Profecia.”
DESTINOOULIVRE ARBÍTRIO
(O Senhor): “Não penseis tratar-se de predestinação confor- me explicam os filósofos mundanos, como se Deus determinasse para cada criatura o que iria passar em vida! Imaginar ou crer ta- manho absurdo pode trazer a morte da alma, por se basear numa lei, produto oculto do inferno, contraste brutal com os verdadeiros princípios da Vida de Deus para os homens. A determinação é feita por eles mesmos, através do livre arbítrio mal dirigido e por não quererem despertar em si todos os sete espíritos de vida, razão por que não chegam à concepção real de seu tesouro interno, verdadeiro e imutável. Deste modo se desviam, querendo encontrar na luz do mundo a Luz verdadeira e interna da Vida, agindo com satisfação conforme impõe aquela.
Quando uma alma se encontra na pior treva de sua pretensão orgulhosa, nem os anjos celestes poderão indicar-lhe outra direção pelo respeito ao livre arbítrio, e ninguém poderá afirmar: Tal foi o destino desse homem! — Sim, foi seu destino, mas não partiu de Deus, mas dele mesmo.
Deus o permitiu em consequência da vontade livre. E isto sucede igualmente a um povo: é e será criador de seu destino tem- poral e eterno. Seria, portanto, erro grave supor-se que Deus te- nha determinado, desde eternidades, ser necessário acontecer tudo que vos demonstrei e profetizei. De modo algum! Todavia, assim será porque os homens o querem, porquanto a parte maior e mais potente se encontra nas trevas do inferno, com prazer e insistên- cia, sem desejar abandoná-las, até mesmo à Minha Chamada po- derosíssima.
Não é possível fazer mais do que Eu fiz, faço e ainda farei, considerando o livre arbítrio humano, e quem não abrir os olhos, modificando sua atitude, não terá meios possíveis para curar sua cegueira e teimosia férrea do coração, sendo preciso um julgamento como recurso final. Para tanto, é indispensável que se complete a medida, fato que ocorrerá em breve para esse povo. Não vos aflijais, pois não sou Eu, mas os próprios homens que assim o querem!”
Manifesta-se Nicodemus: “Então, Senhor, a situação da Hu- manidade é bem precária! Se a Própria Divindade não pode socorrê-
-la contra a sua vontade — quem poderia fazê-lo?”
Digo Eu: “Meu amigo, há muita coisa terrena que escapou ao teu entendimento, muito embora dotado de teus sentidos e in- telecto — como poderás assimilar assuntos puramente espirituais, imperceptíveis?! Já expliquei não poder Deus interferir no homem pela Onipotência quanto à sua evolução espiritual, em virtude de Sua Ordem eterna. Pois se assim fizesse, o homem se tornaria apenas autômato, sem jamais chegar à independência psíquica.
Podes apresentar-Me o pior assassino, que Eu o transforma- ria num anjo de Luz — seu ‘ego’ estará entrementes sem vida! Tão logo Eu Me retraísse com o Espírito da Vontade Onipotente, seria
ele o mesmo que dantes: sua inclinação, ou seja, seu amor, é assaltar e matar; quando lhe for tirada, sua alma deixará de existir.
Todavia, pode tal homem melhorar pela própria situação in- feliz, na qual seu amor nefasto o atirou. A alma só começa a refletir acerca de sua situação malograda quando o julgamento a atinge de modo direto; desde que reconheça a razão de tudo, perceberá igual- mente o desejo de se livrar do estado perverso, procurando cami- nhos e meios apropriados. Com este desejo e vontade, ela se capacita a aceitar um esclarecimento do Alto, ofertado de modos diversos.
Tão logo assim aja, seu amor anteriormente maldoso vai se modificando e melhorando. Recebe cada vez mais compreensão, passando gradativamente a estado mais elevado — mas somente através da permissão de castigo inclemente. Por isto virá para os judeus um julgamento tremendo quando sua medida estiver com- pleta, humilhando-os para todo sempre, em virtude de jamais che- garem ao domínio de sua raça.”
AMEDIDADOBEMEDO MAL
Diz Nicodemus: “Senhor e Mestre, por que só pode advir julgamento tão inclemente após completa a medida dos pecados de um povo? Que medida vem a ser essa?”
Digo Eu: “É algo estranho que tu, decano do Templo e da cidade, não o entendas, entretanto leste repetidamente os sá- bios ditames de Salomon! Quando a criança atingiu a justa me- dida no ventre materno, chegou o momento de nascer. O fruto de uma árvore atinge esse ponto ao amadurecer, caindo ao chão. O conhecedor da Lei, cumprindo-a e não mais a infringindo por amor a Deus e ao próximo, terá completado a medida luminosa do próprio aperfeiçoamento da vida, tornando-se cidadão do Céu na Terra, por ter vencido a morte espiritual através da conquista da Vida Eterna de Deus.
O homem que jamais se deu ao trabalho de se aprofundar nas Leis Divinas, por ser atraído pelas alegrias do mundo, atirando-
-se a elas, começa a esquecer Deus, apagando-se pouco a pouco sua fé Nele. Nessa situação, os pais se tornam importunos a ele. Não só desobedece-lhes, mas causa-lhes toda sorte de aborrecimentos e no fim é capaz de bater-lhes, roubar e abandoná-los. Seu desprezo aos genitores se estende aos semelhantes. Leva vida devassa, torna-se ladrão, assaltante e criminoso, a fim de se suprir de recursos neces- sários à expansão de seus apetites. Deste modo, ter-se-á livrado de todas as Leis da Vida, considerando apenas as de sua natureza má e pervertida pelo pecado, contra a Lei total. A medida, então, estará completa; é um demônio que atraiu o julgamento e único responsá- vel pelo sofrimento atroz que o atinge.
O fato de o julgamento acompanhar a medida completa dos pecados, ou seja, a própria morte espiritual, foi desde Eternidades determinado por Deus para todo o sempre; pois se assim não fora, não haveria fogo, água, orbe, Sol, Lua e criaturas.
O fogo não deixa de ser elemento prejudicial, podendo matar-te. Acaso não deveria existir pelo efeito mortal? A Terra exerce certa atração, pela qual todos os corpos se tornam pesa- dos, sendo constantemente atraídos ao ponto central! Em virtude disto, dá-se a queda e a possível morte! Porventura o planeta não deveria ter essa peculiaridade pelo motivo acima?! Nesse caso, sua situação seria insustentável pela desintegração mais completa que o derretimento de um pedaço de gelo ao Sol, e as criaturas estariam liquidadas. Tal faculdade necessária da Terra e de sua matéria é igualmente julgamento provindo de Deus, sem o qual não existiria matéria!
Assim sendo, tudo que vês no mundo é julgamento determi- nado pela Divindade e quem se afasta de Deus e do espírito, incli- nando sua alma à matéria, só pode ser atingido pelo julgamento e morte. A liberdade e ausência de julgamento só existem no Espírito puro de Deus, alcançável por todos que vivem pela Doutrina, acre- ditando ter Eu vindo por Deus à Terra, como Próprio Deus, a fim de dar a todas as criaturas a Vida Eterna e a Sua Luz. Pois Eu Mesmo sou a Verdade, a Luz, o Caminho e a Vida. Entendeste?”
Diz Nicodemus: “Senhor e Mestre, sim, e Te agradeço pela importante definição. Como explicaste apenas dois fenômenos, peço-Te definires o terceiro, certamente de profundo sentido.”
Digo Eu: “Sim, fá-lo-ei; entretanto, não o entendereis, pois o que está para vir em futuro distante só podereis assimilar quando renascidos em espírito. Assim mesmo, ouvi-Me!
A Coluna luminosa que voltava do Céu à Terra sou Eu, no Espírito do Meu Verbo Vivo, que por Mim será depositado no futu- ro nos corações dos que Me amam e cumprem Meus Mandamentos; procurá-los-ei Pessoalmente para Me revelar a eles. Deste modo, to- dos serão ensinados por Deus.
A divisão da coluna em inúmeras partes significa a revela- ção no sentido intrínseco e espiritual de todas as Minhas Palavras e Ensinos, que desde o começo da Humanidade foram dadas pelos patriarcas, profetas e missionários e atualmente por Mim Mesmo.
De tais revelações detalhadas no sentido espiritual da Palavra de Deus, então, se formará uma Doutrina colossal e verdadeira de Luz e Vida, ou seja, a grande e nova Jerusalém que descerá dos Céus junto dos homens! Os que se encontrarem e viverem na Doutrina nova caminharão na Nova Jerusalém, onde habitarão eternamente e suas alegrias não terão medida nem fim. Pois Eu Mesmo estarei com eles e lhes facultarei a visão de inúmeras maravilhas do Meu Amor, Sabedoria e Onipotência.
Entre o desaparecimento dessa velha cidade de Jerusalém e o surgimento da Nova, de Deus, na Terra haverá pouca Luz entre os homens; pois em breve surgirá quantidade de falsos profetas e sacer- dotes usando Meu Nome para operar falsos milagres, fascinando e cegando as criaturas. O próprio anticristo fará tais coisas com ajuda de regentes, a tal ponto que levaria os Meus escolhidos a se ajoelha- rem diante do novo Baal caso Eu o permitisse. Então deixarei que se dê enorme atribulação entre os homens, como jamais houve sob o Sol. Baal será destronado com a grande prostituta de Babel e a Luz
do Verbo Vivo se infiltrará nos corações de muitos, soerguendo e libertando os oprimidos e cansados, e todos se alegrarão e louvarão o Meu Nome.
Em tal época haverá seguido intercâmbio com os espíritos puros de Meus Céus, tornando-se seus doutrinadores orientados em todos os segredos da Vida Eterna, conforme demonstrou o terceiro fenômeno, pela entrada e saída de inúmeras criaturas através das doze torres.
As doze torres não indicam ser a nova cidade erigida dos doze troncos de Israel, e sim dos doze axiomas de Minha Doutrina, con- tidos nos dez Mandamentos de Moysés, inclusive os dois, de Amor. Eis as torres pelas quais, no futuro, as criaturas entrarão na Nova Cidade de Deus, cheia de Luz e Vida.
Somente quem cumprir os Meus Mandamentos lá será ad- mitido para receber Luz e Vida; assim também demonstram as doze espécies de pedras preciosas, com as quais é feita a muralha que circula a grande cidade, os Mandamentos enunciados.
São eles não somente os portais à Luz e Vida, mas igual- mente seu escudo e proteção que as portas e forças do inferno, ou seja, o mundanismo material, jamais poderão destruir ou vencer.
Junto do fenômeno percebestes a forte irradiação de luz multicor, provinda das pedras cravejadas na muralha; indicam con- ter os dez Mandamentos todos os graus da Sabedoria Divina, alcan- çável apenas pelo cumprimento dos mesmos. Pois os Mandamentos contêm toda Sabedoria de Deus; assim sendo são portadores do Po- der e das Forças Divinas, manifestados na Vontade sábia e onipoten- te e na máxima verdade.
Quem, portanto, tiver se apossado da Vontade de Deus pelo cumprimento dos Mandamentos será detentor da força e liber- dade divinas, alcançando o estado de verdadeiro renascimento do espírito: filho verdadeiro de Deus, tão perfeito como o Pai Celeste.
Por isto digo a todos: tratai antes de mais nada do fiel cum- primento dos Mandamentos, para alcançardes a Perfeição do Pai Celeste, capacitando-vos a realizar coisas mais grandiosas do que
Eu. Tão logo tiverdes atingido esse estado, sereis habitantes anteci- pados da Nova Jerusalém. Eis o sentido do terceiro fenômeno. Tereis compreendido tudo?” Algo perplexos pela Minha Explicação, todos meditam sem chegarem à certeza da compreensão total.
O JUSTO CONHECIMENTO DA SABEDORIA DIVINAATRAVÉSDO RENASCIMENTO
Após profunda meditação, Nicodemus se expressa: “Senhor e Mestre, sumamente elevada e profunda é Tua explanação e jamais poderei externar a devida gratidão; justamente pelo teor sublime, eu e talvez outros não tenhamos compreendido o sentido intrínseco. Ao mesmo tempo percebo não poder penetrar mais além, ainda que recebesse outra explicação, de sorte que nada mais Te peço!”
Digo Eu: “Estás inteiramente certo; tudo isso e ainda outros pontos doutrinários assimilareis somente quando renascidos. Meu Verbo e Minhas Prédicas não podem ser dados dentro da retórica intelectual do mundo, porquanto se baseiam no comprovante do poder do espírito, inteiramente desconhecido de vós, a fim de que vossa fé e futuro saber não se firmem na sapiência de homens espi- ritualmente cegos, e sim na maravilhosa força do Espírito de Deus.
Meu modo de ensino e doutrinação se apresenta aos olhos dos sábios do mundo qual tolice, ignorantes que são do espírito e de sua força, despercebidos pelos sentidos materiais. Todavia, é Minha Doutrina de saber a mais profunda e elevada — mas apenas diante de olhos, ouvidos e corações de criaturas perfeitas, dotadas de boa vontade, cumprindo sempre os Mandamentos de Deus. Para os sábios e importantes deste mundo, que desaparecem com sua sapi- ência, Minha Doutrina não tem tal efeito.
Falo-vos da Sabedoria oculta de Deus, por Ele determinada para vossa eterna glória de vida antes da Criação do mundo mate- rial, Sabedoria esta jamais reconhecida por fariseus, decanos, escri- bas e reitores do Templo dentro de seu raciocínio mundano; pois se
isto tivessem feito, não estariam conjecturando constantemente os meios de matar-Me, Senhor da Eternidade.
Quanto a vós, afirmo como consta: Jamais alguém viu, sentiu e ouviu o que Deus proporciona aos que O amam e cumprem Seus Mandamentos! O que ora vos revelo é Revelação do Espírito Divino dada ao vosso espírito, para poder penetrar e assimilar os segredos de Deus, pois somente o espírito abarca e pesquisa todas as coisas, e assim purificado o faz com as profundezas de Deus. Deste modo, não recebeis de Mim a Luz do mundo, inteiramente desnecessária, e sim o Espírito de Deus, para poderdes assimilar e compreender o que por Mim recebestes de Deus.
Por tal motivo não vos posso falar à maneira intelectual do mundo, mas somente com palavras transmitidas pelo Espírito Di- vino, que ordena espiritualmente todas as coisas; não Me compre- endeis por não ter o vosso espírito penetrado a vossa alma. Quando ela se encontrar no Espírito Divino, com todo amor e boa vontade, também conseguireis julgar tudo pelo espírito, e o que ora vos pare- ce difícil e incompreensível se tonará claro e límpido.
Já percebeis algo do eterno e verdadeiro Espírito de Deus, podendo interpretar espiritualmente certas coisas. O homem mate- rialista nada sente da centelha divina em seu íntimo, e quando se lhe fala a respeito, classifica de tolice, pois lhe falta a visão espiritual da alma. Se alguém quiser assimilar e compreender fatores espirituais, sua alma terá que ser equilibrada pelo espírito; pois toda vida, toda luz e força verdadeiras só residem no espírito que tudo ordena, ja- mais podendo ser desequilibrado.
O homem natural, materialista, é ainda matéria em julga- mento e sua vida física lhe foi dada pelo Espírito Divino como meio para despertar a vida verdadeira e espiritual, tão logo o queira. Assim ele pode, pelo raciocínio natural, conceber os Mandamentos como divinos e empregar a vontade na sua aplicação. Agindo deste modo, o Espírito Divino penetra sua alma à medida do progresso na fé em Deus e no amor para com Ele e seu próximo.
Tão logo a alma consiga certa força, jamais atingível por al- guma derrota, prova irrefutavelmente ter sido penetrada pelo Espí- rito de Deus, organizando todo seu conhecimento e saber; ela terá deste modo vencido sua matéria anteriormente morta, unindo-se a Deus num só espírito, força, luz e vida verdadeiras, jamais alteráveis.
Por isto procurai antes de tudo o verdadeiro Reino de Deus e Sua Justiça, que todo o resto vos será dado como acréscimo pelo Espírito de Deus em vós. Não vos preocupeis das coisas terrenas, nem mesmo dos alimentos do dia de amanhã e de vossas roupas; tal é hábito dos pagãos e outras criaturas mundanas, que jamais desco- briram Deus Verdadeiro. Basta o espírito ter alcançado seu pleno renascimento, e todas as vossas necessidades serão supridas.
Se caminhardes em Meu Rastro conforme vos ensinei, es- tareis em Mim e Meu Espírito em vós, e com Ele sereis capazes de fazer tudo o que Sua Sabedoria disser e Sua Vontade determinar. Assim tereis recebido o suprimento total para vossos dias na Terra.
Estais orientados das possibilidades do espírito; as capa- cidades do Meu são idênticas ao vosso, quando se tiver unificado Comigo. Já vos demonstrei por diversas vezes como isto é possível, portanto agi de acordo que vereis cumprir-se Minha Promessa! — Como já passaram algumas horas da meia-noite, descansemos para amanhã encetar nova tarefa!”
Diz Lázaro: “Senhor, será difícil arranjarmos leitos para tan- tas pessoas!” Respondo Eu: “Para quê? Cada um fique onde está, apoie-se nos braços — é quanto basta!” Nicodemus, com receio de ser visto pelos fariseus, faz menção de voltar para casa.
Digo-lhe, pois: “Não temas os que nada te podem fazer! Eu o querendo e tu acreditando, podes deixar este monte em pleno dia, imperceptivelmente, para reassumires o teu posto.” Diz ele: “Neste caso, fico; pois minha família me supõe no Templo.” Em seguida todos silenciam, entregando-se ao repouso. Entrementes, Raphael procura os escravos a um aceno Meu, acomoda-os igualmente e lhes proporciona sonhos agradáveis; pois é fato comum aos nórdicos te-
rem sonhos proféticos, fazendo-os pacientes, dóceis e alegres. Assim cada um recebe o que merece.
A NATUREZA DOS ANJOS. AMOR E SABEDORIA,CORAÇÃOE INTELECTO
Ainda nos encontrávamos dormindo quando o Sol despon- ta no horizonte. Solícitos, Lázaro e o hospedeiro se levantam para despertar os empregados a fim de tratarem do desjejum, enquanto nos dirigimos ao ar livre. Diante da casa há um poço d’água boa e fresca. Virando-Me para Lázaro, digo: “Manda encher algumas bilhas d’água para lavarmos as mãos, evitando aborrecimentos para Nicodemus, porquanto se poderia alegar comermos o pão sem o de- vido preparo!” Em seguida todos lavam mãos, rosto e pés, recebendo toalhas limpas para se enxugarem.
Nisto se aproxima Raphael e orienta Lázaro estarem os jovens ainda adormecidos e entregues a sonhos, não convindo despertá-
-los tão cedo, pois tinham que se refazer do cansaço provindo da longa viagem.
À luz do dia percebe Nicodemus a beleza radiante do arcan- jo, e não consegue despregar os olhos do mesmo. Após certo tempo de êxtase profundo, ele diz: “Senhor e Mestre, qual a origem deste jovem incrivelmente belo? Nunca vi tanta beleza, masculina e fe- minina a um só tempo. Os cabelos louros e anelados a caírem pela nuca, de brancura etérea! A candura de sua fisionomia; os braços perfeitos! Em suma, não pode ser filho da Terra, e se tivesse um par de asas, seria verdadeiro anjo celeste!”
Digo Eu: “Julgas ser preciso terem eles asas a fim de fazer jus à sua idoneidade? Acaso os três homens que falaram a Abraham tinham asas? Ou os outros que salvaram Lot e o que conduziu o jovem Tobias? Não me consta haver na Escritura menção de suas asas, inclusive nada disto se fala do anjo que impediu Abraham a sacrificar seu filho Isaac.
Somente os dois querubins foram por Moysés representados com asas, para apontar aos judeus sensuais ser a movimentação dos espíritos puros mui rápida no pensar, resolver, agir e concretizar. Para o homem daquela época, não havia velocidade maior que a dos pássaros, razão por que Deus mandou que Moysés desse asas aos querubins. Fora disto, nunca tiveram asas.
Elas representam simplesmente o alto grau de sabedoria e força do puro espírito, e além disto nunca houve no verdadeiro Céu anjo que não tivesse sido homem em qualquer planeta. Tudo o que imaginais como anjos puros nada mais é senão forças e poderes de Deus pelos quais se manifesta a Onipotência Divina em todo o Infi- nito, mas que não pode ser imaginada em figura, porque o Infinito de Deus não pode ser simbolizado por qualquer criatura limitada.
Como todas se destinam psiquicamente a se tornarem ver- dadeiros anjos celestes, este jovem lindo e casto pode estar na Ter- ra sem asas, assim como Eu Me encontro Encarnado, embora Se- nhor de Céus e Terra, entretanto mantenho o Universo. Além de tudo, consta: Em tal época vereis os anjos destinados a servirem a Deus descerem e subirem. Assim sendo, ele pode ser um anjo. Qual tua opinião?”
Diz Nicodemus: “Sim, é evidentemente belo, mas não desce nem sobe entre Céu e Terra!”
Respondo Eu: “Oh, cegueira humana! Como podes supor, sendo homem experimentado, a descida de anjos do Céu físico à Terra, e vice-versa, para a visão de todos? O descer e subir dos anjos representa apenas a subida do amor à verdadeira sabedoria, e a volta desta ao amor, espírito verdadeiro e vivo em Deus.
Quando a criatura desperta no coração o amor a Deus e ao próximo, ela ascende à sabedoria, ou seja, ao conhecimento justo e profundo de todas as coisas. Em tal estado torna-se cheia de hu- mildade e amor vívido para com Deus, voltando ao coração, que se aclara e incendeia cada vez mais no amor divino.
No teu íntimo indagas: Então esta Terra representa o amor e o Céu a sabedoria? Como é possível, quando a maldade nela impera?
Sim, no coração humano impera a falta de amor, entretanto é ele o local do mesmo. O puro amor no coração, isoladamente, traria tão poucos frutos quanto a Terra sem a luz do Sol. O Sol ce- leste para o coração é o intelecto. Ele desce em pensamentos, ideias, conceitos bons e ordenados ao coração, ou seja, à Terra do homem, ilumina e vivifica os gérmens para ações boas e dignas. A luz do in- telecto sendo ainda fraca, qual claridade solar no inverno, o coração não deixa de se tornar mais compreensivo e prudente; mas como persiste no amor próprio, as sementes não germinam, nem crescem e nem podem amadurecer frutos de atividade plena. Se, porém, a inteligência se aperfeiçoa pelo zelo e bom emprego de talentos e capacidades, o calor vivo no coração é ativado, fazendo germinar, crescer, florescer e finalmente as sementes apresentarão frutos de ati- vidade espiritual, para uma abundante colheita de vida.
Assim sendo, deve-se entender na expressão ‘anjo’ pensa- mentos, ideias e conceitos do intelecto iluminado, o céu do saber em miniatura. Descem e sobem servindo ao espírito divino ainda oculto no coração, cujo nome é amor para com Deus e para com o próximo. O fato de o espírito vivo de Deus no coração não ser nota- do e considerado por muitos, não obstante depender dele a salvação temporal e eterna — repete-se Comigo, Senhor e Causa Primária de todo ser e vida, não sendo reconhecido pela Humanidade, muito embora veja descer e subir dos Céus pensamentos, ideias e conceitos grandiosos, iluminando o coração para aquecê-lo e vivificá-lo, trans- formando-os em frutos de atividade espiritual. Por isto há muitos chamados e poucos escolhidos, capazes de assimilar e transformar Minhas Palavras em uma colheita rica e viva de ações.
Tens agora melhor compreensão de quem são os anjos a descerem e subirem dos Céus, servindo-Me como Deus de Eterni- dade e também na Terra, temporalmente, a vós, representantes de Seu Coração; portanto, sois a Terra Dele.”
Diz Nicodemus: “Agora reconheço realmente seres Tu Cris- to, o Unigênito de Deus, cuja Plenitude Te habita! Jamais um pro- feta falou como Tu. Desvendando segredos tão sublimes, poderias esclarecer-nos o sentido da escada de Jacob pela qual os anjos igual- mente desciam e subiam entre Céu e Terra, estando Jehovah no topo da escada.”
Digo Eu: “A visão de Jacob foi o que vos demonstrei tão explicitamente. A escada representa o elo entre coração e intelecto esclarecido. O coração é a Terra, também vista aqui e que na época de Jacob estava deserta, árida e pouco iluminada, em virtude do grande embaraço e aflição dele. Em tal estado ele começou a meditar em Deus, a fim de descobrir o motivo que o levava a isso. Adorme- ceu em pleno campo e viu a ligação entre o seu coração material e o Céu iluminado do intelecto. Então percebeu que seus pensamen- tos, ideias e concepções desciam, como se houvesse uma escada, da cabeça ao coração, iluminando-o e trazendo-lhe conforto, e assim mais vivificados e fortalecidos através do amor sublimado, subiam a Deus, integrando-se de Luz mais potente. Se observardes a vida de Jacob, percebereis sua constante meditação em Deus; a partir daí, viveu rigorosamente pela Vontade Divina.
Ao mesmo tempo indica aquela visão o surgimento da es- cada genealógica entre os descendentes de Jacob e Deus, pela qual os filhos de Deus decrescem e aumentam no Conhecimento Divi- no para, no cume, Jehovah Se apresentar em Minha Pessoa. Deste modo recebeste, aliás todos vós, a explicação desdobrada da escada de Jacob, e sabeis o que deveis compreender no termo ‘anjos de Deus’. Todavia pergunto se entendestes o assunto.”
Diz Nicodemus: “Recebi grande esclarecimento; no que diz respeito a este anjo visível, queria saber se já é realidade perfei- ta ou apenas Pensamento Teu, surgido de Teu Amor, Sabedoria e Onipotência!”
Respondo: “Que pergunta infantil! Afirmo: este anjo é, tanto quanto tu, todas as criaturas e o Universo, ambas as coisas, por- que em todo Infinito não existe outra realidade além de Mim, a não ser Meus Pensamentos, Ideias e Concepções. São elos animados pelo Meu Amor e eternamente fixados pela Minha Vontade. O que faço como Deus, de eternidades em eternidades, também fareis no Meu Reino.
Tal possibilidade dentro do homem podeis deduzir de vos- sas visões, onde projetais vossos pensamentos, ideias e concepções, dando-lhes vida e forma e podendo palestrar com elas como objetos reais. Desconheceis o maquinismo que ocorre em sonhos, quando vos encontrais num mundo real entre seres inteligentes e de atitudes individuais. Quando fordes renascidos em espírito, todos os segre- dos de vossa vida ser-vos-ão esclarecidos, desde sua origem; por en- quanto, podeis aceitar como verdade luminosa que toda manifesta- ção de vida na criatura tem seu motivo mui sábio e real, do contrário jamais se apresentaria.
Após a morte, ela vive no Espaço e tem como base e morada apenas o mundo por ela criado, enquanto cessa a ligação individual com a Terra, pois reconhece ser a matéria total nada mais que pro- vação necessária e pesada, ao passo que a vida livre e independente é de máxima vantagem.”
Diz Nicodemus: “Senhor, quer dizer que eu morrendo, mi- nha alma nada mais verá desta Terra, sobrevivendo em seu mundo criado — entretanto há muita coisa aqui que uma alma ávida de conhecimento gostaria de ter assimilado! Haja vista nossa grande saudade pelo conhecimento do Céu estelar, Lua, Sol, planetas, in- clusive as profundezas do mar. Se ela vive num ambiente surgido de sua fantasia e age apenas com seres aparentes, resultado daquela, a meu ver, não lhe pode proporcionar grande satisfação. Na hipótese, porém, de lhe ser dada a recordação qual sonho lúcido, no qual reco- nheça seu eu, sem lembrar-se das mazelas terrenas — sua existência pode ser alegre, impossibilitando-a de sentir saudade daquilo de que
se livrou. Falo dentro de meu entendimento, no entanto peço-Te esclareceres o assunto.”
Digo Eu: “És não somente fraco no físico, mas tuas noções da vida após a morte são mais incertas e obtusas que teus senti- mentos e percepções. Responde-Me: quando tem o homem melhor visão: num cárcere à noite, ou em pleno dia, no cume de uma mon- tanha? Quem se encontra em plena liberdade, em companhia de bons amigos — acaso terá vontade de voltar à prisão para analisar os cantos e cubículos?! Medita e responde, em seguida dar-te-ei escla- recimentos maiores!”
ALMAECORPO.ESTADODAALMAMATERIALISTA.A LUA
Diz Nicodemus: “Senhor, a resposta à Tua pergunta se dá pelo sentimento humano. Deduzo, todavia, que uma alma perfeita verá no Além toda Tua Criação numa luz muito mais clara que em vida, guardando igualmente recordação nítida de sua existência ter- rena. Estou certo?”
Digo Eu: “Plenamente, e demonstrarei o motivo para que ninguém afirme: Obrigou-nos Ele a crer e não duvidamos da reali- dade, embora não nos tivesse explicado a razão! Este não será Meu Ensino, pois quero que entendais o segredo do Reino de Deus!
O corpo por si só como matéria inerte nada vê, ouve, sente, sem alma. É apenas instrumento necessário da psique, de tal for- ma construído e organizado, capacitando a alma a se servir dele no mundo exterior. Pode ver, ouvir e sentir coisas boas e desagradáveis, movimentar-se e executar variadas tarefas.
O guia dos membros é a inteligência e a vontade do coração; pois o corpo não tem nem um, nem outro, a não ser que a alma se tenha integrado na carne através de seus apetites mundanos e sensu- ais, perdendo a noção do seu eu espiritual. Em tal caso, todo inte- lecto, inclusive vontade, se tornaram carnais. Está como que morta e lhe parece loucura quando ouve algo sobre emancipação espiritual e da vida após a morte.
Tal psique materialista não morre após o desprendimento doloroso, mas continua no mundo dos espíritos; apenas é sua exis- tência tão precária quanto seu conhecimento e consciência, numa esfera puramente espiritual. Acha-se num sonho algo mais lúcido e, não raro, ignora ter vivido num outro mundo, porquanto age den- tro de sua sensualidade. Se é advertida e instruída nesse sentido por almas mais esclarecidas, não lhes dá crédito e as ridiculariza.
Leva muito tempo uma alma mundana e materialista a che- gar a um conhecimento mais claro. Tão logo o consiga, readquire a recordação, podendo igualmente ver, ouvir e sentir tudo que acon- tece dentro e sobre a Terra.
Caso uma alma tenha alcançado em vida a perfeição através do renascimento espiritual, e por ele chegado à visão e percepção claras das coisas puramente espirituais e celestes, atinge ao mesmo tempo a noção certa e real da totalidade da Criação material, inte- grando-se de tudo, inclusive da vida na Lua, Sol, a constituição das estrelas, sua finalidade e função.
Quando tal alma perfeita se tiver libertado do corpo físico, sua visão é semelhante à divina e, caso queira, vê, ouve, sabe e sente tudo. Se assim é, por que deveria perder sua recordação total como criadora de seu mundo espiritual-divino?!
A fim de que possas compreendê-lo mais a fundo, soltarei por minutos a tua visão e a de alguns aqui presentes. Que assim seja!” Imediatamente várias pessoas caem em estado visionário e se veem numa zona desconhecida, sumamente agradável, de sorte a Me pedirem deixá-las ficar, pois não querem voltar à Terra.
Pergunto-lhes se veem o orbe. E elas respondem: “Sim, atrás de nós, vemo-lo transparente!” Indago se veem a cidade de Roma, e elas o afirmam, descrevendo-a inteiramente. Os romanos, ouvindo o relato, muito se admiram, porquanto nenhum daqueles personagens conhecia a metrópole.
Prossigo perguntando se veem a Ásia setentrional. Todos respondem: “Sim, Senhor, até os confins desse enorme Continente; mais além só vislumbramos água e algumas ilhas! Que vasto país,
cuja enorme capital é protegida por extensa muralha e habitada por inúmeras criaturas!”
Digo Eu: “Qual é sua vestimenta?” E elas descrevem com minúcias as vestes, e um velho fariseu, posteriormente convertido ao judaísmo, queda perplexo, porquanto teve oportunidade de ver vários chineses nos confins da Índia.
Em seguida, permito-lhes a visão da Lua e a descrição feita se restringe a um mundo árido, com alguns duendes tristonhos e de cor pardacenta. Não há flora nem fauna. Nisto os faço voltar à visão natural, inclusive à recordação de tudo.
Nicodemus então diz: “Que maravilha, Senhor! Estávamos aqui, vimos-Te e aos outros perfeitamente, e ao mesmo tempo tí- nhamos a visão clara e nítida de tudo que descrevemos, dando-nos a experiência da visão indescritivelmente mais lúcida da alma liberta. Não somente vimos, mas ouvimos tudo. Uma árvore, uma casa ou um navio, homem ou animal, eram vistos em sua forma física, en- tretanto nossa visão traspassava tudo, muito embora não fossem os corpos transparentes.
Nas criaturas percebemos até mesmo seus pensamentos, que no início apresentavam-se quais pequenas imagens no coração. Quando, semelhante a enxame de insetos, subiam ao cérebro, tor- navam-se mais claros e definidos, voltavam ao coração, cresciam e se externavam na esfera humana, aumentando até formarem um mun- do ao redor da criatura. Nos irracionais nada disso se via.
Mas o que há com a Lua? Que mundo árido e deserto! Aqueles seres não deixam de ter forma humana, mas dão impressão de pertencerem a uma espécie de animais, muito embora etérea. Percebi como determinado duende crescia e diminuía. Se fosse ma- terial, não lhe seria possível tal coisa. Que há com a Lua, Senhor?”
Digo Eu: “Poderás colher informes junto de Meus discí- pulos. Tenho coisas mais importantes para demonstrar e explicar, após o desjejum. Dentro em pouco subirão os trinta gregos para conversarem com aquele jovem. Virão mais cedo, em virtude da perturbação causada pelos fenômenos.”
“Está bem, Senhor”, diz Nicodemus, “Tua Vontade Se faça! Apenas queria saber a identidade daquele jovem maravilhoso.”
Digo Eu: “Sabê-lo-ás no momento preciso. Seu nome é Raphael.”
Diz Nicodemus: “Tal é o nome de um arcanjo, segundo a Escritura. Quiça é ele mesmo?! Que susto! Afirmei isto desde o começo!”
Respondo: “Não contestei, mas demonstrei o que é um anjo. Por que deverias ter receio deste, quando tu mesmo és desti- nado a te tornares arcanjo?! A fim de apagar qualquer dúvida, saiba ser ele o espírito de Henoch! Seu corpo se prende à Minha Vontade. Por isto te digo não haver jamais outros arcanjos nos Céus, senão aqueles que já viveram num planeta! Agora basta deste assunto. Os gregos estão se aproximando. Não Me denuncieis, porquanto ainda é prematuro conhecerem-Me pessoalmente!” Assim Me levanto para caminhar um pouco; entrementes, os gregos se acomodam na tenda próxima, onde tomam o desjejum.
AVERDADEIRAADORAÇÃODE DEUS
Nem bem terminaram a refeição, o grego, que na noite ante- rior tinha falado com tanta eloquência, dirige-se a Lázaro e Raphael fazendo menção de usar da palavra; diante da beleza do anjo, queda perplexo. Só depois de alguns segundos diz: “Eis o Olimpo, onde habitam os deuses; se não me tivésseis instruído haver apenas um só Deus, teria tomado a ti, jovem maravilhoso, por Apollo. Certamen- te és um Seu Filho, mortal, portanto merecedor de nossa adoração.” Nisto, os gregos apanham moedas romanas de ouro, querendo de- positá-las aos pés de Raphael.
Ele, porém, diz: “Guardai isto onde foi tirado. Os verdadei- ros deuses não se deixam adorar, nem aceitam oferendas materiais. A vontade sábia e cheia de amor aos filhos do mundo consiste na crença em Deus Único, Eterno e Onipotente, ao Qual deveis amar acima de tudo com todas as forças de vossa alma e ao pró-
ximo como a vós mesmos, quer dizer: fazei-lhe aquilo que dese- jais vos faça!
Crendo e agindo dessa forma, tereis adorado a Deus condig- namente, ofertando-Lhe prenda agradável, sendo aceitos como filhos imortais, e o poder e força da morte serão afugentados de vossa alma.
Adoração labial e oferendas materiais foram inventadas pelos sacerdotes, reis maus e dominadores. Deixam-se honrar e exigem sacrifícios elevadíssimos por parte dos homens, aos quais procuram impressionar, afirmando exigirem seus pecados penitência dessa or- dem — do contrário, receberiam castigos em pragas penosas. Isto fazem não em virtude dos deuses, mas sim em benefício próprio e ganância para subjugarem os ignorantes.
Deus Verdadeiro apenas quer que todos se amem quais ir- mãos, vivendo livremente sobre a Terra e tornando-se cada vez mais sábios pela Graça Divina. Orientados por mim, retirai vosso dinhei- ro, dispensável aos homens verdadeiros e a Deus Único!” Os gregos apanham as moedas e guardam-nas na sacola.
O orador então diz com amabilidade: “Oh, criatura divina, merecedora do máximo amor! Tuas palavras foram meigas, verda- deiras e doces como mel, e serão por nós respeitadas! Todavia não compreendemos por que aceitais remuneração pelo alimento, entre- tanto rejeitais nosso dinheiro!”
Diz o anjo: “Difícil é satisfazer aos homens, até mesmo para Deus. Acaso sabíeis ontem sermos filhos de Deus? Consideraste-nos simples criaturas que se deixavam pagar as despesas. Agimos como tal e levou tempo e provas para modificarem vossa opinião.
Sabendo com quem tratáveis, tomastes o desjejum e nin- guém vos pediu remuneração, nem o fará. Eis a situação: aqui só pagam impostos os estrangeiros, os radicados estão livres pela antiga Lei. Estranho é todo aquele que desconhece nosso Deus e Suas Leis como servo pagão. Entretanto muitos há, entre judeus, descrentes e desrespeitadores das Leis, vivendo somente para os seus apetites. Tais homens exigem imposto e pagamento dos radicados; por isto são por nós considerados estranhos. Compreendeste?”
Responde o grego: “Ah, agora sim! Confesso ser esta insti- tuição verdadeiramente divina, e desejo apenas orientação da sig- nificação dos fenômenos noturnos. A cidade toda está alvoroçada e a maioria dos comerciantes estrangeiros a abandonaram com as mercadorias, temerosa dos efeitos possíveis. Além do mais, ninguém compra algo, na expectativa de acontecimentos horrendos a se pre- cipitarem sobre a metrópole. Se não tivéssemos tido oportunidade de vos conhecer ontem, já estaríamos longe. Lembrando-nos de vós, enchemo-nos de esperanças para ouvir orientação concisa!”
Diz o anjo: “Observai todas essas pessoas, e não descobrireis pavor ou nervosismo. Por quê? Por saberem a razão dos aconteci- mentos. Estão em plena visão da Luz Divina; os da cidade são cegos, nada veem e entendem, e seu pavor é castigo justo pela teimosia.
Os fenômenos representam coisas boas para os bons, preju- ízo para os maus. Tornai-vos, portanto, igualmente bons dentro da orientação dada por mim, que vosso futuro vos trará benefício, aqui e no Além! Assimilando-o a fundo, podeis desde já estar alegres, pois minhas palavras são verdade plena!”
Diz o orador: “Jovem e sábio amigo! Agradeço em nome de todos. Tu e o amável hospedeiro — certamente teu pai — prometestes-nos contato mais íntimo com o Deus Verdadeiro; a realização nos enche de gratidão e alegria. Prometemos o fiel cum- primento de tudo. Apenas mais uma pergunta: consta ser venerado naquele Templo o Deus dos judeus! Será o mesmo que o vosso, ou trata-se de um ídolo, como em nosso povo?”
Diz Raphael: “Há tempos lá só se venerava Deus de Verdade, pregando aos homens as Leis Divinas; aos desobedientes se reco- mendava penitência, reforma e renúncia aos pecados. Assim fazen- do, a Graça de Deus voltava a eles, do contrário o castigo redundava justamente na ausência da mesma — às vezes por toda a vida. Passa- vam por grandes sofrimentos e quando no final vinha a morte, não havia consolo, mas dores atrozes, pavor e aflição. Os cumpridores
das Leis Divinas jamais perdiam a Graça de Deus, gozavam de boa saúde e a morte nada tinha de pavoroso.
Os tempos mudaram: os próprios doutrinadores se transfor- maram em criaturas mundanas. Ainda que pronunciem o Nome de Deus, seu coração não acredita Nele, nem O ama, manifestando o pior ateísmo. Por isto lhes foi demonstrado, durante esta noite, o que os aguarda em virtude de sua maldade, e também foi o motivo pelo qual disse que os bons poderiam esperar coisas boas, os maus, prejuízos.
Lá embaixo também vivem judeus; sua fé e ação são piores que dos gentios, por isto a Graça e a Luz da Vida de Deus lhes se- rão tiradas e conferidas àqueles. Oriento-vos a respeito Dele para poderdes transmiti-lo a parentes e amigos. Dentro de poucos anos enviaremos alguns mensageiros ao vosso país, a fim de ensinar-vos mais amplamente as Verdades luminosas de Deus.
Segui em Nome Dele, e caso enfrenteis uma tempestade no mar, chamai pelo auxílio do Deus Verdadeiro, e ela se acalmará sem que sofrais outras intempéries! Servir-vos-á para testemunho de ser Ele Senhor sobre toda a Natureza, através da Força e do Poder de Seu Espírito.”
Os gregos agradecem ao anjo pelo ensinamento e promessa. Antes de partirem, o orador diz: “Jovem adorável, pleno do Poder Divino! Acaso o Deus Único, que certamente está entre nós em Pes- soa, preocupar-se-á conosco quando estivermos em alto mar passan- do aflição?”
Diz o anjo: “Eu sabendo disto, quanto mais o Espírito de Deus! Eu, pessoalmente, nunca estive em Athenas, vossa capital; en- tretanto, sei de tudo que lá existe e acontece, mormente em tua casa! Acreditas?”
Diz o grego, encabulado: “Sim, creio; acontece achar-se de- baixo de minha casa...”
Conclui Raphael: “...uma catacumba onde escondeste ouro, prata e pedras preciosas, roubo feito há sete anos pelos teus piratas num navio romano. Dentro de nossa Lei, tal ação é grande pecado, pois não deves fazer ao próximo o que não desejas que te
faça! Desconhecias o Mandamento de Deus e fizeste a Mercúrio uma oferenda.
No futuro nenhum de vós deve exercer a pirataria, pois em tal caso jamais a Graça de Deus seria vossa parte. Além disto estais sob a jurisdição romana, que igualmente proíbe o roubo. Seguindo-
-a, não pecarás contra Deus. Compreendeste?”
Responde o grego: “Já vejo nada vos ser oculto como filhos de Deus; e se naquela época tivesse noção da Verdade, não teria pra- ticado o roubo e jamais o repetirei. Não sendo possível desfazê-lo, pergunto-te qual o destino a dar ao tesouro?”
Diz o anjo: “O proprietário é muito mais rico que tu e não precisa dele; existem muitos pobres em vosso país, aos quais podeis fazer caridade; pois Deus, o Senhor, ensina: O Bem feito aos ne- cessitados tê-lo-eis aplicado a Mim, e Eu vos recompensarei aqui e cem vezes mais no Meu Reino! Empregai os bens supérfluos entre os pobres, que vos tereis redimido dos pecados, perante Deus e os homens. Agora segui em paz!”
OALIMENTODOS ANJOS.
SEXTOESÉTIMOLIVROSDE MOYSÉS
Entrementes, somos convidados por Lázaro a tomar o desje- jum. Quando Nicodemus percebe o bom apetite de Raphael, ele Me pergunta como era possível tal coisa, e Eu respondo: “Então não vês a realidade desse espírito alimentar-se como Eu, o Maior dos Espíritos? Necessitando de um físico para se tornar visível, preciso é nutri-lo com alimento do orbe, muito embora seja seu corpo su- mamente etéreo. Uma vez desnecessário, dissolvê-lo-á num átimo, desaparecendo diante de vós.
No Céu dos espíritos puros também existe alimento, espiri- tual e não material. O alimento espiritual consiste no puro Amor e na Sabedoria de Deus, e penetra o Universo, alimentando inúme- ros seres, primeiro os espíritos e, através desses, a Criação material. Em primeiro plano, o infinito Espaço do éter onde se movimentam
miríades de sóis e planetas quais peixes n’água e aves no ar. Do éter, se suprem primeiro os corpos cósmicos e destes, seus habitantes, dentro e sobre eles. Terás compreendido?”
Responde Nicodemus: “Sim, Senhor e Mestre, à medida que um homem possa assimilar Tua Sabedoria Infinita. Quando tiver progredido espiritualmente, tais assuntos ser-me-ão mais acessíveis. Por ora ignoro o que venha a ser um espírito puro, a diferença entre éter e ar, a consistência de um Sol e sua distância da Terra. Além disto, falaste de sóis! Como poderia saber tal coisa? Ainda que me integrasse dos fenômenos materiais, não percebo o puramente es- piritual, inalcançável pela mente. Que vem a ser um espírito? Qual sua forma, onde e como vive? São perguntas jamais suficientemente explicadas. Não é isto?”
Digo Eu: “Sim, falaste certo; enquanto o homem perdurar mortal não será capaz de assimilar a resposta mais completa. Alcan- çando o renascimento do espírito e a imortalidade através do cum- primento de Minha Doutrina, encontrará dentro de si a resposta nítida às tuas perguntas. Pois somente o espírito penetra em si mes- mo e nas profundezas espirituais em Deus, conforme vos demons- trei ontem à noite. Tua memória não sendo das melhores, voltas a assuntos já esclarecidos. Já não te sendo possível o entendimento das coisas terrenas, não te deves admirar da completa ausência de compreensão das relações espirituais e celestes.
Por que nunca leste e relegas os Sexto e Sétimo Livros de Moysés e o apêndice profético? Lá se encontra muita coisa útil à compreensão do Céu estelar, o mundo dos espíritos e sua existência. Procura tais obras e estuda-as com carinho que teu coração será ilu- minado! Porventura existiria matéria se não fosse criada, organizada e conservada pela força e vontade dos espíritos?”
EXPERIÊNCIASDEPROFETASNO ALÉM
Diz Nicodemus: “Tens eternamente razão, da qual carece- mos por não existir dentro de nós verdade, sabedoria e força vi- tal. Não deixa de ser difícil ao homem se libertar do mundo para ingressar no espírito. Ouvir simplesmente os Ensinos mais sábios de nada adianta ao ignorante, caso não tenha chegado à realidade de fatos espirituais através de experiências próprias. Ainda que um indivíduo o consiga, milhares nada disto percebem e não haverá progresso para a Humanidade. Outra coisa seria se todos tivessem as mesmas provas!”
Digo Eu: “Falas de coisas espirituais qual cego descrevendo as cores! Julgo que o Criador dos homens saberá melhor qual o tra- tamento necessário para alcançarem a meta fixada. Operei milagres que vos obrigaram à crença de ser Eu o Messias Prometido. Tal coa- ção não vos é útil para salvação de vossa alma, porquanto alcançareis a bem-aventurança somente pela prática do Evangelho.
Acredita-Me: se quisesse transformar-vos em máquinas, bas- taria um Pensamento ligado à Vontade, e todo o Templo, Jerusalém, o próprio país Me reconheceriam como Messias, Jehovah, Zebaoth! Acaso isto seria de proveito aos judeus e pagãos? Afirmo-te: tão pou- co quanto a esta travessa de madeira que se movimentará em todas as direções, movida pela Minha Vontade!
Vê, ela tem vida e flutua no ar qual pássaro! Quererias trocar tua existência pela mesma?! Embora tenha vida, está isenta de cons- ciência própria, pois é penetrada pela Minha Consciência que a vivi- fica. Poderás dirigir-lhe algumas perguntas, que a travessa responderá sem boca e língua. Poderias crer ter ela vida e inteligência próprias?
Digo mais: poderia conservar essa vida aparente por toda a Eternidade, devido à Minha Onipotência! Teria ela com isto existên- cia própria, independente e livre? Jamais; enquanto Eu a mantiver viva pelo Meu Poder, ela é inerte e morta. Sua vida aparente é Minha Onipotência, ou seja, Minha Própria Vida. Eu a retirando, aparece a
inércia e o julgamento necessário de toda matéria, e não descobrirás vida nela, conquanto se movimente em todas as direções.
Manifestação idêntica teriam as criaturas caso as coagisse com a Minha Onipotência ou por meio de milagres, impedindo-lhes o livre pensamento. É, portanto, muito melhor a livre descrença que a fé imposta pelos milagres. A liberdade plena e independente da von- tade humana se baseia no grande Plano de Deus. Pode o humano ser instruído por Deus no que fazer para alcançar a perfeição da vida; nunca, porém, deve ser coagido, nem por Deus, nem por espírito al- gum. Pois se assim acontecer, estará julgado, psiquicamente morto, inexistente como criatura livre e independente.
Por este motivo, permito mui raramente visões e experiên- cias do reino dos espíritos por ti desejadas, e caso aconteçam vez por outra a pessoas isoladas, destinadas quais profetas, geralmente provindas do Alto e tendo passado encarnações noutros mundos, tal fato não as prejudica, tampouco aos semelhantes, que poderão dar-lhes crédito. Não o querendo — o que, infelizmente, é comum
— continuam livres no pensar e determinar de suas ações, de maior utilidade que qualquer coação de fé.
O homem só consegue ser feliz por Deus e em Deus à medida que tiver submetido seu livre arbítrio à Vontade Divina, unindo sua consciência à de Deus. Se a Divindade lhe tirasse o livre arbítrio su- plantando-o pela Vontade Divina através da Onipotência, o homem estaria como que morto, pois teria apenas vida idêntica à Minha, ma- nifestada nesta travessa. Deus criou o homem de tal forma a poder su- cessivamente desenvolver-se, a ponto de achar impossível existir algo mais sábio que seu intelecto e raciocínio. Penso ter dado explicação completa. Se a tiveres compreendido, vamos nos dirigir ao ar livre!”
OPOVOEOS TEMPLÁRIOS
A esse Meu convite, todos Me acompanham ao mesmo local onde estivéramos pela manhã. Avista-se Emaús, lugarejo perto de Jerusalém, alcançável por vários caminhos para pedestres. A estrada
de rodagem obrigava a dar grande volta, de sorte a se preferir o cami- nho a pé. Precisamente nesse dia havia feira de pão em Emaús, mas em virtude dos fenômenos, quase ninguém tinha feito pão.
Orientado deste pormenor, Nicodemus Me diz: “Senhor e Mestre, aqui se encontram as padarias do Templo, dando semanal- mente renda de cerca de mil moedas de prata romana! E hoje não há pão! Que farei?! Certamente haverá barulho por isto! Senhor e Mestre, poderias ajudar-me, caso fosse de Tua Vontade!”
Digo Eu: “Serás ajudado; todavia, digo a todos: não acreditais se não vos são proporcionados milagres sucessivos, ainda que a verda- de seja palpável! O povo não terá grande reação, porque também assis- tiu aos fenômenos, e além disso haverá suficiente provimento de pão.
Chamo vossa atenção para outro pormenor do qual surtirá maior embaraço ao Templo do que da possível falta de pão! Vede o mundo de gente em todas as estradas para Jerusalém! Todos eles querem orientação dos templários a respeito do espetáculo noturno! Os sacerdotes os suprirão com prédicas de penitência, falando da Ira Divina que precisa ser aplacada mediante contrições e sacrifícios.
E o povo perguntará: Por que dizeis isto agora, quando de- víeis há tempo saber de nossa situação perante Deus? Sabemos ter Ele sempre advertido durante anos o seu povo, através de profetas e visionários, das consequências provindas de seu afastamento das Leis. E se ultimamente alguns nos recomendavam reforma de nossos atos, declaraste-os falsos, perseguindo os que lhes davam ouvidos. Agora, assustados com os sinais inauditos pelos quais se vê nitida- mente a Ira de Deus — pretendeis atirar a culpa sobre nós. Não o aceitaremos, e sim dirigir-nos-emos pessoalmente a Ele, pedindo perdão pelos pecados sem vossa interferência.
Tal reação atirará os sacerdotes em grandes embaraços e al- guns obstarão: Deus certamente Se aborreceu convosco por não quererdes seguir-nos, pois sempre vos dirigis aos falsos profetas, em- penhados em afastar-vos do Templo.
A multidão responderá: Enganai-vos, pois jamais ouvimos a voz dum falso profeta, mas a dos verdadeiros que declaravam aber-
tamente ter-se aproximado o Reino de Deus. Foram por vós perse- guidos como sempre fizestes a tais criaturas e será o motivo pelo qual Jehovah nos demonstrou sua grande Ira, entregando-nos à punição de nossos inimigos. O fato de não serdes profetas concluímos de vossa ignorância quanto à nossa situação perante Deus.
Novamente um sacerdote interporá: Se esta foi vossa opi- nião, por que viestes ao Templo? Poderíeis ter ficado em casa!
O povo retrucará: Não fostes vós o motivo de nossa vinda, e sim o Templo e Deus, ao Qual pediremos, contritos, perdão dos pecados. Se quiserdes, podeis acompanhar as nossas orações; nada pagaremos por isto, e sim daremos óbolos aos necessitados!
A tal determinação popular, os sacerdotes recuarão, enquan- to o povo fará grande alvoroço no Templo e no átrio. Se quiseres, amigo Nicodemus, poderás te convencer de Minhas Palavras e trans- mitir algum conselho ao povo; nada digas de Minha Presença aqui!”
Nicodemus agradece e diz: “Tudo farei para acalmar a mul- tidão. Que direi ao Sumo Pontífice, aos fariseus e decanos caso me perguntem onde passei esta noite, pois devem saber não ter eu estado nem no Templo, nem em casa? Falando a verdade, denunciar-Te-ei!”
Digo Eu: “Não tenhas receio; ninguém te perguntará, e além disto serás inspirado quando necessário! Poderás voltar à noite, pois passarei o dia aqui.”
Nicodemus desce do monte, mas não pode deixar de olhar para trás, a fim de averiguar se não é visto por judeu. Por isto en- vio-lhe Raphael, que o conduz até às portas da cidade sem ser visto. Quando lá chegam o arcanjo desaparece, e no mesmo instante está em nosso meio. Em seguida, digo a alguns discípulos que podem igualmente ir ao Templo para testemunharem os fatos. Assim fize- ram e à tarde voltam, contando o que sucedera.
Em seguida, Lázaro Me diz: “Senhor, até eu estou ansioso por saber do desfecho do caso no Templo, pois ainda deparo com muita gente pelas estradas. Se tudo isto for enchê-lo, a balbúrdia será inédita. A voz de Nicodemus será fraca para sobrepujá-los.”
Respondo: “Preocupa-te com outras coisas! Ainda tenho meios de sobra para impedir um tumulto; todavia, não chegará a tal ponto. Eis que os jovens despertaram com fome. Vai, Raphael, e tra- ta de supri-los, inclusive com vinho, diluído em dois terços d’água.” Ligeiro, o anjo executa Minha Ordem, para alegria dos adolescentes, que mal se contêm em expressar sua gratidão filial. Após alimenta- dos, postam-se em fila e pedem Minha Aproximação, para poderem Me agradecer individualmente.
Digo-lhes, pois: “Não é propriamente necessário; preferindo assim fazer, é melhor virdes isoladamente. Se Eu o fizesse, com facili- dade surgiria o ciúme entre vós, julgando Eu dar preferência. Assim, depende de vós quem desejar ser o primeiro.”
Dizem eles: “Neste caso, o atropelo seria desagradável para Ti! Por isto é melhor determinares onde deve começar a fila; até no amor é preciso haver ordem. O bom Deus tudo organizou tão maravilhosamente neste país, de sorte a ser preciso respeitarmos Sua Ordem!”
Digo Eu: “Bem, começai, pois, pela ponta direita!” Em se- guida eles se dirigem, dois a dois, a Mim, primeiro os rapazes, depois as meninas. Curvam-se profundamente, comprimem Minhas Mãos contra o peito, novamente se curvam para voltar ao lugar. No final perguntam o que poderiam fazer então.
Eu lhes digo: “Alegrai-vos com observações úteis, como se- jam: o belo panorama, as flores etc., e considerai ter feito isto tudo Deus de Sabedoria e Onipotência e agradecei-Lhe no coração. Mo- vimentai-vos à vontade como nós!” Gratos, os ex-escravos se distra- em pela redondeza.
Entrementes, nós outros subimos ao cume do monte, onde há um bosque de oliveiras com grande número de bancos. Satisfei- tos, todos expressam seu contentamento a Lázaro. A vista é maravi- lhosa: veem-se o Jordão, o vale, muito ao longe parte do Mar Morto.
Após certo tempo, Agrícola se externa: “Confesso jamais ter gozado panorama tão estupendo! Realmente, será difícil e mais do- lorosa a morte aqui, do que em local menos belo, pois dá vontade de eternizar a vida!”
Digo Eu: “Terias razão, caso a alma em união com o Espírito de Deus não recebesse a faculdade de gozar paisagens muito mais maravilhosas em outros mundos, na hipótese de constituir este fator o maior prazer para ela! A Meu ver existem outros êxtases para a alma liberta do corpo, que a simples observação de paisagens des- lumbrantes.
Admitamos que fosses obrigado a observá-la durante um sé- culo e, embora provido de tudo, garanto-te que o enfado de ti se apossaria, a ponto de não mais suportá-la. Gozar em companhia de bons amigos um belo panorama enleia a alma; a seguir, ela deseja modificações para maiores experiências e ensinamentos.
Ainda que uma alma perfeita consiga ver tudo com os olhos físicos, sua capacidade de ver, ouvir e sentir em estado de liberdade espiritual será muito maior! Há pouco vos demonstrei tal fato quan- do as pessoas, tocadas pela visão interna, descreveram tua capital tão nitidamente como se tu a estivesses analisando.
Portanto, compreenderás ser a visão da alma mais apurada em estado de liberdade, e se deres crédito às Minhas Palavras e Pro- vas, não será possível afirmares ser mais difícil alguém morrer aqui, do que em zona menos privilegiada! Por certo não duvidarás da exis- tência e consciência da alma após a morte?”
Diz Agrícola: “Claro que não, Senhor e Mestre, porquanto já fiz experiências na Espanha, Sicília e Egito. Aqui, o caso é outro e me levou a fazer essa observação.”
Neste instante, o grupo de aduaneiros Me pergunta se Eu não Me aborreceria caso eles fossem para casa, a fim de verificar se seus empregados não procuraram extorquir a multidão a caminho de Jerusalém.
Respondo: “Está bem, sede bondosos para compensardes o mal por tantos anos praticado, que sereis remidos dos pecados!” Satisfeitos, os aduaneiros se afastam.
NATUREZADEALMAE ESPÍRITO
Novamente Me dirijo a Agrícola: “Podes fazer tuas objeções!” Ele começa: “Senhor e Mestre, é fato consumado a existência da alma após a morte; mas — para onde vai e qual a natureza dela e a do espírito? Segundo Tua Afirmação, o Espaço é Infinito, portanto almas e espíritos lá se devem encontrar.
Outro ponto: qual a forma de uma alma ou de um espírito, e por que o homem não os pode ver? A ausência de conhecimento neste assunto faz com que tenhamos medo da morte.”
Digo Eu: “Seria fácil explicar-te caso tivesses a compreensão para tal; ela te falta ainda, muito embora tenhas ouvido de Mim vá- rias explicações e te tornaste testemunha de alguns milagres. Assim é difícil dar-te elucidação maior.
A alma humana é substância puramente etérea, concate- nada de muitos átomos luminosos ou partículas diminutas, para uma forma humana perfeita através da Sabedoria e Onipotência Divinas; e o espírito é a Vontade de Deus, o fogo do Puríssimo Amor Divino.
O espírito puro, um Pensamento de Deus surgido do Seu Amor e Sabedoria, adquire vida pela Vontade Divina. Deus sen- do qual fogo de Seu Amor e Sabedoria, o mesmo ocorre com o Pensamento realizado e projetado. O fogo é uma força, portanto é tal Pensamento de Deus igualmente uma força consciente e ativa, com a mesma clareza com que foi projetado. Penetra a matéria sem
contudo por ela ser penetrado, porque a matéria é consequência da expressão do Espírito surgido de Deus.
6. A alma é de certo modo matéria dissolvida e coagida pela força do espírito; passando à forma primitiva e unida a ele, perfaz o seu corpo etéreo luminoso e substancial, assim como a alma forma, através de sua vontade espiritual, sua veste da matéria carnal que a envolve, após inteiramente dissolvida. Tens aí uma breve elucidação da natureza da alma e do espírito puro.
Quanto ao local da permanência da alma após o despren- dimento, dificilmente compreenderás; ainda assim darei pequena orientação, de onde poderás tirar algum conhecimento. O principal experimentarás dentro de ti, quando tiveres alcançado o pleno re- nascimento, ou seja, a união do espírito com a alma, porquanto ela não é capaz de assimilá-lo inteiramente enquanto não lhe advir a força do espírito para tal. No primeiro período de sua existência postmortem, a alma geralmente se encontra onde viveu na Terra, isto é, no caso de não ingressar completamente perfeita no Além.
Em tal caso, ouve e vê o mundo natural, muito embora lá não mais se encontre. Sua existência é mais ou menos um sonho lúcido, no qual ela vive numa zona ou paisagem de sua própria pro- jeção, agindo como se se encontrasse no mundo natural, sem que algo lhe falte.
Pela Permissão de Deus, geralmente é destruída tal zona, e a alma passa a outra, correspondente ao estado íntimo, e pode le- var tempo até que compreenda, por vários ensinamentos, ser tudo que pretende possuir, fútil. Positivando-se em tal compreensão, ela começa a refletir seriamente a respeito de sua situação, percebendo paulatinamente ter abandonado o mundo material, enchendo-se de ânsia para alcançar pouso efetivo e estável.
Chegado este ponto, é ela orientada por espíritos perfeitos sobre o que deve fazer; seguindo tais conselhos, torna-se mais lúcida, porque é cada vez mais penetrada pela centelha divina dentro dela. À medida que ela cresce qual embrião no corpo materno, tudo a seu redor começa a ter maior consistência.
Tão logo for inteiramente penetrada por ela, atinge a ple- na visão, conhecimento claro, consciência e recordação perfeita de tudo: o que foi, como se criou, o que fez e qual a aparência e consis- tência do mundo em que viveu.
Pode analisar nitidamente Terra, Lua, Sol, planetas — o que até hoje nenhum astrônomo, grego ou egípcio pôde fazer — inclu- sive outros sóis de enxames globulares, que vos expliquei ontem, regozijando-se sobremaneira com suas formações maravilhosas e no Amor, Sabedoria e Onipotência de Deus.”
GRAUSDIVERSOSDEBEM-AVENTURANÇADAS ALMAS
(O Senhor): “Isto tudo é certo e indispensável para uma alma perfeita, entretanto é apenas o menor grau da enorme felicidade, porque com o tempo começará a cansá-la, assim como te causaria enfado a observação secular desta linda paisagem.
Grau mais elevado constitui o dote da força criadora real- mente divina, podendo tudo fazer dentro da Sabedoria, o que Deus produz da mesma forma.
Outro grau, quase máximo, de felicidade, se baseia no cons- tante Convívio com Deus, Senhor e Criador Único, seu Amigo mais Íntimo, podendo amá-Lo ilimitadamente e por isto supervisionar com Ele a Criação material e espiritual.
A máxima bem-aventurança de uma alma perfeita se concre- tiza na liberdade divina, pela união com Deus através do amor.
A Verdade de Minhas Palavras podes registrar com teus pró- prios olhos neste Meu jovem servo. Por várias vezes perguntaste pela sua identidade. Agora te informarei: este adolescente de há muito é espírito puro, todavia já viveu na Terra! Chamava-se Henoch e foi o primeiro profeta e doutrinador dos descendentes de Adam.
Como sua alma nos primórdios se inflamou no amor puro e mais elevado para com Deus, tal amor dissolveu o corpo em substância etérea revestindo a alma liberta, tornando-se, para sem- pre, um arcanjo dos mais elevados Céus, isto é, da mais suprema
liberdade divina, o que podes deduzir da sua permanência jun- to de Mim.”
Arregalando os olhos, Agrícola exclama: “O quê? Este — um espírito puro e perfeito?! É de carne e osso, e se alimenta como nós! O fato de ele produzir milagres procurei explicar pela aceitação como Teu discípulo, porquanto não o vemos qual espírito puro. Ao tocá-lo, sente-se o mesmo que em nós! Mas, enfim, acredito, embo- ra perturbe meu raciocínio. Como pode ter corpo?”
Respondo: “Já te disse termos tempo para explicações. O res- tante ser-te-á proporcionado por Raphael-Henoch, porquanto dirá e demonstrará o mesmo que Eu, devido à sua liberdade, poder, sa- bedoria e força, conquistados como posse dele. Podes começar tuas pesquisas!”
OS ANJOS
Vira-se em seguida Agrícola para Raphael: “Sublime servo de nosso Deus, Senhor e Mestre! Que espécie de corpo tens entre nós? De carne e sangue?”
Diz Raphael: “Convence-te pessoalmente!” O romano isto faz e constata ser o mesmo idêntico a um mortal, e diz: “Nada sinto de espiritual — entretanto és puro espírito e quase da idade do Gê- nero Humano desta Terra?”
Insiste o anjo: “Repete o exame e veremos qual tua conclu- são!” Novamente Agrícola quer apalpá-lo, todavia não sente maté- ria, e seus dedos se fecham no ar. Admiradíssimo ele diz: “Isto é para perturbar um homem inteligente! Há pouco tinhas corpo sólido, agora não existe! Se porventura ainda puderes falar — onde ficou tua matéria?”
Responde o anjo: “Onde estivera anteriormente; a minha vontade fez com que a sentisses, e agora, igualmente, a ausência material. Tudo que nós, espíritos perfeitos, queremos se realiza den- tro de nossa liberdade e sabedoria, momentânea ou sucessivamente, numa ordem preestabelecida.
Em virtude de nosso amor para com Deus, achamo-nos ple- nos de Sua Sabedoria e Poder, suportáveis e perceptíveis, a ponto de ser o Amor, Sabedoria, Vontade e Poder Dele igualmente posse nos- sa. Existem, entretanto, profundezas inconcebíveis em Deus, jamais sondáveis por espírito criado; pois se assim fosse, ele não seria feliz, porque não haveria esperança de outras bem-aventuranças provin- das de Deus. Tereis compreendido isto, romanos?”
Respondem vários: “Amigo celeste, para assimilar tal coisa — é preciso algo mais que o nosso intelecto! Deve ser como dizes; todavia, temos que esperar até que nossas almas se tornem aperfeiçoadas.”
Diz o anjo: “Pois bem; dirigir-me-ei apenas a Agrícola, pois vossa compreensão não é semelhante à dele. Podeis prestar atenção à nossa palestra e passo a palavra ao vosso amigo!”
Diz o romano: “No fundo, assimilei alguma coisa; na ínte- gra, sou como os outros e aguardo tempos melhores, de acordo com a Promessa do Senhor! Apenas desejava explicação de como podes desmaterializar-te, entretanto continuares presente! Ora és algo real, em seguida pleno nada, entretanto é o nada idêntico à realidade!”
Diz o anjo: “Mas isto é compreensível! Nós, espíritos, na es- fera puramente espiritual e por vós imponderável, somos algo unica- mente real e de origem primária. Todo resto no mundo da matéria é simples aparência, produzida pela nossa vontade a fim de fornecer às vossas almas materiais um intermediário constante pelo qual podeis alcançar a liberdade plena e real como a nossa.
Apanha uma pedra para eu poder dar-te uma demonstração! Muito bem! Dirás ser ela pura realidade, pois sentes peso e dureza. Todavia, afirmo-te ser tal realidade idêntica a mim quanto ao corpo físico, em relação ao espiritual. Pois dureza e peso desta dependem unicamente da consistência de nossa vontade.
Se eu, por exemplo, quiser que ela se torne idêntica a mim quanto ao corpo, tua mão a traspassará como fez comigo. Isto se dando, a matéria da pedra, produzida pela nossa vontade espiritual, terá alcançado sua realidade básica, sem a qual se apresenta qual pedra. Examina-a de novo, se realmente é a mesma!”
Diz Agrícola: “Sim!” Prossegue o anjo: “E agora?” Respon- de o romano: “Ah, vejo-a qual pequena nuvem na palma de minha mão, sem peso e aspereza. Coisa estranha! Como fizeste isto?”
OPODERDOS ANJOS
Diz o anjo: “Já te disse dar-se isto pela constância de nossa vontade, e toda matéria nada mais é que Imutabilidade da Vontade do Espírito de Deus, muito embora te pareça tão variável. As di- versas substâncias da matéria e seus elementos, pelos quais parecem surgir e existir diante de teus olhos — são nossos pensamentos. For- ma e cores são ideias surgidas de nossos pensamentos. Sua utilidade representa conceitos surgidos daqueles, e o alcance de um destino espiritual para tudo que ora é matéria, são nossos propósitos dos quais surgirá sua meta final.
Por isto, só existe vida verdadeira e real em nós, espíritos imortais, enquanto a matéria tem vida simplesmente por nós reali- zada e dependente, conforme acabas de verificar com a pedra. Ainda tens a nuvem em tua mão; eu a preencherei com a constância de minha vontade e logo terás a pedra anterior à tua frente!”
O fenômeno estonteia Agrícola, que diz: “Ela será para mim um tesouro como recordação deste fato milagroso! Porém, outra per- gunta: dentro de mim existe uma alma e, nela, um espírito idêntico ao teu! Por que não posso fazer o mesmo que tu com a ajuda dele?”
Responde o anjo: “Por não estar tua alma amadurecida e teu espírito não ter ainda ingressado nela. Todavia, ele realiza algo pela constância da própria vontade, incógnita à tua alma: a construção e conservação temporária do teu corpo. Ela não o percebe, tampouco a maneira pela qual é constituída, porque seu construtor interno não lhe pôde demonstrar, em virtude de seu não amadurecimento.
O espírito intrínseco trabalha constantemente para o rápido amadurecimento e plena liberdade; entretanto, não lhe pode impor a mesma coação, pois, deste modo, ela se tornaria mais materialista e recalcada do que por influência externa. Por este motivo foram
dados à alma vontade e intelecto próprios através do ensino, a fim de determinar, de livre e espontânea vontade, o desprendimento do mundanismo e, por meio da introspecção, encetar a trilha mais pura. À medida de sua purificação, o espírito puro, até então habi- tante do Além, a ela se une. Esta união é o renascimento espiritual e em tal estado poderá, ainda encarnada, fazer o que fiz como espírito unido à minha alma.”
ANATUREZADO AR
(Raphael): “Quando estive encarnado, por muitos anos, re- cebi pela Graça do Senhor a noção deste caminho interno e o pal- milhei com crescente perseverança. Assim ocorreu que, no final de minha vida, meu espírito e minha alma se amalgamaram, dando po- der sobre o corpo, a ponto de poder dissolvê-lo momentaneamente conforme fiz com a pedra, inclusive com o meu físico. Dele conser- vei apenas o necessário para que tu me visses com a visão material.
No momento em que se fizer necessário um físico idêntico ao teu — basta apenas querer. Assim quero! Podes certificar-te ser ele o mesmo que anteriormente!” Perplexo, o romano constata o fato. Em seguida, indaga: “Quando dissolveste teu corpo, como homem perfeito, também pudeste reconstruí-lo?”
Responde Raphael: “Tão bem como agora, entretanto não o quis por ser uma vida puramente espiritual e incorpórea muito mais perfeita que qualquer físico, embora projetado pela vontade. Neste corpo minha ação é reduzida. Tão logo vejas eu operar algo milagro- so, ele desaparece para ressurgir após a ação. Sou capaz de tudo com ele, todavia não de modo tão perfeito. Tens ainda outras dúvidas?”
Responde Agrícola: “Oh, em quantidade! Acaso serias capaz de transformar parte do ar puro em matéria qualquer?”
Diz Raphael: “Por certo; primeiro, é o ar matéria e contém todos os elementos; além disto, depende de meu espírito permi- tir plena ação à minha vontade, portanto posso transformar o ar. Dize-me no que deve ser modificado!”
Diz Agrícola: “Amigo, deixo isto ao teu critério mui sábio! Faze o que quiseres que tudo estará bem!”
Diz Raphael: “Neste caso quero que o ar ao nosso redor se condense numa coluna perfeita, a doze passos daqui, numa altura de dez metros e dois de circunferência! Que assim seja! Vai e ana- lisa aquela coluna e sua consistência!” Todos os romanos se enca- minham para lá. Em seguida exclamam: “Que coisa extraordinária! É realmente uma coluna de granito sólido, incomum em Roma! Não resta dúvida; no espírito reside a vida, e toda matéria é apenas consequência da imutabilidade da vontade de um espírito puro!”
Prossegue o anjo: “Qual vosso cálculo referente ao peso?” Responde Agrícola: “Será difícil determiná-lo; presumivelmente terá cem mil libras e nem mil homens poderão levantá-la!”
Diz Raphael: “Teu critério é certo; contudo, ser-me-á fácil erguê-la apenas pela vontade. Podes determinar altura ou distância desejadas, que executarei de pronto teu desejo.”
Diz Agrícola: “Sendo esta tua vontade, peço que a suspen- das a cem metros de altura, a meio caminho de Emaús!”
Diz o anjo: “Está bem, que assim seja!” Nem bem acaba de falar a coluna se acha na altura determinada, e em seguida é vista na zona referida. Todos ficam atordoados, mormente os romanos.
Raphael, porém, diz: “Como é possível tamanha manifes- tação de perplexidade! Acaso haveria algo impossível a um espírito puro? Tudo se baseia na vontade firme do mesmo! Se somos capazes de transportar planetas, sóis simples ou centrais, inclusive enxames globulares, como duvidardes da transplantação de uma coluna?! Quem tem poder de brincar com leões como se fossem moscas por certo não terá receio de mosquitos!”
NATUREZADO ESPÍRITO
(Raphael): “Como ainda há tempo, demonstrar-vos-ei algo mais, a fim de não supordes eu me entreter apenas com pedras. Aque- la coluna existe e permanecerá naquele local durante mil anos, pela
constância de minha vontade! A fim de que, mormente os romanos, vejam não haver impossibilidades a um espírito, surgirão, no mesmo ponto onde se apresentava a coluna de granito, uma tamareira, lade- ada por duas figueiras, todas elas carregadas de frutos maduros.
Pronunciei-o e liguei minha vontade à palavra e prontamen- te se apresentaram! Ide saboreá-los!” Todos aceitam o convite e se alegram com o delicioso aroma dos frutos.
O anjo prossegue: “Que venha mais uma dúzia de ovelhas para o pasto de Lázaro, nosso querido amigo e irmão! Ei-las como propriedade dele! Julgo ser prova insofismável do poder de um es- pírito puro e plenamente livre em sua vontade. Refleti a respeito e externai vossa compreensão, para poderdes receber elucidação maior do Senhor!”
Diz Agrícola: “Amigo celeste, seria fácil caso nos encontrás- semos em tua esfera sublime; acontece ser nossa trajetória até lá mui longa. Tuas explicações são compreensíveis ao nosso intelecto; o que escapa ao mesmo é o fato de ser a vontade constante de um espírito idêntica aos elementos telúricos e cósmicos.
Neste caso, a matéria nada é, tampouco a alma, produto da mesma. Apenas o espírito puro é real. Qual sua composição e quais seus elementos? Tal pergunta jamais será respondida por mortal, enquanto não se tiver espiritualizado. Por isso, deves ter paciência conosco, porquanto tuas elucidações, não obstante as provas realiza- das, ainda não conseguem fornecer a luz necessária da composição do espírito puro. Facilmente se emprega tal definição; onde está a compreensão da mesma? Logo, é inútil meditarmos a respeito, e aconselho começares a externar-te mais profundamente, caso não se torne cansativa nossa incompreensão.”
Diz Raphael: “Amar a Deus acima de tudo e servir aos homens destinados a se tornarem espíritos puros como nós constitui máxima felicidade e bem-aventurança! Como poderia cansar-me o que vos servirá de maior elucidação? Prestai atenção ao que acrescentarei.
Em síntese, é Deus o Espírito Puríssimo de todos os espíritos, Elemento Básico e Eterno de todos os elementos. O espírito puro
em si, como matéria e elemento, é fogo e luz, ou o próprio Amor e Sabedoria. Não convém imaginardes fogo material e amor sensual, tampouco luz solar ou artificial, conquanto exista correspondência entre ambos. O fogo do espírito é Vida pura e sua luz — Sabedoria.”
NATUREZADO ÉTER
(Raphael): “Julgas ser o ar que vos envolve tanto quanto nada. Basta ser levado a forte movimento e sua força, qual tufão, arranca do solo os cedros mais possantes, eleva ao mesmo tempo as vagas do mar a verdadeiras montanhas, provando ser o ar algo po- deroso. É, portanto, um corpo que contém toda sorte de elementos em estado primitivo e violento.
A água, mormente de chuva ou fonte, é o mesmo que o ar, porém algo mais condensado, e a água do mar ainda mais compacta.
Subamos dez horas acima do globo terrestre e encontrare- mos o puro éter, completamente inexistente para os vossos olhos. Se olhardes horizontalmente numa distância de várias horas, o ar puro que o enche apresentaria as montanhas numa fumaça azulada. Se tal espaço fosse pleno de éter puro, as montanhas seriam vistas com toda claridade. A distância entre Terra e Sol está completamente saturada deste éter.
Nele se encontram todos os inúmeros elementos em estado mais livre que no ar mais puro desta Terra. São forças libérrimas e muito mais próximas e afins do fogo e luz primitivos, e alimentam a atmosfera telúrica, que por sua vez supre a água, e esta o solo com tudo que nele se encontra. Concluímos ser o éter algo mui impor- tante e não inútil como se apresenta aos sentidos.
Ainda assim, o éter não é algo espiritualmente puro; tem íntima semelhança com a substância da alma, mas apenas como intermediária no Espaço, onde colidem inúmeras forças de Deus, unificando-se e agindo em conjunto.
Por certo indagarás: Como pode haver ação homogênea en- tre elementos tão diversos? — Digo-te: nada mais natural e fácil!
Neste planeta do Senhor, nos mares, rios, etc., existe número inima- ginável de vegetação, animais e minerais, de sorte a ser impossível a um cientista desta época anotá-lo! Formam um conjunto com o orbe e agem para uma só finalidade, entretanto são tão diversos em espécie e ordem, a ser fácil conseguires diferenciar uma figueira de uma sarça, um leão de um boi, uma andorinha de um pato, um peixe de uma tartaruga, e o chumbo do ouro.
Na Terra tal diferenciação é fácil; não a percebes no éter, no ar e na água, muito embora as inúmeras espécies de forças e seus elementos produzidos sejam mais distintamente isolados entre si do que se apresentam na matéria.
É, pois, o fogo espiritual da substância do éter, invisível aos sentidos, uma força eternamente ativa surgida de Deus, preen- chendo o Espaço Infinito, agindo e criando constantemente. Deus Mesmo é, no Seu Centro, o Espírito Eterno e Primitivo, o Homem Eterno que preenche, desde Eternidades, o Espaço surgido por Ele com Seus Pensamentos e Ideias, que saturados pelo Seu Amor, atra- vés de Sua Sabedoria e emancipados pela Vontade se tornam seres isolados, em formas ordenadas. Nestes seres é depositada a capaci- dade de se reproduzirem eternamente, desenvolvendo-se na escala gradativa da Ordem Eterna de Deus, unificando-se na sublime se- melhança Divina.”
OELEMENTOESPIRITUALDA MATÉRIA
(Raphael): “Demonstrar-te-ei alguns exemplos dados a Láza- ro pelo Senhor e por mim, para que possas compreendê-lo melhor. És, além de militar, horticultor, e possuis vastos jardins e hortas onde cultivas toda espécie de flores e frutos. A fim de que sejam constantemente supridos, precisas colher sementes que te dão gran- de alegria pela germinação; acaso terias escolhido solo diverso para cada semente? Afirmas possuir o teu vasto terreno à beira do Tibre até o Mar Mediterrâneo apenas uma só qualidade de terra, e todos os vegetais produzem abundantemente.
Se, porém, não chove no verão — fato comum em Roma — teus empregados têm que regar o jardim. Porventura tens água es- pecial para cada planta? Respondes que não. Então é a água comum útil para todas.
Concluímos possuir teu jardim uma só espécie de solo e água, assim como o ar, a luz e o calor do Sol são idênticos, descontando a mudança de estação, que todavia atinge o terreno todo.
Se, portanto, as condições ao crescimento dos mais variados vegetais são idênticas, deveriam produzir os mesmos efeitos no to- cante à forma, paladar e sabor — entretanto dá-se enorme diferença. Ao mastigares um caroço de limão sentes gosto amargo. Onde o fruto se supre da agradável acidez? Essa observação se estende a todas as espécies. Se refletires um pouco, perguntarás como podem forças similares produzirem efeitos tão diversos. Digo-te: todas as substân- cias psíquicas existem primeiro no éter, em seguida no ar e na água. Visão, olfato e paladar mais apurados não conseguem descobrir em um desses elementos originais e comuns algo de paladar ou aroma de qualquer vegetal — sem mencionarmos forma e cor. Como, por- tanto, se dá tal fenômeno?!
Deparamos com elementos puramente espirituais na ma- téria orgânica, demonstrando ao pesquisador tenaz ser apenas o espírito algo real, enquanto aquilo que se apresenta aos sentidos nada é; unicamente o que reside na semente age como elemento espiritual. Oculta-se numa membrana diminuta dentro do gér- men. Tal elemento puramente espiritual enfeixado na membrana é um Pensamento ou uma Ideia plena, luz e força de vontade, em seu perfeito isolamento dos inúmeros outros, igualmente marca- dos pela espécie.”
AÇÃODOESPÍRITOSOBREA MATÉRIA
(Raphael): “Tal espírito isolado na membrana do gérmen, de posse de sua inteligência lúcida e consciente de seu poder — propriamente ele mesmo — facilmente percebe quando a semente,
habitação material por ele constituída, se encontra em posição ade- quada para ação correspondente.
Tão logo a semente é depositada na terra úmida e o invólucro da matéria substancial é amolecido devido a uma troca de vibração das partes psíquicas com as externas, prontamente o espírito começa a fazer uso de sua inteligência e poder de vontade. Conhece a fundo as partículas a ele correspondentes dentro da terra, água, ar, luz e ca- lor do Sol; atrai-os e deles forma, dentro de sua ordem, o que é afim à sua natureza, de sorte a surgir um vegetal com a enorme variedade de sua espécie. A folhagem, ou seja, a parte externa desde a raiz até a coroa, é pelo espírito criada apenas para sua multiplicação dentro das novas sementes, levando ao Infinito sua individualidade, muito embora se tenha elevado, passando à criação de formas e seres mais perfeitos, em união com as partículas psíquicas assimiladas.
O que acabo de te explicar dá-se em escala menor em todos os minerais; em grau mais elevado nos irracionais, e nas criaturas de modo mais potente. É igualmente aplicável na formação dos mun- dos cósmicos, dos enxames globulares e do próprio Homem Cósmi- co em sua totalidade, descrito e demonstrado pelo Senhor.
Daí poderás deduzir que toda verdade e realidade só se en- contram no espírito, enquanto a matéria nada mais é que a cons- tante vontade do mesmo, podendo ser amainado, dissolvido pouco a pouco, e finalmente transformado em um corpo de substância psíquica, dentro de um espaço longo ou curto, à medida que uma tendência psíquica se apresenta acessível à ordem interna e viva do espírito, de acordo com a vontade livre depositada dentro dela.
Observa com atenção a Natureza e descobrirás o que ora te expliquei! Não podes exigir de mim, no curto espaço de nosso convívio, que eu venha elucidar-te minuciosamente sobre todos os minerais, vegetais e irracionais, com referência ao seu conteúdo pu- ramente espiritual ou de substância psíquica apenas. Basta saberes quais as relações entre espírito, substância psíquica e matéria. Essa regra vale para toda Eternidade e todo Infinito; entendendo o Alpha, entenderás o Ômega. O que se encontra entre ambos é idêntico à
sua particularidade — com exceção das inúmeras formas. Como ainda há tempo, podes expressar tua compreensão do assunto.”
OESPÍRITO,FORÇA INTRÍNSECA
Diz Agrícola: “Amigo celeste, impossível alguém dar defini- ção mais elucidativa que tu. Por certo compreenderás melhor por que não é viável termos capacidade assimiladora; pois, enquanto o mortal não a tiver alcançado, não conseguirá penetrar no verdadeiro conhecimento. Ainda assim, estou plenamente ciente de se achar somente no espírito a realidade intrínseca. Apenas te peço alguns exemplos, sempre de maior utilidade.”
“Facilmente poderia satisfazer-te”, responde Raphael, “entre- tanto não captarias o elemento espiritual por meio dos sentidos. O espírito é em tudo a força intrínseca, penetra, vê e domina tudo — o que também será feito pelo teu, mas não hoje nem amanhã, e sim quando tudo dentro de ti estiver em plena verdade.
Observa os discípulos do Senhor, dos quais dois, no momen- to, se acham no Templo, sendo um materialista! Os outros se en- contram quase no ponto em que eu estou como puro espírito. Essa conquista não foi fácil como julgas. São na maioria pescadores do Mar Galileu, possuidores de bens terrenos e família; mas tudo isto abandonaram para seguir o Senhor na conquista do Reino de Deus, Seu Poder e Força! Em virtude disto, alcançaram em curto tempo o que realizarás aos poucos como homem do mundo.
Fá-lo-ás à medida do teu amor para com Deus e ao próximo; a força deste amor demonstrará o quanto despertou e amadureceu o Reino de Deus dentro de ti.
Tal amor é o teu espírito como verdade e realidade únicas, e a própria vida eterna e indestrutível! Tal realização não te posso demonstrar pelo exemplo, pois terás que experimentá-la dentro de ti. Até lá deves crer na esperança do cumprimento de tudo que o Senhor prometeu a ti e a todos, como Verdade de Origem Eterna!
Todavia, darei algumas provas pelas quais deduzirás encontrar-se apenas no espírito o elemento original e a realidade ab- soluta. Vós, romanos, afirmais: O que desde o início não tem, ou não pode ter, força, não poderá realizar algo, pois do nada, nada surge. O simples raciocínio conclui ser o espírito algo real; se fosse um nada, inconsciente de si mesmo, como poderia tornar-se consciente?!
A fim de que tudo que existe possa surgir, formar-se e sub- sistir, preciso é que tal elemento espiritual seja algo verdadeiro para projeção sucessiva. Na semente é, portanto, o espírito depositado no gérmen, unicamente algo real, ao passo que o corpo vegetal em si nada é, mas apenas o que o espírito projetou. Ele trabalha através da inteligência e pela força de vontade, surgindo então uma planta, um arbusto, uma árvore, um animal, até mesmo um mundo inteiro.
Muito embora tivesse explicado várias vezes o que é o espíri- to, não o podes assimilar a fundo, porque o teu próprio espírito ain- da não te penetrou; através de tua alma podes conceber ser a origem dele fogo e luz vivos e conscientes, portanto amor e sabedoria em máximo grau. Nem o Senhor poderá te dizer algo mais a respeito!”
LIBERTAÇÃODA MATÉRIA
Diz Agrícola: “Estou mais esclarecido e lembro-me de algu- mas frases do velho Platon. Por muito tempo pesquisou a Natureza Divina e finalmente lhe foi transmitida a visão de Deus qual fogo e luz. Ele mesmo sentiu-se como que inteiramente dissolvido, sem perder a consciência. O fogo que o envolvia não lhe produzia ardor, mas apenas calor benéfico e extasiante, e uma voz semelhante às melodias de uma harpa lhe dizia: Vê e sente a Natureza Divina; vê e sente a ti mesmo Nele e por Ele! — E Platon percebeu sua figura humana rodeada de inúmeras outras! Nessas, descobria infinidade de outras que, em conjunto, perfaziam uma só forma humana. Tua explicação tem grande semelhança com a visão do grande sábio, mui conhecido do mundo intelectual. Por certo Platon não viu fogo e luz
com os olhos da carne, mas do espírito; assim penso que, quando es- tiver espiritualizado, obterei o mesmo estado que ele. Estou certo?”
Diz Raphael: “É isto mesmo; entretanto, foi Platon pagão e não pôde chegar à percepção nítida, possível a quem se torna pos- suidor da Doutrina de Deus. A fim de que possas ter noção mais compreensiva a respeito da realidade do espírito, dar-te-ei alguns exemplos, com a Permissão do Senhor!
Vê, o que nos envolve é ar puro e transparente; podes cansar teus sentidos à vontade, e nada mais descobrirás que insetos, alguns escaravelhos e, talvez, um pássaro! Vou abrir a visão interna de tua alma, e ficarás estonteado diante do que existe no ar. Assim o quero
— e já te achas em estado vidente. Que deparas?”
Diz Agrícola: “Mas isto é incrível! Que quantidade enorme de plantas, animais, zonas e até mesmo figuras humanas! Além dis- to, vejo quantidade de pequeninos vermes luminosos a se cruzarem cá e lá, se condensarem num lio e no mesmo instante surge uma forma. Todavia não subsiste, passando a outra. Em toda parte existe luz; as coisas apenas não têm consistência, transformando-se cons- tantemente. Somente algumas figuras ainda se conservam! Começo até a ficar tonto! Que vem a ser essas larvas luminosas de espécie tão variada?! Quando tento agarrar uma ou outra, nada fica em minha mão! Que brincadeira é essa?”
Diz Raphael: “Espera um pouco e verás algo mais substan- cial!” Nisto se aproximam do romano várias aves e peixes, voando e flutuando no ar, e ele agarra um exemplar de cada um. Virando-se para o anjo, Agrícola diz: “Amigo celeste, faze com que eu veja o ar natural, para certificar-me se tenho pássaro e peixe nas mãos!”
Diz Raphael: “Como não! Podes analisar tuas presas!” Achan- do-se novamente na vibração natural, Agrícola percebe suas mãos vazias. Estupefato, ele exclama: “Mas onde estão? Vejo ter sido mi- nha visão mais sonho que realidade!”
Diz o anjo: “Justamente o contrário! Há pouco te encontra- vas mais próximo da realidade que agora! Ainda seguras pássaro e peixe — em tuas mãos psíquicas, e te digo não te abandonarem tão
cedo esses animais, correspondentes à tua índole, nem eles a ti. Tens em Roma, como patrício antigo, um escudo em cujo lado externo se vê, em dourado, um pássaro com uma espiga no bico e um peixe com um verme na boca, e como prezas tais insígnias mundanas, não te libertarás tão cedo.
Através da visão psíquica chegaste a ver muitas figuras e for- mas, de acordo com tuas experiências recentes; todavia, não pudeste fixá-las. Teus pensamentos em constante mutação em formas diver- sas apresentam-se tal qual à tua alma. Apenas os emblemas de tua família continuam em tua mão psíquica, idêntica à tendência e ao desejo externos da alma; caso queiras vê-los materialmente, poderei realizá-lo.”
Diz Agrícola: “Peço-te tal favor para ver se realmente são se- melhantes aos meus e talvez consiga me livrar mais facilmente de minha tolice.”
Diz o anjo: “Facilmente poderás consegui-lo afastando teu coração de tais futilidades, dirigindo-se inteiramente ao Senhor. Se o puderes, esses animais deixarão a tua alma; materialmente ficarão em tuas mãos o tempo que eu quiser. Quero que desapareçam — e já não mais existem! Demonstrei-te tudo que a verdade interna te po- derá esclarecer mais e mais; o resto terás que descobrir dentro de ti!”
PROCESSODATRANSFORMAÇÃOINTERNADO HOMEM
Em seguida o anjo se dirige, a um aceno Meu, a Lázaro e am- bos vão verificar se fora preparado o almoço, com as ovelhas criadas por Raphael. Agrícola então Me diz: “Senhor e Mestre, sinto algo estranho dentro de mim, após as explicações daquele espírito ange- lical. Partindo de Ti, já assisti a muitas coisas elevadas, achando-me cada vez mais confortado; agora, porém, sou estranho a mim mes- mo! Que vem a ser isto?”
Respondo: “Meu amigo, tudo está dentro da ordem! Enquan- to não te tornares estranho a ti mesmo, tua aproximação do Reino de Deus não é mui forte; tão logo sintas certa estranheza, prova o
despertar do teu espírito, que deu um passo à frente, em tua alma. Dando-se isto pela primeira vez em tua vida, podes considerá-lo de bom agouro. Repetir-se-á sempre mais positivamente.
Deves com isto ficar muito satisfeito, pois prova a forte ati- vidade do teu espírito dentro da alma! Enquanto te encontras na sensação corriqueira e habitual, pertences a este mundo, sem a ca- pacidade de te aproximares realmente do Reino de Deus. Quando o espírito puro desperta e começa a penetrar a criatura, com sua vida e luz, inicia vida inteiramente nova, jamais imaginada. Nisto se baseia a prova máxima que o homem inicia após o desprendimento do corpo: uma existência nova, nunca imaginada e conhecida.
Quanto ao desprendimento físico da alma humana, não Me refiro à morte propriamente dita, mas àquele estado em que a cria- tura expulsa, quase inteiramente, todos os desejos sensuais e mun- danos, começando a viver dentro do espírito.
Com grande ímpeto ele se prende à alma que, sempre mais sensível, entra em contato com o mundo espiritual verdadeiro. Esse mundo, anteriormente desconhecido, repousa no fundo do coração humano, semelhante à faísca pura do espírito na membrana germi- nadora da semente.
Enquanto não morrer dentro da terra e se dissolver de tal for- ma que suas partes anteriormente sólidas comecem a ingressar na semelhança do espírito — ele queda oculto e inerte. Tão logo a maté- ria da semente amolece na Terra, começando a dissolver-se, asseme- lhando-se em suas partículas psíquicas ao espírito oculto no gérmen, o espírito começa a organizar os elementos afins. Penetra-os, cada vez mais, e dá-se uma situação nova, conforme observas em cada vege- tal recém-surgido. Tal observação nas sementes, em pequena escala, ocorre em proporções vastas e totais no homem, quando destrói seus desejos físicos e psíquicos através de sua vontade firme, dissolven- do-os, e pela sublimação os torna sempre mais idênticos ao espírito.
Em tal situação, a criatura não se pode sentir a gosto, por- quanto está habituada a viver dentro do mundo; com o tempo, se familiariza com seu mundo novo interno e unicamente verdadeiro,
e o externo começa a se tornar estranho. Por isto não te preocupes por ter Meu Raphael te sacudido um pouco mais que de costume; foi apenas em teu benefício.
Como espírito puro, pôde agir diretamente sobre o teu, de modo mais forte que qualquer criatura iluminada que, entretanto, não tenha alcançado o pleno renascimento espiritual. Foi grande vantagem para tua alma, permitida por Mim; portanto, não há mo- tivo de apreensão! Quando fores mais frequentemente atingido por tal sensação, podes alegrar-te; pois demonstrará a aproximação mais estreita do Reino de Deus no coração de tua alma. Compreendeste?”
Diz Agrícola: “Agradeço-Te, Senhor, por esta explicação ben- dita! A sensação perdura, sem perturbar-me. Apenas desejava saber como o anjo estava ciente dos emblemas do meu escudo antigo; acha-se ele em Roma e nós, aqui. Como podia vê-lo?”
Digo Eu: “Nada disto precisa porque, como espírito puro, viu tudo minuciosamente dentro de tua alma. Além do mais, pode- ria ter transportado para aqui o mencionado escudo!”
Diz Agrícola: “Isto certamente será mais difícil; muito em- bora seu espírito penetre toda a matéria, podendo dissolvê-la, a ma- téria não poderá penetrar a si mesma. Meu escudo se acha num ar- mário de pedra, trancado com porta de aço. Seria preciso destruí-la inteiramente para tirar o escudo, e caso o transportasse com grande velocidade, seria dizimado pelo ar!”
Digo Eu: “Julgas dentro de tua compreensão; a noção dos espíritos puros é bem diversa. O anjo nem precisaria ir a Roma; bastaria vontade e conhecimento penetrantes, lá dissolveria o escudo como fez à pedra através da vontade, e aqui condensaria a matéria à sua forma. Vês, portanto, nada ser impossível! Medita um pouco e tua alma se iluminará! Eis que voltam do Templo os dois discípulos acompanhados de alguns homens. Aguardemos sua chegada para relatarem os acontecimentos lá verificados.”
Dentro em pouco chegam quatro homens: um deles é nosso hospedeiro no vale, vizinho de Lázaro das proximidades de Bethânia, onde fiquei várias vezes e o outro, amigo deste, também tavoleiro perto de Bethlehem, dono de enorme hospedaria na estra- da principal. Lá entrei certa vez curando muitos enfermos. Os dois discípulos, Thomaz e Judas, os acompanham, e o último pretende fazer um relato minucioso de tudo que havia sucedido no Templo.
Interrompo com as palavras: “Fala quando fores convidado; por enquanto ainda sou Senhor e Mestre de todos, e bem sei a quem incumbir da tarefa do relato!” A esta reprimenda Judas recua aborre- cido e diz a Thomaz: “Já esperava por essa!”
Diz o outro: “A caminho avisei-te de que não devias salien- tar-te! Acaso ainda não aprendeste com as inúmeras lições do Se- nhor ter valor apenas quem se humilha constantemente?! Eu não me adiantei e também não fui advertido! Além disto, vieram esses dois homens que presenciaram os fatos antes de nós. Voltemos ao nosso local de sempre e façamo-nos observadores.” Conformado, Judas se- gue o conselho do apóstolo.
Entrementes, dirijo-Me ao vizinho de Lázaro e o convido a contar o que se passara, e ele diz: “Senhor e Mestre, já desde madru- gada me encontrava no Templo, em virtude dos fenômenos extraor- dinários; soubesse eu que Tu estavas no Horto das Oliveiras, teria vin- do aqui. Assim, eu e esse amigo fomos ao sinédrio, onde a confusão era indescritível. Vez por outra um sacerdote subia ao púlpito para dar explicações; percebendo sua incompetência, o povo se revoltou, mormente quando convidado a sacrifícios e penitências, dizendo: Quantos atos de contrição foram por nós efetuados e alegastes estar Jehovah satisfeito! Nesta noite vimos o efeito de tudo, porquanto a Ira Divina era inegável! Disto não nos cabe culpa, mas a vós que nos levastes a atos criminosos, alegando com isso ingressarmos dire- tamente no Céu. Chegou vossa vez de fazer penitência pelos pecados cometidos por vós aos profetas, e Deus certamente nos aceitará!”
(O hospedeiro): “O sacerdote afirmou então ter jamais assas- sinado um profeta, tampouco seus colegas. Isto despertou nova rea- ção no povo que exclamava: Há mais de quarenta anos és sacerdote e alegas não teres presenciado o estrangulamento do bom Zacharias
— faz vinte e cinco anos?!
Há alguns meses o filho dele foi por vosso intermédio captu- rado pelos esbirros de Herodes. Quando este percebeu a inspiração divina em João Baptista, tratou-o qual amigo, deixando-lhe toda liberdade. O espírito do mal em breve vos informou a respeito e começastes a tramar o aniquilamento do pregador. Na perversa ge- nitora de Salomé, encontrastes um instrumento apropriado, conse- guindo vosso plano escabroso.
Atualmente existe outro profeta, da Galileia, do qual João di- zia não ter mérito para desatar-Lhe as sandálias e do Qual os profetas haviam predito ser Ele o Messias.
Qual foi vossa resposta? Não poder surgir nenhum na Ga- lileia, e todos os que Nele cressem seriam amaldiçoados. Refuta- mo-vos da seguinte forma: Jamais constou não aparecer da Galileia o Próprio Messias! Não faz muito esse grande Profeta doutrinou no Templo de modo tão sábio, que vossos esbirros incumbidos de prendê-Lo afirmaram jamais alguém ter falado tão sabiamente!
Lázaro, proprietário de Bethânia, era membro de vosso Con- selho e, como homem mais rico da Judeia, fazia grandes oferendas ao Templo. Não satisfeitos com isto, procurastes convencê-lo de que seria melhor legar seus haveres ao sinédrio, pois os pobres deveriam trabalhar para seu sustento.
Ele, de comum acordo com as irmãs, resolveu consultar os necessitados — com exceção dos enfermos — se estariam dispostos a qualquer serviço, mediante boa remuneração. Assim fez e conse- guiu cultivar suas terras, continuando a proporcionar grandes auxí- lios ao Templo. Todavia, não vos conformastes, procurando desviar os trabalhadores de Lázaro. Não surtindo efeito vossa traição, outros
meios foram empregados: proferistes maldição contra o Monte das Oliveiras, porque seu dono não queria fazer-vos doação do mesmo!
Porventura estava vossa ação dentro da Vontade de Deus, pela qual não se deve cobiçar os bens do próximo? Em sua defesa Lázaro tornou-se cidadão romano, gozando de proteção total; em compensação, paga taxa reduzida, ao passo que vos é sustada a pene- tração de suas terras por meio de cães ferozes!
Qual foi vossa vantagem?! Acaso vossos direitos se baseiam nas leis romanas?! Por isto Deus vos demonstrou o destino reservado a Jerusalém e ao Templo! Quantas fortunas açambarcastes das viúvas e órfãos, prometendo-lhes a bem-aventurança temporal e eterna?!
Informados de alguma jovem bonita, solteira ou não, envi- áveis um templário disfarçado a fim de levá-la ao mau caminho, do qual nunca mais se salvava devido a ameaça de apedrejamento. De há muito não acreditais em Deus, arrogando-vos o direito de representá-Lo, e para tanto foram criadas leis novas visando vossa cobiça e gula. Nesta noite, porém, Deus surgiu novamente testemu- nhando ser o Mesmo da época de Abraham, Isaac e Jacob. Sois, por- tanto, os únicos responsáveis pelas calamidades futuras! — Diante de ameaças tão fortes, o sacerdote só podia alegar sua fraqueza, suge- rindo a presença de um escriba.”
AQUESTÃODO BELEMITA
(O hospedeiro): “Quando o escriba subiu ao púlpito, come- çou a falar com ênfase: Deus apenas Se dirigia a Moysés e Aaron; nunca o fez diretamente ao povo, preso ao bezerro de ouro! Lem- brai-vos bem que jamais o povo representa a Voz de Deus, manifes- tada apenas pelos profetas ou por nós, sacerdotes. Se, entretanto, insistis em tal absurdo, cometeis grave pecado contra Jehovah e seus representantes. Somos indulgentes com vossa fraqueza, perdoando tal pecado; ignoramos se Ele também o fará!
A multidão se irritou com tais palavras e um belemita tomou a dianteira, falando em nome de todos: Sabemos tanto quanto vós
ter Deus falado a Moysés e Aaron; igualmente é sabido ter Ele Se di- rigido, no princípio, somente ao povo. Amedrontados pela voz tro- vejante de Jehovah, os judeus pediram que Ele Se dirigisse apenas a Moysés; mas deixemos esse assunto, abordarei algo mais importante.
Pedimos-te explicação pela suplantação das Leis dos profetas por ditames egoísticos e dominadores, e qual o motivo do assassí- nio dos profetas, inclusive Zacharias, João e agora até pretendeis o mesmo com o maior de todos, autor de milagres inéditos, pregando além disto a Palavra Divina?!
Milhares testemunham Sua Pregação e Atitudes milagrosas, dando-nos direito de expressarmos nossa opinião. Respondei com clareza, do contrário sentireis os punhos do povo revoltado. — Des- culpando-se com indisposição acometida, o escriba desaparece e se esconde num canto do Templo.”
HISTÓRIADOPOVO JUDAICO
(O hospedeiro): “Logo em seguida subiu ao púlpito um ve- lho e venerando rabi, amigo de Simeon e Zacharias. Confiante com sua presença, a multidão lhe pediu algumas palavras de conforto. E ele começou: Meus amigos! Perdoai a minha língua não possuir a mesma verbosidade de antanho; todavia, não me falta boa vontade para satisfazer-vos.
Os sinais desta noite, transmitidos pelos Desígnios de Deus, foram de molde a fazer tremer a todos, inclusive pagãos. Tudo neste mundo é perecível, somente eterna é a Onipotência de Deus, da qual dependem as nossas almas. Se elas continuam a viver após a morte física, até hoje ninguém sabe; todos os profetas o ensinaram e somos obrigados a crer — e se não o fizermos, somos idênticos aos saduceus que se deixam seduzir pelos filósofos gregos.
Infelizmente existe, mormente no Templo, maior número de saduceus que entre vós, onde os ricos nada mais acreditam, apli- cando apenas fé externa. A plebe vendo tal atitude, segue o exem- plo, dando-se um círculo vicioso, comparável à época de
Noé e Lot.
Deus mandava Seus mensageiros luminosos às criaturas da Terra, advertindo-as sobre as consequências de sua teimosia; elas, tendo-se desviado em demasia da religião, não davam ouvidos aos mensagei- ros, martirizando-os e até mesmo os matavam.
Em tempos dos juízes ainda não havia cidade propriamente dita, apenas comunidades com simples habitações e, no centro do país, no Monte Horeb, a tenda sagrada onde se encontrava a Arca da União. Os judeus não precisavam de fortalezas, porquanto eram defendidos por Jehovah; viviam em paz, com saúde e desconheciam miséria.
Pelos fins da era dos juízes, os judeus se entregaram ao ócio e desconsideraram os Mandamentos. As advertências recebidas sur- tiram efeito nos de boa índole; os materialistas apenas mantiveram as aparências, enquanto no íntimo o mundo sobrepujava. Não só insatisfeitos com suas habitações rústicas, exigiram igualmente um rei, cidade e castelos sólidos, e sob o regime de Samuel tornaram-se insistentes nesse sentido, até que Deus, o Senhor, falou: ‘Eis um povo ingrato! Não se contenta com Minha Orientação, juntando aos muitos pecados praticados perante Mim o maior — a exigência de um soberano. Tê-lo-á!’ Faço esta súmula para compreenderdes o motivo da atual queda total do judaísmo, antigo e verdadeiro.
Saul já teve sólido castelo, muito embora ainda não houves- se cidade propriamente dita. De pronto surgiram guerras contra os filisteus, e os pais se viram obrigados a entregar filhos, serviçais, in- clusive animais caseiros. Tal foi a bênção de um rei judeu, enquanto Samuel era vivo e ungiu Saul a mando de Deus. Samuel julgou estar o povo curado de seu orgulho, mas em vão! Exigiu um rei mais poderoso e sábio, e Samuel ungiu David que em breve construiu Bethlehem e deitou o fundamento de Jerusalém. Seu filho Salomon acabou a construção de cidade e templo, com grandes gastos e pom- pa; o povo, porém, caiu em grande penúria e miséria. Pelos livros da Crônica, sabemos de sua sorte até a prisão babilônica e devia-se acreditar que os quarenta anos daquela prisão tivessem modificado a índole judaica; pelo contrário, queriam à força outros soberanos, pagãos, sacerdotes e sumos pontífices!
A época dos profetas vem até nossos dias; o povo, obscureci- do com o regime, nada mais entendia e, além disto, reis e sacerdotes perseguiam os profetas com ódio e vingança cruel — cenas que ireis ainda assistir, muito embora não haja mais soberanos, e os judeus de há muito suportem o regime férreo dos pagãos.
Desta vez, Deus Se apiedou do Seu povo e enviou um Mes- sias na Pessoa do Sábio de Nazareth, o Qual conheço desde pequeno quando foi circuncidado por Simeon, recebendo o Nome de Jesus. Digo-vos isto como Verdade suprema; mas os judeus do Templo perseguem com ódio a todos que divulgam tais segredos.
Eis o motivo pelo qual Deus permite fenômenos como os desta noite! Os pecados dos templários quase atingem a medida permitida por Deus, e a grande Paciência de Jehovah pende num fio de cabelo. Quando ultrapassar tal medida, acontecerá a Jerusalém o que vistes na segunda aparição e talvez ainda antes de decorrerem cinquenta anos.
As doze colunas de fogo, finalmente reduzidas a uma só, apontam a consolidação das doze tribos de Israel na Pessoa do Mes- sias, que no final, não sendo aceito, voltará de onde veio.
A Leste houve ainda outro sinal confortador, como me disse Nicodemus, mas somente visto por aqueles que aceitam o Messias. Deixo que o meu amigo faça o relato pessoalmente. — Com tais pa- lavras, o orador recomendou paciência ao povo e desceu do púlpito. E o belemita afirmou: ‘Eis um judeu da escola de Aaron; ele sozi- nho nada conseguirá! O importante é a existência de crentes entre fariseus e escribas!’ Observações semelhantes foram feitas, e todos aguardavam a chegada de Nicodemus.”
DISCURSODENICODEMUSAO POVO
(O hospedeiro): “Um arquifariseu havia assistido à simpática manifestação de fé no Salvador de Nazareth, por isso se dirigiu ao púlpito e disse: Baseado no poder sacerdotal vos digo: quem crer no mencionado Salvador, afirmando ser o Messias Prometido, será amaldiçoado pelo Templo!
Mal terminou essas palavras, a tribuna foi rodeada pela mul- tidão que gritava: Nós afirmamos que quem não acreditar Nele será por nós amaldiçoado! Todavia, merece sete maldições e a própria morte o sacerdote, incumbido de conhecê-Lo antes do povo! Mi- serável, não assististe os milagres desta noite? Espera, que sentirás nossa simpatia!
A tal recepção, o templário começou a pedir socorro, en- quanto o povo gritava mais ferozmente! Nisto, o belemita de porte gigantesco adiantou-se, sacudiu o fariseu de tal forma a quase fazê-lo perder os sentidos e, em seguida, carregou-o para perto do repos- teiro do qual surgira; e aplicando-lhe mais algumas bofetadas, lhe disse com voz possante: Desta forma o povo esclarecido entregará o dízimo aos sacerdotes! Some, do contrário pagarás com a vida!
— Completamente atordoado, o fariseu desapareceu e se escondeu num cubículo de sua casa.
Logo em seguida apareceu um mensageiro romano, postou-
-se na tribuna destinada aos oradores comuns e disse: O prefeito vos adverte, em nome da lei, de vos absterdes de qualquer ato violento! Deveis considerar ter sido construído esse Templo para honra de vosso deus! Se vos for feita injustiça por parte de um templário ig- norante, estamos prontos para vossa defesa!
O belemita agradeceu em nome de todos e acrescentou: Tua advertência foi boa; mas quando as forças celestes começam a dese- nhar sua vontade no Firmamento, as ordens dos homens em breve estarão findas!
Respondeu o romano: Não resta dúvida; no entanto, as cria- turas não alterarão aquelas forças através de brutalidades! Conside- rai, pois, o conselho do prefeito!
Entrementes, apareceu Nicodemus, recebido com grandes salvas! Com calma ele disse: Amigos e irmãos! Venho apenas confir- mar as palavras do nosso amigo, e folgo em poder lidar com homens simpatizantes de minhas convicções!
O arquifariseu fez queixa ao sinédrio de vossa reação e foi informado de ser imprudente procurar insuflar o povo alterado.
Sendo desta forma confortados, convém agradecerdes a Deus e vos retirardes aos lares! E caso encontreis outros à procura de informa- ções, esclarecei-os a fim de que poupem a longa caminhada, pois o Templo ficará fechado hoje e amanhã.
Em seguida, a multidão indagou da explicação do terceiro fenômeno, e Nicodemus respondeu: Informar-vos-ei, mas em sur- dina, por terem essas paredes ouvidos! Esperai-me à tarde no cami- nho para Emaús. — Eis, Senhor, o meu relato dos acontecimentos no Templo!”
CONSELHODOS FARISEUS
Digo Eu: “Caro amigo, relataste fielmente o sucedido e o que se referia à Minha Pessoa. Minha Vontade auxiliou-te, pois sem Mim tudo no homem é fraco; com Minha ajuda torna-se forte em tudo.
Deu-se o possível para a nossa causa: o povo e Nicodemus Me descreveram Tal Qual Sou e devia-se supor estar o Templo con- vertido. Nada disto! O rabi e Nicodemus estão em apuros com os demais fariseus por Me terem declarado o Messias. Inspirei-lhes a devida resposta e Nicodemus acabou de retrucar com tamanho fer- vor, que ninguém mais conseguiu reagir.
O sumo sacerdote acusava o rabi e Nicodemus de terem con- fessado abertamente o Meu Nome no Templo, enquanto deveriam lançar suspeitas contra Mim, afirmando ter sido Eu um falso dou- trinador e revolucionário, causador da Ira de Deus.
Nicodemus então respondeu a Caifás: Ora, julgando-vos tão inteligentes, ide ao Templo ainda repleto e falai como de costume, e aguardemos a reação popular. Centenas de vossa classe falaram ao povo e o efeito redundou na fuga do profeta, a fim de evitar seu massacre. Que teríeis feito caso fôsseis atrozmente judiados? Não é, portanto, mais prudente adaptarmo-nos à situação?
Foi inteiramente inoportuno fazerdes advertências rudes à multidão e cabia-vos apenas consolá-la. Além disto, tu mesmo, Cai- fás, nos convidaste a apaziguar os ânimos! Por que essas reprimendas
quando agora todos estão calmos? Ainda está em tempo de arriscardes vossa pele; cuidado, porém, pois todos conhecem vossos pecados!
Respondeu o sumo sacerdote: Se for preciso temer o povo, deixamos de ser sacerdotes! Não é possível cedermos — venha o que vier!
Disse Nicodemus: Podes fazer o que te agrada; mas que farás se todos se colocarem sob a proteção romana? Quais seriam os meios de atraí-los novamente ao Templo?
Qual foi a vantagem de tua obstinação contra Lázaro? Tornou-se romano e perdeste toda influência sobre ele. Anterior- mente doava ao sinédrio no mínimo cem libras de ouro e quinhentas de prata por ano; agora paga somente o dízimo, todavia o suspende- rá, porque já houve combinação a respeito com os romanos. Se, em virtude de tua obstinação, outros seguirem o exemplo de Lázaro, fi- caremos isolados no Templo! Eis minha opinião, e as consequências demonstrarão ter eu falado a verdade! — Tal assertiva não foi do agrado do sumo sacerdote, entretanto nada pode obstar, por haver outros decanos de acordo com Nicodemus.
Após algum tempo, Caifás irritou-se novamente: Sei o que fazer para voltarmos à antiga segurança: o falso profeta da Galileia tem de desaparecer — e o povo voltará a nós! Falei certo?
Muitos fariseus e escribas concordaram, ao passo que Nicodemus, vários decanos e o velho rabi contestaram, e o último disse: Sou o mais idoso entre vós e sei o que se passa há oitenta anos no Templo e na Judeia. Por várias vezes surgiram criaturas inspira- das, sempre perseguidas e aniquiladas pelo Templo. Examinai nossos apontamentos diários e verificareis ter sido prejudicial tal proceder, pois jamais o sinédrio aumentou sua reputação com tais crimes!
Onde estão os samaritanos, os saduceus? Quantos não se tornaram essênios? Outros, gregos e romanos? Quem ainda nos visitaria de Tyro e Sidon, da Capadócia, Syria e das cidades do Euphrates? Na minha mocidade, o Templo de lá recebia grandes so- mas e riquezas, e tornou-se altivo e cruel! Os sacerdotes desrespeita- ram o Mandamento ‘Não matarás!’ e a consequência foi a supressão
daquelas dádivas. Se continuardes nas crueldades dos antepassados, em breve perdereis os que já se acham abalados no Templo!
Novamente Caifás se virou para Nicodemus e perguntou se concordava com o parecer do rabi. E ele disse: Já me expressei e re- pito não concordar nem protestar. É como falou o meu velho amigo. Não devo satisfação quanto à minha convicção íntima, e de agora em diante pouco direi em público. Sou chefe de Jerusalém e reitor acreditado pelo imperador sobre todos os cidadãos, assistindo-me o direito de jusgladii. Fazei o que vos agrade; deixar-vos-ei com meu amigo, e caso queirais ouvir algumas palavras razoáveis, dirigi-vos a Emaús onde estarei em minha propriedade.”
DESENTENDIMENTONOALTO CONSELHO
(O Senhor): “Perplexos, os templários procuraram solução para o caso, e Caifás propôs alguém tentar insuflar outras ideias à multidão, mas nenhum deles se animou. Como se aproximava do meio-dia, incumbiu-se um acólito de se dirigir ao átrio convi- dando o povo a retirar-se; o Templo ficaria fechado em virtude do antessábado e para limpeza.
O empregado assim fez, mas foi mal recebido, pois o gigan- tesco belemita gritou: Sabemos quando convém deixarmos o Tem- plo! Além do mais, abandoná-lo-emos para nunca mais voltar; pois ele e seus moradores são culpados da desgraça anunciada.
Orientado desta sentença recebida pelo acólito, Caifás aduziu: Eis o que há muito afirmei: somos traídos pelo nazareno, que pela ma- gia conquistou a amizade dos romanos. No mínimo consideram-no semideus, e dentro em breve fá-lo-ão vice-rei dos judeus! Por isto de- veríamos tudo empreender para exterminar esse homem perigoso!
Disse um decano: De minha parte já esclareci ser precária nossa situação: como amigo dos romanos, nada de bom nos espera, caso o deixarmos prosseguir na conversão. Que fazer?
Disse um outro: Eu saberia, caso fosse sumo sacerdote! Inda- ga Caifás: O quê? Prossegue o primeiro: Bem, estamos a sós e posso
falar abertamente. Na realidade rejeitamos Jehovah, Moysés e todos os profetas, tornando-nos puramente detentores da letra, pois entre nós ninguém tem fé! Sendo evidente a adesão do povo ao nazareno, façamos o mesmo, ao menos proforma, lucrando igualmente com os romanos!
Com um salto Caifás reagiu: Também te queres tornar trai- dor?! És amaldiçoado por mim!
Disse o decano: Repete isto diante do povo; perante o Con- selho não te assiste tal direito! Lembra-te bem, do contrário teremos que procurar o prefeito!
Aparteia um outro: Aqui temos o direito de falar sem ro- deios. Se pretendes fazer prevalecer tua vontade, de nada adianta nossa assembleia e seria conveniente sustá-la no futuro. Que não foi feito pelo Templo a fim de prender o nazareno, sem resultado? Por que não deste ordem de prisão quando pregou no átrio?
Disse Caifás: Quem teria coragem de reação contra o povo?
Retrucou o decano: Se assim é, por que amaldiçoas um co- lega que isto afirmou?! Caso tomarmos providências contra ele, nos- so destino estará selado; deixando-o agir à vontade, nossa existência perdurará por algum tempo, mormente aceitando algumas reformas do serviço templário. Segundo teu conselho, nada nos restará, senão fugir! Tenho dito!
Eis que todos começaram a discutir: uma parte a favor dos decanos, outra assistindo ao sumo sacerdote. Finalmente os primei- ros se retiraram aos lares; os fariseus, entretanto, também se despe- dirão dentro em pouco, pois já é meio-dia.
Eis a situação no Templo, e Eu a transmiti tão minuciosa- mente a fim de que saibais o efeito nulo das advertências noturnas sobre essa ninhada de serpentes! São e serão incorrigíveis, por isto a Luz lhes será tirada e entregue aos pagãos. Eis que vêm Lázaro e Raphael nos chamar para o almoço; vamos entrar!”
Diz Agrícola: “Senhor e Mestre, Teu relato acerca do Con- selho e da atitude dos sacerdotes me revoltou de tal maneira, que tenho vontade de comunicar tudo a Cirenius.”
Digo Eu: “Amigo, sabes do Meu Poder! Mas se quisesse jul- gá-los pela força, em nada os beneficiaria, porquanto Minha Onipo- tência não pode modificar o livre arbítrio. Isto compete à Doutrina pela qual a criatura determina sua ação. Não querendo aceitá-la e muito menos aplicá-la, ipso facto é má e encontrará dentro de si seu próprio julgamento!”
JEJUME ORAÇÃO
Como os aduaneiros haviam partido após o desjejum, o es- paço na sala é maior, de sorte a se acomodarem alguns escravos mais compreensivos, acompanhando o nosso almoço. Eram cerca de trin- ta e lhes fora dada capacidade de entendimento do nosso idioma, para proveito próprio e de seus companheiros.
Quando o vinho começa a produzir seu efeito, os greco-judeus discutem a respeito das leis do jejum e um deles faz a seguinte obser- vação: “Desde Moysés os judeus tiveram de respeitar certos dias e até mesmo semanas inteiras. Os profetas muito aplicavam o jejum para reduzir as sensações carnais, dando livre ação ao espírito. De igual modo jejuavam frequentemente os visionários, a fim de facilitarem a visão espiritual. Quem desejasse receber Graça especial de Deus deveria fazer promessa de jejuar, orar tempo determinado e sempre era atendido.
Neste ambiente não se fala em jejum. Dá impressão querer o Senhor e Mestre abolir tais promessas antigas. Entretanto, seria proveitoso ouvirmos Dele Mesmo o que seria justo.” A tais palavras, um do grupo se vira para Mim e repete a questão.
Fixando-o, digo: “Em boa ocasião abordei este assunto; foi, como outros, por vós esquecido. Assim repito: de modo algum revogo a lei do jejum! Quem jejua no sentido verdadeiro não deixa de beneficiar-se, porquanto torna mais livre e espiritualizada sua alma. Ninguém, porém, atingirá a bem-aventurança por este meio, mas simplesmente pela fé em Mim e cumprindo a Vontade do Pai, transmitida por Mim. Tal cumprimento pode ser efetuado sem
consideração a determinados dias, abstenção de certos alimentos e bebidas.
Quem desfrutar de fartura e aplicar o verdadeiro amor ao próximo jejuará com justiça; tal jejum é agradável aos Olhos de Deus e útil à vida eterna da criatura. Quem tiver grandes posses, que dê de acordo; o menos rico poderá dividir o pouco entre seus semelhantes, juntando tesouros nos Céus! É mais feliz quem dá, do que quem recebe!
Quem pretende jejuar com justiça perante Deus e em be- nefício da vida eterna da alma abstenha-se do pecado por amor a Deus e ao próximo; pois os pecados pesam na alma, dificultando sua ascensão.
Quem, qual fariseu e alguns ricos, vive pela gula e não presta ouvidos à pobreza comete pecado contra a lei do jejum, tanto quan- to o adúltero e impudico.
Se o físico de uma criatura solteira ou casada te atrai e se- duz desvia o teu olhar, abstém-te do prazer carnal e terás jejuado realmente!
Alguém te ofendendo e irritando, perdoa-lhe e faze as pazes; terás feito jejum valioso.
Se, todavia, fizeres o Bem a quem te prejudicou e abençoa- res a quem te amaldiçoa — jejuaste verdadeiramente.
O que é ingerido pela boca para alimentar e fortificar o corpo não vilipendia o homem; mas o que dele se atira sobre o pró- ximo, como sejam: calúnias, crítica, palavras obscenas, maldições, falso testemunho, mentiras, maledicências e blasfêmias, maculam o homem que deste modo quebra o verdadeiro jejum.
Jejuar com justiça quer dizer desistir de tudo, suportar com paciência o fardo destinado e seguir-Me; pois Eu Mesmo sou de todo coração Meigo e Paciente.
Não vem ao caso qual o alimento ingerido; apenas deve ser limpo e suportável. Muita precaução no uso da carne, caso queirais desfrutar de vida longa e saudável! A carne de animais sufocados é prejudicial, porque gera maus espíritos nos nervos; e a carne dos
animais considerados impuros é apenas saudável quando preparada como ensinei.
Quando vos dirigirdes, em Meu Nome, a povos diversos, podereis comer o que vos oferecerem! Nunca vos excedais! Na medi- da justa, tereis aplicado o jejum; todo o resto é superstição e enorme tolice dos homens, de onde serão libertados tão logo queiram.
Quanto à oração segundo os judeus, não tem valor e re- presenta um horror para Deus. Qual seria o efeito das prolongadas preces labiais, mormente quando pagas a oradores privilegiados, na suposição de serem somente elas proveitosas e fortes?! Digo-vos: se milhares de tais pregadores orassem durante mil anos, seriam tão pouco ouvidos por Deus quanto o ornejar de um burro esfaima- do. Essas preces são verdadeiro coaxar de rãs no brejo, sem senti- do e razão.
Deus é em Si Espírito de máxima Sabedoria, detentor da Inteligência mais profunda e lúcida e a própria Verdade. Quem, pois, quiser orar a Deus de modo efetivo terá de fazê-lo em espírito e verdade. Assim faz quem se dirige ao silencioso recôndito de amor, no coração. Deus, que perscruta todos os corações, facilmente vos analisará, descobrindo de pronto quais vossos desejos, atendendo aos pedidos feitos em espírito e verdade.
A prece verdadeira consiste no cumprimento dos Manda- mentos e na prática da Sua Vontade por Amor a Ele. Quem ora des- te modo fá-lo em verdade e ininterruptamente. Todos os anjos dos Céus Divinos adoram a Deus constantemente, porque executam a Vontade do Pai.
Ele não quer ser adorado, venerado e louvado com salmos, saltérios, harpas, címbalos e cornetas — mas pela permanente ação viva dentro de Seu Verbo e Vontade.
Ao analisardes as Obras de Deus descobrindo cada vez mais Seu Amor e Sabedoria, crescendo na dedicação e tornando-vos sem- pre mais sábios, igualmente orais em verdade, ofertando-Lhe justo louvor; quanto ao que até então entendestes por orar, é oco, nulo e sem valor.
Sabeis o que significa jejuar e orar, portanto não pergunteis por que Eu e Meus discípulos não agimos como judeus e fariseus ignorantes. Fazemo-lo em espírito e verdade, incessantemente, e é ridículo perguntar-Me tal coisa.
Meus discípulos não devem jejuar enquanto Eu permanecer com eles como justo Noivo de suas almas; quando não mais estiver em seu meio como agora, terão que jejuar fisicamente, porquanto o egoísmo das criaturas pouco e até mesmo nada lhes dará para comer. Tereis compreendido isto?”
Respondem todos: “Perfeitamente, Senhor e Mestre! Eterna gratidão por Ensinamento tão profundo!” Concluo: “Agi de acordo, que vivereis em verdade! E agora fortificai-vos sem receio!”
OSSERVOSDOTEMPLO DISFARÇADOS
Após nos termos fartado, chega um empregado de Lázaro e lhe diz: “Patrão, lá fora estão algumas pessoas pedindo falar-te em particular. Segundo parece, são de Bethlehem, de aspecto paupérrimo!”
Vira-se Lázaro para Mim: “Senhor, qual será o desejo deles? Seria fácil falar-lhes caso eu fosse prevenido.”
Digo Eu: “Não podes confiar neles! Não são de Bethlehem, mas templários disfarçados, que por meios persuasivos vêm pedir-te informações a Meu respeito. Estarão até mesmo dispostos a se torna- rem Meus adeptos, tão logo saibam de Meu paradeiro. Debaixo de seus mantos ocultam cordas e espadas, para Me levarem à força ao Alto Conselho de Caifás. Essa raça adúltera e criminosa encheu-se de coragem após o afastamento do povo. Meu Tempo, porém, ainda não chegou. Enfrenta-os com Raphael, que saberás o que dizer, en- quanto ele fará o que lhe cabe.”
Aproximando-se Lázaro do grupo de vinte homens, todos se levantam e o orador diz, após profunda reverência: “Caro e bom amigo! Todos nós somos das proximidades da velha cidade de David e aqui corremos aflitos, em virtude dos sinais horríveis ocorridos
durante a noite, e desejamos saber o que nos aguarda possivelmen- te. Para tal fim já estivemos no Templo, onde as opiniões eram as mais contraditórias e desconsoladoras. Quando a irritação popular atingira o auge, um velho rabi informou caber a maior culpa aos templários e sua atitude condenável diante da doutrina de Moysés, parecer este por nós aceito. No final, referiu-se a um tal profeta Jesus da Galileia, e sem o menor escrúpulo alegou ser aquele o Prometido Messias! E o povo exultava de alegria!
Como concordássemos, resolvemos descobrir o nazareno e possivelmente nos tornarmos seus discípulos. Desde cedo estamos à procura de informes e soubemos que talvez nos pudesses orientar, porquanto o profeta é amigo especial de tua casa. Se assim for, pedi- mos nos esclareças para nos dirigirmos incontinenti a Ele.”
Responde Lázaro: “Deveis estar cientes ter sido eu devoto prosélito e colaborador do Templo; a ganância do sinédrio aumen- tava constantemente, a ponto de querer que eu me tornasse men- digo. Quando percebi não surtirem efeito minhas ponderações em contrário, nada mais pude fazer senão aceitar a cidadania romana. Bastaria me tocardes com um dedo apenas, e amanhã teríeis que responder diante dos juízes de Roma, merecendo certamente julga- mento capital — o que convém ressaltar!
Este preâmbulo foi necessário para facilitar o assunto! Vossa petição foi muito bem engendrada, entretanto esquecestes ter eu capacidade de perscrutar as intenções mais ocultas. Portanto sei qual vossa índole. Alegastes morar nas proximidades de Bethlehem — todavia sois reles servos dos fariseus inescrupulosos. Qual o motivo de mentirdes de tal forma? Afirmastes a busca de um certo Jesus de Nazareth para que vos aceite como adeptos, entretanto estais arma- dos de espadas e cordas para prendê-lo e levá-lo ao sinédrio! Vosso atrevimento é diabólico e não posso deixar de usar de meus direitos como cidadão romano!
Qual teria sido o demônio capaz de vos influenciar a querer tornar-me traidor do Homem mais puro e honesto?! Jamais agi deste modo com inimigo qualquer — e agora deveria fazê-lo com Ele,
somente porque vos perturba em vossa política fraudulenta! Por que fizestes isto? Quem vos disse estar eu em condições de informar o paradeiro do Salvador da Galileia?”
Os esbirros quedam perplexos e o orador retruca: “Como podes afirmar tal absurdo sem exame minucioso?”
Reage Lázaro com violência: “O quê?! Pretendeis negar vossa atitude infame?! Pagareis caro por isto! Sou hospedeiro que jamais cobrou um níquel de um pobre viandante, pois pela lei ro- mana tenho que aceitar a todos, judeus ou pagãos. Se, portanto, acolhi o Profeta Jesus de Nazareth, acaso podeis chamar-me à res- ponsabilidade?
Bem que vos tornastes testemunhas dos grandes milagres desta noite — vossos corações tigrinos continuaram obtusos e não tendes pejo de aumentar vosso número de pecados! Agora vos darei a prova se tenho razão por assim falar!” E virando-se para Raphael, Lázaro prossegue: “Faze com que revelem sua verdadeira natureza!”
O anjo dirige-se aos servos do Templo e diz: “Obedecei a Lázaro, do contrário porei a descoberto vossa índole!”
Responde o fariseu: “Seria preciso que viesse um rapazola delicado como tu, para nos obrigar a abrir os mantos?!”
Determina Raphael: “Bem, querendo experimentar o meu suposto poder, aplicá-lo-ei, dizendo: Desapareçam os mantos que ocultam espadas e cordas!” No mesmo instante os vinte fariseus se veem desprovidos daquela proteção, dando impressão de serem atin- gidos por um raio.
Diz Lázaro: “Porventura ainda pretendeis afirmar vossa procedência de Bethlehem e vossa intenção louvável junto ao Na- zareno?! Que fareis agora? Dependeis do meu poder e este jovem é capaz de vos dizimar como fez aos mantos!”
Diz o outro, tremendo de pavor: “Amigo Lázaro, deposi- tamos nossas armas e nos entregamos à tua benevolência. Somos maus e perversos sob o domínio do Alto Conselho. Nunca tivemos oportunidade para aprendermos algo de bom. Se fosse possível con- seguirmos outro emprego, estaríamos felizes. Somos teus prisionei-
ros e conhecemos o poder de teu ajudante. Jamais serviremos ao Templo, tampouco perseguiremos o Salvador!”
Diz Lázaro: “Arrancai vossas insígnias condenáveis e dirigi-
-vos à zona de Bethlehem onde tenho grande propriedade. Aceitai meus serviços que a remuneração será melhor que no Templo. A fim de que sejais aceitos pelo administrador, recebereis documentação apropriada, feita pelo jovem amigo.”
Nem bem Lázaro termina, Raphael já tem os distintivos à mão, que pelo primeiro são entregues aos interessados. Dá-lhes ainda certa importância para a viagem e acrescenta: “Caso presteis bons serviços e vivais dentro dos Mandamentos de Moysés, cada um de vós receberá anualmente cem moedas de prata, além do sustento. Ide pelo caminho mais curto, para não chegardes à noite. Brevemen- te também irei para certificar-me de vossa atitude.”
Felizes, todos se encaminham ao novo destino; em meio à marcha conjecturam quem podia ser aquele jovem poderoso. O orador, finalmente, aduz: “Nosso parecer pouco adianta; quando Lázaro chegar, por certo dará explicações.”
Entrementes, os empregados de Lázaro transportam as ar- mas para dentro de casa. Em seguida, ele e Raphael se unem a nós e Eu digo: “Desempenhaste teu papel a Meu contento, arrancando vinte almas do inferno; o Alto Conselho não será salvo tão facil- mente. Deveria o orador transmitir ao sinédrio o que apurou a Meu respeito, para em seguida receber ordem de captura. Como agora nenhum desses servos para lá voltará, o plano do Templo foi frustra- do; eis por que tudo ocorreu para tal finalidade.
E a atitude do Conselho? Alguns membros se dirigirão para Emaús, à casa de Nicodemus, para ouvir algo acerca do terceiro si- nal; ele, o velho rabi e o decano José de Arimatheia são bastante inteligentes para saberem o que dizer. Vamos, pois, para fora onde estivéramos de manhã.”
A estas Minhas Palavras todos se levantam e Me acompanham à colina, inclusive os ex-escravos. Lá de cima percebemos a caravana de delegados do Alto Conselho a caminho de Emaús, e quando che- gam à coluna de origem milagrosa param estatelados, pois não com- preendem sua procedência e como poderia ter chegado ali. Para sua construção e levantamento seriam precisos vários meses. Eles tinham feito este trajeto há poucos dias e nada disto viram. Nicodemus seria capaz de prestar informação, porquanto a coluna se acha em seu ter- reno. Faço tal observação aos presentes que observam com atenção não ser possível aos arquifariseus se separarem da coluna.
Vira-se Agrícola para Mim: “Senhor e Mestre, seria interes- sante saber-se os absurdos proferidos por aquela delegação ateia.”
Digo Eu: “Meu amigo, podes calcular serem suas opiniões sumamente tolas; onde poderiam colher critério certo sobre qual- quer assunto?! Quem quiser projetar opinião boa e verdadeira terá que ser bom e verdadeiro; eles, são cheios de maldade e hipocrisia. Como poderiam pronunciar algo justo?! A fim de que te convenças quão tola e ignorantemente aqueles beatos se expressam, transmitir-
-te-ei algumas objeções.
Um deles, por exemplo, diz ter sido a coluna trazida do in- ferno através de um demônio, porquanto ainda estava quente. (Ela de fato fora aquecida pelo calor do Sol). Isto porque Nicodemus não pactuava com o sinédrio. Com tal observação muitos concordam, fazendo algum aditamento no mesmo estilo.
Há um disposto a defender Nicodemus, porquanto alega: De modo algum quero duvidar da origem explanada, entretanto não posso aceitá-la como fato real; pois se o demônio quisesse trazer do inferno coluna idêntica em terreno de quem discordasse com o Templo — haja vista Lázaro de Bethânia — grande quantidade de colunas existiriam na Judeia.
Não concordo convosco. Nicodemus foi e ainda é amigo de tudo que julgue extraordinário. Os magos sempre foram bem
acolhidos por ele. Certamente alguns feiticeiros hindus ou persas produziram tal coluna por meio de ciências ocultas e com auxílio de elementos do ar, da água, da terra e do fogo.
Essa opinião também encontra alguns simpatizantes. O pri- meiro orador apenas acrescenta: Isto dá na mesma, pois sabemos es- tarem tais feiticeiros ligados ao inferno, executando suas obras com ajuda de demônios.
Diz o outro: Ignoramos o poder integral dos espíritos ele- mentares! Até mesmo em ervas consta existirem forças ocultas!
Eis que um terceiro se expressa: De modo geral concordo; entretanto tenho ainda outra ideia: essa coluna pode ser distinção dos romanos, amigos íntimos de Nicodemus, a fim de manifestarem sua preferência. Dispõem eles de carros e outros meios, inclusive de escravos. Assim, facilmente poderiam ter transportado a coluna durante a noite. Claro é não representar ela algo agradável para o Templo. Vamos a Emaús, para colhermos informes precisos.
E vede, a caravana tenebrosa deixa a coluna, dirigindo-se àquela cidade, mas vez por outra se vira para trás. Além dessas, ain- da outras opiniões tolas e maldosas foram apresentadas acerca de origem e finalidade da coluna, e seria prejuízo perder-se um minuto com seu relato, porquanto nenhuma alma lucraria algo para sua sal- vação. Prefiro relatar-vos antecipadamente a recepção daquela co- missão por parte de Nicodemus. Para melhor compreensão, falarei como se já tivesse ocorrido.
À longa distância ele percebe a chegada, fato de desagrado para ele e seus amigos, inclusive dois romanos. Trata-se, porém, de ser prudente como a serpente e dócil qual pomba!
O velho rabi opina: Deve ter sucedido algo importante no Templo, trazendo esses arquifariseus aqui, pois costumam fazer-se pagar por cada passo dado.
Diz Nicodemus: Julgaste bem; compete-nos a máxima vi- gilância, pois são as raposas mais ladinas do Templo. Esperai aqui, enquanto os receberei como anfitrião; pois se não o fizesse, con- siderar-me-iam vilipendiador do conceito do sinédrio. — Dito e
feito. Após os cumprimentos habituais, Nicodemus indaga o motivo daquela honra.
Um deles responde prontamente: Será mais fácil conver- sarmos em tua confortável residência, porquanto a caminhada nos cansou bastante. Antes de tudo, dize-nos quais são teus hóspedes.
Responde Nicodemus: Apenas o velho rabi, José de Arimatheia e alguns romanos, meus vizinhos; portanto, não os pos- so desconsiderar como tais. Minha família também se acha aqui para refazer-se do susto desta noite!
Diz um fariseu: Bem, poderemos falar sem rodeios, e os romanos até são oportunos. Entremos! — Conduzindo-os à sala, são recepcionados pelos amigos, e Nicodemus lhes indica os primeiros lugares na mesa, fato muito considerado pelos fariseus. Servem-se o melhor vinho em taças de prata, pão, ovos e sal, e os judeus não fazem a mínima cerimônia.
Mais animado pela bebida, um deles começa: Após refeição tão farta, explicaremos os vários motivos de nossa chegada, e pode- reis expressar vossa opinião a respeito. Quando hoje pela manhã dei- xastes o Alto Conselho em virtude de algumas controvérsias — para o que tínheis pleno direito como decanos — vários assuntos foram abordados acerca do revolucionário de Nazareth.
Nenhum de nós contesta realizar ele coisas inéditas; seu discurso é igualmente sábio e penetrante. Todavia qualquer um pode chegar a tal ponto. Nós mesmos vimos frequentemente magos orientais que realizavam coisas incríveis, motivo por que os pagãos os consideram deuses, pois ignoram que tais deuses de carne e osso usam de recursos ocultos. Tais meios jamais foram vistos. O mesmo deve acontecer com o nazareno; entretanto, é sua atitude perigosa, por afirmar abertamente ser o Messias Prometido, garantindo a vida eterna apenas aos que nele creem.
Descobrimos o seu plano em querer elevar-se a rei dos ju- deus, o que resultaria em lutas tremendas, pois os romanos não nos tratariam com grande piedade. Para evitá-lo, resolvemos perseguir o nazareno por todos os meios e entregá-lo à justiça romana. Se for
realmente o Messias, não poderá ser morto e haveremos de crer nele. Assim não sendo, ficará provada sua feitiçaria.
20. A fim de capturá-lo preciso é saber-se onde está. Por isto enviamos vinte esbirros, fortes e astuciosos, a Lázaro, que segundo soubemos sempre se acha no Monte das Oliveiras por ocasião dos festejos. Tal expedição não levaria mais que uma hora. Até então nenhum componente voltou! Por isto viemos julgando ter Lázaro mandado os esbirros para aqui, na suposição de tu, como reitor de Jerusalém, estares informado. Percebemos agora nosso erro e te per- guntamos se conheces o paradeiro do nazareno. Uma vez informa- dos, saberemos o que fazer. Os sinais desta noite podem facilmente ter sido obra dele com ajuda dos essênios. Caso se encontre com eles, nosso plano não surtirá efeito.”
DISCURSODENICODEMUSDIRIGIDOAOS TEMPLÁRIOS
(O Senhor): “É fácil compreender-se o aborrecimento de Nicodemus. Após certo tempo de reflexão, ele diz: Meus amigos, eis um caso difícil de ser abordado! Vós mesmos assististes no Templo ao desaparecimento do nazareno quando afirmou existir ele antes de Abraham, razão por que quisestes apedrejá-lo. Meditei a respeito e cheguei à conclusão de que nada se consegue pela violência com tal homem. Como sei de muita coisa que ignorais, terei a devida pre- caução para não desafiá-lo. Por isto aconselho nada fazerdes contra ele e aguardardes com calma o resultado dessa questão.
Se tiver base divina, nosso esforço será inútil; firmando-se em ações humanas, cairá por si só. Se ele com o tempo se tornar politi- camente perigoso, os romanos tomarão conta dele. Até então não se tornou temível e os romanos o têm em boa conta. Em tal situação seria imprudente adiantar-se-lhes.
A faísca que não me queima não será por mim destruída. Concluístes acertadamente terem sido os sinais desta noite provo- cados por ele. Assim sendo, pergunto: por que essa fúria cega de perseguição? Sem dúvida ainda provocará aborrecimentos maiores,
sem que possais reagir. Quanto dinheiro e empregados não foram por vós sacrificados! Qual o resultado?
Novamente enviastes vinte dos melhores esbirros. Onde es- tão? Por certo foram orientados com os demais! Sede razoáveis e desisti de perseguir um homem inatacável, capaz de nos dizimar sem que nos possamos defender.
Certamente vistes uma coluna na qual a mão humana não trabalhou. Só pode ter sido criada pelo nazareno, porquanto ela sur- giu de um momento para outro. Ninguém a transportou para lá; do contrário, os campos em volta estariam pisados.
Não importa qual o seu poder, divino ou mago, pois de modo algum podemos opor-nos a ele. Eis o que penso, e pergunto a esses romanos se tenho razão. — Ambos responderam: De pleno acordo. Quando de certa feita andávamos pelo Egito setentrional, conhecemos perto de Memphis um homem de pele escura, sem ser negro. Nossa caravana era constituída de duzentas pessoas e nosso programa visava viagem à própria África.
Ao chegarmos a um ponto do Nilo de difícil travessia, surgiu de uma gruta o dito personagem, coberto de andrajos. Sua figura era estranha e seu olhar paralisou nossos passos. Expressando-se em grego, disse: Que procurais neste deserto?
Um dos nossos respondeu: Desejamos penetrar no país dos negros e estudar os seus hábitos e costumes, a fim de vermos se há possibilidade de intercâmbio comercial.
Disse o outro: O país dista muitos dias de viagem para vosso meio de transporte; para mim é mais fácil lá chegar, porque disponho de forças da Natureza. Advirto-vos, romanos gananciosos, que nun- ca dirijais vossos passos àquele país ainda feliz e inocente enquanto eu aqui estiver de sentinela. Mesmo se fôsseis em número mil vezes maior, não seríeis capazes de dar apenas um passo à frente! Por isto vos aconselho voltardes de onde viestes, do contrário ficareis presos aqui e vossa carne servirá de alimento para os meus leões e condores!
Tais palavras categóricas nos impressionaram de forma tal, a nos tirar a coragem de prosseguir, não obstante munidos de armas.
Como a fisionomia do homem esboçasse certa amabilidade, um de nosso grupo lhe disse humilde: Tem a bondade de nos informar a tua identidade e como chegaste a um poder de vontade tão forte. Em seguida voltaremos à pátria.”
OPODERDO NÚBIO
(O Senhor): “Respondeu o núbio: Sou um homem genuí- no e verdadeiro como os houve em eras remotas, cuja finalidade se destinava a elevar o espírito ao pleno poder e evitar que sua alma se enterrasse no lodo das paixões carnais.
Vós, de há muito deixastes de ser criaturas; sois apenas larvas humanas, obrigadas a usarem de armas de aço a fim de se defen- derem de um inimigo externo, enquanto não conseguem vencer o maior adversário — as tendências materiais — para despertar, liber- tar e fortificar o espírito.
De que vos adianta a vida física se não sabeis como fazer renascer o espírito?! O homem só se torna homem quando tiver encontrado a si mesmo no próprio espírito; isto não é possível na vida que levais, porque vos afastais, em vez de vos aproximardes do vosso destino.
De tempos em tempos surgem, entre vós, criaturas que se encontram no justo caminho, se bem que não na meta final; são por vós oprimidas e perseguidas com todo ódio e rancor, impedindo cheguem ao destino pleno, e vós continuais espiritualmente mortos e no final morrereis como irracionais, após vida pesada, e o prêmio é a morte eterna.
Em vossa cegueira psíquica julgais eu me expressar de tal modo como sábio egípcio, habitante da solidão, a fim de exigir-vos maior respeito. Estais equivocados. Para provar-vos ter eu falado a plena verdade e o que a um homem justo seja possível através da vontade de seu eu espiritual, darei alguns exemplos para, a cami- nho de volta à pátria, facilitar-vos a concepção de pensamentos mais profundos.
Vede lá no alto um condor gigantesco! É da minha vontade que desça aos meus pés, obedecendo às minhas ordens. Lá vem ele qual flecha! — Quedamos estatelados, enquanto o núbio externava ordem ao condor de apanhar um peixe do Nilo. Em poucos instan- tes a ave obedeceu e ele disse: Deste modo a Natureza total serve ao homem intrínseco!
Em seguida abriu e limpou o peixe, deitando-o em cima de uma pedra certamente aquecida, porquanto o grande espécimen em poucos minutos estava frito, e constatamos seu sabor todo especial.
Isto feito, o núbio disse: Essa prova foi de vosso agrado? Vejo-vos à procura de água fresca, porquanto o Nilo é mui turvo. Observai essa rocha, seca e aquecida pelo Sol, entretanto nos dará quantidade de água cristalina. Eu o quero — e podeis saciar a sede!
Perguntamos se ele vivia só, nessa solidão, e se tinha adeptos; e ele respondeu: Isto, para vós é deserto; para mim é mais que vosso Elysium, existente apenas na fantasia. Seria vossa metrópole deserto insuportável para o meu espírito, porquanto lá não se encontra um só homem verdadeiro.
Individualmente estou só, mas não como homem espiritu- al; tenho adeptos de ambos os sexos, que vêm de tempos em tempos para receberem novas diretrizes ao aperfeiçoamento de sua vida inte- rior. Habitam como eu em palácios iguais a este, que ocupo há cin- quenta anos e já foi usado por diversas criaturas genuínas. Trata-se de minha primeira companhia que reside próximo a esta gruta. Para vós, neste refúgio existe noite trevosa; para mim é ele mais claro que essa claridade solar. Pois quando o interior da criatura se tornou claro e lúcido através do seu espírito eterno, que se origina em Deus, Uno e Verdadeiro, qual foco da Luz Primária — não mais existem noite e trevas para ela. Vossa luz de vida interior já é treva densa; quão profunda deve ser vossa própria obscuridade! Aplica-se con- vosco o provérbio: não vedes a floresta densa em virtude das árvores.
Desta minha gruta abarco a Terra toda, sua consistência, criaturas, seres e metrópoles orgulhosas e sei de tudo que se passa. Além disto, vislumbro outros mundos que chamais de estrelas, po-
dendo alegrar-me no Amor, Sabedoria e Poder de Deus. Nisto se baseia a minha segunda companhia.
Posso ainda lidar a qualquer tempo com todos os espíritos, e com eles tornar-me sempre mais sábio — e nisto se baseia minha terceira companhia.
Como, porém, a vontade de uma criatura verdadeira pos- sui poder incompreensível para vós e força de grande penetração, posso, caso precise me defender de um inimigo, criar uma quarta companhia que até mesmo vos posso demonstrar com a garantia de proteção, pois nada vos sucederá. Assim o quero — e eis que vem aí!
Dentro de poucos minutos vimo-nos rodeados de uma al- cateia de leões e panteras, contra a qual grande número de guerrei- ros destemidos não se poderia defender. Ficamos apavorados. Mas o núbio deu simples ordem às feras que se dispersaram, enquanto ele dizia: Se necessário fosse, poderia chamar alcateia maior desses guerreiros. Vistes de sobejo como uma criatura genuína é soberana da Natureza e suas forças, por isto vos despeço em paz!
Um de nosso grupo perguntou se não era possível nos ensi- nar as normas de vida para alcançarmos tal dignidade humana. Ele respondeu: Será difícil para vós, enterrados que sois no mundo e seus prazeres, e não tendo o menor conhecimento do Deus Único e Verdadeiro. O primordial é o conhecimento deste Deus; por meio Dele descobrindo a si mesmo, as Leis através do Espírito divino e, pelo fiel cumprimento, alcançar a vida interna e verdadeira. Para tanto é preciso romper com o mundo e seus prazeres fúteis, coisa difícil para vossa vida habitual.
Em época não mui distante surgirão da Ásia doutrinadores inspirados, ensinando-vos o conhecimento de Deus Verdadeiro e Suas Leis. Prestai-lhes atenção, crede e agi de acordo, que sereis leva- dos ao justo caminho, no qual podereis progredir até o ponto de vos facilitar a perfeição da vida após a morte! — Com isto vos disse tudo que vos seja útil; ide em paz e não vos deixeis tentar de voltar a esta zona! Somente criaturas renascidas e escolhidas por Deus poderão fazê-lo sem castigo!
Nem bem terminara, não conseguimos continuar parados; pois vimo-nos impelidos por uma força oculta que nem nos per- mitiu ao menos olhar para trás, de sorte que alcançamos a antiga cidade de Memphis pela manhã do dia seguinte. É fácil imaginar-se ter sido aquele acontecimento motivo de muitas conjecturas.”
O ROMANO ADVERTE OS TEMPLÁRIOS DO PODER DO SENHOR
(O Senhor): “Ao voltarmos para Roma, a capital nos parecia realmente um deserto, e quando soubemos haver entre judeus pes- soas semelhantes ao personagem no Egito, vendemos tudo e deixa- mos a pátria; aqui adquirimos pequena área para nos dedicarmos ao nosso ‘eu’ interno. No vosso Templo tão recomendado nada disto encontramos; mas sim um personagem em discussão entre vós, que realmente realiza mais do que tudo visto até hoje. E tal homem quereis perseguir?! Considerai-vos felizes por ele não ser vosso per- seguidor, pois quando tal acontecer, estareis perdidos para sempre!
Qual seria vossa atitude caso ele chamasse milhões de feras para a vossa metrópole ou aos seus arrabaldes?! Em poucos instantes vos teriam estraçalhado, sem que houvesse possibilidade de defesa, conforme consta já ter feito coisa semelhante.
Se nós, romanos, sentimos profundo respeito diante de tal soberano sobre a Natureza — que pretendeis alcançar contra ele, pois comparados a nós, sois verdadeiros insetos?! Caso não desistais, vosso embaraço será tanto pior!
Ouvindo tais palavras, os fariseus não sabem retrucar; após alguns instantes, o mais inteligente diz: É possível que assim seja; mas que fazer?! Caifás resolveu o extermínio daquele homem em combinação com Herodes, e somos obrigados a executar ordens. Se fosse por nós, deixaríamos o barco correr para vermos o fim.
Dizem os romanos: Quem não aceita conselho não pode ser socorrido. Dentro em breve vos lembrareis de nossas palavras! Não importa se acreditais ou não no formidável poder de tal homem,
pois sereis testemunhas de termos falado a verdade! — Com isto, ambos se levantam, pois a cegueira e maldade dos fariseus são in- suportáveis. Eles então indagam de Nicodemus qual teria sido o motivo dos outros se despedirem tão bruscamente, e ele responde: Também não sei explicá-lo. De qualquer maneira, não deveríeis ter feito menção de Herodes, pois eles não o suportam nem de longe, em virtude da brutal decapitação de João Baptista, que gozava alta consideração por parte dos romanos. Aconselho-vos todo cuidado, pois eles não toleram gracejos! — Aceitando tal advertência, os fa- riseus agradecem inclusive o bom trato e, em seguida, se dirigem rápidos ao Templo.
Todos estão satisfeitos com seu afastamento e os dois roma- nos também aparecem de novo. Nicodemus então explica o senti- do do terceiro fenômeno. — Agora dize-Me, Agrícola, que achas disto tudo?”
Retruca ele: “Tinha vontade de marchar com um exército contra Jerusalém, a fim de estraçalhar essa camarilha. Todavia, foi proveitoso terem aqueles romanos imposto algum respeito, dimi- nuindo a vontade de perseguir-Te. Além disto, desejava visitar os dois patrícios em Emaús!”
Digo Eu: “Fá-lo-emos amanhã, pois também sinto saudade deles. Se julga terem os servos do Templo abrandado sua volúpia per- seguidora, estás enganado. Aparentemente darão tal impressão; no íntimo, sua astúcia aumentará. Nada conseguirão, a não ser quando seu julgamento estiver à porta. — Deixemo-los; desejo saber vossa opinião a respeito daquele personagem descrito pelos romanos.”
Diz Agrícola: “Recordo-me ter ouvido este caso em Roma e talvez conheça aqueles conterrâneos. Se houvesse muitos idênticos àquele núbio, a Humanidade estaria em situação privilegiada. Será que ainda é vivo?”
Respondo: “Sim, e amanhã estará aqui com seus adeptos; pois recebeu através do seu espírito conhecimento de estar Eu em Carne entre os homens e já se acha a caminho para cá, e o dia de amanhã será muito interessante.”
Todos se alegram com este prenúncio e Eu digo a Lázaro: “Manda trazer pão e vinho, pois queremos dar expansão à nossa alegria.” Os presentes se suprem e expressam gratidão ao Doador de alimento tão saboroso e farto. Entrementes, a judia Hélias percebe que os fariseus, a caminho de volta, param novamente na coluna em discussão. Como a moça chame a atenção do fato, digo: “Deixa-os em paz; nada acharão para salvação de suas almas, porquanto seus corações continuarão obtusos até o fim da vida!”
Diz Hélias: “Ah, se tivesse poder sobrenatural faria com que essa camarilha fosse obrigada a seguir aos lares por cima de áspides, cobras, escorpiões e lacraus!”
Obtempero: “O pavor da perseguição romana é mais eficaz do que a tua receita! Já abandonaram a coluna, pois descobriram serem seguidos por alguns, supondo sejam romanos. Agora até co- meçam a correr! Isto surtirá maior efeito que tua bicharada!”
Em seguida recomendo a Lázaro mandar igualmente algum pão e vinho, diluído, para os escravos. Quando ele, em companhia de Raphael, chega às tendas dos jovens, já estão supridos de tudo; então diz: “Pronto! Que faremos agora?”
Responde o anjo: “Voltemos de bom grado; pois o Senhor não espera ação de quem, como tu, cumpre a Sua Vontade tão solí- cita e prontamente. Uma vontade perfeita e submissa ao Senhor vale perante Ele como ação plena, pois em tal caso é Ele a executá-lo, como vês. Se as criaturas o compreendessem e agissem de acordo, quão fácil e livre de preocupações seria a sua vida e quantas bênçãos sorveriam na Terra! Todavia são ignorantes e se envolvem na matéria morta, onde sufocam. São obrigadas a procurar o sustento com suor sangrento, enquanto poderiam desfrutá-lo sem esforço físico, não só mais facilmente, porém mais puro e melhor.
Amanhã irás conhecer em Emaús criaturas perfeitas do Egito setentrional e te admirarás do poder ilimitado de sua vontade. Serão
sete ao todo; mulheres, filhos e os ainda não aperfeiçoados ficarão na pátria, sob a direção de um homem íntegro, pois sem ele passariam mal. O mestre da antiga escola de sabedoria egípcia virá com seis adeptos adiantados e verás quão facilmente descobrirá o Senhor e a nós. — Agora, voltemos!”
Quando junto de Mim, indago a Lázaro se os jovens tinham sido tratados. E ele diz: “Sim, Senhor; mas nada contribuímos para tanto, pois ao lá chegarmos, já estavam supridos. Tu, Senhor, cer- tamente experimentaste a minha vontade, todavia foste Tu a agir, como sempre! Minha eterna gratidão, pois sem Ti nada somos e nada conseguimos!”
Digo Eu: “Está bem, está bem. Senta-te aqui e sê alegre co- nosco!” Ambos tomam assento ao Meu lado e Lázaro quer entrar em detalhes a respeito da visita de Emaús; os dois hospedeiros, porém, se adiantam pedindo permanecer em Minha Companhia, a fim de conhecerem os egípcios.
Digo Eu: “Como não? Quem recebe a Mim e aos Meus dis- cípulos será de modo idêntico bem visto por Mim. Quanto maior número de testemunhas, tanto mais proveitosa a disseminação do Meu Evangelho. Assistireis a verdadeiros milagres com aquelas pes- soas que vivem tão simplesmente como os primitivos patriarcas!”
Conjectura Lázaro: “Então devem ser descendentes de Noé e não de Adam; pois o Dilúvio deve ter chegado até o Egito!”
Digo Eu: “Caro amigo e irmão! Não deves confundir o Dilúvio natural — motivado pelos poderosos hanochitas — com o espiritual do pecado, do contrário jamais tirarás conclusão certa. Pela inundação ocorrida na parte ocidental da Ásia em época de Noé, grande número de criaturas e irracionais sucumbiu, porque as águas passaram por cima do Ararate. Todavia, não atingiram o orbe completamente, ainda não habitado em todos os pontos. O Gênero Humano, no que se deve entender a Terra espiritual, foi inundado pelo Dilúvio do pecado, ou seja, do esquecimento de Deus, adul- tério, orgulho, avareza, inveja, domínio e egoísmo, e deste modo Moysés interpretou aquele acontecimento.
Os mais altos picos são o desmedido orgulho das criaturas daquele tempo, e o Dilúvio é a humilhação que atingiu a todos os soberanos e a cada reino de maneira peculiar. O resto será ventilado amanhã. Voltemos ao pão e vinho!”
A CARIDADE. CONDUTA DAS CRIATURAS ATRAVÉS DA PROVIDÊNCIA DIVINA
Enquanto nos aprazamos no bosque das oliveiras, diz um dos setenta judeus, entre os quais se acha a conhecida adúltera: “Como somos felizes! O mais sublime alimento espiritual para as almas e o melhor suprimento físico! Possam todos que, como nós, se encon- trem na miséria inculpável alcançar este estado! Se fosse possível, desejaria que todos os sofredores recebessem socorro, física e espiri- tualmente!”
Digo Eu: “Meu amigo, bem seria possível; mas em virtude de motivos mui sábios não é conveniente. Há grande número de pesso- as cumuladas de vários males e sofrimentos a quem desejas ajudar de acordo com o teu bondoso coração, o que Me agrada. Mas se assim agirmos, teremos provocado justamente o contrário!
Ninguém melhor do que Eu conhece miséria e males huma- nos, e não existe pessoa mais misericordiosa e bondosa do que Eu; todavia, reduzidos seriam os benefícios produzidos pelo Meu Amor e Minha Misericórdia caso Minha Sabedoria não cooperasse.
Existe, por exemplo, uma pobre família cujos membros não têm trabalho, morada e alimento. Mendiga de casa em casa, de ci- dade em cidade e mal consegue saciar sua fome, enquanto outros vivem na abundância e ainda enxotam os pobres de sua porta.
Tal proceder é maldoso e certamente dirás: ‘Deus, Onipoten- te e Bondoso — como podes permitir tais abusos?! Destrói criaturas como essas!’ Todavia, Deus não te atenderia! Por quê? Acaso deve proliferar a falta de amor?
Não, digo Eu! Entretanto, tudo terá o seu tempo nesta Terra, pelos Desígnios de Deus, onde as criaturas devem amadurecer para
a verdadeira Filiação Divina! Deste modo o rico tem o seu tempo de fartura para fazer caridade com o supérfluo, enquanto o pobre tem oportunidade de se exercitar na paciência e renúncia, oferecendo sua miséria a Deus. O Pai o socorrerá a bem de sua alma e igualmente punirá o rico egoísta em época oportuna. Pois ambos se destinam à Filiação de Deus!
A referida família fora rica em tempos passados, porém incle- mente para com os pobres, de sorte que o destino de sua felicidade terrena foi mudado em benefício de sua alma. Caso lhe fosses dar repentino socorro, em breve se tornaria insolente, vingando-se de quem a enfrentasse com aspereza. Experimentada pela paciência, será ajudada pouco a pouco e imperceptivelmente, reconhecendo nisto a Providência Divina com resultado muito mais profícuo do que se tivesse ganho a sorte grande.
O rico egoísta será levado paulatinamente a um estado mais precário. Seus negócios fracassarão vez por outra, levando prejuízos nas colheitas e rebanhos. Ele ou sua esposa e filhos adoecerão, e os golpes do destino recairão sobre ele em cheio.
Se porventura reconhecer sua injustiça, será ajudado; não o fazendo, perderá tudo, inclusive o cajado da mendicância, sofrendo coisas ainda piores.
Quem o confortar e o ajudar receberá de Mim conforto e ajuda; ajuda integral ninguém lhe poderá proporcionar até que a Vontade Divina o permita. Por isto, Meu amigo, acalma-te; já sei quem está em condições de receber socorro!”
OMALESUA CONDENAÇÃO
Feliz com esse ensinamento, o judeu volta a sua atenção ao re- pasto, no que é imitado pelos companheiros. A mulher dele, porém, diz comovida: “Como é Bom e Justo o Senhor! Terá que amá-Lo quem o tiver reconhecido em Verdade! Se os templários chegassem a tal ponto, certamente venerá-Lo-iam! O demônio, todavia, não permite este conhecimento, por serem eles seus servos mais fiéis, não
merecendo a menor Graça do Senhor! Arrepender-se-ão no inferno, exclamando: Por que deixamo-nos ofuscar pelo anjo das trevas?! — Tal remorso de nada adiantará! Senhor, agradecemos-Te por nos te- res revelado, pobres e pequeninos que somos, o Reino de Tua Graça, suprimindo-o aos sábios deste mundo!”
Digo Eu: “Falaste bem e dentro de teu entendimento; deves, porém, considerar não haver remorso no inferno, para remissão de um espírito infernal pelos atos criminosos praticados na Terra. Se ele chegasse a tal arrependimento, atingiria a purificação e salvação. Um espírito mau — um demônio — não pode despertar em si remorso salutar, pois não corresponderá à sua índole, e sim apenas lastima não ter feito coisa pior.
É fácil concluir-se não haver melhoria para tal alma, nem salva- ção. Enquanto tudo no anjo celestial é bom na origem, num demônio tudo é mau em essência. Quanto mais profundos os pensamentos e a vontade de um anjo, tanto mais livre, poderoso e semelhante a Deus; ao passo que os pensamentos e desejos mais fortes de um demônio tornam-no cerceado, impotente e contrário a Deus, pois sua maldade primitiva impede sua força, criando sua condenação e morte real.
Querida, caso o demônio fosse capaz de um remorso bom, não seria demônio, nem se encontraria no inferno. Por isto, nenhum espírito mau pode regenerar-se por si mesmo, apenas por meio de influência externa e em eras infindas. A influência terá que corres- ponder à natureza dele, quer dizer, má e perversa. Deste modo, o mal abafa a maldade demoníaca, único meio de levar-se alguma luz e melhoria a ele.
Eis o motivo por que os suplícios de espíritos infernais sempre se apresentam externamente, como acontece em criaturas maldosas na Terra. Quando ensinamentos, admoestações e sábias leis nada conseguem num homem maldoso, ávido por contrariá-las constan- temente, impossível ele melhorar por si só. Cairá nas mãos de juízes severos e inclementes, que o sobrecarregarão com penas dolorosas.
Por tal sofrimento, começará a refletir a respeito do moti- vo de sua desdita; confessará sua inaptidão e a implacabilidade da
condenação, e no final concluirá ser ele mesmo base e motivo de tudo através das ações perversas, cometidas de livre vontade e volú- pia contra as leis de ordem geral. Reconhecendo serem seus crimes os próprios algozes, começará a detestá-los, desejando jamais tê-los praticado. Eis o primeiro passo para possível melhoria!
Todavia, não podem terminar as penas externas, porquanto o mau somente começa a detestar sua inclinação por lhe ter trazido maus resultados. Terá que reconhecer pelo ensino externo ser sua índole realmente perversa, motivo por que a repele.
Tão logo se decida a detestar o mal pelo mal, procurando o bem pelo bem, tornar-se-á mais paciente com a punição, achando justo e benéfico o sofrimento, por lhe ter dado oportunidade de re- generação. Chegado a este ponto, podem diminuir as penas externas à medida da transformação interna.
Se os juízes mundanos assim entendessem, poderiam trans- formar muitos criminosos em homens bons; aplicam prontamente a pena capital, fazendo de um maldoso confesso, um demônio per- feito para o mundo dos espíritos. Isto não pode continuar! Se fordes obrigados a lavrar julgamento, aplicai-o como vos demonstrei para a verdadeira remissão do pecador, e não para sua perdição total!”
APENA CAPITAL
Diz Agrícola: “Senhor e Mestre! Gravei bem fundo no co- ração as Tuas Palavras justas e santas, e pô-las-ei em prática; entre- tanto, desejava saber se é aconselhável abolir-se a pena capital em qualquer caso!”
Digo Eu: “Meu amigo, sei o que pleiteias. Soubeste de um dos Meus discípulos que Eu Mesmo apliquei tal medida em alguns esbirros maldosos à Minha procura, faz um ano.
Por isto te digo: se, igual a Mim, reconheceres no criminoso um diabo perfeito, determina imediatamente a pena de morte, con- forme determinou Moysés inspirado por Mim; não tendo tal certeza
— não te precipites!
Desde eternidades assiste-Me o direito de matar todo o Gê- nero Humano e sou o permanente Executor da Criação material do Infinito; mas aquilo que por Mim é exterminado ressuscita em espírito para todo o sempre.
Se disto fores capaz, podes matar a quem quiseres, no justo momento; assim não sendo, não deves fazê-lo, a não ser em defesa própria ou em caso de guerra determinada como castigo de Deus contra povos incorrigivelmente maldosos. Em todas as demais hi- póteses não deves matar nem dar tal ordem, enquanto não tiveres recebido Minha Luz total! Compreendeste?”
Responde Agrícola: “Agradeço imensamente, Senhor e Mestre! Seguirei tal norma, conquanto não possa insinuar dire- trizes ao Imperador; em particular ele aceita, vez por outra, bom conselho.”
Digo Eu: “Podes fazê-lo, sem contudo alcançares grande re- sultado. Tendes em Roma algumas leis aceitáveis; mas igualmente quantidade de costumes maus e nocivos, ao lado dos quais dificil- mente algo puramente bom e verdadeiro pode germinar.
Afirmo-te: Roma é e será uma Babel, prostituta mundana, não obstante todos os males que sobrevirão, ainda que haja muitos seguidores fervorosos de Minha Doutrina.
Determinastes a pena capital para assalto, roubo, assassínios e outros crimes; entretanto, devem, durante os festins, os gladiado- res lutar pela própria vida, a fim de aumentar as vossas sensações, e o vencedor é distinguido. Eis um mal que jamais servirá de bênção a um povo! Além disto, conservais toda sorte de lutas contra feras, nas quais muitos homens perdem a vida de modo cruel; entretanto, conseguis alegrar-vos com isto! Eis outro mal, dificilmente acom- panhado da bênção do Alto. Sem esta, não haverá subsistência para Estado e povo — isto podes crer.
Se te assiste alguma influência, faze com que tais abusos sejam abolidos no Império Romano, e que ao menos vós, de alguma consciência, não compartilheis, muito menos essa juventude que le- varás para Roma, e assim poderás alegrar-te de Minha Bênção.
Dei-vos apenas os dois Mandamentos de Amor que deveis cumprir fielmente; para assim agirdes, impossível é alegrar-vos com lutas ferozes. Manifesta pouco amor quem pode assistir ao extermí- nio de um homem ou irracional. Pois o amor verdadeiro e vivo con- tém piedade e misericórdia justas. Como pode alguém sentir amor se a morte cruel do próximo lhe é volúpia?! Por isto, varrei com tudo que seja indigno de um coração bem formado! Se vires alguém chorar, não deves rir; pois assim fazendo, dás a entender que a dor, como ele próprio, teu irmão, te sejam completamente indiferentes.
Teu semelhante se alegrando de sua felicidade, não lhe in- vejes a curta alegria de sua sorte terrena! Não te aborreças, mas com- partilha com ele, que tornarás mais nobre o teu coração!
Ao observares um esfaimado enquanto te encontras satis- feito, não penses estar ele nas mesmas condições; procura saciá-lo e sentirás uma grande alegria no coração, muito mais agradável que o apetite satisfeito. Pois o coração pleno de bons sentimentos vale mais que o ventre cheio.
Se tua algibeira está repleta e em casa possuis grande fortu- na, não vires o rosto a um pobre te abordando humildemente, nem lhe faças sentir a diversidade de vossa sorte! Sê amável e ajuda-o a sair de sua miséria. Deste modo teu coração se encherá de alegria, e o pobre será teu amigo, jamais esquecendo teu ato espontâneo. O verdadeiro amor ao próximo se baseia na ação daquilo que se deseja receber dele.
Se uma criança pobre te fala, não a afastes; abençoa-a e ale- gra o seu coraçãozinho, que serás confortado pelos Meus anjos no Céu! Repete Comigo: Deixai vir a Mim todos os pequeninos, e não os retenhas; pois deles é o Reino do Céu! Em Verdade vos digo: se não vos tornardes como crianças no coração, não estareis Comigo no Meu Reino! Pois digo-vos que o Reino Celeste é primeiro delas!
Sei alimentardes o péssimo hábito de martirizardes crianças pobres a ponto de produzirem baba venenosa, da qual vossos sacer- dotes e magos preparam forte tóxico. Tais horrores se dão na Roma de hoje! Onde se cometem perversidades desta ordem, o inferno
completo está em função, e não se pode manifestar a Minha Graça. Juízes sábios e justos deveriam, de há muito, ter sustado tais absur- dos que gritam aos Céus; entretanto, pouco ou mesmo nada foi feito neste sentido.
Afirmo-vos: Minha Ira se dirige àquele que pratica tais ab- surdos com irracionais; pois eles também são criaturas Minhas, pos- suem vida e sentir; portanto, o homem não deve praticar abusos com eles. Quanto mais elevada que todos os irracionais da Terra é a criança mais pobre! Quem, pois, com ela praticar tais horrores é demônio e amaldiçoado!
Poderia enunciar uma quantidade de peculiaridades ro- manas de vosso conhecimento e permitidas secretamente contra pagamento de certo tributo; compete-vos sustar tais aberrações perversas. Se tiverdes vontade firme e rigorosa, jamais sereis pri- vados do Meu Socorro. Antes de tudo, é preciso que o queirais realmente; pois Minha Vontade jamais Se anteporá à do homem nesta Terra, conforme vos expliquei diversas vezes, a não ser num julgamento, todavia precedido por muitas advertências. Ireis en- frentar sérias lutas; uma justa causa merece sempre luta vigorosa. Terás compreendido tudo?”
Responde Agrícola: “Sim, Senhor e Mestre, e infelizmente a situação é tal qual a descreveste. Entre os romanos de moral elevada, de há muito a maldade é criticada e proibida aos sacerdotes, mor- mente a criminosa preparação daquele tóxico. Ainda assim dão-se fatos e nada de positivo se consegue contra o sacerdócio; o povo está a seu favor e facilmente pode ser instigado contra o Imperador e contra nós; basta apenas querer.
As lutas contra feras podem ser rapidamente abolidas e quanto aos gladiadores, muito apreciados pelos antigos romanos, já se tornam escassos, porquanto ninguém quer se prestar para tal fim. Em festins importantes são às vezes apresentados, entretanto mais proformado que na perversidade antiga. Somente as touradas são espetáculo apaixonado; tudo faremos para que se tornem ao menos mais raras, suplantando-as por coisas educativas.
Certo é não ser possível cortar-se tais males e abusos com uma espada idêntica à que decepou o nó górdio, e para a limpeza do estábulo de Áugias se necessita de força hercúlea. Se bem que nada temos em comum com Hércules nem Alexandre, com o tem- po haveremos de realizar qualquer melhoria. Não nos faltam rigor e boa vontade.”
Os demais romanos acompanham tal manifestação de Agrí- cola, e Eu concluo: “Muito bem; onde for que vos reunirdes em Meu Nome, Eu estarei convosco em Espírito, ajudando na realização do Bem e da Verdade! O que vos digo é e será eternamente verdadeiro, pois em verdade afirmo: Céus e Terra desaparecerão, Minhas Pala- vras e Seu Cumprimento, jamais! Agi em Meu Nome, que sempre vos ajudarei, dando-vos a Vida Eterna!” Todos Me agradecem por Promessa tão consoladora, e em seguida erguem as taças para brin- dar a bem-aventurança futura do Gênero Humano.
OSTRÊSMAGOSDA ÍNDIA
Nisto aproxima-se um empregado do albergue e se dirige a Lázaro: “Patrão, chegaram três homens e desejam falar-te; parecem orientais.”
Diz este: “Manda-os vir até cá!” Quando se aproximam, Lázaro dá os sete passos de hábito judeu para recebê-los e diz: “Qual vosso desejo? Sou dono do albergue.”
Diz um deles com voz vibrante: “Somos magos e artistas es- peciais da Índia e desejamos apresentar alguns números, a fim de custear a viagem ao Ocidente para, na proximidade do fim do mun- do, estudar os trâmites do Sol, da Lua e das estrelas. Já soubemos se- res um dos homens mais ricos dessa metrópole e, além disto, amigo de fatos extraordinários; por isto aqui estamos para pedir-te licença de darmos algumas provas diante de todos.”
Diz Lázaro: “Isto não depende de mim, mas de meus hós- pedes ilustres! Irei consultá-los.” Dirigindo-se a Mim neste sentido, respondo: “Deixa-os darem demonstração de sua arte para que os
romanos, amantes de tais magias, venham a conhecer a diferença en- tre elas e Minhas Ações e Milagres. Será útil ao fortalecimento de sua fé em Mim, e amanhã compreenderão mais facilmente o que pode o homem verdadeiro pelo poder de sua vontade. Podes dirigir-te a eles neste sentido.”
Prontamente os magos apanham as varas de seu manto e fa- zem três círculos no solo e no ar. Os romanos estão atentíssimos. Em seguida o chefe diz, com voz enérgica: “Ilustres senhores, estas varas consistem de madeira milagrosa, porém rara, de nossas montanhas mais elevadas. Quem disto tiver conhecimento e a ventura de desco- brir tal árvore, apanhando três galhos em época determinada, pode- rá, por meio deles, realizar quase tudo, através da vontade dirigida.”
Um outro apanha um pássaro morto de sua roupa e diz: “Pi- carei esta ave em pedaços; reduzirei esses a farinha entre duas pedras e em seguida será queimada. Da cinza farei surgir, por meio desta vara, a ave viva que levantará voo.”
Dito e feito. Tudo acontece como fora anunciado, e o mago pergunta se o milagre nos satisfez. Um romano responde: “Foi re- almente extraordinário. Demonstra mais um, que saberemos pagar de acordo.”
Solícito, o mago apresenta um punhado de flores secas e diz: “Assim como a vara vivificou a ave morta, ela fará com que estas flores fiquem tão frescas como se apanhadas neste instante!” Conser- vou-as algum tempo na mão esquerda, passou a vara por cima — e o ramo estava fresquinho! Mostrando-o aos romanos, ele prossegue: “Pelo poder desta vara, tudo que seja velho e murcho respira vida nova. Caso desejardes, darei mais uma pequena prova, pois as gran- des só posso demonstrar diante de milhares de pessoas!”
Dizem os romanos, com exceção de Agrícola: “Sim, podes continuar!” E ele afirma: “Sinto-me feliz por ter encontrado aqui tantos apreciadores da alta magia, e espero merecer igual atenção durante as provas especiais.” Com isto, tira um pedaço de pão do bolso da túnica e diz: “Todos podem certificar-se ser isto pão verda- deiro, entretanto será transformado em pedra!”
Observa o público: “Seria extraordinário, pois veem-se as migalhas que dele se desprendem.” Após a prova realizada, que provocou admiração total, os romanos fazem menção de pagar vultosa soma.
Eu, todavia, dou um sinal a Raphael, que se posta no meio deles, levanta a mão direita e diz: “Não! Jamais tal fraude compro- vada deve ser paga, mas severamente punida, porque seduz a alma e até mesmo pode matá-la. Tudo isto foi mistificação e vós, pagãos ignorantes, nada percebestes. Prová-lo-ei!”
RAPHAELDESMASCARAOS MAGOS
No mesmo instante, os mantos dos egípcios caem por terra, aparecendo dos bolsos quantidade de objetos, aves vivas e mortas, bem como flores secas e frescas. Raphael faz demonstração das ma- gias e pergunta aos romanos se realmente desejam pagar por tama- nha fraude. Eles se negam e os hindus confessam ser apenas esta sua faculdade milagrosa.
Diz Raphael: “Então trabalhai honestamente para vosso sus- tento!” Fazendo eles menção de se retirar, o anjo os retém, dizendo: “Ireis quando o permitirmos, pois ainda temos que conversar. Apa- nhai vossos mantos!”
Diz o chefe dos prestidigitadores: “Como podes, jovem belo, envergonhar-nos diante de assembleia tão ilustre?! Nada pedimos e nos satisfaríamos com pequena remuneração. Sabemos ainda ou- tras peças.”
Retruca Raphael: “Sei disto! Tudo se baseia em truques pe- los quais vos fazeis pagar, classificando-vos de famosos. Ao que me consta, existe entre vós uma lei que castiga, com rigor, mentira e impostura. Ainda assim, são elas vosso meio de vida, porque os ig- norantes vos sustentam, enquanto os magos menos astuciosos não escapam ao justo castigo. Prejudicais as almas através de avisos per- suasivos, afirmando a realização de milagres pelo poder de varas, palavras e vontade.
Tudo isto é miserável mistificação, pior que qualquer outra, na qual o impostor é desprezado e levado perante a justiça, enquanto vossas ações vos trazem grandes honrarias, até mesmo divinas. Houve casos em que vos apresentastes como seres divinos, aceitando sacri- fícios e adoração; inclusive se construiu um templo em vossa pátria, onde vossa imagem é adorada! Digo-vos ser isto obra do inferno e de seus maus espíritos, aos quais vos ligastes, não como se fossem coope- radores nas vossas fraudes, mas porque fazeis na Terra o que praticam no inferno; pois entre demônios tudo é mentira e embuste.
Como sacerdotes, aprendestes da casta as artes diabólicas e cor- reis mundo a fim de atrair as criaturas; vossa chegada a essa zona é inútil e vos garanto serdes impedidos no prosseguimento das mesmas.
De saída alegastes vosso plano de viajar ao fim do mundo para estudar a constelação cósmica; todavia, não vos é estranha a for- mação da Terra, pois houve em vosso meio homens bem orientados a respeito. Nunca divulgastes tais conhecimentos, e sim o povo fora ameaçado com severas punições quando se atrevia a crer e manifes- tar outras ideias que não as por vós inventadas. Para tais mentiras infames é ele obrigado a pagar sacrifícios pesados, suportando ainda martírios cruéis.
Porventura nunca imaginastes ser tal procedimento injusto?! Divulgais uma entidade suprema e bondosa, equilibrada por outra, maldosa; nunca acreditastes em tais divindades, deixando-vos, po- rém, venerar e adorar como filhos de um deus! Que criaturas sois?! Eu mesmo respondo: sois piores que as feras mais atrozes da Terra! Elas vivem dentro de uma certa ordem instintiva; vós, como seres dotados de razão, intelecto e livre vontade, sois contra os semelhan- tes, mais perversos que irracionais. Que me dizeis?”
DEFESADOCHEFE MAGO
Diz o chefe: “Jovem sábio e magnífico! De modo algum ne- gamos a situação por ti descrita; no entanto, já a encontramos des- se modo. Quem a inventou terá que responder perante um deus
qualquer a desgraça surgida como consequência. Fui educado como filho de um sacerdote e não tenho culpa de ser o que sou. Entre nós, o embuste religioso é virtude excelente; basta levar-se o homem inculto a uma crença firme por meio de artes ocultas, que ele se tor- na inteiramente feliz, vivendo dentro de uma ordem determinada, sem pavor da morte, pela fé na vida eterna da alma. Tirando-lhe tal crença, é ele mais infeliz que qualquer animal acossado. Antes de conseguirmos fazer de todas as criaturas sábios intelectuais, a ira do povo se teria atirado sobre nós. Por enquanto é melhor deixar as coisas como são. Só um deus onipotente poderia alterar esse estado de coisas.
Viajei por todo o mundo e estive no vasto reino além da grande muralha; nunca encontrei homens dotados de inteligência elevada. De modo geral é ela posse do sacerdócio, e a plebe se aco- moda com seus ensinamentos.
Toda pessoa sabe que vai morrer; mas quando goza de saú- de e abastança, torna-se inimiga da morte. O constante pavor da morte dominaria em breve o homem, a ponto de incapacitá-lo para qualquer trabalho e educação intelectual, pois existe em nosso país um povo que amaldiçoa a vida e evita a procriação, a fim de não po- voar o mundo com seres infelizes. Aumenta apenas pela imigração masculina, porquanto falta o sexo feminino. Existe o sacerdócio re- nunciador a tudo, ensinando os homens o conhecimento de deuses poderosos e invisíveis; apresenta-se como mensageiro e servo dos mesmos, operando milagres. Dá provas de suas palavras; o povo crê porque assistiu a tudo e é feliz por ter perdido o pavor da morte, pela fé numa vida melhor e eterna no além-túmulo.
Eis o fruto do sacerdócio, merecedor de consideração, não obstante convicto de ser a morte o final da criatura. A fim de manter a crença popular, o povo jamais deve ser orientado nos segredos dos sacerdotes, os quais convém considerar como criaturas superiores, cuja sabedoria e poder a alma só consegue compreender após a mor- te; pois se o fizesse em vida, seria seu extermínio psíquico. Nessas bases, levam existência calma e feliz. Por esse motivo perseguimos os
taumaturgos quando não fazem parte de nossa casta, aplicando-lhes punições severas, como sedutores a mando de um espírito mau. É preferível que um sofra a bem da comunidade, do que esta sentir as consequências de uma criatura maldosa.
Entre os nossos sacerdotes, alguns há detentores de provas re- ais da vida da alma após a morte; servem apenas para os iniciados nos mistérios da vida. Quanto à plebe, só convém apresentar fatos retum- bantes com cerimônias externas; são apreciados e aceitos, facilitando ainda grandes oferendas e bom ânimo ao trabalho. Isto tudo não é tão prejudicial como pensas e te convido a expressares teu parecer.”
CONFISSÃODO MAGO
Diz Raphael: “Dou-te razão no que diz respeito à tua inter- pretação material; pois a uma barulheira infernal os próprios animais selvagens se assustam. Muito forte é a impressão por vós causada, porquanto o povo entende vosso linguajar; se assim não fosse, cer- tamente fugiria diante de vossas encenações de feitiçaria pomposa. Todavia, repito terdes razão dentro de vosso entendimento.
Para que fim, porém, empreendestes essa viagem, apresen- tando-nos essas magias sem fundo? Qual vossa intenção? Porventura devemos considerar-vos poderosos mediadores entre Deus e os ho- mens, e finalmente acreditar que sois verdadeiros deuses? Em vossa pátria podeis fazer o que vos agrade; para que fim viestes aqui? Não foram ouro, prata e pedras preciosas o motivo, possuindo vós gran- des riquezas. Quiçá pretendeis converter-nos para a vossa crença? Eis vosso plano oculto, porque vossa ambição vos fez sair da Índia. Advirto-vos nada alcançardes nesse sentido, mas sim seríeis prejudi- cados. Voltai, por essa vez impunes, à pátria, e jamais ouseis retornar para tal fim; e mesmo lá, não vos excedais, pois nosso Deus, Único e Verdadeiro, perderia a Paciência castigando-vos com Sua justa Ira! Entendeste, feiticeiro desvairado?”
Responde o hindu: “Belo e sábio adolescente! Reconhecemos teres razão em tudo, pois nosso atraso na Índia é evidente. Contudo,
somos felizes, porque nada nos falta. O povo, crente na vida eter- na, não teme a morte. Apavora-se somente com um estado infeliz, consequência do não cumprimento das leis. Isto provam as extraor- dinárias penitências praticadas na Índia.
Considerando esse estado de coisas, não é possível um su- posto deus, sábio, bom e justo, nos querer castigar. Caso não lhe agradem os meios aplicados em benefício do nosso povo, poderia expressar a sua vontade para tal fim.
Têm várias utilidades nossas viagens por outros países. Te- souros não nos seduzem, porque preparamos os campos com ara- dos de ouro, e o ferro nos seria muito valioso. Tampouco nos tenta a apresentação de nossa arte, pois nosso público hindu é enorme. Não pleiteamos angariar adeptos pelo fato de não viajarmos como sacerdotes, mas como simples magos e sábios do Oriente. Sentindo no íntimo a nossa real carência, procuramos supri-la no estrangeiro.
Pressentimos a existência de um deus sábio e onipotente, por cuja vontade tudo foi criado. Até mesmo fomos informados por sábios da antiguidade existir no Ocidente um povo em constante união com a Divindade, portanto capaz de nos esclarecer. Já pene- tramos bem profundamente em tal direção, sem contudo encon- trarmos o mencionado povo. Descobrimos apenas nosso próprio privilégio comparando-nos a outros sábios do mundo, devido ao pressentimento de Deus e de nossas magias inofensivas.
Confessamos que entre todos ainda não descobrimos um mais sábio que tu. Achamos-te capaz do conhecimento da Verda- de e seria do nosso agrado ouvir-te a respeito; pois até hoje foste o primeiro a descobrir nossas magias. Fizeste-nos severa reprimenda, e para tanto tinhas motivo de sobejo; todavia, teve seu benefício.
Caso encontremos o que de há muito almejamos, promete- mos não mais prosseguir nas feitiçarias. Se assim não for, continua- remos em nossa busca e certamente não haverá quem nos condene. Não somos falsos, mas prudentes, e sempre fomos bem sucedidos em nossas empresas. Não te aborreças e permite voltarmos amanhã
— não somos magos, e sim sedentos de Deus!”
Diz Raphael: “Não estou sentido, conhecendo vossa índo- le; entretanto, vos asseguro ser Deus Verdade e Sabedoria eterna, e jamais poderá ser encontrado e compreendido através de artes mis- tificadoras! Deus é Santo; o embuste — seja qual for sua espécie e motivo — é ímpio, portanto condenável e indigno.
Quem quiser encontrar Deus como máxima Verdade terá que fazê-lo com toda humildade e sinceridade de sentimentos; por meio de mentiras e fraudes, jamais!
Existem em vosso país sábios da antiguidade por vós chama- dos Pirmanji e conhecedores de Deus Único e Verdadeiro. Por que não vos deixais orientar por eles?”
Responde o chefe: “Não é possível entrar-se em contato com eles, porque habitam alturas acessíveis somente a condores; ninguém conhece o seu paradeiro. Certa ocasião conhecemos alguns adeptos, mas, com toda nossa inteligência, nada aprendemos. Desconfiamos de sua origem peculiar pelo fato de nos terem relatado coisas de nossa infância, e além disto predisseram ocorrências que até hoje se realizaram perfeitamente.
Quando começamos a falar da possível existência de Deus, desviaram o assunto. Como insistíssemos, afirmando estarem eles em nosso poder, responderam: Encontramo-nos no Poder insupe- rável de Deus Verdadeiro, acima do Qual não existe outro! — e no mesmo instante desapareceram diante de nossos olhos. Lucramos apenas com a ideia mais firme da Existência Divina; de modo algum podemos positivar uma noção clara.
O mesmo acontece com nosso sumo sacerdote: sabe tanto quanto nós. Por isto envia pelo mundo afora, anualmente, alguns de seus sacerdotes mais aptos, a fim de angariarem conhecimentos de Deus, do qual consta em nosso antigo livro: Jaseamzkrit(Eu estou oculto). Mas onde? Eis o motivo real de nossas constantes viagens. Nosso povo leva vantagem, porque crê estar Ele oculto num palácio de ouro, no cume duma montanha inacessível, no que é positivado
através de nossas ações milagrosas. Mas onde está o Deus Verdadei- ro? Eis outra questão!
Procuramo-Lo em todas os recantos e grutas terrestres, ain- da que de acesso dificílimo, e descobrimos muita coisa estranha — Dele Mesmo, nada! Entretanto, toda Criação demonstra a Existên- cia de um Pai sumamente Bom e Sábio. Todavia, ninguém se pode vangloriar de tê-Lo visto ou Lhe ter falado.
Não é realmente difícil tornar-se o homem consolador de uma criatura e até mesmo de um povo; insuportável, porém, é ficar-
-se privado do próprio consolo. Não resta dúvida termos usado de meios inapropriados; onde estariam os recursos eficientes?
Afirmaste ser Deus a Verdade e só pode ser encontrado pela própria verdade. Isto soa muito bem; mas o que é a Verdade e onde encontrá-la? Feliz quem a pressente; onde estaria o dono da mesma? Aponta-me tal homem, que será por nós procurado até o fim do mundo para lhe oferecermos todos os tesouros de nosso reino, em troca de sua riqueza espiritual.
Digo-te sinceramente, mesmo com risco de seres tu o Per- sonagem oculto, que o homem em constante busca da Verdade vale tanto, ou talvez mais, que o felizardo que a tivesse encontrado por mero acaso, todavia a oculta, deixando os sedentos seguir caminho, enquanto poderia saciá-los com poucas palavras.
Eis o motivo de nossa maior dúvida quanto a Existência de Deus: qual vosso privilégio caso O tenhais encontrado, e quem poderia afirmar ter sido vosso empenho mais firme que o nosso?
Nós, hindus, temos base para discutir como povo remo- to; no entanto, não é certo nos encontrarmos por muito tempo no mesmo atraso espiritual. De qualquer maneira, não nos cabe culpa.
Se porventura tiveres escondido um tesouro e prometeres grande recompensa aos serviçais caso o encontrem de olhos venda- dos, mas que assim não sendo, seriam eternamente punidos — tua justiça seria idêntica à dos animais ferozes!
Se Deus Verdadeiro isso exigisse dos homens fracos desta Terra, melhor seria não ter nascido. Alguém me perguntando o ca-
minho para determinado local, é meu dever servir-lhe de guia solíci- to — e tal foi sempre minha atitude.
Se procuramos por todos os meios ao nosso alcance, cla- mando pela Presença Dele e Ele não nos satisfazendo o imenso desejo, só há três hipóteses: talvez não exista, e tudo que vemos é apenas consequência da Natureza; ou é Ele tão Elevado, de sorte a se preocupar somente com coisas infinitas; ou então, um Ser surdo e insensível a ponto de as criaturas terem a mesma importância que os insetos. Em tais hipóteses, Deus nos é inteiramente desnecessário. Que me dizes à minha explicação?”
OVERDADEIROCAMINHOPARA DEUS
Diz Raphael: “Agora falaste sinceramente, dando provas de terdes procurado Deus, a Verdade Eterna, através da Verdade plena, e posso afirmar que jamais chegaste tão perto Dele como agora! To- davia existe muita coisa, em vosso íntimo, imprestável em sua plena conquista e enquanto não descobrirdes e expulsardes tal mácula ne- gra, difícil será chegar a Ele, não obstante Sua Presença.”
Diz o mago: “Que seria tal mácula?”
Responde o anjo: “Vosso orgulho sacerdotal. Pois ai de quem vos encontrasse deixando de vos cumprimentar, casualmente. Seria considerado criminoso e sujeito a grave penitência, que redunda em séria mortificação; e para os ricos, em sacrifícios monetários, não raro fabulosos. Eis a mácula negra que, enquanto for alimentada, Deus não Se deixará descobrir; pois isto só é possível por quem de- sejar tornar-se psiquicamente semelhante a Ele.
Tornar-vos semelhantes a Deus quer dizer: enchei-vos de amor ao próximo e vosso coração de humildade, candura, paciên- cia e misericórdia para com todos, que Deus terá Misericórdia para convosco, deixando-Se encontrar no Espírito do Seu Amor e Sabe- doria eternos.
Se procurardes Deus somente na Verdade e por ela, não deixa- reis de vos aproximardes, todavia não vos seria possível perceber Sua
Natureza intrínseca, muito menos entendê-la; pesquisando-O no amor, humildade, meiguice, paciência e misericórdia, achá-Lo-eis, reconhecendo-O para colherdes a vida eterna de vossa alma.
Houve neste país um grande profeta, pleno do Espírito Divi- no. Luz e Verdade eram seu caminho e o Poder de Deus se manifes- tava em cada palavra. Em virtude de Desígnios estranhos, foi obri- gado a fugir para o estrangeiro, pois na pátria procuravam matá-lo. Ocultou-se numa gruta, alimentando-se de raízes, e passado algum tempo pediu que Deus Se lhe mostrasse uma só vez, pois estaria pronto para morrer.
Eis que ouviu uma voz: Posta-te na entrada da gruta, que passarei por ela! — O profeta obedeceu e enquanto esperava, sur- giu uma violenta tempestade a ponto de arremessar rochas inteiras como se fossem palha ao vento! E ele julgou ter passado Jehovah, demonstrando-Se daquele modo aos mortais.
A voz lhe disse prontamente: Enganas-te! Deus não Se acha na tempestade! Espera, que Ele passará! E imediatamente um fogo violento passou pela entrada da gruta, e Elias disse de si para consi- go: Tua Presença Se manifesta no fogo, Senhor? — Novamente a voz respondeu: Não! Tem paciência que agora Deus passará!
E o profeta esperava, tremendo de pavor. Súbito, fez-se sentir um delicado sussurro, Manifestação de Deus. E a voz dizia: Quem quiser fitar Deus deve procurá-Lo no amor, humildade, meiguice, paciência e misericórdia; quem tentar outros meios e caminhos não encontrará Jehovah!
Vede, aquilo que a voz disse ao grande profeta foi por mim expresso, indicando-vos o justo caminho. Neste, havereis de encontrá-Lo; por vossos meios — jamais! Entendestes?”
SISTEMASRELIGIOSOSNA ÍNDIA
Diz o mago: “Jovem amigo, tão belo quanto sábio! Não contas dezesseis anos, entretanto falas qual homem experimentado! Quem foi o teu mestre?”
Responde Raphael: “Não há mestre mundano que me en- sine, pois tal sabedoria é transmitida pelo Espírito Divino àqueles que amem a Deus acima de tudo e ao próximo como a si mesmos. Alegais ser o amor o móvel de vossas mentiras e embustes, querendo beneficiar o povo e que, sem essa caridade, ele haveria de desespe- rar. Estais equivocados. Há entre ele muitas criaturas inspiradas por Deus, que vos consideram no coração tanto quanto eu. Alimentam pavor tremendo de vossas punições, por isso aparentam grande res- peito. Intimamente vos desprezam mais que a morte, no que têm toda razão. Se fôsseis desistindo pouco a pouco de vossas tolices e crueldades, suplantando-as pelos meus ensinos, o povo começaria a vos louvar e respeitar.”
Diz o mago: “Se isso dependesse apenas de nós! Como adep- tos dos Zienta-Viesta(visão pura) e do Zan-skritnão somos tão cru- éis e temos piedade para com o próximo. Os discípulos do miserável Zourouazto(Por que agitas?), que localizam a divindade no fogo, são cheios de ensinamentos, hábitos e costumes cruéis. Foram por nós desalojados até a costa do grande mar; no entanto, não foi pos- sível dispersá-los inteiramente. Respeitando eles nosso regime sacer- dotal, submetendo-se ao mesmo, foram tolerados, mas nunca consi- derados. No que diz respeito ao nosso povo das montanhas, poderia ser educado para algo melhor; os habitantes costeiros e os seguidores de Zourouaztoserão mais difíceis porque sofrem a influência da superstição.
Quanto a nós, que aqui ouvimos a pura verdade, tudo fare- mos para transmiti-la a outrem; naturalmente ela terá que ser expe- rimentada. Caso tivermos prova de tudo, nosso zelo será eficiente; assim não sendo, continuaremos a considerar-te, admitindo não merecermos a realização de tua quase promessa. De maneira alguma começaremos a abalar a crença popular.
Julgamos, pois, ter combinado o necessário contigo; recebe nossa gratidão pelo grande trabalho, e permita guardarmos no co- ração tuas palavras tão benéficas. Quando te encontrares face a face com o Criador, santo e eterno, lembra-te de nossa pobreza espiritual
e pede-Lhe transmitir às nossas almas a verdadeira Luz da Vida e Sua Santa Vontade!”
OPRESSENTIMENTODOSMAGOS.O DIAMANTE
Todos se comovem com as palavras do mago e até Meus Olhos Se enchem de lágrimas; por isso digo a Raphael e a Lázaro não deixá-los seguir, pois desejo encontrem à noite a Quem procuram.
Ambos se aproximam dos hindus e o anjo diz com amabili- dade celeste: “Para onde pretendeis seguir? O Sol já está no horizon- te e vosso séquito acha-se bem acomodado na cidade. Ficai a noite nesse albergue.”
Diz o mago: “Amigo celestial! Desejaríamos ficar muitas noi- tes em tua companhia, para ouvir ensinamentos tão maravilhosos! Com prazer aceitamos teu convite, garantindo pela despesa.”
Intervém Lázaro: “Em meu albergue o vosso gasto será mí- nimo.” O chefe sugere um deles dirigir-se à cidade para orientar os amigos de sua permanência em casa de Lázaro.
Diz Raphael: “É desnecessário, pois já o sabem.” Indaga o hindu: “Como? Sei não ter sido enviado alguém e, ainda que assim fosse, ignoraria o albergue deles.” Obsta o anjo: “Não vos preocu- peis; aos verdadeiros amigos de Deus Único nada é impossível neste mundo. Eu mesmo informei os teus colegas e trouxe teu cálice de ouro cravejado de diamantes, rubis e esmeraldas, para tomares o nosso vinho. No fundo dele veem-se tuas iniciais.”
Exclama o mago: “Chegamos ao nosso destino! Isto só é pos- sível a um deus! Certamente assistiremos a grandes feitos!”
Diz Raphael: “Tens razão! Não me julgues, porém, Aque- le que tanto tens procurado; todavia, está Presente! Por ora é só!” Quando o Sol desaparece no horizonte, Lázaro se vira para os ma- gos: “Meus amigos, o que acabastes de assistir é apenas o início de tudo que ireis presenciar, dentro do atual estado psíquico. Exercitai-
-vos na paciência, meiguice e verdadeira humildade, para suprir-vos de grandes bênçãos. Vossos possíveis gastos já estão saldados.”
Diz o chefe: “Quem teria feito isso?” Responde Lázaro: “Não pergunteis, pois foi o Dono de todos os tesouros da Terra.” Prossegue o outro: “Inclusive os de nosso reino imenso?” “Sim”, diz Lázaro. In- daga o mago: “Acaso conheces nossas riquezas fabulosas?” Responde Lázaro: “Eu não, porém esse jovem e mais um Outro Personagem as conhecem de modo muito mais amplo!”
Vira-se o hindu para Raphael: “Quando estiveste na Índia para saberes disso tudo?”
Responde o anjo: “Sei até de um grande diamante, de valor inestimável, o qual conservas de tal modo, que ninguém na tua pá- tria sabe algo a respeito!”
Admirado, o chefe diz: “Realmente, assim é. Podes fazer uma descrição do mesmo?” Diz Raphael: “Será mais indicado trazê-
-lo para depositá-lo em tua mão, conforme fiz com o cálice. Presta atenção ao tempo que levarei para tal fim!”
Conjectura o mago: “Se disso fores capaz, és um deus! Pois nossa pátria dista daqui setenta dias de viagem, e tu pretendes trazer-me a pedra num instante?!”
Diz Raphael: “Quanto tempo demorei?” Responde ele: “Até agora não te ausentaste!”
Prossegue o anjo: “Ainda assim trouxe tua pedra preciosa! Vê se é a mencionada!” O mago quase tem uma vertigem quando vê o milagre e não consegue se acalmar.
CAMINHOPARAA PERFEIÇÃO
Após certo tempo de perplexidade, diz o mago: “Jovem mila- groso! Não consigo imaginar Deus superior a ti; pois teus milagres não são admissíveis a um ser humano. Eis meu cálice e o diamante, único em qualidade. Certamente atravessou o ar qual relâmpago e deveria ter feito algum ruído. Nada disto aconteceu! Em suma: estamos na Pre- sença de Deus, e nada, a não ser tua força, nos poderá afastar daqui!”
Diz Raphael: “Meus amigos e irmãos, peço não me consi- derardes em nada melhor que uma criatura mais aperfeiçoada pela
Graça Divina! Que sou eu perante Deus? Um nada, no nada! O que faço é ação do Espírito Divino a preencher-me de tal modo, que meu coração é pleno de amor e da Vontade de Deus. Acontece somente aquilo que a Vontade Divina dentro de Mim deseja; pois a Palavra e a Vontade de Deus são a Única realidade, a Existência e Continuidade de todas as coisas e seres, e a própria ação realizada.
Dentro de mim só existe uma centelha do Espírito Divino; está em permanente união com Ele, eternamente infinito. Deste modo, a minha centelha divina, em constante ligação com Deus, quer apenas o que é da Vontade Dele; percebe-a a toda hora, ope- rando de pronto o que o Espírito Divino deseja.
Em vós se oculta a mesma centelha, apenas se assemelha ainda ao gérmen na semente. Enquanto não for deitado no solo, continua inerte; somente quando tudo que seja externo e matéria desmorona, possibilitando a unificação da substância psíquica com o gérmen, o espírito começa a agir e operar milagres, tantas vezes vistos por vós.
De igual modo, o homem material tem que destruir todas as aspirações mundanas através da vontade psíquica. Não deve ligar o amor às coisas terrenas; sua única aspiração se deve dirigir ao conhe- cimento, ao amor de Deus e ao cumprimento de Sua Vontade, ainda que redunde em enormes sacrifícios para corpo e alma.
Por esse meio o espírito no homem se põe em ação, em breve o preenche, fá-lo semelhante a Deus e lhe dá todo poder e força, inclusive a criatura encontrar Deus — o Amor, Sabedoria e Verdade eternos — apenas pelo puro amor a Ele, e, por Ele, a Verdade.
Experimenta expor uma semente ao ar, onde seja beneficiada pelos raios do Sol, e verás como secará sem germinar! O mesmo acontece com o homem à procura de Deus pela luz intelectual: res- seca e se atrofia, e todo o seu esforço é inútil.
O gérmen cheio de vida sendo depositado no solo quer dizer: o homem, começando a renunciar aos prazeres sensuais, torna-se cheio de humildade, meiguice, paciência, amor e misericórdia para com o próximo, incentivando seu amor a Deus! Em tal situação ele
já se encontra qual semente viva e germinadora no solo da vida ver- dadeira. O seu espírito provindo de Deus o penetra inteiramente e o ajuda no seu crescimento à vida eterna e à contemplação de Deus.
Quem isso realizar terá encontrado a Deus, eternamente oculto, e jamais perdê-Lo-á. Eu assim fiz, alcançando meu estado atual; a maior parte dos presentes também se acha em tal situação e ainda mais adiantada que eu. Querendo, podereis atingir o mesmo fim; para tanto, seria preciso banirdes muita coisa mundana do vos- so íntimo. Compreendestes?”
ACULPADOS MAGOS
Diz o chefe mago: “Pouco a pouco começo a compreendê-lo; entretanto, surge a indagação por que não recebemos há mais tempo essa verdade tão sublime do Deus Único e Verdadeiro, por meio de uma revelação? Desde épocas remotas suspiramos por ela na enor- me treva da ignorância; também somos humanos, adoramos a Deus sob o nome de Delailama(cria e destrói), rejeitando a doutrina de Zorouasto. Contudo, nunca obtivemos qualquer revelação, motivo por que perdemos a fé. Qual foi a razão disso? Éramos vítimas duma maldição ou os próprios culpados inconscientes?”
Responde Raphael: “Vós mesmos sois o motivo. Não só uma, mas muitas vezes foram inspiradas criaturas em vosso meio para de- monstrarem o caminho errado que palmilháveis. Que lhes fizestes? Foram por vós amaldiçoadas como hereges e, caso capturadas, a morte mais cruel servia de exemplo apavorante para outras. Nisso se baseava o orgulho ilimitado e o domínio insaciável.
Na vossa compreensão, o Senhor do Infinito deveria Se ma- nifestar entre vós, para que pudésseis passar ao povo uma gota por hora apenas. Não concordando com isso, Ele vos deu, em vez da Luz Celeste, a treva do inferno, na qual a maioria ainda se encontra.
Deus é, em Sua Natureza, o Amor mais elevado e puro. É excessivamente Benigno, Humilde, Paciente, Meigo e Misericordio- so. Detesta toda e qualquer pompa mundana. O orgulho é-Lhe um
horror, e o domínio posse comum do inferno, do qual divulgastes coisas horrendas! Pois também lá todo espírito mau quer ser sobera- no, não havendo ser e vida sem mentira, embuste, orgulho e domí- nio. Dize-me se não foi assim! Como poderia uma revelação divina estender-se entre vós?!
Em vossa cegueira mundana, julgais ser apenas possível Deus Se manifestar como Ser Supremo aos pretensos soberanos; pois o homem comum era considerado abaixo do irracional. Vosso engano foi tremendo; Deus é justamente a própria Humildade, Meiguice, Paciência, o Amor Eterno e a Misericórdia perfeita, e Se dirige so- mente aos que correspondem a tais atributos. Seu Lema eternamen- te santo é: Deixai vir a Mim os pequeninos e simples; deles é o Reino do Céu, do Amor, da Sabedoria, da Verdade e da Vida Eterna!
Tudo isto vos foi anunciado por criaturas do povo ainda do alto da fogueira que as devia consumir, razão por que lhes atirastes pedras à boca, e quando encarceradas, arrancaste-lhes as línguas, em vez de escutá-las! Dizei-me: qual deveria ser a Ação de Deus se vosso orgulho desmedido assim tratava os inspirados pelo Espírito Divi- no? Quantos milhares não foram torturados — e ainda sois capazes de indagar a quem cabe a culpa?!
Estudai vossa História, onde achareis em verdade o que aca- bo de falar! Em seguida dizei: Deus Onipotente, perdoa nossa ce- gueira ilimitada, pela qual pecamos de modo tão infernal. Somente nós somos os culpados de nossa prolongada cegueira! Dá-nos Tua Luz a fim de que possamos encontrar-Te, ó Santíssimo!, que o Se- nhor vos perdoará os pecados, trocando o julgamento pela Graça. Compreendestes?”
PROSSEGUIMENTODA CONTROVÉRSIA
Diz o mago: “Compreendemo-lo algo melhor; pois julga- mos que Deus, o Ser Supremo, habitando acima das estrelas, só Se podia manifestar aos de posição igualmente elevada. Se, por acaso, um homem simples pretendia ter recebido uma revelação da Própria
Divindade, os sacerdotes declaravam tal afirmativa como heresia pu- nível frente à Majestade e Santidade Infinita de Deus, merecendo geralmente a morte.
Deus devia saber desse nosso erro! Por que não Se expressou a um sumo sacerdote de tal modo a convencê-lo de sua fonte fidedig- na, traduzindo a Vontade Suprema?! Se isso tivesse sucedido, dificil- mente um profeta teria sido condenado à morte; pois os sacerdotes seriam informados da possibilidade de um escravo, ou até mesmo uma mulher, poder receber inspiração divina, e tais criaturas teriam sido alvo de respeito e crédito.
Como tal fato jamais ocorreu, continuamos os mesmos de sempre. Considerando esse aspecto pela lógica, chego à conclusão de não sermos os únicos culpados de nossa ignorância. Expresso simplesmente minha opinião; pois uma revelação transmitida por pessoa conceituada teria maior efeito do que sendo de classe inferior, portanto não tem meios de divulgação entre sacerdotes e soberanos. Que me dizes a respeito?”
ODESTINODOPOVO HINDU
Diz Raphael: “Teu parecer razoável prova teres adquirido quantidade de conhecimentos filosóficos, enquanto os vossos livros de História estão cobertos de poeira, considerada Santa. Por isso, não estudais a narração de vossa raça.
Todavia afirmo que no início de vosso surgimento, Deus, o Verdadeiro, Se revelou apenas aos decanos e patriarcas, durante um milênio. No princípio, tudo corria bem; quando, aos poucos, os res- ponsáveis se tornaram ricos e venerados, começaram a incluir seus próprios preceitos, e o povo acreditava e seguia-lhes tais normas.
Em breve, esses estatutos sobrepujavam os divinos, em virtude de não surtirem efeito todas as advertências dadas aos sacerdotes e pa- triarcas. Deus então inspirou visionários e profetas em meio do povo a fim de advertirem os grandes e poderosos, completamente afastados de Deus, pois sobrecarregavam os pobres com toda sorte de exigências.
Os fanáticos, porém, se apoderaram dos profetas, fustiga- ram-nos no início, assegurando-lhes punições mais severas caso se apresentassem como inspirados do Alto.
Eles então operaram milagres e predisseram os castigos que surgiriam diante de sua maldade. Isso tampouco surtiu efeito. Os visionários e profetas foram martirizados e mortos. Alguns fugiram e o Espírito de Deus os levou a um local desconhecido. Deles se formaram os Pirmanji, muito embora aqueles vales inacessíveis já tivessem sido habitados por criaturas de índole ainda simples.
Assim aconteceu já antes de vossa época; e como Deus foi por vós abandonado, fez Ele o mesmo, no que se baseia o obscureci- mento prolongado do julgamento e da morte de vossas almas!
A luz da Vida agora se fez para vós; no vosso país ainda estará distante. Pois se for usada apenas em vosso usufruto, pouca utilidade terá; transmitida ao povo, provocareis escândalos, tanto nele quanto nos regentes. Ninguém vos prestará ouvidos, e caso insistirdes tereis a mesma sorte dos demais profetas.”
Diz o mago: “Aceitamos a verdade de tua exposição; no en- tanto, nós três e o séquito não temos culpa do agravo de nossa re- ligião, pois de há muito sentimos o mal, razão por que fomos à procura da Verdade, aqui encontrada tão maravilhosamente.
Se a situação é tão precária em nossa pátria, resta saber qual atitude tomar. Convém guardarmos o recebido, ou devemos passá-
-lo aos outros em época oportuna? Pois conhecendo a Luz e desejan- do empregá-la, todavia obrigados a seguir os absurdos dos outros, tornar-nos-emos traidores piores que dantes.
Anteriormente julgávamos beneficiar a plebe pela mentira e o embuste. Agora deveríamos prosseguir nessa trilha, não obstante termos chegado à fonte verdadeira?! Não, meu amigo! Preferimos seguir até o fim do mundo com nossos familiares, servos e tesouros, para podermos viver dentro dos novos conceitos! Talvez tenhas con- selho melhor?”
Diz Raphael: “É difícil ajudar-vos! Se bem que haja no vosso reino muitos desejosos em receber o que já encontrastes em parte, tão
logo se integrem de vossos conhecimentos, não lhes será possível per- manecer na pátria. Lá estabeleceu-se o verdadeiro inferno e em tal am- biente é difícil alcançar o Céu, porque o interessado na verdade vai ao encontro de milhares de obstáculos que o perseguem com insistência.
Podeis voltar à Índia e experimentar com cuidado se os co- legas suportam tais inovações. Quem as aceitar não deve ficar no país da treva e do julgamento do inferno, do contrário será tragado! Se, em virtude do vosso próprio aperfeiçoamento, não quiserdes vol- tar, haverá desculpas e meios de sobra como justificativa. Eis meu conselho, e podeis agir à vontade.”
Diz o mago: “A decisão é fácil. Se nossos colegas tiverem o mesmo rigor pela verdadeira Luz da Vida e sentindo encontrar-se ela no Ocidente, irão à sua procura; não tendo esse desejo — que continuem na treva e morte! Uma coisa faremos para sua salvação: enviaremos alguns servos munidos de cartas cifradas. Querendo, po- derão decidir do próprio destino. Estará bem assim?”
Diz Raphael: “Muito bem! Mas que será de vossos tesou- ros imensos?”
Responde ele: “Os de grande valor estão conosco — e o maior foi descoberto aqui e vale mais que todas as riquezas do orbe! Quanto ao resto, poderá ser dividido entre os serviçais, evitando contendas; mais tarde poderão nos seguir!”
Conclui Raphael: “Tal atitude terá sua bênção! Agora me- ditai acerca de minhas palavras e preparai-vos para coisas mais eleva- das; entrementes irei preparar uma boa ceia com meu amigo.”
AREVELAÇÃODADAÀ ÍNDIA
Vira-se Agrícola para Mim: “Senhor e Mestre! Sempre ima- ginei a Índia um país milagroso, de cultura remota igual ao Egito, e eis que vejo precisamente o contrário. Quando receberá esse povo a Luz da Vida?”
Digo Eu: “Terá sua oportunidade; por enquanto ainda não está em condições para tanto. A massa é obediente e paciente, beata a seu
modo e tem fé firme. Se fôssemos tirar-lhe a sua crença, seria aniquila- da, com prejuízo para as almas. É por isso aconselhável não esclarecer a Índia antes do tempo; em época oportuna, receberá ensinamentos em gotas, razão por que ainda existem sábios e visionários especiais, como não mais os há entre judeus. Tais homens divulgam uma luz crepuscular, sem a qual esses três hindus não teriam dado aqui.
Quando nasci em Bethlehem dentro de um estábulo, também chegaram três sábios do Oriente e fizeram-Me a primeira saudação, oferecendo-Me ouro, incenso e mirra, para em seguida voltarem à pátria. Há algum tempo eles aqui voltaram e esse vizinho de Lázaro os hospedou. Existem, portanto, sábios na Índia; mas poucos.
Além disto, não são os atuais sacerdotes tão rigorosos quanto aqueles sábios ocultos de cem, duzentos e até quinhentos anos atrás; pois várias epidemias, por eles preditas, dizimaram pelo menos dois terços dos personagens importantes; grandes terremotos, tempesta- des e inundações tornaram os sacerdotes e soberanos mais dóceis e pacientes, conquanto de modo geral mantêm os princípios da incle- mência e crueldade. Há tempo de sobra para esse povo sensual, até que amadureça para uma luz mais elevada.
Raphael tratou-os dentro de Minha Vontade, conquistando-
-os rapidamente; todavia, não deveis denunciar-Me antes de ama- nhã. Eis Lázaro e Raphael de volta. Após a ceia voltaremos aqui para observarmos o Céu estelar.”
Todos se dirigem ao refeitório e os magos se admiram da ar- rumação de fausto oriental, especialmente em sua mesa, abarrotada de iguarias do seu país. O chefe se levanta e diz a Lázaro: “Prezado amigo, por que esse desperdício? Muitos pobres poderiam ser ali- mentados com o valor correspondente a esse luxo! Não há necessi- tados nessa zona?”
Responde Lázaro: “Como não? Eu mesmo cuido de muitos! Naquela mesa comprida estão setenta; e nas minhas propriedades milhares encontram acolhida e ocupação. Todos os pobres acham as portas de minhas casas abertas. Por isto, não vos preocupe a pequena honra que vos faço pelo tratamento especial!”
Durante a refeição pouco se fala; apenas os romanos pales- tram em latim. No final, o chefe dos magos se levanta novamente e diz a Lázaro: “Estamos otimamente alimentados, por isso desejo saber o que devo!”
Retruca o anfitrião: “Não recebestes sal?” — Diz ele: “Sim, eis o resto num saleiro de ouro!” Aduz Lázaro: “Então tudo está pago; pois é hábito entre nós ser livre de despesa o hóspede que re- cebe sal à parte. Louvai o Deus, Único e Verdadeiro, pois é Ele meu Pagador por tudo e para sempre!”
Diz o hindu: “Tens razão; se nós ao menos já O tivéssemos encontrado como sucede convosco, nosso louvor seria mais vivo! Todavia, estamos satisfeitos com a certeza plena de Sua Existência; pois sem Ele, aquele jovem não poderia ter operado milagres possí- veis a um Ser Supremo, tampouco expressar-se de modo tão elevado!
Esse Deus desconhecido seja louvado com todas as forças de nossa alma; deve ter sido Ele a nos guiar para cá, dando-nos oportu- nidade de orientação por vosso intermédio.
Tua casa — a julgar pelas aparências — deve ser suprida de tudo, ainda que se ignorasse tua sábia administração de bens. Se, além disto, as informações colhidas correspondem às aparências, tal lisonja aumenta a simpatia pelo anfitrião. Entretanto, seria desani- mador caso os interessados pelo conhecimento de tal homem fossem enfrentar problema insolúvel.
Aos poucos manifestar-se-ia o sentimento de um filho para com o pai, de há muito procurado alhures. O coração do filho sen- te-se cada vez mais aflito. Procura distrair-se pelo mundo afora; po- rém, dias e noites se seguem sem que o pai retorne. Desesperado, o filho vai à procura dele. Visita as suas propriedades, onde encontra vestígios flagrantes da presença do genitor; enfim, acha tudo, tudo
— somente não descobre o amado! Ele desce às profundezas terre- nas, galga os cumes das montanhas e exclama: Pai querido, onde estás? Por que não te deixas descobrir pelo teu filho? Caso tenha
pecado contra o teu mandamento raramente expresso, perdoa ao fraco, cego e pobre, e faze com que ouça tua santa voz!
Deste modo prossegue o filho na busca do pai. Ouve o ru- mor dos ventos pelas matas; o furioso rugir da tempestade em mar e terra; percebe as harmonias das aves e vê os relâmpagos entre as nuvens; a Face do Pai, porém, não aparece e o eco de sua voz não chega até o filho.
Eis a situação dos filhos da Índia, e nenhum de nós sabe a origem do nosso livro Jaseamskrit. O seu axioma oculto perdura, quer dizer, o grande Pai de todas as criaturas continua oculto. Se tal acontece aos que O procuram, que será dos outros que não o fazem?
Já nos sentimos felicíssimos com a aproximação do seu rastro; muito maior será nossa alegria quando pudermos vê-Lo e falar-Lhe com todo amor e humildade. Caso não mereçamos tal Graça, pe- dimos não vos esquecerdes de nós quando diante de Sua Majestade Infinita! Com isto repetimos nossa gratidão e louvor, a Ele e a vós, do fundo de nosso coração!”
TUDOTEMOSEUDEVIDO TEMPO
Esse discurso comove os presentes, e Pedro Me diz em surdi- na: “Senhor, vê como anseiam por Ti; por que não Te apresentas?”
Respondo: “Sei do motivo, que não te diz respeito! Semelhai-
-vos a crianças inexperientes, ávidas pelo fruto ainda não amadure- cido. Acaso ainda ignoras que nesta Terra tudo tem e deve ter seu devido tempo? Eu Mesmo sinto forte desejo de Me dar a conhecer a esses três. Meu Amor e a Sabedoria eterna, provinda Dele, dizem: Nada antes do justo tempo. A precipitação de um átimo deitaria a perder muita coisa, apenas reajustável por uma prova prolongada do livre arbítrio. Basta o pecado da fraqueza humana; como poderia o Mestre Eterno da imutável Ordem criadora sair fora da mesma?!
Esteja certo serem Meus Sentimentos mais fortes que de to- dos vós; conheço, todavia, Minha Ordem Eterna, contra a qual, de certo modo, todo homem e anjo podem pecar; Eu, jamais! Pois o
Meu Afastamento da Ordem teria como consequência o extermínio de todos os seres. Quando rui a pedra fundamental de um templo ou edifício, por estar oca e apodrecida, qual seria o efeito?! Elogio tua fé e teu sentimento — tua dor não Me diz respeito, antes do tempo! Pensa e sente Comigo, que caminharás lépido.” Pedro se cala, gravando Minhas Palavras no coração.
O hindu, que havia percebido a cena, prontamente se vira para Raphael: “Jovem milagroso! Ouvi palavras sumamente im- portantes de um homem, certamente sábio! Não poderias dizer-me quem é? Confesso que eu e meus amigos sentimos atração estranha para com ele. A todo preço quero conhecê-lo!”
Diz Raphael: “Paciência, meu amigo; isso não é tão fácil como o transporte de teu diamante! Pois onde deve agir a livre von- tade da criatura, ela não pode ser interceptada por uma coação! Tem paciência! Iremos ao ar livre, onde terás oportunidade de conhecê-lo melhor!” Todos nos dirigimos para fora e cada um toma o lugar de costume, enquanto os magos se sentam perto de Mim.
OFURACÃOESUAUTILIDADE.OMAR MORTO
Achando-nos assim acomodados, de repente começa a soprar um forte vento frio do Norte e Lázaro Me diz em surdina: “Senhor, se essa ventania crescer, seremos obrigados a entrar!”
Digo Eu: “Amigo, caso não o quisesse, ela não se manifesta- ria. Eu o querendo, ela se apresenta chamada por Mim. É oportuna, porque tudo que o Pai em Mim quer é bom! Por isto ninguém deve temê-la como prejudicial à saúde. Dentro em pouco compreenderás a sua causa.”
Quando termino, o vento aumenta consideravelmente, le- vando os hindus a se dirigirem a Raphael: “Ouve, jovem belo e po- deroso, descobrimos ser possível ao homem realizar coisas grandio- sas através da união de sua vontade com a divina; todavia, surgem fenômenos naturais dificilmente vencidos, ainda que pelo homem mais perfeito. Haja vista essa ventania desagradável. Temos a im-
pressão de serem os elementos inconscientes, não obedecendo a uma vontade poderosa.”
Diz Raphael: “Estais enganados! Pois se a pedra mais dura se submete ao poder da vontade ligada a Deus, quanto mais o ar, constituído de potências psíquicas especificadas, muito mais afins ao elemento espiritual. Este vento, tão incômodo para vós, sopra porque o queremos e o motivo se apresentará; basta dirigir o olhar em sua direção!”
Todos assim fazem e deparam, na região do Mar Morto, grossas nuvens de fumaça cobrindo o horizonte Sul, e vez por outra se formam colunas de fogo, prontamente apagadas. O chefe dos ma- gos se vira para Raphael, dizendo: “Que é isso? Será um incêndio?”
Responde este: “Oh, não! Existe naquela zona um lago imen- so, denominado pelos judeus de Mar Morto, porque nele e acima dele, em considerável altura, não subsiste um ser vivo.
Peixes ou outros animais aquáticos têm vida curta, inclusive plantas. Pois a base do lago é constituída de um depósito de enxofre e piche, longo e profundo. Em determinadas épocas se incendeia debaixo d’água, rompe o solo e o fogo se projeta até a superfície, mas é prontamente apagado pelo líquido a penetrar nas fendas. Todavia não impede novas erupções, igualmente abafadas pela água.
O incêndio se estende durante horas em sua fúria; o efeito, que consiste num borbulhar do lago em virtude de fumaça e vapor em vários pontos, continua durante dias. Não é aconselhável apro- ximar-se, muito menos contra o vento, pois os gases a se desenvol- verem sufocam qualquer criatura.
A atual erupção sendo fortíssima e a fumaça correndo em nossa direção, a Vontade Onipotente de Deus fez surgir do Norte o vento frio e rico de elementos vitais; aumenta à proporção do cres- cimento do fogo subaquático, e além disto impele a fumaça e vapor aos desertos da Arábia.
Eis o motivo do vento frio do Norte, a mando de uma Von- tade sábia e poderosa. Isso prova ser possível à vontade humana, em união com a divina, mandar sobre todos os elementos.
Eu te demonstrando Sabedoria e Vontade Divinas, verás ter o lago nefasto vários afluentes, mas nenhum escoamento terrestre. Por quê? Primeiro, por necessitar — como muitos outros semelhan- tes — a água para extinção do fogo subaquático, e segundo pelo prejuízo de tal água venenosa, que tornaria estéril e inabitável a zona circunjacente. Deste modo, Amor, Sabedoria e Vontade Divinas ze- lam por aquilo que passa despercebido aos olhos do homem.
Quem observasse criaturas e demais organizações do plane- ta através dos olhos do espírito descobriria em toda parte a Vontade Divina, o Grande e Santo Pai e Organizador cósmico, de espíritos, de si mesmo, e não necessitaria fazer indagações quanto à possibili- dade de mando sobre os elementos, quando a vontade do homem está em união com Deus. Compreendeste?”
DÚVIDASDO MAGO
Responde o chefe dos magos: “Creio que sim; no entanto, haveria muita pergunta a fazer para tornar mais clara a noção da Sabedoria Suprema de Deus Verdadeiro. Existem em a Natureza, ao lado de coisas mui sabiamente organizadas, outras que, não obstante sua especial constituição, não se acham em conexão de utilidade.
Por tais observações são confundidos aqueles que mais se in- teressam pela Divindade, de sorte a se tornarem ateístas; descobrem poder e força como causa de tudo que existe, sem contudo poderem definir o motivo e a relação entre si.
Confesso ser fútil minha objeção; quem jamais chega a dú- vidas demonstra pouco interesse pela existência de Deus, Sua Natu- reza, da alma humana após a morte física e se continua consciente. Através de tua descrição do Mar Morto, seu efeito prejudicial e a ventania como resultado benéfico da Ordem e Sabedoria de Deus, concluí estar um fato relacionado a outro.
Surge, porém, a seguinte questão: Por que motivo Deus, Sábio e Bom, criou um lago tão prejudicial? Conhecemos muitos países isentos de tais lagos. Por que existe aqui? Para que fim seu
depósito de enxofre e piche, cuja exalação se torna perigosa à vida? Acaso têm tais lagos uma finalidade útil ou aparecem casualmente, levando a Divindade a tomar providências apropriadas?
Seria possível um Deus, sábio e bom, alcançar boa finalidade através de um meio nocivo? Vê, amigo, quanto mais se medita a respeito, tanto mais estranhas são as conclusões! Poder-se-ia afirmar uma Divindade Benévola não poder criar algo maléfico. Deve haver um poder oponente, em constante luta contra o outro, sem haver possibilidade de vitória entre ambos. O bom cria coisas boas, en- quanto o mau destrói aquelas obras.
Aceitando tal hipótese, o destino do homem é lastimável, porque depara com sua constante destruição. Como poderia eu me alegrar de minha existência, sujeita a breve extinção debaixo de do- res e grandes aflições?! No final, pode-se abolir tal suposição, di- zendo: Talvez nem exista um Deus, ou então há muitos, cada qual criando novos seres. Talvez haja apenas a força da Natureza incons- ciente, mas constantemente ativa, assim como o vento que se choca contra a rocha.
Uma semente cai, por exemplo, em bom solo, produzindo fartamente; ao passo que uma outra se atrofia em terreno estéril. Tampouco a semente quanto o solo são conscientes de seu poder e força; uma circunstância qualquer fez com que um terreno fosse fértil; outro, magro, dando colheita correspondente.
Pode o homem pesquisar e estudar, colhendo experiências em todo o orbe, e jamais descobrirá determinada ordem, mas ape- nas casualidades, uma dependente da outra. Com tais pesquisas a Divindade sai perdendo! Alegaste com Justiça descobrir o homem um Deus Sábio, Justo e Onipotente em a Natureza; deparando ele fenômenos como o Mar Morto — é preciso que Deus Mesmo o ajude a compreender a razão disto tudo. Peço-te, pois, esclareceres tal ponto, para podermos prosseguir!”
Diz Raphael: “Será difícil discutirmos a respeito, porquanto te achas mui atrasado e abarrotado da sapiência hindu. Seria preciso demonstrar-te a organização interna do mundo e dos seres, no que são precisos outros conhecimentos que não vosso estudo preparató- rio. Ainda assim, dar-te-ei alguns tópicos, de modo que poderás tirar certas conclusões. Abre o entendimento do teu coração!
Vê, és homem e teu corpo consiste de muitos órgãos, des- conhecidos para ti. Sem tal organização orgânica, a vida da alma seria inadmissível. Todavia, não se acham os órgãos mais importan- tes numa ordem perfeita. Vê as artérias, como cruzam teus braços desordenadamente! Entretanto, reina nelas a ordem mais utilitária. Observa a posição de teus cabelos! Estão espalhados em desalinho sobre a cabeça e o corpo todo; todavia, Deus os conhece a todos e cada qual está no seu lugar! Em outras criaturas seu crescimento é diverso, porém certo, porque o Senhor, em Sua Sabedoria, aprouve dar a cada indivíduo forma e têmpera diversas, a fim de que se co- nhecessem entre si, podendo amar-se.
Do mesmo modo, Deus dá até mesmo aos animais caseiros variedade de formas para facilitar o conhecimento do dono, enquan- to os animais selvagens se assemelham quase totalmente, por não haver necessidade do homem individualizá-los. Entre aves caseiras e selvagens encontrarás a mesma relação.
Suponhamos serem todas as zonas no orbe tão idênticas como um olho ao outro, cada construção igual à vizinha — e dese- java saber como irias descobrir tua pátria ao longe!
Analisa as árvores frutíferas de diversos proprietários e verás grande variedade, embora da mesma espécie. Deus assim permite a fim de que cada um conheça suas árvores como velhos amigos.
Darei mais um exemplo antes de passar ao ponto principal. Que seria se todas as donzelas tivessem o mesmo rosto, tamanho, ex- pressão e vestimenta?! Acaso poderias diferenciar tuas filhas da espo-
sa, de tua mãe ou das irmãs?! Se teu pai tivesse tua fisionomia, e teu filho igualmente, em suma, tudo fosse idêntico na Criação total?”
Exclama o mago: “Por favor, acaba com isto! O próprio pen- samento seria impossível com a completa ausência de diversidade! Começo a perceber para onde me queres levar. Continua, pois cada palavra tua vale mais que mil libras de ouro!”
OPORQUÊDADIVERSIDADENA CRIAÇÃO
Diz Raphael: “Falaste bem, pois numa monotonia de criatu- ras, terminaria todo o prazer pela vida e com ele, toda inspiração. O pensamento externo parte da observação do homem, dirigindo seus sentidos normais aos objetos variados e suas formas; pode com- pará-los, refletindo e julgando acerca de suas relações úteis e assim lhes dando nomes apropriados, pelos quais surgiram linguagem e posteriormente, as letras.
Caso todas as zonas, árvores, animais e criaturas fossem idên- ticos — qual seria a reação sobre os sentidos humanos? Nenhuma! Não necessitaria o homem gravar a menor alteração e muito menos elaborar algum pensamento; a própria linguagem e escrita seriam precárias se Deus tivesse criado mundos e seres dentro de tua rigoro- sa compreensão da ordem.
Ele sendo infinitamente mais Sábio do que possamos imagi- nar, criou tudo numa ordem mais perfeita que o intelecto humano poderia conceber. Deste modo é permanente Educador e Mestre dos homens pela infinita variabilidade, facultando-lhes os meios de reconhecerem, denominarem e refletirem sobre todas as variabili- dades da Criação, podendo e devendo empregá-las em benefício ou prejuízo próprio, fato impossível caso tivesse aplicado tua ordem.
Porventura poderia teu amor despertar para com uma criatu- ra que se assemelhasse às outras, qual mosca à sua afim?! Não te seria possível recordar a fisionomia de tua amada para dizer-lhe: És tu a minha eleita! — Tão logo se tivesse escondido entre as outras, não
a poderias reconhecer; fato semelhante sucederia com ela referente à tua pessoa.
Daí concluirás repousarem, na aparente desordem da Cria- ção Divina, provas muito mais verdadeiras e maiores da existência do máximo amor e sabedoria de Deus Onipotente, do que na ordem tão procurada por ti, porém sem êxito!
Chamei tua atenção para as artérias em teu corpo, de modo algum espalhadas em simetria, assim como também o teu próxi- mo as tem visivelmente diferentes. Por quê? Vê, não encontrarás duas criaturas completamente parecidas! Se Deus, o Senhor, traça as formas externas totalmente diversas, aplica também tal medida ao organismo interno e aos talentos de cada alma. Pois se todas ti- vessem as mesmas aptidões, tornar-se-iam dispensáveis, e o amor ao próximo seria apenas expressão labial.
Viste, portanto, ser a aparente desordem a testemunha mais fiel da Existência da Ordem mais elevada, sábia e amorosa de Deus, e podemos voltar ao tema do lago.”
OPLANETACOMO ORGANISMO
(Raphael): “Tanto esse quanto outros lagos semelhantes são tão sabiamente organizados como tudo que acabo de mencionar. Tens um corpo alimentado, conservado e vivificado pelo alimento e a constante respiração do ar puro. As partículas alimentícias são em tudo parcamente distribuídas. O ar que respiras é quase totalmente expirado; somente uma parte ínfima passa ao pulmão como elemen- to substancial para a vida; o resto é expirado. Alimento e bebida não constituem elemento de nutrição integral, e sim apenas um mínimo etéreo é conservado pelo corpo, enquanto o resto é expelido por via natural.
Sendo isto necessidade primordial em criaturas, flora e fau- na a fim de conservarem a vida, é igualmente imprescindível num corpo cósmico. Deve estar munido de órgãos pelos quais expele a impureza desnecessária. Voltemos ao lago maléfico e verificamos ser
ele um órgão necessário à expulsão da impureza, assim como o físico humano também os tem.
A Terra é, tanto quanto tu, um ser orgânico e psíquico, res- pira e age no Espaço Infinito. A experiência certamente te ensinou serem os excrementos animais e os vegetais mui úteis à estrumação de campos, pastos e vinhas. Digo-te, porém, haver relação entre a impureza animal e a telúrica.
O solo fértil da Terra, as montanhas e os mares são de certo modo a impureza do orbe, porquanto surgiram pelo fogo interno, em épocas inimagináveis. Tudo que aparece na superfície, como se- jam: enxofre, piche, sal, água, minerais e metais, serve à formação do solo fértil, fauna e criaturas.
Se, portanto, o orbe ainda hoje faz, pelos órgãos e poros, aquilo que fazia em épocas remotas pela sábia organização do Criador Eterno, não é possível classificar tal ocorrência de má, e sim benéfica.
O solo ou um lago não sendo profícuos à vida de plantas e animais, não se lhe pode acusar de maldoso. O homem é bastante inteligente para poder evitar locais impróprios à subsistência, pois existe grande quantidade de zonas habitáveis. O mar tem extensão muito maior que a terra. Quem poderia dizer: Deus agiu impru- dentemente e deveria ter aplicado o caminho inverso na formação do orbe! Criaturas, irracionais e vegetais estariam providos com a existência de lagos, rios, ribeiros, fontes, chuva e neve.
Concordaria eu caso não tivessem sua origem no grande Oceano. Se este não fosse como é, não existiria água doce. Creio ter dissipado tuas dúvidas por explicações naturais. Considerando-as, chegarás à compreensão nítida da Existência de Deus Verdadeiro, Seu Amor, Bondade, Sabedoria e Poder, e não haverá fenômeno no mundo capaz de abalar tua fé e conhecimentos.
Caso alguém pretenda insinuar-te outro ensinamento por meio de considerável verbosidade, transmite-lhe o que acabo de expor. Se aceitar teu conhecimento, podes considerá-lo amigo da verdade e tratá-lo como irmão; não aceitando a verdade clara, clas-
sifica-o de ignorante qual pagão e herege, evitando sua companhia e seus afins!
Há, todavia, diferença entre quem não queira aceitar a Ver- dade e quem não o consiga, devido a sua pobreza intelectual. O primeiro não merece grande paciência, porquanto não aceita a Luz por orgulho e presunção, exigindo que todos adotem suas normas. Com o outro deves ter bastante paciência; não lhe falta vontade, mas capacidade intelectiva. Tornando-se mais inteligente pela tua paciência e teu amor, aceitará a Verdade. Com isso demonstrei-te muita coisa. Dando-lhe a devida atenção, descobrirás o restante dentro de ti. Teu espírito, provindo de Deus, elucidar-te-á acerca da profundeza e sublimidade da Verdade Divina; pesquisa em tua alma se chegaste à compreensão total.”
FINALIDADE DAS ÁRVORES VENENOSAS DA ÍNDIA.ODESENVOLVIMENTODA TERRA.
AIMIGRAÇÃODOS MARES
Responde o mago: “Surge dentro de mim uma noção qual luz matinal antes da aurora; são conhecimentos que necessitam criar raízes, a fim de que se tornem posse de minha vida. Não duvido de tuas palavras. Tenho apenas mais uma indagação a fazer, caso tua paciência não se tenha esgotado.”
Diz Raphael: “Qual é? Fala!”
Prossegue o hindu: “Nasce na Índia, numa grande ilha e em alguns vales costeiros, um arbusto estranho, que é o pavor do país. É tão venenoso a matar tudo pela exalação, impossível de ser extinta, e muito mais perigoso que o Mar Morto. Pessoas desprevenidas, vez por outra, se aproximam de tais arbustos, sucumbindo de morte horrível. Para que fim existe esse vegetal?”
Diz Raphael: “Caro amigo, tem grande importância para o país onde o Senhor de Céus e Terra permite seu crescimento; foi dado aos hindus como fiel vigia, advertindo-os de habitarem em tais zonas às quais Ele destinava outra finalidade.
Vossos antepassados foram orientados a evitarem aqueles va- les estranhos, porque estavam longe de servirem para habitação; no solo regem forças de elementos crus, e os arbustos em questão se destinam à assimilação do veneno exalado das profundezas da Terra, a fim de não intoxicar outras regiões.
Se tais peculiaridades foram preditas durante um milênio, impossível alguém se alterar com a atitude de um teimoso que insista em dirigir-se para lá, sabendo do risco que corre. Compreendeste?”
Responde o mago: “Sim; mas como acontece que algumas regiões da Terra amadureçam mais cedo que outras?”
Responde o anjo: “És realmente ignorante! Acaso já viste um ser humano no qual todos os órgãos crescessem a um só tempo?! Quanto tempo leva para chegar a adulto e quanto mais até alcançar a maturação da alma?! Julgas Deus transgredir Sua Ordem Eterna? Nunca! Ele é a própria Ordem perfeita e sabe o que faz, o como e o porquê de tudo!
Observa essa cordilheira! Há muitos milênios tinha o dobro de altitude e os vales, mais do que a atual profundeza; não havia seres humanos, porque eram preenchidos por lagos com gigantescos animais aquáticos.
Eis que o grande Senhor e Mestre de Eternidade fez sur- girem tempestades horrendas com raios e trovões, e terremotos apavorantes.
Dizimaram as montanhas e seus destroços encheram os va- les profundos. Em vez dos lagos, rios caudalosos inundaram as pla- nícies, carregando com seu ímpeto rochas menores até que fossem reduzidas; pois toda areia de rios, ribeiros, cascatas e mares represen- ta a redução de gigantescas montanhas da era primitiva. As planícies deste modo preenchidas, o Senhor reduziu os rios, e suas margens se transformaram em solo fértil.
O mesmo acontece ainda hoje, conquanto em menor pro- porção. Vês ser Deus, o Senhor, a Eterna Ordem Mesma e não neces- sita apressar-Se, seja onde for; pois constitui Sua máxima Felicidade ver, como em todo o Infinito, um fato surgir do outro, dentro da má-
xima Ordem. Assim sendo, tua indagação: por que as zonas telúricas não eram habitáveis ao mesmo tempo — foi inteiramente supérflua!
Digo-te mais: o grande Oceano é impelido de catorze mil em catorze mil anos, do Sul para o Norte, e vice-versa. A contar de hoje, em oito a nove mil anos o grande Oceano estará acima des- ta montanha. Em compensação, secarão grandes extensões no Sul, dando nutrimento a homens e animais. Em tal ocasião, tornar-se-á habitável grande quantidade de regiões, agora ainda inapropriadas para tanto no Norte do planeta, isto é, quando a parte setentrional estiver novamente livre do mar.
Penso ter dito o suficiente ao naturalista que és, isto por- que sei que os sábios do Oriente conhecem forma e constituição da Terra, muito embora ocultem tais conhecimentos. Terás mais algu- mas dúvidas?”
Responde o hindu: “Não, jovem sábio peculiar! Falas da Terra como se tivesses assistido à sua formação primitiva, qual teste- munha ocular! O mais interessante é que em nada te podemos con- testar. Segundo as nossas vastas experiências, a situação é tal qual por ti descrita, e a Existência de um Deus Verdadeiro e Eterno é mais evidente; portanto, já sabemos como agir a fim de encontrá-Lo.
Que prazer nos proporcionarias aceitando recompensa pela tua grande bondade; não sendo isso possível, nada nos resta senão agradecer-te de coração, pedindo novamente te lembrares de nós quando junto do Senhor. Agora desejo apenas trocar algumas pa- lavras com aquele homem que tanto me atraiu durante a ceia; em seguida, partiremos confortados para transmitirmos aos outros a dá- diva aqui encontrada. Posso dirigir-me a ele?”
AQUESTÃODA VERDADE
Digo Eu: “Como não? Ainda que a noite seja escura, será possível conhecermo-nos mais de perto. Qual tua opinião acerca da- quilo que o Meu servo, aparentemente jovem, disse e demonstrou? Fala, sem exceder-te!”
Diz o mago: “És por certo um homem mui sábio e desper- taste a minha atenção no refeitório; meu coração sentiu-se tão atra- ído e sensibilizado, a ponto de dificilmente me conter, pois desejava abraçar-te com toda força. Nunca se passou coisa idêntica comigo e com meus companheiros, enquanto podemos admirar calmamente o teu servo. Ajuda-nos a compreender o motivo disto!”
Digo Eu: “A Luz desperta a luz, o amor desperta o amor, e a vida desperta a vida; pois um morto não pode despertar um morto, e um cego não será guia de um cego. Eis o motivo de vossa sensação referente à Minha Pessoa. O resto sabereis mais tarde.” Tais palavras causam profunda impressão nos três hindus. Silenciam e meditam, enquanto nós outros continuamos a observar os fenômenos no Sul.
Após algum tempo, o chefe mago diz aos amigos: “Esse ho- mem deve ser grande sábio; pois em poucas palavras disse tanto, que se poderia pensar e falar durante anos a respeito. Se quisesse expressar mais alguns pensamentos! Parece lacônico como todos os sábios, pois não raro acham ridículas e mesquinhas as indagações de ignorantes, não obstante lhes deem impressão de inteligentes. Mas ele mesmo disse que o amor desperta o amor — e nós o amamos tanto, a ponto de nos arriscarmos a outra pergunta, antes de voltar- mos ao nosso albergue.”
Como os companheiros concordem, o chefe se aproxima de Mim e diz: “Oh, homem simpático e sábio, não é possível resistir a um desejo íntimo de te importunar com mais uma questão. Disseste que o amor desperta o amor, e daí concluo tu nos amares, desper- tando sentimento idêntico em nós. Assim sendo, não te aborrecerás eu perguntar-te algo?”
Respondo: “De modo algum; pois temos tempo de sobra para tanto. Deves, porém, perguntar apenas por coisas dignas de um homem justo. Com muita coisa inútil se preocupa a criatura; entretanto, necessita apenas de uma só: a Verdade. Ainda que pos- suísse tudo, faltando-lhe a Verdade, o homem seria o ser mais pobre do mundo. Por isso deve ele, antes de mais nada, ir à procura da Verdade, ou seja, o Reino de Deus na Terra! Encontrando-a, terá
encontrado tudo. Por isso, indaga somente pela Verdade, tão neces- sária a todos.”
Diz o mago: “Falaste sabiamente. A verdade em todos os seres e esferas é realmente o maior bem do homem inteligente e pensante. Não há falta maior e mais sentida do que a verdade. Mas onde encontrá-la? Há trinta anos estamos à sua procura e somente aqui descobrimos seu rastro, sem acharmos sua plena luminosidade. Por isso te pergunto, porquanto pareces tê-la encontrado em toda pujança: o que é a Verdade e onde está?
O homem de inteligência reduzida facilmente se satisfaz, pois aceita a mentira como sendo verdade. Crê, e sua fé cega lhe dá a feli- cidade. O pesquisador, porém, não consegue crer sem conhecimento: anseia pela luz e deseja apalpar a Verdade, caso a vida lhe deva ser útil. Sem provas cabais da Verdade é ele o ser mais infeliz. Eis nossa situa- ção. Por isso repito: o que é a Verdade e onde encontrá-la?”
NATUREZAELOCALDA VERDADE
Digo Eu: “Encontrai-vos no limiar do templo onde reside a Verdade. Ela existindo, tem que se revelar na vida e não na morte; pois à morte, a Verdade não é útil. O homem justo e íntegro é um templo real da Verdade que reside no coração.
Quem procura a Verdade terá que fazê-lo dentro e não fora de si; pois a Verdade é a Vida, a Vida é o Amor. Quem amar sem fal- sidade a Deus e ao próximo terá a Vida, e esta Vida é a Verdade que habita no homem. Por isto te disse estardes no limiar do templo da Verdade; deste modo é o homem em si a Verdade, o caminho para ela e a própria vida. Compreendeste?”
Diz ele: “Sim, no que diz respeito à tua própria pessoa, en- quanto tal não se dá conosco. Sabemos por ti e pelo jovem o que fa- zer a fim de encontrarmos Deus, e por Ele, a Verdade. Já possuímos a semente e depositá-la-emos no solo do coração. A maneira pela qual germinará e dará frutos será constatada no futuro; não se pode colher antes de semear.
Em nós não há vida e justo amor — portanto não estamos na Verdade. Consola-nos a ideia de terdes o verdadeiro Deus, ou seja, a plena Verdade, fato demonstrado pelas ações e palavras do jovem. Com o justo zelo chegaremos a tal ponto. Demonstra-nos o caminho mais curto à meta final, que seremos eternamente gratos!”
Digo Eu: “Lestes na Babilônia a Escritura dos judeus e ad- mirastes a sabedoria de Moysés. Conheceis o Levítico e afirmais: Eis a Lei justa! Quem a observar será feliz! — Agi deste modo, que alcançareis a bem-aventurança!”
Diz o hindu: “Amigo, acaso nos viste na Babilônia, que dizem ter sido a maior metrópole do mundo? Não nos lembramos de tua pessoa.”
Digo Eu: “Se Meu servo sabia onde ocultavas o grande dia- mante, quanto mais sei Eu, o seu Senhor, o que fizestes há dez anos na Babilônia, a esta hora, sem ter necessidade de estar presente. Di- go-vos: o homem cujo espírito penetra a alma não necessita estar presente em toda parte a fim de tomar conhecimento dos fatos, pois unindo-se ao Espírito de Deus, está ele presente, vê, ouve e sabe de tudo. Tal foi dito pelo Meu servo; repito-o apenas para estimular vossa ação. Já sabeis o que fazer, e nada mais tenho a acrescentar. Caso tiverdes outro pedido, podeis falar.”
Diz o chefe: “Constatamos teu grande saber, que nunca nos foi facultado, não obstante termos encontrado na Índia setentrio- nal um pirmanji, que todavia não nos informou da possibilidade de evolução. Disse-nos apenas: Não estais preparados e falta-vos o conhecimento da vida interior do homem. Viajai em direção ao Orion, acompanhado de outras estrelas, em ordem imutável, onde conhecereis a vós mesmos! — Eis tudo que falou.
Encaminhamo-nos a Leste, enfrentando muitas lutas e pe- rigos, e após prolongada procura descobrimo-vos aqui, recebendo orientação do caminho da sabedoria interna. Se prosseguirmos em nossa viagem a Leste, certamente conquistaremos a sabedoria plena.
Observamos, em direção daquela constelação, criaturas mais sábias e poderosas, e seus livros continham sabedoria profunda, se bem que oculta, conforme constatamos na Babilônia.
Eram escritos em hebraico antigo, não tão fácil de compre- ender como o vosso idioma; tinha grande semelhança com o nos- so, primitivo. Lá descobrimos uma profecia na qual o Espírito de Deus prometia um Messias, Mediador entre Jehovah e os judeus. Insistimos para que o pirmanji nos orientasse a respeito. Nada de- finitivo pôde dizer; época e hora eram apontadas sem precisão, e além disto constava que para Deus mil anos seriam idênticos a um dia. Assim, é possível os judeus serem obrigados à longa espera. Ele próprio acreditava que o profeta se referia a coisa mui diversa do que a real chegada do Messias. Como abordássemos esse assunto, certos de tratarmos com pessoa incrivelmente sábia, desejávamos ouvir de ti o que pensar a respeito.”
DELIBERAÇÃODOS MAGOS
Digo Eu: “Há trinta anos já estiveram aqui três sábios do Oriente por ocasião do Nascimento do Messias, trazendo-Lhe ouro, incenso e mirra. Acaso nada soubestes a respeito?”
Responde o mago: “Sim, tens razão. Éramos ainda jovens aprendizes, que pouco se interessavam por tais fatos, e além disto eles quase nada deixaram transpirar a não ser entre seus afins; cer- tamente não causaram impressão, por isso nada soubemos. Dizia-se apenas ter nascido um novo rei entre o povo antigamente tão po- deroso, cujo braço dominaria e dizimaria os inimigos e opressores.
Sabemos terem aqueles sábios encetado outras viagens; nin- guém soube do resultado, conquanto fossem magos mui hábeis. Eis a pura verdade, na qual descobrirás explicação para a nossa pergunta. Se quiseres dar informações diretas, ficaríamos mui agradecidos.”
Digo Eu: “Ouvi-Me, pois! Precisamente aquele suposto rei foi o Messias prometido que veio ao mundo — não somente para os judeus, mas para todos os de boa índole, a fim de trazer-lhes uma Luz verdadeira da Vida de Deus.
Através Dele, todos os povos seriam beneficiados e diriam: Salve Aquele, com a veste do Amor, da Verdade e Justiça Eterna; pois apiedou-Se de nossos males, salvando-nos do pesado jugo do julgamento e da morte!
Quem Lhe prestar ouvidos e agir de acordo com Sua Dou- trina colherá a Vida Eterna dentro de si! Aqui estamos, e diante de nós se acha revelada a grande Promessa! Surgiu para os povos o Sol do Céu e da Vida Eterna; milhões já se aquecem com seus raios vi- vificantes — e vós viestes do Oriente, porque recebestes igualmente um raio deste Sol.
Vosso coração estando ainda cego, procurais o Sol da Vida, não percebendo onde está; vosso fraco reflexo ao menos vos trouxe aqui, portanto abri a visão do coração e perguntai às estrelas, a fim de que demonstrem a situação daquele Sol!”
Vira-se o chefe para os companheiros: “Este homem fala de modo estranho e deve saber como andam as coisas. Certamente es- tará apto a nos fornecer orientação referente à proximidade do men- cionado Sol da Vida.
Devemos indagar às estrelas! Que poderiam elas nos dizer? Será ele muito mais indicado para tanto, muito embora às vezes atribuíssemos aos astros o conhecimento de fatos excepcionais, mas que já conhecíamos muito antes. O povo o acreditava, somente nós não, e muito menos esses personagens que se encontram em plena luz. Portanto, nada feito com a astrologia; convém indagarmos aos que têm credenciais, usando a devida inteligência!”
Diz um colega: “De que nos serve a inteligência, se esses sábios já conhecem os nossos pensamentos! Acho mais razoável nos satisfazermos com a noção recebida, deixando o resto à mercê de sua boa vontade. Além do mais, já vi não estarmos preparados para a verdade de Deus, Único e Verdadeiro.
Podemos pedir-lhes demonstração do caminho mais curto à conquista da Luz da Verdade e da Vida, pois é sabido que o homem consegue certas aptidões pelo estudo e pela pesquisa. Se além dis-
to dispõe de um guia sábio e experimentado, o resultado será mais promissor.”
Diz o primeiro: “Em tua simplicidade és muito mais inte- ligente que eu, com toda a minha sapiência. Resta apenas saber se podemos permanecer aqui.”
Conjectura o outro: “Segundo o parecer do sábio judeu, convém ficarmos, porquanto nossos amigos se acham informados de nosso paradeiro; és nosso chefe e tens direito para determinares nossa atitude.” Satisfeitos, os três se dispõem ao repouso.
ASERUPÇÕESVULCÂNICASNAREGIÃODOMAR MORTO
Entrementes, se repetiam e intensificavam os relâmpagos na zona do Mar Morto, dando assunto para várias observações. O pró- prio Lázaro, os greco-judeus e a ex-adúltera afirmam jamais terem visto fenômeno tão violento. Somente os romanos quedam impas- síveis e Agrícola Me diz: “Senhor, não deixa de ser um espetáculo interessante; nossos vulcões, são bem diferentes!”
Concordo: “Por certo, entretanto não tão importantes quan- to esse lago; nele está enterrada uma triste história, semelhante à do Mar Cáspio, por vós conhecido. Por tal razão esses fenômenos são muito mais notáveis que vossas montanhas vulcânicas; conheço-as e sei terem sido soterradas algumas cidades por uma violenta erupção do Vesúvio, há alguns decênios.
Na atual explosão da Natureza compartilham milhares de al- mas humanas, arrastadas numa luta inútil contra Mim; enquanto nos vulcões, somente reagem espíritos da Natureza contra as Leis da Minha Ordem. Eis a grande diferença! A fim de que possas obser- vá-lo melhor, abrirei a tua visão interna, dando-te oportunidade de veres coisas estranhas.”
No mesmo instante, Agrícola exclama: “Senhor, liberta-me desta visão horrenda! Que monstros pavorosos! Todo o lago e o ar até acima das nuvens estão cheios de caricaturas mais horripilantes! Guerra aniquiladora de tamanha crueldade nunca se viu na Terra!
Qual a finalidade? Ao mesmo tempo vejo grande número de seres de expressão bela, mas severa, vestidos de branco, dirigindo-se rapida- mente àquele campo de batalha, enquanto os monstros fogem com horror. Quem são eles?”
Respondo: “As figuras horripilantes são antigos sodomitas. Por esta luta que procuram travar contra Mim, são eles amainados paulatinamente pelos espíritos da paz e da ordem, que os levam a maior equilíbrio. O vento que se apresenta muito frio e vindo do Norte nada mais é do que a falange de espíritos alvos, dos quais os maus debandam. Se te saciaste com a visão, podes voltar ao esta- do normal.”
Voltando a si, Agrícola Me diz: “Senhor, desde que sossobra- ram Sodoma, Gomorra e as dez cidades adjacentes, já se passaram mais de mil e quinhentos anos — e aquelas almas não teriam chega- do a uma noção mais lúcida?”
Digo Eu: “Tiveste a prova evidente de quanto custa aperfei- çoar-se uma alma no Além, ao menos no sentido de levar-lhe peque- na noção e conhecimento de sua maldade, que lhe dificulta alcançar um estado mais liberto e feliz.
Desde o momento que aceite tal possibilidade, torna-se ini- miga de sua maldade antiga, desprezando-a e procurando melhorar de própria iniciativa. Mesmo recaindo vez por outra em seu peca- do anterior, ela não insiste no mesmo, e sim se arrepende. Desse modo diminuem e esfriam suas paixões maldosas, fazendo-se a luz em tal alma.
Como foram os espíritos da paz a se empenharem na reden- ção de uma alma maldosa, é ela atraída à esfera deles, onde se exer- cita na paciência, ordem e calma. Uma vez firme em tais tendên- cias, poderá passar a uma situação melhor, que todavia não se pode apresentar qual prêmio de regeneração, e sim como consequência natural de sua ordem interna. Pois se percebesse ser a melhoria re- compensa Minha pelo esforço — o que é na realidade — em breve despertaria o antigo egoísmo. Esforçar-se-ia apenas com o fito de maiores vantagens, e não para sua própria evolução.
Por esses motivos facilmente aceitos, se vê ser mui lenta, no Além, a verdadeira regeneração de uma alma pervertida. Se deve ser mantida sua existência, Minha Onipotência só pode influir no sentido de lhe proporcionar estados tais, que se apresentem como consequência justa de suas ações maldosas. Só deste modo é possível melhorá-la realmente. Não importa o tempo que leva para tanto, pois é indiferente para Mim frente à Eternidade, na qual se nivelam todas as existências, passadas e futuras, assim como também Me é indiferente se uma criatura viveu há vários milênios ou viverá daqui a outros tantos. Na Eternidade, o primeiro homem não terá vanta- gem diante daquele que nasceu por último.
Todavia, é indizivelmente melhor para a própria alma al- cançar o quanto antes o seu aperfeiçoamento, porque sofrerá muito menos, e além disto leva muito maior vantagem uma alma ativa do que uma ociosa e claudicante, assim como na Terra um viandante que inicia uma viagem muitos dias antes que um outro, indolente, preguiçoso e indeciso. Enquanto o primeiro já goza das grandes van- tagens do seu zelo e dedicação, o preguiçoso nem ao menos deu o primeiro passo de sua longa caminhada, virando-se constantemente, refletindo se deve dar o segundo ou se talvez conviesse voltar para casa. Se tal alma de tão fraca iniciativa passa longo período pela mi- séria, a outra se apossa de grandes bens e desfruta de vantagens dig- nas de inveja; pois quem se acha eternamente na vanguarda jamais é alcançado por um claudicante.
Para Mim, tal não constitui diferença, pois sou e serei Aquele que fui eternamente; mas, entre os graus de felicidade dos espíritos, as variedades serão infinitamente grandes. Compreendeste isto, amigo?”
DÚVIDASDEAGRÍCOLAQUANTOÀEVOLUÇÃO HUMANA
De olhos arregalados, Agrícola diz: “Senhor, como Ser mais independente e livre de todo o Infinito, podes dirigir-nos tais pala- vras! É bem verdade que, se eu alcançar, em épocas distantes, certo
grau de felicidade com a perspectiva de um futuro eternamente feliz
— a existência terrena, cheia de amarguras, vale tanto quanto nada. Ainda assim é um dia penoso e martirizante, algo real ao homem finito, e diante da recordação surge a dúvida da compensação dentro da Eternidade.
Torna-se o homem miserável cidadão deste mundo através de Tua Vontade Onipotente. Desfruta da convivência de criaturas animais, do paganismo egoísta e dominador, construção de mentiras e mistificações inúmeras; é obrigado a aceitá-las e, se assim não fizes- se, seria aniquilado qual verme abjeto. Conheço milhares de casos dessa ordem.
Com essa educação só pode surgir uma fera humana, e por isto sou por Ti condenado a épocas indizíveis sem meio de socorro. É lícito, pois, apresentar-se a indagação diante de Ti, Deus Verdadei- ro, por que motivo fui obrigado a me tornar habitante deste planeta. Anteriormente era um simples nada, sem vontade de existir.
Uma vez criado pela força de Tua Vontade Onipotente, per- gunto por que não vim ao mundo em circunstâncias pelas quais pudesse me tornar homem justo, dentro de Tua Ordem. Eis uma questão mui importante! É fato irredutível termos que morrer fisi- camente; o mais triste, porém, é que no Além teremos que suportar uma morte psíquica quase infinda, como consequência de uma vida errada. Como juiz romano, não poderia condenar uma criança cul- pável de qualquer delito ante os pais, isto por não ser ela responsável pela falha educação. No final, nem aos genitores cabe culpa, por- quanto também sua educação não fora mais privilegiada.
Tu, meu Senhor e meu Deus, possuis desde eternidades o melhor de tudo e podias proporcioná-lo às pobres criaturas, Teus filhos, em benefício de coração e alma. Nada disto fazes; temos que nos tornar, primeiro, feras selvagens para sermos atingidos pelo Teu Julgamento e somente poucos poderão dizer: O Senhor de Céu e Terra compadeceu-Se de nós!
Perdoa, Senhor, a minha sinceridade, à qual fui levado pela Tua Ação estranha para com os três magos. Porventura são cul-
pados de sua índole? Há muito tempo estão à Tua procura sem encontrar-Te; agora, em Tua Presença, não Te revelas! Dize-me se tal é preciso, partindo de Tua Sabedoria, pois Teu Amor, Meiguice e Bondade desejam que todos sejam felizes!”
AEVOLUÇÃODA HUMANIDADE
Digo Eu: “Se fosse tua memória mais forte, recordar-te-ias ter sido debatido justamente esse ponto em várias ocasiões, de modo compreensível. Entretanto, tua memória tornou-se mais fraca, es- quecendo o que já repeti com muita paciência. Não importa; tenho tempo para estender-Me. Ouve-Me, pois!
Quem jamais criou um Sol, uma Lua, um planeta habitável, ignora como tudo isto é mantido, conservado e levado à final evo- lução. Eu sei de tudo e fixei a Ordem Eterna, sem a qual ninguém poderia alcançar e organizar qualquer empreendimento.
O homem — Minha Semelhança perfeita — tem que dispor de uma vontade completamente livre, pela qual terá que se transfor- mar, positivar e libertar de Minha Onipotência a fim de desfrutar de Minha Presença, vivendo e agindo como criatura forte, livre, eman- cipada e feliz.
Vê, todas as criaturas estão sujeitas às Minhas Leis imperati- vas, inclusive o físico humano — com exceção de alma e espírito, isto é, no que diz respeito à vontade e ao conhecimento livre. Forma e organização vital da alma, em todas as suas partes, são igualmente obra sujeita à Lei surgida por Mim, porém de tal forma a se poder enobrecer e fortificar, ou então tornar-se ignóbil e enfraquecida, se- gundo o livre arbítrio.
A livre vontade pouco adiantaria ao homem sem a capaci- dade do conhecimento livre e da razão derivante, que demonstra à vontade o bem e a verdade, o erro e o mal.
Somente após ter colhido conhecimentos e despertado e aguçado o intelecto apresenta-se a Revelação da Vontade Divina, demonstrando os justos caminhos para a Vida Eterna e para Deus.
Pode o homem aceitá-la ou não, porquanto tem o livre arbítrio pe- rante Deus, pois sem ele seria animal dotado apenas de instinto ir- resistível.
No começo da Criação houve apenas um casal, Adam e Eva. Foi por Deus dotado com todas as capacidades: profundos conheci- mentos, intelecto mui lúcido e vontade livre e poderosa, diante da qual todas as criaturas se tinham que curvar.
Além de tais dons, recebeu o casal, da Bondade Divina, uma revelação claríssima e compreensível, designando-lhe livre e aberta- mente o que deveria fazer para atingir a finalidade determinada pelo caminho mais curto e fácil. Ao mesmo tempo, Deus o elucidou ser possível agir contra a Vontade Dele, caso pretendesse seguir o cami- nho da atração carnal e do mundo material, no que se projetaria à condenação e à morte.
Por certo tempo, tudo correu bem; em breve, venceu a volúpia — por Moysés representada por uma serpente — sobre o conhecimento do Bem e da Verdade provindos da Revelação Divina; o primeiro casal infringiu o Mandamento, para averi- guar o resultado! E hoje em dia quase todas as criaturas agem da mesma forma.
Deus nunca deixou faltar revelações, pequenas e maiores, sem contudo obrigar alguém ao seu cumprimento. Feliz, porém, quem as considerasse, organizando sua vida de acordo.
O primeiro casal recebeu de Deus a educação mais apurada e elevada, podendo transmiti-la sem dolo a todos os descendentes; basta analisares as criaturas de dois mil anos mais tarde, em época de Noé, e vê-las-ás transformadas em diabos perversos!
Pergunto: faltou a Adam e Eva uma educação aprimorada? Não! Acaso não a passaram aos filhos? Sim, no mais puro sentido! Sentiam as criaturas dentro de si a tentação de agir contra os Man- damentos de Deus, porque tal proceder agradava ao físico, e deste modo submergiram na maior perversão e ateísmo. E quando Deus enviava Seus mensageiros para adverti-las paternalmente, eram eles banidos, enxotados e alguns cruelmente sacrificados.
No final, se entregaram à destruição do planeta, enchendo sua medida de maldades: abriram as comportas das águas subterrâ- neas, afogando-se os próprios vilipendiadores.
Isto não foi julgamento surgido da Vontade de Deus, mas permitido como consequência fatal da organização telúrica; pois se te atiras de um penhasco tendo morte instantânea, serás atingido pelo julgamento não provindo de Deus, mas como efeito da consti- tuição da Terra, pela qual o homem inteligente saberá ser todo peso atraído pela queda.
Não há, pois, criatura na Terra tão abandonada que não conseguisse melhorar; mas não o querendo desde criança, torna-
-se culpada de sua infelicidade. E isto se relacionará igualmente a um povo.
Não existe um, em todo o orbe, incapaz de progredir espi- ritualmente. Mas onde está a vontade? Para o mal terá vontade de sobra, enquanto carece de boa vontade para o puro Bem e a Verda- de, preferindo o culto carnal; deste modo, a alma individual, bem como a de um povo inteiro, ingressam no julgamento e na morte da matéria, incapacitados de ouvir, compreender e assimilar o que seja o espírito, sua luz e vida. E caso se pretenda sacudir tais almas carnais do seu sono, tornam-se raivosas e cheias de ódio, atacando o benfeitor como o lobo se atira sobre o rebanho, estraçalhando-o sem dó nem piedade.
Acaso é Deus culpado se tais criaturas caem na maior ce- gueira psíquica, onde permanecem por milênios? Se ele permite um julgamento prudente, age como Pai sábio e bom, pois apenas uma grande dor física consegue afastar a alma da matéria, levando-a ao espírito. Compreendeste?”
Responde Agrícola: “Sim, Senhor, agora estou perfeitamen- te a par e Te peço perdão pela ousadia de interpelar-Te, pois fui mui ignorante.”
Digo Eu: “Amo criaturas de teu caráter, tomando a sério a verdade! — Voltemos a atenção ao fogo!” Novamente se faz silêncio; os três magos se afastam para conjecturarem a Meu respeito.
O chefe mago diz aos colegas: “Tenho impressão de achar-se o Espírito de Deus nesse homem, pois jamais alguém falou como ele!” Os outros concordam e assim prosseguem nas conjecturas, enquanto descobrimos vez por outra novas erupções do incêndio. Quando começo a Me externar, eles se aproximam para ouvirem as explicações da constituição telúrica e seus variados fenômenos externos e internos.
No final, diz o chefe aos colegas: “Isto só pode saber com tamanha clareza quem criou a própria Terra!” Muito embora ansioso por maiores esclarecimentos, ele não se atreve em dirigir-se a Mim, razão por que o chamo, dando-lhe permissão para tanto.
Respeitoso, ele diz: “Senhor, que mais poderia perguntar-Te?! Todas as minhas anteriores indagações se prendiam à procura de Deus Verdadeiro, para reconhecê-Lo e amá-Lo de coração. Sinto tê-Lo encontrado em Ti, de sorte só me restar o pedido de ex- pressares a Tua Vontade. Segui-la estritamente será nossa mais sa- grada missão. Que devemos fazer para merecermos Tua Miseri- córdia e Graça, e em seguida compartilharmos da vida eterna de nossa alma?”
Digo Eu: “Sois, realmente, convictos de terdes encontrado em Mim Aquele há tanto tempo procurado?”
Responde ele: “Meu coração o sentiu quando Te externaste abertamente acerca de Tua Pessoa; portanto, não alimento dúvidas de seres Aquele que adoramos em nosso coração.
Não foi em vão que Teu jovem servo nos alertou da presença da Verdade puríssima. Tu Mesmo és esta Verdade e o Próprio Me- diador entre o Teu Espírito e a criatura. Quem Te possuir terá Luz, Vida, Sabedoria e Força!
Só consegue apoderar-se de Ti quem reconheceu e cumpriu a Tua Vontade. Impossível um ser criado e finito estar de posse de Tua Natureza, porquanto és Deus de eternidades em eternidades. Tua Vontade, porém, o homem pode adquirir e tornar-se ativo dentro
dela. Assim fazendo, terá ele conquistado a Ti Mesmo, pelo conhe- cimento e pelo amor.
Por isto Te peço insistentemente revelares a Tua Santa Vonta- de, para podermos exclamar: Senhor e Pai Eterno, Tua Santa Vonta- de Se faça em nós, por nós e para nós, a fim de que tenhas satisfação com Tuas criaturas e filhos de Teu Amor!”
Digo Eu: “Caro amigo, falaste bem e com justiça; todavia, Me consideras Deus, unicamente Verdadeiro, como homem seme- lhante a ti! Não percebes ter Eu nascido de carne e sangue e ser Minha Alma idêntica à tua? Acaso teve Deus um início e poderia nascer qual homem?”
Responde ele: “Deus Eterno, cuja plenitude espiritual resi- de evidentemente em Ti, jamais teve início, tampouco poderia nas- cer fisicamente; entretanto, Ele Te deu um invólucro como justo Mediador, completando-Te com a Força do Seu Espírito. Quem, pois, Te vir e reconhecer verá Aquele que está em Ti; e fazendo Tua Vontade, em breve reconhece-Lo-á dentro de si.
Além do mais, falaste ao romano como somente um Deus o poderia, e isto confirma a verdade de minha descoberta. Terás Teus motivos mui sábios pelos quais não Te revelaste anteriormente. Nem o merecíamos e tampouco exigimos provas de Tua Divindade.
Basta o que foi feito e dito pelo Teu servo; a maior prova, porém, foram Tuas Próprias Palavras! Não obstante sem mérito, pe- dimos orientação quanto à nossa atitude para alcançarmos a vida eterna e a Tua Graça!”
Digo Eu: “Muito bem, se assim credes, fazei o que disse o Meu servo, que vivereis e sereis felizes! Amai a Deus acima de tudo e ao próximo como a vós mesmos, passando aos filhos este ensina- mento. Não vos considereis mais importantes em virtude de vossas riquezas e fazei ao semelhante o que dentro da razão podereis exigir vos faça — que vivereis e a Graça Divina estará convosco para sempre!
Conhecedores da Lei de Moysés, respeitai-a em todos os itens, pois nela é apontada a melhor e mais pura ordem vital. Quem a seguir amará a Deus acima de tudo e ao próximo como a si mes-
mo. Nesse Mandamento se baseia toda a sabedoria da Vida, da qual outros sábios predisseram alguns pontos.
A palavra vos sendo a máxima prova de Minha Missão Divi- na, permanecei nela e tornai-vos seguidores para a própria vida! Falo da vida eterna de vossa alma, e não da temporal. Compreendeste?”
ACEITAÇÃODOVERBONA ÍNDIA
Diz o mago: “Cremo-lo por Tu o teres afirmado e seguire- mos, como talvez nenhum outro povo, estritamente as Tuas Pala- vras. Surge, entretanto, outra questão: devemos nos recolher à Ín- dia ou convém evitarmos esse país viciado, ou então seria preferível demonstrarmos aos cegos a Luz finalmente encontrada? Desejamos cumprir apenas a Tua Vontade!”
Digo Eu: “Em parte alguma se desconsidera o valor de um profeta tanto quanto na própria pátria. Entre os afins, gozais a fama de algo descontrolados, e por terdes apelado à sua consciência, envia- ram-vos ao estrangeiro. Voltando com o justo conhecimento, pou- cos aplausos deveis aguardar por parte deles, e entre o povo exces- sivamente ignorante a aceitação seria ainda pior. Para vossa própria salvação, convém continuardes na resolução tomada. Enviai vossos servos a fim de resolverem vossos negócios, em seguida se juntem ao vosso grupo. Do resto, não vos preocupeis; vosso país é dois mil anos jovem demais para Minha Doutrina, isto é, ele é excessivamente cego e tolo. A Leste ireis encontrar criaturas mais acessíveis à Minha Luz, podendo-lhes transmiti-la.
No futuro o Oriente, agraciado pela Luz claríssima, perambu- lará por longo tempo em noite trevosa, enquanto a Luz da Vida será espargida no Ocidente. Até mesmo este local, onde agora surgiu esta Luz, será entregue à mais densa noite e treva; pois também esse povo, com poucas exceções, não reconhece a época de sua Graça mais eleva- da e salutar! Ai dele quando a Luz lhe for tirada e entregue aos pagãos!
Sois estrangeiros vindos do Oriente; achastes-Me e Me reco- nhecestes. Por ocasião da Minha Encarnação, aqui estiveram alguns
conterrâneos vossos, sendo os primeiros a Me saudarem, pois Me reconheceram na criança recém-nascida. Mas entre esse povo esco- lhido desde antanho, mui poucos Me reconhecem, enquanto mui- tos Me perseguem sempre que possível. Por tal motivo, a Doutrina lhes será tirada e entregue aos gentios. Antes que esta Luz torne aqui, chegará ao vosso país situado no grande Mar. Compreendeste?”
Diz o mago: “Sim, Senhor, entretanto estranho não terem os habitantes daqui Te reconhecido, porque certamente deste gran- des provas! Os meus conterrâneos não seriam tão cegos, pois para muitos, a Tua Palavra seria suficiente. E caso nosso sumo sacerdote tivesse assistido apenas a um milagre do Teu servo, teria aceitado a Tua Doutrina, muito embora não a tivesse passado ao povo. Sua fé cega o incapacita à aceitação. A cegueira do Teu povo é inexplicável, porquanto tem o Sol Máximo no zênite, entretanto procura a noite somente encontrada nas cavernas.”
Digo Eu: “Infelizmente, é essa a situação! Por isto inspirarei outros povos, desde já e ainda mais no futuro; todavia, será realidade que entre muitos chamados, se encontrem poucos escolhidos.”
Diz o hindu: “Senhor, como entendê-lo? Tal expressão par- tindo de Tua Divina Boca não é animadora; pois entre os poucos escolhidos, entendo aqueles constantemente bafejados pela Luz da Vida, e entre os muitos chamados, todos também destinados para tanto, mas que por circunstâncias várias são impedidos na aceitação. Nosso pequeno grupo se pode considerar escolhido; mas a grande massa, infeliz, nem faz parte dos chamados. Qual será o seu destino após a morte?”
Digo Eu: “Não compreendeste o sentido de Meu Pronuncia- mento, por isto darei explicação.”
OSCHAMADOSEOS ESCOLHIDOS
(O Senhor): “Deves compreender o problema da seguinte maneira: toda criatura deste orbe se destina e é chamada à Luz e à Vida; mas nem todas se prestam para doutrinadoras. Acaso seria de
utilidade para os homens — cuja finalidade principal consiste em servirem-se mutuamente — se todos fossem ricos e capazes de tudo? Em tal caso, um prescindiria do outro, e o amor ao próximo seria simples expressão, conforme já demonstrei por várias vezes aos Meus discípulos. Nem seria preciso usarem do idioma, se porventura nin- guém sentisse qualquer necessidade!
Digo-te: numa completa igualdade de talentos, capacidades, formas, habitações e bens, estariam os homens, não obstante seu in- telecto idêntico, no mesmo nível que os irracionais — e ainda mais abaixo destes!
A fim de evitar essa situação, tudo se acha distribuído de modo mais variado, facilitando a necessidade recíproca, sendo um mestre ou auxiliar do próximo. Deste modo, deve haver igualmente, na esfe- ra do conhecimento da Luz interna da Vida, escolhidos especiais que demonstrem a verdadeira Luz aos muitos chamados, que por sua vez têm que ouvir, crer e agir dentro dos ensinamentos recebidos.
Os chamados, aceitando o que aprendem, são tanto quanto ou até mesmo mais favorecidos que os escolhidos; pois se um esco- lhido que traz em si a Luz viva não agir de acordo, terá que prestar contas mais rigorosas pelos talentos mal empregados do que o sim- ples chamado, ao qual compete apenas ouvir, crer e agir.
Vê, os escolhidos são Meus servos, e os chamados Meus ser- vos e filhos! A fim de que vejas não haver privilégio entre um e ou- tro, dar-te-ei uma parábola! Houve um rei que mantinha dez servos principais para sua organização doméstica. Certo dia, ele teve que se ausentar para assumir a direção de um novo reinado.
Antes de se despedir, chamou a todos, entregou-lhes dez li- bras e disse: Agi prudentemente até a minha volta. — Quando os cidadãos (chamados) disto se informaram, começaram a reclamar e se tornarem inimigos do soberano, por tê-los abandonado e não lhes ter entregue igualmente libras e talentos. Por isto, enviaram mensa- geiros ao encalço do rei com o seguinte recado: Não concordamos com a regência desse soberano; por que motivo somos inferiores a seus servos, quando o servimos do mesmo modo?!
Entrementes, o rei retornava, após conquistar outro país. Nem bem se acomodou no castelo, mandou chamar os servos, a fim de averiguar o lucro de cada um. O primeiro adiantou-se e disse: Se- nhor, tua libra me rendeu dez! — E o rei respondeu: Servo conscien- cioso, como foste fiel com tão pouco, terás poder sobre dez cidades!
Apresentou-se outro: Senhor, tua libra me rendeu cinco! — E o soberano observou: Serás regente de cinco cidades!
Então se aproximou o terceiro; e o último disse: Senhor, guar- dei a tua libra confiada, até a tua volta! Tive medo de ti, por seres homem duro; pois tiras onde não deste, e colhes onde não semeaste.
E o rei respondeu: Condenas-te a ti mesmo, servo maligno! Se sabias ser eu homem severo, tirando onde nada dei e colhendo quando não semeei — por que não depositaste o dinheiro no banco, a fim de que o recebesse com juros?
E virando-se para os demais servos: Tirai a libra deste pre- guiçoso e dai-a ao primeiro, possuidor de dez! — E os servos obsta- ram: Ó rei, se ele já tem dez, para que entregar-lhe mais esta?
Eu Mesmo vos digo a todos: quem tem receberá acréscimo, para que tenha abundância; a quem não tem será tirado o que tem. Os que não quiseram a direção do rei pecaram, por isto devem ser estrangulados na noite de treva do julgamento e da morte da alma!
Vê, Meu amigo, eis como andam as coisas Comigo! Quem tem receberá muito mais, para que tenha abundância! Quem não tem ficará isento do pouco que lhe for confiado, e entregue ao que já tem muito.
Os muitos chamados que não atendem à voz do servo e não querem aceitar o Senhor de Luz e Vida, a fim de que pudesse orien- tá-los na sua salvação, serão estrangulados pela noite do seu próprio coração. O servo preguiçoso terá que esperar por muito tempo até que lhe seja entregue outra libra. — Dize-Me se te agrada esta pará- bola. Concordas com o rei?”
Diz o hindu: “Senhor, vejo-me na situação em que o raciocí- nio abandona o homem e os cabelos começam a se pôr em pé! Por certo não és Tu o rei tirano a tirar onde não dá, querendo colher onde não semeou?! Tenho impressão de originar-se tudo de Ti, tendo se- meado em toda parte, portanto podes tirar e colher por ser tudo Teu.
Concordo com o castigo dos vilipendiadores; pois em seu caso não se admite a Paciência Divina, na qual o maldoso ganha tempo e terreno para a realização de seus crimes, enquanto o homem de bem cai em miséria profunda, perde finalmente toda fé e se vê obrigado a devolver a libra confiada após cuidadosamente guardada.
Justa é a recompensa do servo diligente; o fato de o outro, algo indolente e temeroso, não ser recompensado pela devolução incólume do talento pareceu-me algo duro por parte do rei!
Sou amigo dos homens, e não posso ver alguém sofrer, mor- mente não merecendo seu sofrimento qual criminoso. O servo que devolvera o dinheiro não teve compreensão e inteligência do primei- ro, nem do segundo, que ganhou cinco libras. Não vejo maldade no seu proceder e desejava saber de Ti qual o seu destino, pois fora cognominado de maligno!”
Digo Eu: “Será o que foi: servo simples e comum, porque não possui capacidade para tarefas maiores! Até mesmo um escolhido re- cebe capacidades e talentos iguais a qualquer outro, necessitando se- rem desenvolvidos a fim de que seu livre arbítrio não sofra prejuízo.
Quem desenvolver seu talento com toda dedicação terá con- quistado o real tesouro, ao qual será acrescentado cada vez mais; quem não desenvolvê-lo, não querendo livrar-se de sua ociosidade, será culpado se, no final, se torna mais tolo, não obstante a libra guardada, do que os não simpatizantes com o Rei da Luz.
Eis o motivo da estagnação de tais servos preguiçosos, e os chamados continuarão em sua treva, a ponto de não haver coisa pior do que serem despertados pelo vozerio do dia. Porventura deveria o sol enviar mensageiros aos dorminhocos e perguntar-lhes se é de seu
agrado que ele suba acima das montanhas?! Vê, o sol não fará isto, tampouco o Rei da Luz e da Vida, devido à ordem geral a manter os mundos!
Quem receber a libra terá recebido a ordem do soberano; o cumprimento depende do livre arbítrio do servo, e o rei não é culpado do ócio daquele, pois sabe quais as capacidades conferidas. Está, portanto, o rei no seu direito, e jamais um servo preguiçoso e indolente! — Reflete bem, grava o quadro e depois dize-Me se o rei é realmente tirano inclemente! Ter-Me-ás compreendido?”
Responde o mago: “Sim, Senhor, e Tua parábola recebeu um facho de luz, enquanto seria difícil entendê-la como simples quadro. Quem sentir qualquer aptidão deve desenvolvê-la pelo próprio es- forço! Isto feito, receberá o resto pelo Rei da Luz, podendo tornar-se verdadeiro doutrinador de muitos, por Ti denominados de ‘chama- dos’. Justifica-se que ‘Quem tem receberá, para ter abundância. Mas quem não tiver perderá o que teve’. Existe, porém, algo não comple- tamente assimilável, e tomarei a liberdade de expressar-me.
Zelo e dedicação justos, no Bem e na Verdade, são virtudes louváveis, enquanto o ócio é base de todos os pecados! Mas quem dá zelo e dedicação a um, e ócio a outro? Penso serem conferidos por uma Vontade superior.
Eu mesmo tenho vários filhos; fiz a experiência com o mais velho e uma filha que são extraordinariamente dedicados nos estudos de artes e ciências, enquanto os demais são preguiçosos e necessitam ser constantemente obrigados aos deveres. São filhos dos mesmos pais, têm boa saúde, gozam o mesmo ensino, todavia existe grande diferença nos talentos e na aplicação do estudo. Como explicá-lo?”
PREPAROÀ EDUCAÇÃO
Digo Eu: “Nada mais fácil, pois já te demonstrei a necessida- de das variações entre as criaturas, a fim de que uma se torne indis- pensável e útil à outra. Se todas fossem de zelo igual e detentoras dos mesmos talentos, tornar-se-iam reciprocamente desnecessárias. Por
isto os filhos do mesmo casal possuem talentos e aptidões diversas. Cabe ao educador sua classificação, adotando o ensino correspon- dente, para que todos sejam levados ao justo destino.
Se pretendes fazer de todos os teus filhos alfaiates ou tece- lões, muito embora dotados de tendências e aptidões diversas, des- cobrirás zelo e dedicação apenas nos que tiverem talentos para tal. Os outros, de pouco ou nenhum talento, quando posteriormente atingirem a maioridade, escassos benefícios prestarão ao próximo, porque jamais conseguiram devida destreza como os que desde nas- cença usufruíram tais dons.
Baseia-se, portanto, principalmente nos pais e demais educa- dores da juventude o zelo maior ou menor dos filhos. A videira pro- duz a uva e a figueira, o figo, e ambos têm sabor agradável; se apli- cares o mesmo trato a ambas, a figueira dará poucos frutos, e caso não podares a videira, ela atrofiará sem produzir. Compreendeste?”
Diz o mago: “Ó Senhor, agradeço-Te por explicação tão ma- ravilhosa! Quão cego e tolo é o homem em sua pretensa sabedoria! Basta se observar forma e tamanhos diversos de cada criança: uma é áspera, outra meiga e delicada! Se as diversidades externas são tão visíveis — que esperar das tendências internas!
Acaso não são suficientes os estigmas externos, para o homem pensante concluir as diversidades internas de talentos e aptidões, a fim de que fossem desenvolvidos de modo profícuo?! Mas não! Tal não é bastante ao cientista cego, como fui e ainda sou; pois deseja igualar a todos! Devem pensar e agir como ele e cumular-se de pe- sos para os quais lhes faltam forças; deste modo, se educam loucos, incapazes de se tornarem úteis a alguém. Novamente Te agradeço, Senhor, pois adotarei essa medida nos próprios filhos.”
Acrescenta Agrícola: “Também nós a aplicaremos, eu espe- cialmente; também sou pai e, além disto, os jovens que levarei para Roma serão educados de acordo com suas aptidões. Claro precisa- rem de uma educação básica: a leitura das Escrituras, escrita e arit- mética, inclusive idiomas usados no Império Romano. Estará bem assim, Senhor?”
Digo Eu: “Por certo; pois antes de tudo é preciso que ca- minhem, usem as mãos, ouçam e vejam antes de poderem realizar qualquer coisa. Por isto, são necessários os conhecimentos prepara- tórios por ti mencionados, a fim de chegarem à verdadeira ciência da vida. Todavia, deve-se cuidar que os homens não façam dos co- nhecimentos e estudos preparatórios a coisa principal, entregando-
-se a vida inteira ao estudo das Escrituras e idiomas, esquecendo a educação interna e o despertar do espírito, no qual finalmente consiste o maior valor da vida! De que adiantaria ao homem escrever e entender todas as letras do mundo e falar os idiomas de todos os habitantes terrestres, se todavia sua alma levaria prejuízo?!
Por isto procurai antes de mais nada o Reino de Deus na Ter- ra, dentro de vós, e todo o resto vos será dado com este Reino inter- no; sem ele — ainda que possuidor de todos os tesouros do mundo e todas as ciências dos sábios — o homem terá tanto quanto nada.
O dono do Reino de Deus em seu coração tudo possui: a ciência mais elevada e profunda, a vida eterna, sua força e poder, o que por certo vale mais que tudo proclamado de grande e valio- so no mundo.
Amanhã, em Emaús, certificar-vos-eis do que seja um ho- mem perfeito. Digo-vos: um homem realmente perfeito pode mais que todos os homens imperfeitos do orbe. Por tal motivo, tratai de vos aperfeiçoardes! Estando perfeitos, sereis e tereis tudo. Entretan- to, vos aviso ser preciso violência na conquista do Reino de Deus; os interessados terão que aplicar a maior violência, pois não agindo deste modo, dificilmente dele se apossarão em vida.”
OREINODE DEUS
Diz em seguida o mago: “Senhor, como pode suceder o ho- mem fraco e inepto aplicar violência ao Reino de Deus? Pois resta saber onde está tal Reino, a fim de que ele se apodere do mesmo!”
Digo Eu: “Ouviste tantos ensinamentos durante horas a fio, até mesmo Me reconheceste — e ainda ignoras o que seja o Reino
de Deus?! O fiel cumprimento da Vontade Divina é vosso Reino do Céu! Todavia, este cumprimento não é tão fácil como imaginas, pois as criaturas mundanas se opõem ao mesmo e perseguem os verdadei- ros conquistadores. Por isto, quem deseja apoderar-se inteiramente do Reino de Deus não deve temer os que podem matar o corpo, mas não prejudicar a alma; ao homem convém temer a Deus, que pela Sua Ordem Imutável também pode atirar a alma ao inferno!
Quem teme a Deus mais que aos homens e, não obstante a perseguição destes, cumpre a Vontade Divina impõe violência na conquista do Reino de Deus e na certa será vitorioso.
Além disso, acresce um fator importante em tal conquista: preciso é que o homem se abnegue a si próprio em todas as coisas do mundo, perdoe de coração aos ofensores, não alimente ressentimen- tos ou ódio contra quem quer que seja, ore para os que o maldizem, pague o mal pelo bem, não se superestime, suporte com paciência as tentações e se abstenha da gula, do excesso de beber, impudicícia e adultério. Quem isto praticar igualmente aplica violência à conquis- ta do Reino de Deus.
Quem, todavia, reconhecer a Deus, venerá-Lo, amá-Lo e ao próximo como a si mesmo, entretanto respeitar e temer o mundo, não se atrevendo a confessar abertamente o Meu Nome, porquanto lhe poderia trazer algum prejuízo — não terá aplicado violência ao Reino de Deus; portanto, não o conquistará em vida, e no Além terá que enfrentar lutas sucessivas para tal fim!
Quem souber e crer ser Eu o Messias Prometido terá que fazer o que ensino, ensinei e futuramente ensinarei, do contrário não Me merece e Eu não o ajudarei na educação de sua vida interna. Eu sou a Vida da alma através de Meu Espírito nela, e este Espírito se chama: o amor a Deus. Quem, portanto, amar a Deus acima de tudo e por isto cumprir sempre a Vontade Dele terá preenchido a sua alma com o Meu Espírito, que é o aperfeiçoamento e a vida eterna da alma.
Se alguém Me conhecer, entretanto temer o mundo, dizen- do: Realmente, aceito o Messias, acredito e faço secretamente tudo
que ensina; nada, porém, deixo transparecer, porquanto é preciso se viver no mundo a fim de que ninguém me possa criticar — tal homem não será fiel discípulo de Minha Natureza e Nome; ainda não possui o amor verdadeiro e vivo para com Deus e dificilmente será cumulado da plenitude do Reino de Deus em vida; pois esta consiste precisamente no mais elevado amor a Deus, que de modo algum teme e receia o mundo.
Quem, sendo preciso, Me pronunciar perante o mundo será por Mim apresentado ao Pai no Céu; quem não Me confessar diante do mundo não será por Mim confessado perante o Pai no Céu!”
De pronto o mago indaga: “Senhor, quem é Teu Pai, e onde está o Céu? Acaso podes, como Senhor da Eternidade, ter pai?”
Respondo: “O Amor Eterno em Deus é o Pai, e Sua ilimi- tada Sabedoria é o Céu! Quem ama a Deus acima de tudo confessa a Deus, portanto a Mim, diante do mundo; e Eu também o confes- sarei no Meu Amor, no que consiste a vida eterna da alma humana. Como o homem alcança a máxima Sabedoria através de tal amor vivo, ou seja, o Céu ou o Reino de Deus, ele ipso facto terá con- quistado o Reino de Deus, que jamais lhe poderá ser tirado. Gravai Minhas Palavras em vosso coração e agi de acordo, que tereis a vida eterna e verdadeira dentro de vós! — Agora, concedei-Me um curto repouso e meditai sobre tudo que foi dito e demonstrado!”
LOCALIZAÇÃODO CÉU
O silêncio é geral, porém breve, porquanto o número de pes- soas é grande e a noite tinha sido tão espetacular. Os greco-judeus começam a palestrar e cada qual pretende possuir a maior compre- ensão de Minhas Palavras. Finalmente, um se expressa da seguinte forma: “Quem afirmar ter tido a melhor assimilação dos Ensina- mentos do Mestre estará enganado, pois Ele também afirmou que ninguém se deveria superestimar, mas sim ser humilde e discreto. Querendo, portanto, apontar ao próximo sua falta de compreensão, demonstra seu próprio erro.
Outra coisa seria caso dissesse: Não assimilei esse ou aquele assunto. Qual é tua opinião? — Caso o outro lhe demonstre, com amor e modéstia, a maneira pela qual aproveitou o ensinamento, tal não é exaltação de seu intelecto, mas obra de verdadeiro amor ao próximo. De modo algum concordo com discussões.” Tal advertên- cia estabelece a ordem, pois todos reconhecem a razão do orador.
Os três magos, por sua vez, descobrem um ponto incompre- ensível, quer dizer, a localização do Céu, pois alegam: “É admissível perfazer o Reino de Deus o pleno conhecimento do Pai, de Sua Von- tade, Sabedoria, Amor e a ação individual, bem como a certeza da vida eterna, portanto o aperfeiçoamento do homem; onde, porém, está a localidade das almas desencarnadas?”
Com essa dúvida, o mago quer se dirigir a Mim; Eu o ante- cipo, dizendo: “Já sei o que te preocupa; todavia, não o compreen- derias, por não estar a tua alma bastante liberta da matéria. Quando estiver mais unida ao espírito do Meu Amor dentro de ti, o teu próprio espírito te demonstrará o local daquele reino, onde tua alma viverá e agirá eternamente na máxima liberdade. Por enquanto, tua mente não o poderá assimilar.
Onde, por exemplo, Me acho agora? No mundo criado por Mim Mesmo! Quando tiveres alcançado a perfeição verdadeira e eterna de tua vida, e o teu corpo te for tirado como julgamento, ou seja, o Meu imperativo a ser desenvolvido a favor de tua vida intrín- seca — serás capaz de criar tudo de ti mesmo, igual a Mim, e viverás nessa criação própria.
O fato de residir força criadora em tua alma ainda muito ma- terialista, poderás deduzir de teus sonhos. Onde está o mundo que habitas nos sonhos nítidos? Consiste apenas na inteligência e vonta- de de tua alma, que também possui querer, muito embora durante o dia consideres o fato como mera casualidade. Reflete um pouco, que receberás inspiração mais clara! Para o dia de hoje terminei a Minha Tarefa, por isto dirigir-nos-emos às tendas para completo repouso até amanhã, onde haverá mais revelações.” Com isto Me levanto com os discípulos e nos encaminhamos para uma grande tenda.
A manhã surge calma e radiante. Eu, Pedro, João e Jacob nos levantamos meia hora antes da aurora, fazendo observações sobre a Natureza a despertar de seu sono. Os pássaros já se manifestam e saúdam com seu canto mavioso o Sol prestes a surgir; a Oeste brilham pequeninas nuvens rosadas e debruadas a ouro. Os picos das montanhas parecem arder em fogo e no vale do Jordão neblinas alvas se erguem aos poucos. Um bando de grous vindo da Galileia se dirige a Oeste, pois o odor do Mar Morto, ainda mui forte, obriga essas aves sensíveis a tomarem essa direção. Deste modo, há ainda outras cenas nessa bela manhã de outono, das quais os dorminhocos nada percebem.
João, extasiado, diz: “Senhor, haverá nos Teus Céus manhãs tão radiosas como esta?”
Digo Eu: “Como essa, não; porém muito mais maravilhosas e duradouras, pois essa não podes prorrogar — a celeste pode e será eterna, pois vos digo o que já disse por várias vezes: ninguém viu, nenhum coração sentiu as maravilhas que Deus reserva para os que O amam! Em vosso estado terreno, não suportaríeis nem a menor; quando o Meu Espírito vos tiver penetrado, sereis capazes de supor- tar o Amor dos Meus Céus em êxtase exuberante!”
Diz João: “Senhor, poderemos ver a Terra quando estiver- mos no Céu?”
Digo Eu: “Não somente esta, mas inúmeras outras, pois vós, como Meus filhos e fisicamente Meus irmãos, tereis que reger a Criação Infinita!”
Prossegue João: “Senhor, quais os espíritos por Ti ordenados que regem atualmente o Cosmos? O Regente Principal és eviden- temente Tu; mas a Teu lado se acham, como Raphael, inúmeras le- giões de anjos poderosos. Que farão se nós futuramente tivermos a Graça de organizar a Criação a Teu Lado?”
Respondo: “Meu caríssimo João, ainda és fraco e bastante in- fantil em assuntos do Reino de Deus! Acaso não é o Espírito de Meu
Pai em Mim o Regente do Infinito, de eternidades em eternidades? Todos os anjos estão plenos deste Espírito, que é tudo em tudo! Quando fordes perfeitos, só o sereis por Ele!
Vê, existem inúmeras almas criadas; as aperfeiçoadas são pe- netradas por um só Espírito, pelo qual têm a vida eterna, a Sabe- doria, o Amor, Poder e Força, e assim agem, como Eu, nos Céus, quais colaboradores dos mundos e seus seres, no Espaço material e infinito.
Compreendereis e assimilareis tudo isso e muita coisa mais quando aperfeiçoados, o que sucederá logo após Eu ascender deste mundo ao Meu Reino Celeste, para o Meu e vosso Deus, em vós.
A fim de que vos envie o Meu Espírito, preciso é Eu Mesmo Me encontrar em Mim como Deus, o Pai Eterno. O Meu Espíri- to vos levará às verdades ainda incompreensíveis, e então fareis o que faço, e ainda coisas mais grandiosas. A maneira pela qual isto será possível ser-vos-á ensinada pelo Meu Espírito, que glorificará vossa alma.
Eis que começam a se movimentar os outros hóspedes e o Sol surge no horizonte. Silenciemos e observemos as aparições comuns à Aurora, entretanto portadoras de novidades e raridades, como nenhuma outra em a Natureza telúrica!
Já vem subindo os três magos que durante a noite se di- rigiram à cidade, relatando aos amigos os acontecimentos daqui. Prestarão bons serviços referentes a alguns fariseus ignorantes que irão a Emaús, e além disto se tornarão amigos dos homens perfeitos dos confins do Egito setentrional!”
PARTIDAPARA EMAÚS
Nisto aparecem Lázaro e Raphael na porta da casa e o pri- meiro faz menção de se dirigir a Mim; o anjo o retém, dizendo querer Eu descansar. Dentro de alguns minutos Eu Me manifesto novamente e peço a nosso anfitrião o preparo de um bom desjejum. Em menos de uma hora tudo está pronto.
Raphael lhe dera assistência, mas de modo natural, pois ou- tro meio não seria aconselhável por causa dos magos, atentos a tudo que não fosse corriqueiro. Quando está servido, o hospedeiro de Lázaro lhe dá aviso, que por este é passado a Mim; Eu, no entanto, lhe digo: “Não era preciso Me avisares; ainda assim foi bom, em virtude dos estranhos, por isto — vamos!”
Levanto-Me, com os três discípulos, para dirigir-Me ao refei- tório e os presentes seguem o convite de Lázaro. Alguns dos outros discípulos conjecturam qual o motivo de Minha pressa. Eu nada digo, dirigindo Minha atenção ao desjejum.
Ao terminar, Agrícola diz: “Senhor e Mestre, hoje não Te en- tendo! Costumas ser tão calmo e paciente, e agora não tens a devida serenidade para a refeição. Que pretendes?”
Respondo: “Já vos disse ontem: necessito Eu estar com Nicodemus em Emaús, por medidas de Meu conhecimento. A tra- jetória para tantos será difícil, pois podemos andar somente em gru- pos de doze e em caminhos diversos. Se fôssemos qual caravana, os templários seriam advertidos, impedindo Minha Ação. Por este motivo, irei na frente com os três discípulos por caminho desusado, enquanto vos dividireis em grupos e, dentro de duas horas, estare- mos todos juntos em casa de Nicodemus.
Repito novamente: sede precavidos como as serpentes, porém meigos no coração quais pombas; pois lá embaixo habita verdadeiro ninho de víboras e serpentes, que necessita ser domado com seus afins! Compreendei-o bem e tomai as devidas providências, que te- reis um dia felicíssimo para a maior bem-aventurança de vossa alma! Seguirei imediatamente com Pedro, Jacob e João. Meus discípulos serão levados por Raphael; os jovens ex-escravos, por Lázaro. Caso vós, hindus, desejardes acompanhar-Me, aprontai-vos!” Satisfeitos, os três magos se juntam a Mim.
Agrícola pergunta se há diferença de ele andar em Minha Companhia, enquanto os diversos romanos seguiriam outro cami- nho. Respondo: “Como quiserdes, em tal caso já o meu grupo estará
completo.” Seguimos morro abaixo e, dentro em pouco, estamos na estrada para Emaús, que nesse dia, feriado, está quase vazia.
ACAMINHODE EMAÚS
Após termos passado por Jerusalém nas proximidades da co- luna criada por Raphael, somos abordados por dois pobres a cami- nho daquela cidade, à cata de esmolas. Um era cego e guiado pelo outro. Pedem-nos um auxílio. Digo Eu: “Respondei-Me, que prefe- ris: saúde e força para poderdes trabalhar e ganhar o vosso sustento, ou uma esmola adequada à vossa necessidade?”
Dizem eles: “Senhor, não te conhecemos! Se fosses capaz, preferiríamos a primeira oferta; isto não sendo possível, pediríamos um auxílio dentro de teu critério.”
Prossigo: “Se tivésseis fé, seria realizável o primeiro ofereci- mento!” Diz o cego: “Sabemos e cremos serem possíveis a Deus todas as coisas; Ele, porém, não mais opera milagres, em virtude da maldade humana, começando pelo sumo sacerdote até nós. As Leis Divinas foram abolidas e suplantadas por outras, péssimas. As Leis sendo no- civas, os homens se tornam maus, porquanto a fé e os conhecimentos são consequências das religiões. Assim sendo, adora-se o bezerro de ouro e não tardará um julgamento tenebroso. Este meu amigo me descreveu os sinais de anteontem, que nada de bom prometem; por isto, Deus não há de querer fazer milagres em época tão atrasada!”
Digo Eu: “Perdeste há dez anos a luz de teus olhos pela mal- dade de um vizinho ciumento, inclusive teus bens por causa das suas intrigas; entretanto, conservaste a luz do coração e mereces readqui- rir a visão completa! Quero que vejas e possas ter forças físicas!” O pobre se vê inteiramente aturdido diante do milagre!
Após alguns instantes, ele cai de joelhos e diz comovido: “Se- nhor, não sei quem és, mas sei o que fizeste! Para tanto é preciso mais conhecimento que um simples médico. Não usaste unguento, não tocaste os meus olhos, quiseste — e eu me tornei cheio de saúde.
Isto quer dizer que estás pleno do Espírito Divino, como o foram os antigos profetas! Como poderia pagar o que fizeste a um pobre?”
Respondo: “Apenas cumprindo os Mandamentos de Deus, trabalhando em teu país e te alimentando com critério! E tu, amigo, deves fazer o mesmo, reconquistando a saúde plena!”
O outro, um tanto aleijado, sente-se forte e cheio de saúde, por isto também Me agradece de joelhos, dizendo: “Grande profeta, sabedor de como meu amigo perdeu a visão, pedimos-te para nos dizeres onde encontrar trabalho, tão difícil atualmente.”
Digo Eu: “Dirigi-vos a Bethânia, à casa de Lázaro, e contai às suas irmãs o que vos sucedeu, pois fostes enviados por Mim. Sereis imediatamente aceitos! Levantai-vos e segui caminho!” Novamente eles agradecem e se afastam. A caminho de Bethânia conjecturam a respeito de Minha Pessoa e Meus acompanhantes. Presumem ser Eu profeta, talvez Elias retornado. Quanto à identidade dos outros, não chegam à conclusão.
Entrementes, Me vejo em apuros com os três magos; pois foi o primeiro milagre que assistiram. O chefe diz: “Senhor, vejo seres Deus, pois tal ação só é possível a Ele!” Respondo: “Silenciai, estais falando sem saber o que se passa no homem; em Emaús sereis informados!”
OSENHOREA MENDIGA
Perto de Emaús vem ao nosso encontro uma mendiga las- timando-se de sua miséria, pois, como viúva e mãe de dois filhos pequeninos, não podia carregá-los a fim de conseguir o suficiente alimento. Por isto nos pede esmola.
Digo-lhe: “Por que gritas tanto? Não somos surdos e capazes de socorrer-te ao pronunciares teu pedido mais modestamente!”
Obsta ela: “Senhor, isto fiz, mas os corações de quase todas as criaturas são duros e surdos, e não consideram a pobreza silenciosa. Somente usando de certo ímpeto se consegue despertar interesse.”
Digo Eu: “Agradas-Me como pobre verdadeira, no entanto não plenamente, por preferires a mendicância ao trabalho. Ainda
não tens trinta anos, és forte e cheia de saúde; poderias, portanto, trabalhar e ganhar o sustento para os gêmeos. A vadiagem é mais do teu agrado, de sorte que estudaste teu ofício. Para Mim, tais meios de propaganda da pobreza não surtem efeito, mas apenas a pura Verdade! Além disto, tenho mais uma coisa a te dizer!”
Diz a mulher: “Hum, não sei o que será!”
Digo Eu, com severidade, porém amável: “Minha filha, teria muita coisa a acrescentar! Ajudar-te-ei caso te regeneres e deixes de pecar; do contrário, nada farei por ti! Ainda que gritasses cem vezes mais, Eu não te atenderia! Assimila bem o que te direi!
Vê, carregas um embrulho às costas! O que contém ele? Um lindo vestido de seda persa, que te custou uma libra de prata quando ainda eras rica! Ao chegares perto do albergue, acomodas os gême- os, pões o vestido e te apresentas sedutora a comerciar a tua beleza. Quando aponta o dia, tens a aparência atual e gritas por esmolas. Dize-Me se isto se justifica perante Deus e os homens!? Não te con- deno, apenas quero ouvir teu parecer!” A atrevida tão confusa está, que não sabe o que responder.
Após algum tempo de reflexão de sua mente algo volúvel, ela diz: “Nunca te vi ou falei! Como podes saber disso tudo? Certamen- te alguém me traiu. Infelizmente, assim é; que culpa tem uma pobre viúva caso se submeta a certas coisas que não estejam na Ordem de Deus? Por isto não é maldosa; basta observar as mulheres dos fari- seus, escribas e até mesmo dos levitas, que perante Deus deveriam ser puras, e ter-se-ia outros motivos para admoestações, do que à minha pessoa, levada à miséria. Além de tudo, confesso teres falado a verdade. Ajuda-me, que nunca mais usarei tais meios de subsistên- cia! É fácil criticar e punir; ajudar, ninguém quer!”
Digo Eu: “Não te critico nem te castigo, muito embora te- nha Poder; alimentas o erro de não preferires trabalho pesado a uma vida de vadiagem! Nisto se baseia o motivo de tua pobreza e neces- sidade, por isto te apontei tal fraqueza para que te corrijas. A tais almas indecisas, Deus não ajuda. Acaso ainda não pediste a Ele, com fervor e confiança?”
Diz a mulher: “Amigo, para de me falar do Deus surdo e in- clemente dos judeus; é mais fácil uma pedra nos atender! E gritando por esmolas, as criaturas egoístas ainda me dão atenção; teu Deus é mais surdo que pedra!”
Digo Eu: “De modo algum; tu ainda não O reconheceste, não Lhe deste fé e amor, e além disto nunca Lhe dirigiste um pedi- do sincero de socorro. Deus então te procura com a miséria, a fim de que te lembres Dele, e quando menos o esperas, Ele vem ao teu encontro para te ajudar realmente — entretanto, afirmas ser Deus mais duro e surdo que pedra!
Fazes grande injustiça a Ele que não te julga por isso, mas te socorre realmente — física e psiquicamente — para não sucumbires com tua alma!
Quando eras solteira e teus pais ainda viviam, eras obedien- te e religiosa, e Deus e teus progenitores se alegravam contigo; mais tarde casaste com um homem bondoso; entretanto, modificaste o teu gênio. Não amavas o teu esposo e te viraste contra os pais, por- que te casaram com homem que não podias amar. O desgosto deles, já idosos e enfermos, encurtou-lhes a vida. Tua atitude tornou-se mais ríspida para com teu marido, que começou a beber, adoeceu e, perdendo o emprego, em breve morria, deixando-te viúva e pobre.
Essa infelicidade foi permitida por Deus por teres rompido o Mandamento que manda os filhos honrarem e amarem os pais, a fim de que se lhes prolongue a vida; segundo, não amavas o homem escolhido pelos genitores, fazendo-o passar horas amargas.
Já se passou um ano, e ainda não pensaste em reconhecer os teus defeitos e arrepender-te pedindo perdão a Deus. Todavia, afirmas ser Ele mais duro e surdo que pedra, não se apiedando das criaturas, ainda que Lhe peçam. Qual é teu parecer a respeito?”
Diz a mendicante, contrita: “Senhor, foi Deus quem te en- viou! Acendeste-me justa luz e sei o que fazer: venderei este vestido para comprar veste de contrição; pois enquanto não tiver feito peni- tência, Deus não ouvirá a minha prece!”
Digo Eu: “A veste de contrição não apagará teus pecados; é preferível comprares pão. Teu vestido de mendicância não deixa de ser andrajo de contrição; arrepende-te dos pecados, abstém-te de outros, que os antigos serão perdoados por Deus!”
Diz ela: “Amigo, dize-me quem és, porquanto me afirmas tudo com tanta certeza! Desejo dar-te a devida honra!”
Respondo: “Não a preciso de ti! Faze o que te aconselho, que me terás dado a melhor honra, seja Eu quem for! Vai em paz!” Ela agradece e segue para Jerusalém, após receber ajuda monetária de Agrícola e dos três magos. Entrementes, nos aproximamos das muralhas de Emaús.
ASCRIANÇASMENDIGASDE EMAÚS
Quando próximos do portal, abordam-nos sete crianças de seis a onze anos, quase nuas, pedindo pão. Digo-lhes: “Meus peque- ninos, onde tiraremos pão em plena rua?”
Diz o menino mais velho: “Querido e bom pai, se te apiedas- ses de nós, bem poderias nos arranjar pão e roupa! Aqui há alimento em quantidade, mas, se pedirmos, seremos enxotados. Tu e esses homens tendes tão boa fisionomia, que imploramos vossa ajuda!”
Diz Agrícola: “Não tendes pais?” Diz o menino: “Sim, mas tão doentes que não podem trabalhar e assim somos obrigados a pe- dir por todos. É triste ser-se tão pobre, sem moradia, pão e roupa!” Diz o romano: “Onde estão os pais, se não tendes onde morar?”
Responde ele: “Lá no fundo está uma velha choupana de pastor, pertencente a um cidadão; ele não a precisa por ter constru- ído outra e permitiu que a habitássemos. Vinde certificar-vos pes- soalmente!”
Prossegue Agrícola: “Mas aqui mora um certo Nicodemus, bom homem. Nunca o procuraste?” Diz o menino: “Não nos atre- vemos, por ser grande senhor. Há muitos iguais a ele, mas não temos coragem de procurá-los.”
Diz Agrícola: “Também nós poderíamos ser personagens importantes, entretanto vos dirigistes a nós!” Explica o menino: “Foi a fome e vossa expressão bondosa que nos levaram a tanto. Assim faríamos, caso encontrássemos Nicodemus na rua; não co- nhecemos sua residência e não temos coragem de ir à cidade, quase despidos.”
Intervenho: “Tende fé, Meus filhinhos, que vos ajudarei! Levai-nos primeiro para junto de vossos pais! Serão socorridos e alimentados!”
Dizem todos: “Oramos diariamente a Deus, e quando assim fazíamos de manhã, surgiu uma voz dizendo: Ainda hoje virá socor- ro! Contamos o fato aos nossos pais. Tristonhos, responderam: Para Deus tudo é possível; nosso socorro mais certo será a morte! — An- tes de voltarmos para casa, vamos agradecer-lhe a Sua Misericórdia!”
Todos se ajoelham, juntam as mãos e dizem: “Pai Querido e Santo, no Céu! Agradecemos-Te a ajuda através desses homens bondosos! Aceita, pois, nossa gratidão!” Em seguida, se levantam e nos pedem acompanhá-los. Comovidos, dentro em breve chegamos à choupana ao pé de uma rocha, onde se encontram os velhos deita- dos no chão, magros quais esqueletos.
Alterado diante de tal quadro, Agrícola exclama: “Isto não sucede conosco, que temos fama de duros e inclementes! Acaso esses judeus preguiçosos não têm tempo de se dar ao trabalho de percor- rer, vez por outra, as redondezas, para verificarem se existe qualquer necessidade premente? Há igualmente pastores nas proximidades; por que não se interessam por essa gente? Nunca vi tamanha ausên- cia de sentimentos!”
Digo Eu: “Amigo, vamos primeiro socorrê-los e resolvere- mos, depois, o seu futuro!”
OSENHORVISITAAFAMÍLIA POBRE
Virando-Me para os enfermos, digo: “Como caístes em ta- manha miséria? Respondei por causa dos que Me acompanham!”
Diz o velho aleijado pela gota: “Senhor, sempre fomos pobres e contraímos reumatismo gotoso, primeiro eu, em seguida minha companheira, em virtude de cansaço excessivo. Até a Páscoa des- te ano morávamos na aldeia; mas o nosso benfeitor faleceu, vindo outro proprietário que não nos queria como criaturas inúteis. Pedi- mos acolhida com outras famílias; ninguém nos aceitou por causa da enfermidade e das crianças. Nada mais nos restou senão passar para esta choupana, a fim de nos abrigarmos contra a chuva. Nossa doença não podia melhorar, e o fato de andarmos quase desnudos se prende à venda das roupas para podermos comprar alimentos. Agora se extinguiram os recursos e morreremos de fome, caso não venha socorro. Que seja feita a Vontade do Supremo; pois sabe por que devemos padecer!
Job sofreu muito — nós, porém, muito mais! Desde a in- fância passamos privações, e agora, na velhice, atingimos o ápice da miséria! Se vos for possível, ajudai-nos; o Senhor vos recompensará na certa!”
Digo Eu: “Por isto aqui estamos! Lembrai-vos, porém: Deus experimenta aos que Ele ama e destina a grandes ações no Reino dos espíritos! Terminastes a fase da provação terrena e sereis feli- zes na Terra com vossos filhos ainda puros; devem ser educados, a fim de não se poluírem quando adultos. Por isto vos digo: levantai-
-vos e caminhai!” No mesmo instante, o casal se levanta com saúde e remoçado.
Admirado, o marido diz: “Homem milagroso, que fizeste conosco? Nunca fomos tão cheios de saúde e fortes! Deves ser um profeta enviado por Deus, ou um anjo encarnado. Quantos remé- dios já se aplicou em entrevados, sem que melhorassem; e tu apenas disseste: Levantai-vos e caminhai! — e estamos sãos. Louvado seja o Deus de Isaac, por ter dado Poder divino a um mortal!”
Os filhos choram de alegria quando deparam com os pais perfeitamente curados, e o mais velho diz: “Eu ouvi e também sem- pre vos falei: quando a miséria chega ao cume, a ajuda de Deus se aproxima para quem O ama! — E isto deu-se hoje! Toda gratidão,
louvor e honra ao Bom Pai Celeste! Diante da felicidade de vossa cura, passou-nos a fome! Se ainda tivéssemos alguma roupa, pode- ríamos trabalhar!”
Digo Eu ao menino: “Atrás da rocha que vos serviu de refú- gio, encontrarás três embrulhos; traze-os para vos vestirdes!” Acom- panhado dos irmãos, o menino obedece e entrega os embrulhos aos pais, e assim todos recebem sua roupa apropriada. A algazarra é grande e a gratidão não menor.
Em seguida, prossigo: “Meus filhos, voltai ao esconderijo e trazei pão e vinho que lá se encontram!” Quando se servem de um grande cesto cheio de pão e várias bilhas de vinho, os pais afirmam jamais terem provado paladar idêntico. Deveriam ser celestes e tra- zidos por anjos.
Digo Eu: “Meus filhos, saciai-vos à vontade e sede alegres e despreocupados. Deus vos experimentou com rigor e suportastes tudo sem queixumes, entregando vossa provação ao Pai. Agora ter- minou, por ter chegado ao ápice; a ajuda milagrosa e rápida não só perdurará até o fim da vida, mas se estenderá além-túmulo! Somente lá sabereis o porquê de tudo.”
AGRÍCOLAEOS PASTORES
Nisto se aproximam alguns pastores para verificar se os enfer- mos tinham falecido. Quando nos percebem, fazem menção de se afastarem. Agrícola chega à porta e diz: “Trouxestes algum alimento ou pretendíeis ministrar qualquer conforto?”
Respondem os homens: “Senhor, vimos como empregados de um patrão severo para sabermos se essa família ainda existe. De qualquer maneira, o casebre terá que ser evacuado, pois no primeiro dia após o Sábado, aqui vêm pedreiros incumbidos de reformas, ra- zão pela qual essa gente imunda terá que ser expulsa.”
Diz Agrícola: “Compreendo vossa atitude dentro da ordem do patrão; entretanto, conhecíeis a miséria dessa família. Por que nunca a socorrestes?”
Dizem eles: “Senhor, temos muito que fazer para nos susten- tar pobremente — e ainda deveríamos cuidar de outros?!”
Diz Agrícola: “Lastimo por vós! Vede, essa família recebeu ajuda régia, e todo benfeitor teria a mesma recompensa. Vosso cora- ção sendo idêntico ao do vosso patrão, nada deveis esperar de nossa parte. Aliás, podeis transmitir-lhe que eu, romano rico e conceitu- ado, teria mandado construir um palácio e feito doação de dez mil acres, caso ele tivesse zelado por esses pobres. Agora podereis dividir o vosso lucro com ele. Envergonhai-vos, judeus, dizendo-vos filhos de Deus, pois a misericórdia dos pagãos vos ultrapassa! Qual é o nome de vosso patrão?”
Diz o pastor, perplexo: “Chama-se Barabe e é rico cidadão de Jerusalém.” Diz Agrícola: “Muito bem! Dizei-lhe que essa família, anteriormente pobre, irá conosco, e ele poderá fazer com o casebre o que quiser!”
Agrícola volta junto de nós; os pastores se entreolham admi- rados e um deles diz: “Vistes? Fui por vós ridicularizado pelo sonho que tive com essa família e vos aborrecestes por eu ter algumas ve- zes dividido o meu pão com as crianças, e quando mais tarde que- riam voltar, vós as enxotastes! Eis o resultado! Sempre vos disse que algo de milagroso haveria de acontecer com essa família e seria bom fazer-se o bem a ela!”
Deste modo os pastores confabulam, até que aparecemos para seguir caminho, causando admiração o estado geral daquela gente. O menino mais velho se aproxima do pastor generoso e diz: “Será teu o que encontrares no casebre!” Referia-se ele ao cesto onde sobrara um pão e um jarro de vinho, e nos panos que envolviam as roupas estavam enroladas algumas moedas de valor.
Nem bem tínhamos dado alguns passos, quando os ou- tros pastores querem entrar no casebre para dividir o que restara. Percebendo-o, Agrícola volta depressa e diz aos atrevidos: “Se ousardes tirar apenas uma migalha sequer, eu vos faço crucificar ainda hoje!” Espavoridos, eles fogem, enquanto o romano diz ao beneficiado: “Apanha tudo e vai à vila, pois não necessitarás trabalhar no futuro!”
Em seguida, Agrícola se junta a nós. Na vila já nos esperam muitos que nos seguiram ao Monte das Oliveiras. Apontando-lhes a família, o romano diz: “Os Passos do Senhor são sempre cheios de milagres e benefícios!”
OSENHORE NICODEMUS
Nisso nos avistam Nicodemus e seu amigo José de Arimatheia e correm ao nosso encontro. E o primeiro diz: “Ó Senhor, que enor- me Bênção é Tua Visita para este local! Tive um pressentimento de Tua Chegada! Poderia convidar-Te a almoçar comigo?”
Digo Eu: “Amigo, somos muitos e não haveria espaço em tua casa; além disso, receberás à tarde alguns fariseus com os quais não desejo encontro, e assim prefiro ficar no grande albergue, também teu. Vai até lá com tua família, José de Arimatheia e o velho e bon- doso rabi, a fim de que vejais a salvação do mundo. Os dois romanos estão aqui radicados e Me procurarão, porque vim expressamente por causa deles.”
Diz Nicodemus: “Ó Senhor, em tudo tens razão, entretanto desejava que meu lar fosse abençoado pelos Teus Santos Pés!”
Digo Eu: “Por este meio, não — e se assim acreditasses, serias supersticioso. Contudo irei até lá quando os fariseus tiverem saído. Agora esperemos os outros, para saberem de Meu Paradeiro.” Per- gunta Nicodemus quem seriam os esperados.
Prossigo: “Todos os que viste anteontem, com exceção dos publicanos. Também Lázaro e Raphael com os escravos chegarão por outro caminho! De sorte que dentro de uma hora se acharão em Emaús algumas centenas de pessoas, bem acomodadas no teu espaçoso albergue!”
Em seguida, ele pede informação a respeito daquela família e Eu respondo: “Amigo, essa gente teria direito de justa queixa contra os vossos habitantes. Pois não podia passar despercebido diante de vossos olhos crianças quase desnudas que aqui vinham pedir alimen- to, e era de vossa obrigação sondar a sua origem. Isto não foi feito
e tal negligência não vos honra perante Mim! Tu e teu amigo José não sois tão culpados, porque geralmente estais na cidade. Existem outros moradores que facilmente poderiam ter cuidado da família. Nada fizeram e Eu nada lhes farei, não obstante haver muitos desfa- vorecidos de Minha Ajuda.
Conheces a velha choupana de Barabe que se acha em Jerusa- lém. Precisamente lá encontrei essas pessoas na pior miséria! O casal estava no chão duro, completamente entrevado e logicamente não po- dia ganhar o seu sustento! Apenas os sete filhos andavam perambulan- do, à cata de pão dos moradores desumanos de Emaús. Nos últimos dois dias nada conseguiram e hoje, o rico Barabe lhes deu ordem de despejo. Caso Eu não tivesse chegado, desejava saber o destino dessa família infeliz. Agora foi socorrida; mas aos daqui não socorrerei!”
Diz Nicodemus, tristonho: “Senhor, se tivesse tido a menor ideia do que se passava, teria aceitado a família! Agora me prontifico em fazer tudo para reparar o erro!”
Digo Eu: “Não tens que reparar erro algum, pois nada disto fizeste! Está tudo feito, e a família não deseja pesar aos emauenses. Se posteriormente quiseres fazer uma busca nas redondezas, bem como em Jerusalém, encontrarás muitas famílias em situação idêntica!
Agora, mudemos de assunto! Como vivem os romanos daqui? Terias oportunidade de avisá-los da presença de Agrícola e da chegada de seus companheiros? Além disto, transmite-lhes esta- rem aqui, dentro de uma hora, os egípcios que já conhecem! Trata de chamar os dois romanos; tenho que falar-lhes abertamente! O dia de hoje será grandioso e cheio de revelações jamais sonhadas!” Nicodemus executa Minhas Ordens e os romanos o acompanham para junto de Mim.
OSCIDADÃOSDE EMAÚS
Quando avistam Agrícola, os romanos não se contêm de ale- gria, pois deviam a ele a felicidade do encontro, na Judeia, com o Verdadeiro Deus e Sua Vontade. Naturalmente, começam a relatar
muita coisa; Agrícola lhes diz, porém, ser isso tanto quanto nada, diante do que iriam assistir ainda nesse dia. Admirados, eles lhe per- guntam se está informado da visita esperada dos egípcios.
Ele apenas diz: “Meus velhos amigos, é preciso crerdes fiel- mente no que foi dito, pois tudo se cumprirá, podendo-vos certificar pela chegada daqueles homens!” Entretanto, chega um grupo após outro e, no final, Lázaro e Raphael com os escravos, cuja gracilidade entusiasma os romanos. O anjo, supõem ser um deus.
Agrícola e os outros romanos dizem: “Pode dar tal impressão
— mas não é assim! Não façais perguntas, pois tudo será explicado a tempo!” A uma sugestão dos conterrâneos, todos se dirigem ao al- bergue de Nicodemus, porquanto estavam despertando curiosidade entre os emauenses. Pouco a pouco lá aparecem para ver o que há.
Nicodemus lhes diz: “Amigos, os romanos marcaram uma assembleia importante, na qual somente eu e alguns judeus podem participar. É melhor vos retirardes, porque ouvi dizer de uma ques- tão contra vós!”
Essa advertência produz o efeito desejado, pois os emauenses até viajavam quando se falava da presença de romanos. Juntando-se a nós, Agrícola comenta: “Não sei se fiz bem usando desse ardil para afastá-los por hoje, entretanto julgo que, podendo se alcançar boa fi- nalidade através de um meio não maldoso, não há pecado. Quantas vezes os genitores prudentes se veem obrigados a conduzir os filhos por meio de subterfúgios!”
Digo Eu: “Teu recurso foi nobre e justo e alcançaste bom resultado por hoje! Quem quiser chegar à plena luz vital da Verdade terá que passar pelo terreno de mentira e engano.
Vê, o mundo inteiro, até mesmo o físico humano, são para a alma e o espírito, engano, portanto mentira; mas sem ela, nenhu- ma chegaria à plena verdade da Vida! No fundo, porém, o mundo corpóreo não é engano e mentira, mas plena verdade. Todavia não é evidente, mas oculta, e só pode ser alcançada pela interpretação.
Assim, teu suposto ardil não foi mentira, no fundo, mas ver- dade; aqui se trata, principalmente, da conquista dos pagãos e não
dos judeus, já supridos da justa luz por Moysés. Não a aproveitando, são culpados de se perderem em sua ignorância teimosa. Portanto, falaste certo, dizendo tratar-se de um conselho romano. Neste ins- tante acabam de chegar os mencionados egípcios; avisa os romanos, para que se preparem.”
Nicodemus dirige-se a eles, passando o recado; eles desejam saber quem dera a informação. E ele responde: “Aquele que sabe de muita coisa mais e ao Qual ireis conhecer!”
OSEGÍPCIOS.OJUSTOPROVEITODO ALIMENTO
Os dois romanos se levantam; quando chegam ao limiar da porta, deparam com os egípcios, e o primeiro, que há vários anos impediu a expedição romana, estendendo-lhes a mão diz: “Saú- do-vos como amigos, assim como vos despedi naquele tempo. Por muitas vezes vos recordastes de mim e aqui viestes para pesquisar e descobrir, em vós mesmos, a natureza do homem perfeito. Ainda assim, ignoráveis este nosso encontro.
Eu não vim tanto por vossa causa, mas sim para sermos ba- tizados por um homem através do fogo da Verdade eterna do Seu Espírito. Desde ontem nos anunciou aos Seus discípulos, dizendo que nós Lhe haveríamos de prestar justo testemunho. Aqui veio por- que sabia nos ter atraído pela Sua Vontade Onipotente. Entramos neste albergue para nos curvarmos diante Daquele de Quem somos filhos ineptos!”
Dizem os dois romanos: “Referes-te ao célebre Salvador da Galileia, do qual ouvimos falar coisas estranhas, muito embora não o conheçamos?”
Responde o egípcio: “Sim, Ele Mesmo! Vamos depressa!” Os romanos abrem a porta do grande refeitório e os sete egípcios en- tram com grande respeito, dirigem-se a Mim, curvam-se e o primei- ro diz: “Senhor de Eternidades, aprouve-Te cobrir-Te com a carne de Tuas criaturas! Sê, pois, louvado por todos os seres, porquanto abriste a grande porta que leva ao Reino imenso da Vida!
Quando preenchias o Infinito com o Teu Espírito Eterno e criaste seres sem número e medida, nenhum estava livre de Tua Sabedoria e Poder, e sim algemado pela Tua Vontade. Agora Te al- gemaste a Ti Mesmo na carne do homem, a fim de libertá-lo e con- duzi-lo ao Reino de Tua Existência Divina, eternamente livre. Sê, portanto, louvado e honrado!
Criaste Tuas criaturas tão livres e independentes a ponto de ouvirem Tua Palavra, e tornando-Te Mestre, ensinaste-lhes os cami- nhos pelos quais poderão assemelhar-se a Ti! Por isto, Te honre cada átomo do Teu Infinito, pois também chegou a sua vez de ingressar em uma vida liberta!
Agora, Deus, Criador e Senhor, permite deleitarmo-nos com Tua Face! Ouvi, criaturas e seres: eternidades se passaram e inúme- ros seres Dele surgiram, aos quais Ele fitava como Seus Pensamen- tos retornando a Ele. Jamais, porém, um ser havia visto o Criador Eterno e Infinito. Resolveu agora fazer-Se Ele — o Eterno — entre vós, sem alteração do Seu Poder e Força, Deus em forma humana, e podeis vê-Lo e falar-Lhe, entretanto não compreendeis Quem está em vosso meio! Refleti sobre minhas palavras e em seguida dizei: Ó Senhor, sou eternamente indigno de me encontrar Contigo sob o mesmo teto; dize-me apenas uma Palavra, e minha alma terá recebi- do a Vida Eterna!”
Em seguida, o egípcio cruza as mãos sobre o peito e Me fita absorto, no que é imitado pelos companheiros. Neste momento ninguém se atreve a pronunciar uma sílaba, não tirando os olhos de Minha Pessoa.
Após certo tempo, Eu lhes digo: “Sede sinceramente bem-
-vindos, Meus amigos de terras longínquas! Ireis prestar-Me serviços relevantes, para maior elucidação e fortalecimento das almas desses vossos irmãos. Há dois dias caminhastes sem alimento, suprindo-
-vos pelo espírito; vosso corpo necessita de um real suprimento de frutos desta terra, que vos será proporcionado por pão e vinho!” O egípcio, porém, se desculpa, dizendo ter sido saciado através de Minha Presença.
Digo Eu: “Sei perfeitamente que uma alma plena de espírito não sente a fome física; entretanto, precisa o corpo de alimento na- tural, do contrário não seria instrumento completo à alma. Por isto, necessitais de nutrição adequada, tornando-vos mais fortes em be- nefício de vossos irmãos!” Nicodemus de pronto trata do necessário. Quando os sete egípcios saboreiam pão e vinho, incomuns, não se cansam em louvar sua qualidade, pois constatam fome e sede reais.
O primeiro então diz: “Por várias vezes minha alma sentiu o sabor desse pão e desse vinho, mas nunca minha boca os provara. Neles se condensam todos os elementos vitais numa forma externa, fortalecendo corpo e alma! Quão imenso seria o benefício na esfera da vida interna caso as criaturas soubessem apreciar tal alimento! Nada disto sabem e não enxergam o dia na profusão da luz: pou- co a pouco compreenderão que estão sorvendo, neste alimento, o Verbo Vivo e a Vontade de Deus. Tão logo pudessem discerni-lo e compreendê-lo, seriam criaturas perfeitas; estando longe dessa compreensão, têm que continuar como discípulos, até conseguirem transportá-la à sua alma.”
Todos os presentes estão perplexos com a observação do egípcio; inclusive aos Meus apóstolos se faz sentir um conhecimento novo. Todavia, nenhum se encoraja à menor troca de palavras.
Os três magos conjecturam: “Agora percebemos claramen- te o que nos falta! Que diferença entre nós e os egípcios!” Lázaro se aproxima despercebidamente e diz: “Ó Senhor, a sabedoria des- se homem me desanima! Encontramo-nos na Fonte Original — e quão adiantado está ele!”
Digo Eu: “Não te aflijas; chegareis até lá e mais distante ainda. É preciso ter paciência e dedicação, pois nenhuma árvore cai de um só golpe! Não fiz vir essas criaturas íntegras para vos enver- gonhar, e sim para vosso verdadeiro aproveitamento! Vereis o que podem e de que também sois capazes, caso vos transformardes em homens reais pelo cumprimento de Minha Doutrina. Deixemo-los se saciarem; dois dias não comeram e pouco beberam. Entrementes, Nicodemus poderá cuidar de nossas necessidades!”
Nisto, se aproximam os dois romanos, Agrippa e Laius, acompanhados de Agrícola. Agrippa, romano de descendência ré- gia, se curva e diz: “Senhor, a sensação foi estranha ao ouvirmos o louvor dos conhecidos egípcios! Não fossem tão honestos, poderí- amos afirmar que Tu os conhecias e combinaste seu testemunho a Teu respeito!
Ainda ontem os classifiquei de exemplo vivo de talento e per- feição mais elevados, quando os fariseus ignorantes demonstravam claramente suas tendências perniciosas, porque eu os queria fazer ver seres Tu igualmente homem perfeito, contra o qual nada conse- guiriam pelo uso de armas. Com essas explicações, eu e meu ami- go Laius alcançamos que os templários refletissem um pouco; mas quando poderia imaginar encontrar os egípcios em Emaús e que Tu repetias nossa palestra aos Teus discípulos, precisamente quando eu aqui fazia relatos?!
Daí nós dois concluímos seres Tu indubitavelmente o Verda- deiro Deus e Criador, em Espírito, não obstante Tua apresentação humana. Se não O fosses, pelo Espírito Eterno, sem origem, um outro teria que ser Teu criador, onde resultariam um Deus Eterno e um temporal, coisa impossível, porquanto o Ser Básico de Deus é unicamente a condição de uma força e de um Poder originais, dos quais és Detentor. Assim sendo, aqui vimos para saudar-Te como Senhor, Deus, Criador e Pai dos mundos, dando nosso testemunho de fé diante de Ti e de todos! Perdoa se houvermos praticado qual- quer erro!”
Digo Eu, amavelmente: “Meus caros amigos, quem vir a Mim como vós não terá cometido erro, portanto nada tenho a per- doar! Por enquanto, fazei reserva do vosso conhecimento, pois o mundo não está em condições de compreender verdades tão profun- das! Caso fossem divulgadas, ele cairia num grande aborrecimento, tornando-se mais ignorante e maldoso.
Quando souberdes ter Eu subido aos Meus Céus Eternos, espargirei o Meu Espírito sobre vós e então podereis transmitir, de viva voz, o que acabastes de revelar diante de Mim!
Agora palestremos como simples criaturas, sem diferenças, a não ser que sois Meus discípulos e Eu, vosso Mestre! Não há dis- cípulo perfeito como o Mestre, enquanto se achar no aprendizado; quando tudo tiver aprendido, será tão perfeito como o Mestre. Eu vim expressamente a este mundo para que as criaturas aprendessem a se tornar tão perfeitas como o Pai no Céu.
Sendo destinadas e chamadas a se tornarem filhos de Deus, terão que se tornar semelhantes a Ele, pois não o fazendo, não che- garão à filiação, portanto não alcançarão Deus.
Por isto é Minha Doutrina um real Evangelho, pois transmi- te e demonstra os caminhos pelos quais podem as criaturas alcançar a Semelhança Divina. Quem ouvir, crer, gravar e agir dentro do Meu Verbo atingirá a Semelhança Divina, possuindo a Vida Eterna e a bem-aventurança infinita.”
DESTINODOHOMEM.AENCARNAÇÃODO SENHOR
(O Senhor): “Não deveis imaginar ser isso tão difícil, pois é facílimo; Meu Jugo que deposito em vossos ombros pelos Man- damentos é suave, e seu peso é leve. Mas nos dias presentes de ig- norância teimosa, o Reino de Deus exige violência, e quem quiser possuí-lo terá que fazê-lo com violência. Em outras palavras: é difícil desfazer-se de todos os hábitos antigos e enferrujados, que pela ten- tação e sedução do mundo deitaram raízes profundas no homem, sendo por isso preciso despir-se de sua veste antiga e rota, e adotar um novo homem, surgido de Minha Doutrina.
Quando em épocas futuras as crianças forem educadas no Evangelho, terão que suportar um jugo mais leve, como adultos cheios de boa e firme vontade.
A Minha Doutrina é de fácil compreensão, pois nada exige do homem senão a crença em Um Só Deus, a Quem deve amar
como Bom Pai e Criador, e a seu semelhante como a si mesmo, quer dizer, fazendo tudo que o outro lhe possa pedir razoavelmente. Penso ter todo homem bastante amor-próprio para não desejar que o próximo lhe faça algo de mal — portanto, não o farei tampouco!
Jamais pagueis o mal com o mal, mas fazei o Bem aos inimi- gos, que tereis dado um grande passo para a Semelhança com Deus, que faz surgir o Seu Sol sobre bons e maus! Ira e vingança têm de retroceder em vossos corações, e no seu lugar terão que surgir cle- mência, bondade e meiguice. Onde isto se dá, a Semelhança com Deus não dista muito como meta final de todos.
Mas, como já disse, esta questão não é tão fácil na presente época e custará certo esforço inevitável! Quem lutar com coragem estará certo da vitória e seu prêmio não faltará; o covarde terá o prêmio merecido, ouvindo a voz da consciência: Se tivesses lutado, terias vencido. Como temeste a luta, não podes exigir prêmio de vencedor e és culpado de teu afastamento do campo da vida, sem louros. — Julgo que ninguém deve temer a luta, quando o prêmio de vencedor é alto. Sou Eu Quem vos diz isto e presumo não neces- sitardes de provas mais elevadas, crendo ser Eu Aquele que reconhe- ceis em Mim!”
Dizem os dois romanos: “Senhor, conhecemos muitos co- vardes; nós, que tantas vezes lutamos com a morte, perdemos todo temor! É mau guerreiro quem vai à guerra com medo da morte; e quem a despreza, bem como a dor, é justo herói e vencerá na certa. Senhor e Mestre de Eternidades, falamos certo ou não?”
Digo Eu: “Perfeitamente; mas muitos há no mundo teme- rosos da morte física, preferindo mentira e mistificação para nada sofrerem! Temem os que provocam a morte, sem poderem danificar a alma; todavia, não temem Aquele capaz de poder atirar sua alma no inferno, ou seja, na morte verdadeira e eterna.
Deixemos isto; não vim ao mundo para fazer julgamentos, e sim tornar felizes e vivos a todos que creem e vivem dentro de Minha Doutrina. Ainda assim, haverá muitos que Me chamarão ‘Senhor! Senhor!’
Minha resposta em seus corações será: Por que Me chamais, estranhos? Não vos conheço! Sabendo ser Eu o Senhor e conhecen- do a Minha Vontade — por que não agistes de acordo?
Por isto vos digo: não basta Me reconhecer e crer ser Eu o Senhor; é preciso fazer o que ensino! Somente pela ação o Amor atinge a plena Semelhança Divina.
A aplicação de Meus Mandamentos não será difícil para quem Me reconhecer e amar acima de tudo; quem o fizer Me abriga no coração, portanto, a perfeição da vida, a plena semelhança Co- migo e a Vida Eterna e feliz. Demonstrei rapidamente como são as coisas referentes a Mim e ao homem! Quem agir desse modo terá em si a Vida Eterna!”
AMOR-DEVOÇÃODEDEUS.AVERDADEIRA HUMILDADE
Diz Agrippa: “Ó Senhor, Mestre infinitamente Sábio, quão imenso deve ser o Teu Amor para com Tuas criaturas, a ponto de Te rebaixares aceitando a forma humana, a fim de ensiná-las e demonstrar-lhes os caminhos pelos quais poderão alcançar a Vida Eterna!”
Digo Eu: “Caro amigo, teu desafogo é bom por ser bom o teu coração; ao passo que no teu intelecto surgiu apenas o raiar do dia, pois o Amor de Deus te parece algo tão milagroso devido à ideia que fazes Dele, qual soberano poderoso, que raramente se revela aos comuns e quase não lhes dirige a palavra.
Considerando Deus desse ponto de vista, enganai-vos muito; pois Ele é Criador de todas as coisas e seres, e não imperador orgu- lhoso num trono de ouro, que julga seus súditos vermes abjetos, ameaçando com a morte a quem se aproximasse sem licença especial.
Se todos os seres são obras de Deus, originam-se em Seu Amor, Sua Natureza, e igualmente de Sua Sabedoria mais elevada e divina, que lhes dá e conserva a forma adequada. Se, portanto, jamais poderia subsistir uma criatura sem Amor e Sabedoria Divina
— como te admiras do grande Amor de Deus para convosco?!
Vós mesmos sois puramente amor de Deus e em Deus, e vossa existência é em si apenas amor divino em forma humana, atra- vés de Sua Vontade! Sendo este indubitavelmente o caso, como vos pode extasiar o Amor de Deus ser tão imenso, a ponto de vir como Homem para demonstrar-vos a trilha à vida liberta, como se fos- se surgida de vós mesmos, emancipada e divina?! Acaso não sois Obras de Deus?!
Desde eternidades é Deus Mestre Perfeito no Macrocosmo e no Microcosmo; nunca foi remendão e não necessita envergonhar-Se de Suas Obras. O homem é a criatura mais perfeita de todas, e pon- to culminante do Amor e Sabedoria divinos, destinado a se tornar deus. Como poderia envergonhar-Se de Sua Obra excelente, achan- do-a sem mérito de aproximação?!
Tens que abandonar tais ideias mundanas de Deus! São fal- sas, e além disto não se prestam para te aproximares de Deus, pois te afastariam Dele paulatinamente, e no final nem te atreverias a amá-Lo diante de tamanha falsa veneração! Existem tais criaturas, até mesmo países inteiros que, não obstante as visíveis obras do Amor e da Sabedoria de Deus, alimentam fé errônea e o falso con- ceito de que somente o sumo sacerdote Dele se aproxima em deter- minadas épocas e com certas orações, sob cerimônia de brilho pom- poso. Com tal aproximação, ele se acha tão enaltecido e santificado, que nem um acólito, muito menos um simples mortal, se lhe pode dirigir; julga não poder algum profano se aproximar da Santidade Divina, a fim de não ultrajá-La, surgindo daí pecado tamanho para o ignorante, que merece morte na fogueira. Que cegueira tremenda dos homens!
Olhai-Me! Eu somente sou Senhor de Eternidade — e como Me apresento? Chamo-vos de filhos, amigos e irmãos, e vossa po- sição frente a Mim é a finalidade de todos, não havendo diminui- ção nem enaltecimento! Toda criatura é Minha obra perfeita, que se deve reconhecer e considerar como tal, e não se depreciar e desprezar abaixo de todos os monstros; quem se despreza, sendo Minha Obra, desprezará o Mestre. De que serviria isto?!
Amigo, a humildade no coração da criatura é uma virtude imprescindível, pela qual mais rapidamente poderá chegar à Luz in- terna da vida! Essa virtude consiste especialmente no justo amor para com Deus e o próximo. É a paciência mansa do coração, pela qual o homem reconhece sua primazia, jamais se levantando contra seus irmãos mais fracos, mas os abraça com amor mais forte, pro- curando elevá-los à própria perfeição pelo ensino, conselho e ação. Nisto se baseia a humildade unicamente verdadeira, e nunca no des- prezo de si mesmo.
Eu Mesmo sou de todo coração humilde e manso, e Minha Paciência ultrapassa todos os limites; nunca tereis assistido Eu Me ter desprezado diante dos homens. Quem não se considerar obra justa de Deus não pode respeitar o próximo, nem a Deus dentro da Verdade, mas apenas dentro de um conceito errado.
Assim como é errada a superestimação do homem, tornan- do-se facilmente perseguidor e opressor dos semelhantes, isento de amor — elemento divino da vida — é igualmente errado ele se de- preciar. Demonstrei-vos o motivo, podendo-vos equilibrar no con- ceito justo; pois se manifestardes demasiado respeito e contrição, não seríeis capazes de suportar qualquer ensino.
Considerai-Me, portanto, Homem perfeito que abriga a plenitude do Espírito de Deus, e por isto Se torna vosso Mestre e Doutrinador, e nosso intercâmbio será o melhor e mais útil! Tereis compreendido?!”
Diz Agrippa: “Senhor e Mestre, como não? Pois externaste a verdade simples e pura; mas qual Teu critério dos salmos e orações tão usuais entre os judeus? Acaso não queres ser adorado como Deus Único e Verdadeiro?”
Digo Eu: “Bem disse Moysés: O sábado é um Dia do Se- nhor; neste dia deves abster-te de trabalhos pesados, orando a Deus, teu Senhor, de coração limpo! — Eu, porém, digo ser a partir de ago- ra todo dia Dia do Senhor, no qual o homem justo deve fazer o Bem dentro do Meu Ensino! Quem isto fizer celebra o verdadeiro sábado e ora a Deus constantemente, e Eu terei grande satisfação por isto.
Quem sentir uma falha de conduta deve retratar-se, procu- rando não repetir tal pecado, que será isentado de seus erros. Nin- guém será perdoado por preces, penitências e jejuns enquanto não desistir de seus pecados.
Quem alimentar certas tendências se torna incapaz de ser admitido no Meu Reino da Verdade, pois o pecado faz parte do âmbito da mentira e da mistificação! Assim andam as coisas! — Eis o almoço; deixemos o prosseguimento na Verdade para depois!”
FORMAEESPÍRITODOS SERES
Todos se acomodam dentro da ordem comum, sendo que os sete egípcios na Minha mesa, farta de peixes do Jordão, e Meus com- panheiros não se contêm de satisfeitos. Lázaro e Raphael também se juntam a nós, após terem cuidado dos jovens.
O primeiro egípcio observa com grande agrado o anjo e Me diz: “Senhor e Mestre Eterno! Quando este Teu servo há quatro mil anos palmilhava a Terra, não era tão belo como agora em estado espiritual. Se um dia tiver merecimento de ingressar no Teu Reino, acaso terei aspecto mais nobre? Comparado ao dele, o meu é real- mente feio; serve para nosso clima, mas não é agradável. Sei que neste mundo não se dá valor à forma externa, e sim somente ao aperfeiçoamento da alma; mas no Teu Reino, a situação deve ser outra, do contrário os espíritos puros não se apresentariam de forma tão perfeita e bela! O mesmo se aplica à cor da pele. Desejava saber qual o motivo. Tenho uma leve ideia, entretanto não consigo pene- trar a fundo.
Vejo em minha alma a Terra toda, suas criaturas e condições; conheço a atitude condenável do homem, penetro até centros do orbe, sei dos miríades de espíritos em todos os elementos, bem como a insuflação do Teu Espírito em todos os seres. Até hoje não descobri o motivo das formas variadas na esfera material e principalmente na esfera da criação puramente espiritual. Se nos proporcionasses pequeno esclarecimento, nossas almas se acalmariam.”
Digo Eu: “Caros amigos, muito trabalho e esforço vos custou encontrar a Verdade; numa luta destemida, alcançastes a maior parte da meta final, causa principal da vida.
Quanto aos outros assuntos, mormente os que ventilaste, não se prendem à salvação da alma, que se inteirará de tudo quando renascida em espírito, vindo de cima e unindo-se a ele. Ainda assim darei esclarecimento; o resto vos será dado automaticamente.
Desde épocas remotas, as criaturas produziram instrumentos musicais; os judeus: harpa, flauta, trombone e o címbalo; os gregos: a lira, o pífaro e a harpa. Quando bem afinados, produzem melodia agradável e harmoniosa; assim não sendo, quer dizer, os sons não estando em uníssono, não se pode produzir melodia ou harmonia.
Imagina a alma humana! Estando em conexão boa e verda- deira com o corpo, ela se encontra igualmente na justa harmonia da vida, que lhe dá a beleza, que naturalmente só se apresenta quando a alma, livre da matéria, estiver no Meu Reino. Quem em vida ob- servar com atenção criaturas boas e más perceberá apresentar a boa forma graciosa e amável, enquanto a maldosa não consegue ocultar algo antipático, desagradável, portanto feio. O motivo se baseia na harmonia ou desarmonia interna.
Encontras tais variações nos reinos animal e vegetal. Natu- ralmente se apresentam tais variações de forma marcante somente no Reino dos espíritos, enquanto na vida corpórea apenas são leve- mente assinalados. Se quiserdes analisar-vos oportunamente, encon- trareis o restante com facilidade. Sois sábios e acostumados às forças da Natureza e seus elementos, e com facilidade encontrareis causa e efeito na esfera da inteligência interna da alma. Na perfeição, o ho- mem encontrará essa e outras explicações quando estiver renascido em sua alma através de Meu Espírito. Portanto, não percamos mais tempo e terminemos o almoço para analisar outro assunto!”
Em seguida, Lázaro pergunta qual Meu projeto, e Eu digo: “Vamos acampar na colina, em direção ao Levante; lá assistiremos coisas grandiosas, dentro de vossa compreensão humana.” Todos es- tão satisfeitos, com exceção de Nicodemus, pois aguardava a visita de dois fariseus à tarde.
Por isso ele se dirige a Mim, dizendo: “Senhor e Mestre, vês o meu coração e sabes o quanto desejo estar presente, entretanto sou obrigado a ficar, perdendo grande benefício para a minha alma. Em parte concordo com Teu afastamento da presença das asas negras; todavia, estou triste com o meu prejuízo. Que devo fazer? Acompa- nhar-vos ou ficar para saber do seu desejo? Talvez não seja preciso minha permanência, porquanto tudo Te é conhecido; caso o assunto se prenda à Tua Pessoa, seria melhor eu esperar por eles?”
Digo Eu: “Irás conosco; os fariseus se informarão do nosso paradeiro, indo à nossa procura. Na colina saberão a Meu respeito, pois quero que assistam a tudo, a fim de lhes tapar a boca. Eu pouco ou mesmo nada farei, deixando que sejam tratados pelos dois roma- nos, Raphael e os sete egípcios, e será suficiente para silenciarem. Não Me descobrirão, nem perguntarão por Mim, pois entre cente- nas não é tão fácil sobressair-se.
Não necessitas deixar aviso em casa, porquanto crianças e empregados informarão onde te encontras. Nada receies, pois não te trairão. Serão inspirados por Mim os que devem falar em Meu lugar! Vamos, portanto!”
Satisfeito, Nicodemus deixa ordem aos empregados para le- varem pão e vinho à colina, dentro de três horas. Lázaro, por sua vez, deseja saber qual a ocupação dos jovens ex-escravos. Respondo: “Devem acompanhar-nos em boa ordem, porquanto também terão que colher experiências mais elevadas.”
Dentro em pouco atingimos a colina, cujo topo é coberto de grama, e em direção ao Norte encontra-se o pequeno bosque. No centro da planície há uma elevação de fácil acesso. No pico,
Nicodemus havia construído vasta cabana, de onde se descortinava lindo panorama. Lá Me instalei com alguns discípulos; os demais se acomodam ao redor do penedo, para poderem assistir a tudo que Eu falaria.
Decorrido algum tempo, chamo Nicodemus e lhe digo: “Presta atenção: os dois arquifariseus, acompanhados de alguns le- vitas, aqui chegarão. Será depositado em vosso coração o que ireis falar e fazer: tu, Lázaro, os romanos, Raphael e os egípcios. De Mim nada digais aos ignorantes!” Assim acontece, e em poucos minutos chegam ao cume os anunciados, bastante aborrecidos.
AVISITADOS FARISEUS
Quando avistam Nicodemus, dirigem-se a ele dizendo: “Po- dias ter ficado em casa para receber-nos condignamente, sabendo de nossa chegada! O fato de seres rodeado de grande número de hóspedes, aos quais desejas evidentemente proporcionar uma tarde agradável, servirá de desculpa. Quem são esses estranhos? Haverá uma festa em Emaús, da qual não fomos avisados?”
Responde Nicodemus: “São dignitários romanos, gregos, egípcios e hindus que hoje chegaram ao meu albergue, e eu os trouxe aqui para se alegrarem com o panorama. Desejando maiores infor- mações, dirigi-vos a eles, conhecedores de todos os idiomas!”
Nisto se adianta Agrícola e diz: “Se viestes como espiões do Templo, certamente estais ávidos de novidades, que vos serão da- das! Sou Agrícola, primeiro auxiliar do Imperador e dotado de todas as prerrogativas imperiais! Esses lá atrás são meus acompanhantes, igualmente chefes de Roma. Meus amigos Agrippa e Laius vos são conhecidos. Atrás do penhasco vedes algumas centenas de pessoas; fazem parte de minha guarda pessoal, e os outros homens também mantenho para proteção particular. Lá na frente estão três sábios da Índia, cujo séquito está acomodado nos arrabaldes; também me pertencem. Esse aqui é um jovem cujo poder alcança mais que todos os poderios do orbe. Ao meu lado estão justamente os egípcios mila-
grosos, dos quais os dois romanos vos relataram coisas estranhas on- tem à tarde; aqui vieram para visitar os meus conterrâneos. Sabeis, portanto, nossa identidade e capacidade. Se desejardes conhecer de mais perto os homens perfeitos, dirigi-vos a eles, pois são donos de si mesmos!”
Os fariseus voltam o olhar para a cabana e perguntam quem se achava lá dentro. Diz Nicodemus: “Está escrito não ser útil ao ho- mem saber de tudo, portanto podereis empregar esse princípio em vós mesmos, caso pretendais não aborrecer esses romanos; deduzi de suas palavras não gozar o Templo grande conceito para eles!”
Os fariseus desistem de sua curiosidade e se dirigem ao pri- meiro egípcio, perguntando se é o mesmo do qual os romanos ha- viam relatado coisas incríveis.
Responde o egípcio com voz forte: “Sim! Que desejais de mim, verdadeiros perseguidores de todos que possuem uma cen- telha do Espírito Divino e demonstram aos outros os caminhos da Verdade luminosa e viva?”
Tal reprimenda do egípcio não é do agrado dos templários, receosos de pedir uma prova do poder do outro. Passado algum tem- po, eles se manifestam: “Bom homem, queríamos apenas pedir-te a realização de um milagre, baseado na força de tua fé e vontade!”
Diz o egípcio: “Sim, fá-lo-ei; antes, porém, quero saber quais os motivos importantes que vos trouxeram aqui, pois deveríeis estar em casa para determinardes os preparativos para amanhã, sábado. Em seguida, efetuarei uma prova — não para vossa salvação, e sim para vosso prejuízo!”
Diz um dos fariseus: “Já vi não ser possível ocultar-se algo de ti, por isso falarei abertamente. Na Galileia, pertencente aos judeus, surgiu um profeta que opera milagres, disseminando nova doutrina contra o Templo! Seduz o povo e o instiga contra nós. Diz-se filho de Deus, deixa-se louvar como Messias Prometido, enfrentando-nos com animosidades quando seguimos as Leis de Moysés. Sabemos perfeitamente ser filho de um velho carpinteiro, que como sua mãe, era criatura comum. Esse profeta nos perseguindo, justifica-se nossa
atitude idêntica. À noite passada apuramos ele se encontrar perto de Jerusalém e que Nicodemus saberia seu paradeiro. Eis o motivo de nossa presença!”
Diz o egípcio: “Que faríeis caso o capturásseis?”
Diz o fariseu: “Seria entregue à justiça para descobrirmos seus crimes. Caso tenha infringido as Leis do Templo — do que estamos plenamente convictos — será condenado à morte.”
OEGÍPCIOREVELAOSPENSAMENTOSDOS FARISEUS
Diz o egípcio: “Sou ainda perfeitamente natural e possuo os dons de Deus pelos quais o homem, ponto final do aperfeiçoamento da Criação, se torna senhor da Natureza, seus espíritos e elementos, de sorte que tenho grande poder. Sei de todos os fenômenos mine- rais, vegetais e animais, desde seu surgimento até a futura desinte- gração total, inclusive todas as relações morais, teosóficas e gover- namentais, e entendo todos os idiomas, até mesmo dos irracionais, sem jamais tê-los aprendido. Tudo isto me foi ensinado pelo meu espírito, dado por Deus, desde a idade de dezenove anos.
Por isso vos digo terdes de há muito vilipendiado os Livros de Moysés, levados pela inclinação dominadora de ócio, luxo, impu- dicícia e adultério, criando novos estatutos com os quais martirizais o próximo, incutindo-lhe carga insuperável, que não tocais nem de leve, porque não tendes fé. Se tivésseis — como tinha vosso patriarca Abraham — os profetas não teriam sido apedrejados, como enviados por Deus para demonstrar o quanto vos desviastes de Seu Caminho.
Eis que aparece o mais elevado e último Profeta, justamente na época predita. Ele ensina a Verdade e aponta serdes filhos não de Deus, mas do demônio, em virtude de vossos pecados contra a Vontade Divina. É compreensível isso vos encher de ódio, razão por que tratais de matá-Lo.
Eu, sábio estrangeiro, afirmo ser isso possível e realmente re- alizado, com a Permissão Dele. Conseguireis apenas matar o Seu Corpo; Seu Espírito Eterno e Onipotente despertá-Lo-á em três
dias. Felizes os que Nele crerem; ai dos mistificadores, traidores e opressores dos homens! Dar-se-á com eles o que vistes ontem no Firmamento! Compreendestes?!”
Retruca um fariseu irritado: “Como te atreves a lançar-nos em rosto tamanha injustiça? Acaso desconheces nosso poder?”
Diz o egípcio: “Digo-o por saber de vossa completa nulidade e da plena verdade do meu poder inalterável diante de um grande exército. Disse-vos apenas a Verdade. Por que não a quereis aceitar? Por serdes filhos do demônio. Não me alteram vossas fisionomias enraivecidas; a causa disso vos será demonstrada por um milagre. Vedes no alto vários condores?”
Todos acompanham a direção e percebem doze dessas aves de rapina, e um fariseu diz: “Que há com eles?”
Diz o egípcio: “Foram por mim chamados para demonstrar o que pode um homem verdadeiro. Farei com que desçam para poder- des vê-los melhor!” O egípcio faz apenas um sinal com a mão direi- ta; e os condores se projetam para a colina e rodeiam os templários. Assustados, eles pedem que as gigantescas aves nada lhes façam, pois agitam constantemente as asas enormes.
Diz o núbio: “Tendes tanto medo deles? Como não temeis Aquele que pode muito mais que eu? Como sois tolos, ignorantes e cegos, e igualmente maus e vingativos! Isso jamais se daria com um sábio, muito embora pudesse condenar nos tolos sua maldade e atirá-los num julgamento severo. Que sucederia a mim caso vos mandasse estraçalhar por essas aves obedientes? Nada!
Julgais eu poder vos liquidar, porque sois em número de quatro. Mas, que aconteceria se um exército me atacasse? Faria o mesmo que fiz convosco. Experimentai dar um passo somente ou fazer uso de vossas mãos! Deixo liberdade apenas à vossa língua; quanto ao resto, assemelhai-vos a estátuas de sal, destino da mu- lher de Lot.”
Os templários tentam mover-se, mas em vão. Por isso pe- dem ao núbio que os liberte desse estado, pois estão dispostos a mu- dar de ideias. Diz ele: “Não o creio; entretanto, estais livres!” Voltan-
do a se mover, um deles obsta: “Com tal poder incrível poderias te tornar soberano do mundo inteiro, não havendo quem se opusesse!”
Diz o egípcio: “Não sou tolo como vós; faço questão apenas do verdadeiro conhecimento do Deus Único, Sua Graça e Amor Vivos, e que possa reconhecer a Sua Vontade para executá-La estri- tamente — o que vale mais que todos os tesouros da Terra!
Se assim fizésseis, teríeis maiores vantagens que ouro e pra- ta. Enquanto Salomon não ocupava o trono nem salas de ouro, era sábio e poderoso. Uma vez rodeado pelo brilho, perdeu sabedoria e poder, inclusive a Graça Divina. De que adiantam ao fraco suas ri- quezas imensas, se no final começa a duvidar da Existência de Deus?!
Todavia, era Salomon muito melhor que vós, não obstante suas dúvidas. Foi sua tendência para o luxo e a volúpia que desagra- dou a Deus; pois Salomon não O considerou, não obstante Jehovah lhe ter aparecido por duas vezes, advertindo-o do mau caminho. A consequência foi a divisão do seu grande reino, ficando o seu filho na pequena área em volta de Jerusalém. Até mesmo esta Graça foi concedida a Salomon por causa do seu pai, David. Quanto a vós, não recebereis Graça nenhuma, mas sucumbireis no charco dos inú- meros pecados e de vossa incorrigibilidade completa.”
PUNIÇÃODE BARABE
Diz um dos fariseus: “Como podes afirmar isso? Por que de- veríamos ser pecadores tão renitentes a ponto de não nos regenerar- mos?! Faze com que vejamos a verdade e que o profeta da Galileia seja realmente a salvação dos judeus, que acreditaremos nele!”
Diz o egípcio, apontando os doze condores: “Essas aves de rapina acreditarão antes que vós! Acaso Ele não pregou por várias vezes no Templo, operando os maiores milagres?! Por que não Lhe destes crédito? Despertou apenas ira e vingança! Se assim é, como afirmais estardes à procura da verdade?! Pergunto-vos: quem melhor do que Ele Mesmo poderia demonstrá-la? Não acreditando Nele — em quem quereis acreditar?”
Diz o templário: “Às vezes uma testemunha desperta mais crédito do que o próprio profeta!”
Contesta o núbio: “Desde Moysés, todos os profetas testifi- caram Dele, e atualmente tendes muitas testemunhas vivas. Foram apedrejadas e à última decepastes a cabeça!
Estais apavorados porque, como estranho, provei o que pode um homem perfeito; mas diante do Primeiro e Maior — o Próprio Deus — não tendes medo, porque vos trata como Seus filhos den- tro do seu Amor, Paciência e Misericórdia?! Todavia vos asseguro, eu, homem perfeito, nada sou perto Dele, pois unicamente Ele é o Senhor de minha e vossa vida e salvação.
Vossa ira e vingança contra Ele jamais diminuirão. Vede minhas aves! Sempre que me refiro a Ele, elas curvam as cabeças
— enquanto no vosso coração aumenta o ódio inextinguível! Elas vos envergonham pela sabedoria e dignidade; vós afundais no lodo da perdição. E ainda alegais poder melhorar, caso reconhecêsseis a verdade? Como pode o cego ver e compreender a luz, se não a possui?! Tampouco podeis compreender a verdade, porque nunca a alimentastes.
Quem quiser assimilar a Verdade terá que ter surgido da Ver- dade. Desde vossos antepassados, fostes filhos da mentira — como, pois, podeis compreender a Verdade mais sublime e santa?! Por isso, tereis o prêmio de vossos pecados!” Nisso, as aves começam a se agitar em volta dos fariseus, que, apavorados, pedem novamente ao egípcio impedir qualquer reação.
Diz o egípcio: “Vossa carne miserável seria péssima até para elas. Vede lá embaixo Barabe, rico cidadão de Jerusalém, que deixou sucumbir uma pobre família anteriormente a serviço dele. Por certo tempo permitiu que morassem naquela miserável choupana; como sua enfermidade se prolongasse, não havendo esperanças de cura, alegou querer restaurar a cabana, dando ordem de despejo.
Eis que veio o profeta onisciente, por vós odiado, visitou o casal cujos filhos desnudos pediam pão sem recebê-lo — conquan- to esse lugarejo fosse padaria de quase toda Jerusalém — deu-lhes
saúde, alimento e roupas, e aquele romano os tirou de seu catre. Lá estão eles, plenamente supridos pelo profeta!
Como sacerdotes de Deus, nada mais fizestes do que con- jecturar, dia e noite, no vosso antro de perdição, a maneira pela qual seria possível aniquilar esse benfeitor!
Com que animais ferozes poderia comparar-vos? O cidadão Barabe é mau; vós sois mil vezes piores! Pois ele será grato ao profeta por ter limpado o catre; em vós, o ódio oculto cresce, por ele vos ultrapassar em Força, Poder e Misericórdia! Por isso, Barabe será menos punido que vós!
Vede os condores! Como sois imprestáveis para seu alimen- to, devem nutrir-se no rebanho de Barabe, no que serão ajudados por lobos e ursos! Assim o quero!”
Nem bem termina de falar, as aves se levantam e se atiram sobre o rebanho e cada uma ergue uma ovelha, carregando-a num voo direto às montanhas. No mesmo instante se percebe quantidade de lobos e ursos que acabam com o restante do grande rebanho, en- quanto os pastores fogem rapidamente. Estupefatos, os templários não se atrevem a pronunciar palavra.
PROMESSADOS FARISEUS
Vira-se o egípcio para os templários, dizendo: “Agradaram-
-vos essas provas?” Mas ninguém se anima a falar, pois, conscientes de seus crimes, seu pavor é grande. Por isso ele prossegue: “Infames mistificadores! Tendes medo de mim porque dei essas provas; entre- tanto, quereis prender e matar Aquele por cujo Poder e Força me foi possível realizá-las! Tolos! Quem é mais: o Senhor ou o servo, o Mestre ou o discípulo? Tremendo diante de mim, como subsistireis diante do Seu Semblante?”
Respondem eles, acanhados: “Falaste acertadamente; mas não nos cabe culpa se é essa a situação do Templo perante o profe- ta da Galileia! É uma grande potência mundana contra a qual di- ficilmente se pode lutar! O profeta não conseguindo modificar os
estatutos do sinédrio, qual seria nossa força?! Na melhor das hipó- teses, poderíamos desistir de nosso apoio ou, então, deixar o Tem- plo, voltando à vida privada. Tu bem poderias modificá-lo, inclusive seus adeptos.”
Diz o egípcio: “Conheço vossos subterfúgios e também estou informado de vossa ação direta contra o maior dos profetas. Afirmo-
-vos dentro da eterna Sabedoria de Deus, em mim: o grande Mestre, pleno do Espírito de Deus, de Seu Poder e Força, não deseja levar as criaturas ao caminho da Luz e da Vida por meio de sinais, e sim através de Sua Doutrina pura e sábia, porquanto as provas obrigam à fé Nele e em Seu Verbo; nunca, porém, proporcionam a convicção livre e interna da grande Verdade. Enquanto ela faltar ao homem — apenas conseguida pelo fiel cumprimento de Sua Doutrina — é ele psiquicamente morto. Pois a simples fé, cega e obrigatória, não fa- culta vida interna e verdadeira, mas unicamente a fé viva e luminosa provinda da ação.
O grande Mestre da Galileia, ciente do que serve à verdadeira salvação de Suas criaturas, opera apenas alguns milagres diante do mundo, preferindo ensinar-lhes a Vontade de Deus, estimulando a sua ação. Provas, Ele só dá quando não prejudicam a alma.
Por esse motivo, não quer coagir o Templo; caso não desista de sua animosidade, será entregue, inclusive os adeptos, ao julga- mento e à perdição. Gravai-o bem! Pois Deus não permite gracejos, porquanto Ele Mesmo destina as criaturas a uma felicidade eterna, segundo o Seu Próprio Rigor.
Fosse o homem algo sem importância, Deus não o teria or- ganizado tão sábia e artisticamente, de sorte a ser ele a obra máxima da Criação total; além disto, não lhe teria dado uma alma capaz de se tornar idêntica ao Criador tão logo o queira, e de mais a mais, não Se teria dirigido aos homens para ensinar-lhes a Sua Vontade, Suas Intenções e qual a meta final.
Refletindo a respeito e considerando vossa vida falha, deveis confessar terdes sempre agido contra a Vontade Divina, razão por que odiais e perseguis o grande Mestre da Galileia. Entendestes?”
Respondem os fariseus: “Sim, não resta dúvida teres falado a verdade; infelizmente, porém, nada alteraríamos no Templo caso comunicássemos tudo que aqui vimos! — Aliás, não permitimos que nos tolham a língua, e não mais seremos oponentes do Galileu; pois percebemos o que pode o homem conhecedor dos caminhos de Deus e possuindo vontade rigorosa. Analisaremos a doutrina do Mestre e adotá-la-emos como norma de vida. Estará bem assim?”
Adianta-se Raphael e diz: “Então tereis que reparar muita maldade aplicada à pobre Humanidade. Assim não fazendo, não haverá perdão para vossos pecados, pois as criaturas não vos perdo- ando, Deus não o fará!”
Diz um fariseu: “Que teríamos feito de mal? Agíamos es- tritamente pelas Leis do Templo; do resto, não sabemos qual nos- so delito.”
Diz Raphael: “Esperai um pouco. O pessoal de Nicodemus traz a merenda. Mais tarde provarei vossas ações.”
Retruca o templário: “Podemos esperar; mas duvido to- marmos a merenda, pois não foi muito agradável o que afirmaste. Realmente, houve sérias opressões por parte do Templo, por nós ordenadas como chefes do mesmo. As Leis já existiam muito antes de nós. Se prejudicamos alguém pelo cumprimento da Lei, desejava saber se nos cabe reparar qualquer dano!”
Diz Raphael: “Já vos pedi um pouco de paciência, até ter- mos tomado o repasto. Depois responderemos.”
Todos se servem, com exceção dos fariseus, e um deles obs- ta: “Um judeu pecador tem que jejuar, orar, fazer penitência rigoro- sa e abster-se de alimentos. Nada comeremos até sermos informados dos nossos pecados.”
RAPHAELREVELAOSCRIMESDOS FARISEUS
Após Raphael ter-se alimentado, aproxima-se dos quatro templários e diz: “Já terminei e prontamente vos tirarei do sonho da justiça! Desculpastes-vos com a alegação de não terdes sido autores
das rigorosas Leis do Templo; quem, entretanto, vos autorizou a en- viardes asseclas disfarçados entre o povo a fim de tentar as criaturas contra Deus e o Templo, através de subterfúgios e seduções varia- das? Tão logo alguém se deixava tentar, era denunciado perante vós, não perdíeis tempo em mandar prendê-lo e, caso fosse rico, deveria pagar multas consideráveis. Seus rebanhos, criação de aves caseiras, estoque de trigo, vinho e dinheiro serviam de resgate dos pecados; se porventura tivesse filha bonita, tinha de oferecê-la ao Templo ou, então, pagar grande soma em dinheiro. Não foi isso pecado que brada aos Céus?!
Ultimamente, vossa astúcia apurou-se! Resolvestes mandar diretamente os carrascos às famílias de algumas posses, açambarcan- do tudo, com a alegação de terdes sido informados de uma infração qualquer, e quem se opusesse seria castigado! Tal proceder se encon- tra em alguma Lei mosaica?
Informados de alguém com dotes físicos, sabíeis levá-la ao adultério, e todo mundo sabe qual vossa atitude com tais infelizes. Em suma, nem em Sodoma e Gomorra se davam coisas idênticas às do Templo, entretanto afirmais terdes agido dentro da Lei instituída por Moysés?!
Acaso sois capazes de justificar vosso comércio sanguinário com mulheres estéreis nas fronteiras da Judeia e porventura desconhe- ceis os salteadores a vosso serviço, que por várias vezes, disfarçados em guarda romana, açambarcavam os tesouros de ricas caravanas?!
Tal ação não consta da Lei, e sim ser obrigação aplicar-se justiça aos estrangeiros e deixá-los seguir em paz quando não forem inimigos. Se como judeus empregastes tamanhas injustiças contra radicados e estrangeiros — como pretendeis repará-las?
Como esperais perdão dos que por vós foram mortos física e espiritualmente, e como restituireis os bens roubados a tantas pesso- as radicadas e estrangeiras como resgate dos seus pecados falsamente atribuídos?!
Que direis se eu acrescentar que vós e vossos predecessores vos empenhastes em perseguir e aniquilar os profetas em virtude de
suas advertências contra vossos crimes, avisando ao povo quanto aos falsos princípios egoístas do Templo, motivo por que também pro- curais exterminar o maior de todos os profetas, pois testifica contra vós, como eu e os egípcios?! Justificai-vos perante mim, que sou mensageiro do Senhor desde Eternidades!”
Replica um fariseu: “Pode ser; entretanto, não compreendo como podes ter alcançado tamanho saber, com tão pouca idade! Aprendeste com o grande profeta a nos denunciar, sem que jamais tivéssemos dado prejuízo a ti!
Acusaste-nos perante os romanos de crimes e injustiças que bradam aos Céus, impossíveis de reparo; se consideras as condições mundanas em que vivemos, saberás não ser possível nadar-se contra a maré, pois cada um tem que virar o manto de acordo com o vento.
Através do discurso do egípcio milagroso e de tua polêmica vibrante, convencemo-nos, pela primeira vez, de uma vida superior no homem. Quem tiver tal convicção conscientemente dentro de si não sente dificuldade de falar e agir na Verdade. Assistimos, pela pri- meira vez, fatos comprovantes da realidade das profecias de Moysés e outros — e assim reconhecemos nossa infração contra a Humani- dade! Não existe meio de repararmos nossos erros, inclusive a trans- missão ao Templo e a todos os fariseus daquilo que aqui concluímos.
O Senhor no Céu saberá por que nos castigou por tanto tempo com cegueira tão tremenda; por isso, julgo Ele não nos con- denar pela queda no abismo. Faremos tudo que for possível, com todas as forças e meios.
Procuraremos influenciar o sinédrio na desistência da per- seguição ao grande profeta, não mais compartilhando do Alto Con- selho; se por isto ele desistir — eis outra questão! Segundo vossa afirmação a respeito dele, não terá motivo de receio do Templo. Falei honestamente e cabe a ti fazer juízo.”
Diz Raphael: “Nada posso opor contra a tua defesa; têm as criaturas perfeitas um poder, fatal para vós, pelo qual vemos teus pensamentos mais íntimos, em desacordo com tuas palavras!”
Obsta um fariseu: “Como é isso possível? Quem poderia falar contrariamente aos pensamentos, se cada palavra é de certo modo pensamento manifesto?!”
Diz Raphael: “Deveria ser assim, mas convosco tal não se dá, nem nunca foi! Se tuas palavras expressam teus pensamentos íntimos, terás dito a verdade; externando uma confissão contrária ao teu sentir, pronunciaste uma mentira que podes incutir a criaturas como tu, mas não de nossa espécie, capazes de ver e ouvir pensa- mentos alheios!
Foste sincero no tocante à desistência da perseguição ao gran- de profeta e no reparo do mal, se possível for; isto, porém, porque nos tomais, inclusive o profeta, por prestidigitadores e não enviados de Deus. Vosso pavor de nós vos leva a concordar. Eu afirmo sermos reais mensageiros de Deus e o grande profeta da Galileia não é pro- feta, e sim Aquele predito por eles!
Se Nele acreditásseis, poderíeis obter o perdão; não crendo nem aceitando Sua Doutrina para empregá-la em vida, o pecado fi- cará convosco, inclusive a morte eterna. Unicamente Ele é o Senhor, como disseram todos os profetas, e por isto pode absolver os peca- dos de quem O procura. Como suposto mago, não vos perdoará os muitos crimes!
Demonstrarei vosso falso conceito crendo-nos feiticeiros. Vede se tenho algo mais que essa veste leve! Que desejais que faça, apenas com minha vontade? Escolhei algo de bom e verdadeiro, portanto razoável!”
Após algum tempo, os dois respondem: “Bem, produz uma figueira real, com frutos, que exista por muitos anos! Queremos pro- var os figos!”
Diz Raphael: “Consta: Não deves experimentar a Onipotên- cia Divina, mas servir a Deus! Tratando-se de demonstrar a diferen- ça entre um mago e um homem que age pelo Espírito Divino, vosso pedido será efetuado! Onde deve ficar a figueira?”
Diz o fariseu: “Lá, à beira da colina onde se vê uma pedra!”
Acrescenta Raphael: “Muito bem! Quero que se apresente o vosso desejo naquele local! Que assim seja!” Os fariseus e levitas se apavoram com o milagre, a ponto de não pronunciarem palavra. O anjo lhes diz: “Ide saborear os frutos para julgardes se são reais!”
Retruca um deles: “Poderoso mensageiro de Jehovah, ve- mos a força da Onipotência Divina no homem! Que Deus nos per- doe o ultraje à Sua Majestade! Não temos coragem de provar o fruto tão milagrosamente criado, pois seria insistir no erro!”
Protesta Raphael: “Oh, não sois tão beatos assim! Rece- ais que os figos vos prejudiquem, por isto não quereis saboreá-los! Outros o farão primeiro!” Imediatamente Nicodemus, José de Arimatheia e alguns outros se dirigem para a árvore, colhem vá- rios frutos e os provam com prazer. Animados, os fariseus os imi- tam, louvando o aroma especial. Em seguida voltam para junto de Raphael, fitam-no dos pés à cabeça e dizem: “És realmente um ser humano ou espiritual?”
Responde o arcanjo: “Atualmente sou humano, mas não como vós, simples formas humanas semivivas, longe da perfeição. Que mais quereis que vos demonstre?”
Respondem os fariseus, algo mais esclarecidos: “Jovem amá- vel, inspirado por Jehovah qual Samuel e David — basta-nos essa prova! Estamos arrependidos de ter expressado um desejo, que cer- tamente ultrajou a Deus. Como criatura agraciada por Ele, podes realizar tudo pela vontade.
Temos a impressão de seres igualmente construtor da gran- de coluna milagrosamente surgida. Para Deus, o Criador, tudo é possível; e em ti age Sua Força e Poder e basta quereres, para fazer surgir teus pensamentos!”
Diz Raphael: “Está bem, confirmo vossa suposição de ser eu o autor da coluna a caminho de Jerusalém. Prova ser o espírito do homem soberano de todas as forças da Natureza ativa nos elemen- tos, pois sem o espírito, provindo de Deus e agindo como tal, não existiriam; assim sendo, tudo lhe é possível dentro das normas eter- nas da Ordem Divina.
Antes de chegar a tal capacidade, ele terá que se apossar da Vontade Divina pelo rigoroso cumprimento desta Vontade revelada por Moysés e os profetas, a ponto de não lhe ser possível agir senão pela Manifestação da Vontade do Pai no coração — coisa fácil para quem reconhecer a Deus e O amar acima de tudo; porquanto o Amor de Deus aumenta a sua força, à medida que o homem pratica este sentimento pelo Amor Divino.
Tão logo se tiver unido a Deus, é ele pleno do Espírito Di- vino inteiramente ativo no homem, por ser a sua vontade nova não mais a manifestação do fraco querer da carne, e sim a Vontade po- derosa e pura de Deus.
O detentor de tal vontade fará evidentemente tudo que quiser!
Por isto, não vos admireis dos grandes milagres efetuados pe- los antigos profetas. Como simples homens, eles faziam milagres tão pouco quanto vós; sua conduta limpa desde o berço, porém, lhes garantia a Presença do Espírito de Deus, de sorte que Ele Mesmo operava os milagres, enchendo seus corações com a Luz da Sabe- doria Divina, e tudo que proferiram era a Própria Palavra de Deus.
Eu — e mais alguns presentes — estamos plenos do Espírito e da Vontade de Deus; tudo que Ele em mim quiser se realiza. Se eu quisesse dizimar a Terra toda, tal aconteceria, do mesmo modo que agora destruirei a rocha saliente na cordilheira.
Observai naquela direção o mencionado penhasco, cuja des- truição não trará prejuízo, porquanto obstrui as florestas do proprie- tário. Assim o quero — e ele deixou de existir! Sua massa colossal se encontra no fundo de um mar imenso, a mil dias de viagem!”
Dizem os fariseus admirados: “Mas não vimos ele ser trans- portado pelo ar!”
Replica Raphael: “Também não vistes germinar e crescer a figueira! Tudo se realiza dentro da Vontade de Deus, pois Espaço e Tempo não O afetam! Sendo de Sua Vontade que tudo surja numa ordem sucessiva, conforme observais em a Natureza, tal será a me- dida aplicada; pois Espaço e Tempo surgem igualmente de Sua Von- tade e Ordem!
O cedro às vezes necessita de séculos para atingir sua altura e força máximas, enquanto o trevo conclui seu crescimento em pou- cos dias. O raio que surge da nuvem precisa de alguns átimos para chegar ao solo, provando ser tudo realizável ao Espírito de Deus. Compreendestes?”
Respondem eles, atônitos: “Sim, à medida que isto seja pos- sível a homens de tamanha cegueira; a incrível velocidade da realiza- ção da Vontade Divina na criatura é algo inconcebível! Cá e lá, a um só tempo — não entra num cérebro humano!”
Diz Raphael: “Por que não? Porventura não sois capazes de vos imaginardes em vosso lar?”
Responde um fariseu: “Sim, mas sem efeito algum!”
Confirma o arcanjo: “Claro, por não estardes unidos ao Es- pírito de Deus que tudo preenche, penetra e aciona! Ele Se encontra no âmago de vossa alma, porém isolado do Espírito Total, em virtude de vosso fraco amor a Deus lhe fornecer alimento reduzido; assim, não consegue estender-se na alma; mas nela penetrando, inundará todo vosso ser, quer dizer, não no tocante ao espaço propriamente, mas na esfera da ação da vontade, que nela existe tanto quanto em Deus, pelo Qual foi depositado como fagulha de vida indestrutível, no coração da alma.
Estender-se na esfera da vontade significa ter a alma subme- tido a sua vontade à de Deus, deixando-se reger por Ela.
A alma permitindo a penetração da Vontade Divina até o âmago, através do conhecimento e cumprimento da Mesma, essa mesma Vontade de Deus desperta o Espírito Divino repousante na
alma. Prontamente ele se une à Vontade da alma dominada por ele, estabelecendo-se a união em tudo, assim como em Deus, não obs- tante em grau infinitamente mais elevado; podemos fazer um para- lelo com os olhos aparentemente iguais, todavia possui um, força de penetração mais forte que o outro.
Atingindo esse estado, o pensamento do homem, pelo qual ele se projeta a um local mais afastado que for, não é inócuo, mas representa lá a identidade realizadora de um homem perfeito. Vê e ouve tudo, porque penetra e rege tudo através da vontade eterna, sem perder sua independência individual. Assim sendo, ela pode tudo re- alizar como pensamento pleno do verdadeiro Espírito de Deus.
Enquanto o homem não tiver alcançado este estado feliz e unicamente verdadeiro, só consegue realizar pensamentos e ideias através de seu físico numa função natural. O pensamento em si nada mais é que teu reflexo num espelho — sem individualidade, força e poder, ainda assim te diz poderes estar num momento num local mui longínquo, não obstante sem efeito, conforme afirmaste.
Compreenderás, portanto, como me foi possível soltar aquela rocha da cordilheira tão afastada e fazê-la submergir no fun- do de um mar distante!
Não vos dei essa prova para atemorizar-vos ou coagir-vos à aceitação da nova doutrina, aliás a mais antiga — mas unicamente para demonstrar-vos o justo caminho à conquista da força verdadei- ra e perfeita da vida de Deus, sem a qual o homem é considerado psiquicamente morto, pois não se terá unido à Vontade Divina.”
AEVOLUÇÃO HUMANA
(Raphael): “Com vossa vida templária inteiramente falsa, desviastes-vos de Deus e nessa marcha vos afastareis cada vez mais! Esperais um Messias mundano que vos liberte da submissão odiosa dos romanos, tornando-vos novamente um povo poderoso e temi- do; tal Messias jamais virá!
Veio Ele, o Prometido e Verdadeiro, na Pessoa do Galileu: quer fundar um Reino espiritual e devolver o Paraíso perdido, figu- radamente o conhecimento completamente perdido de Um só Deus e de Sua Vontade, e nada disto quereis, perseguindo o Mais Santo dos Santos, Deus, pretendendo prendê-Lo e matá-Lo.
Julgai vós mesmos se com tal proceder podereis atingir o es- tado de um homem verdadeiro e perfeito! Respondei-me!”
Diz um fariseu: “Tens razão em tudo, e percebemos a nos- sa culpa do afastamento da verdadeira meta da vida humana. Ao mesmo tempo se nos depara a nossa perdição, pois o Templo não mudará suas ideias, devido à cegueira tremenda, apresentada pelos sinais no Céu vistos ontem à noite.
Quanto a nós, aplicaremos todos os esforços para caminhar- mos na trilha demonstrada; nosso grêmio compõe-se de milhares, piores do que nós, e jamais tal luz os iluminará. Que será deles, permanecendo em sua maldade renitente?”
Responde Raphael: “Chegou a oportunidade que durará mais algum tempo. Quem vier de livre e espontânea vontade será aceito; quem não vier, persistindo em sua cegueira, sucumbirá. A ninguém será obrigada a Doutrina para a conquista da vida interna, pois não seria útil à alma. É dada ao homem a vida natural nesta Terra — a interna, ele terá que conquistar independentemente.
Digo-vos: o segredo e a necessidade da vida interna e per- feita estão de tal maneira próximos e claros, que nem o Sol poderia concorrer! Entretanto, não são de grande proveito, em virtude da liberdade e da determinação própria da alma, por ser o homem de natureza ociosa e inativa; tal, porém, é indispensável; do contrário, ele não teria oportunidade de despertar à vida, para tornar-se, desse modo, mestre independente de sua existência real.
A maioria das criaturas desta Terra não se deixa despertar do sono doce, ao menos para saber quão maravilhoso aponta o dia. Prefere dormir até metade do dia e, se realmente acorda, aborrece-se com a luz que a impede de prosseguir no sono.
Pergunto, em Nome do Senhor: a quem devo comparar tal gênero humano? Os animais têm sua época de repouso e de sono. Quando acordados, tornam-se ativos, dentro de sua espécie, como as formigas e abelhas cuidando do futuro, devido ao instinto. O homem se apraz em seu ócio, não obstante toda revelação, porque tem livre vontade, indispensável, preferindo noite e treva completas à luz, a fim de poder se entregar ao sono mortal, cada vez mais agradável.
Que poderá fazer Deus, impedido de influenciar com a Onipotência, na vida de uma criatura, ou animal e planta a fim de não criar, de uma existência independente e livre, outra submetida à condenação — a não ser o que fazem pais cuidadosos com sua prole dorminhoca?
Experimenta despertar os pequeninos por meio de ruídos; não querendo deixar o leito, é preciso pegar do relho e aplicar-lhes algumas chibatadas que, de modo eficaz, apontam a hora de levantar e de se entregarem aos afazeres do dia.
O mesmo faz — como sempre fez — o Senhor com as cria- turas! Chama seguidamente por elas, através de Seus mensageiros iluminados, a fim de que despertem no dia claro; os filhos não lhes dão atenção, chegam até a insultá-los, pondo-os porta a fora e, às vezes, lhes provocam dano. Eis que vem o Pai em Pessoa e diz em voz alta: Meus filhos, o dia está claro; levantai-vos e entregai-vos aos afazeres cotidianos!
Eles então fingem despertar — como os israelitas em tem- pos de Moysés — para se dirigirem às suas obrigações. Nem bem o Pai abandona a sala de dormir, os filhos desconsideram a chamada, entregando-se ao sono, dormindo mais profundamente que dantes.
Novamente o Pai envia mensageiros para verificarem se os filhos já deixaram o leito. Quando voltam, relatam: Pai, Teus filhos dormem mais do que nunca! Vamos impedi-lo, do contrário sucum- birão todos. É preciso usar do relho!
O Pai aparece novamente com o relho; e alguns filhos sal- tam do leito de morte, com medo do castigo; vestem-se e, ainda atordoados, vão cuidar dos afazeres, reclamando do Pai. A maioria
espera o açoite a fustigar, cai numa ira cega e se atira contra o Pai, para estrangulá-Lo. Que merecem tais filhos?”
Dizem os fariseus: “Ai deles! O Pai ofendido Se enraivecerá, expulsando-os e jamais os reconhecendo como Seus filhos. Peram- bularão quais cães no estrangeiro e no deserto entre pagãos ásperos, prestando, cá e lá, serviços de miseráveis escravos. Quem terá pie- dade deles?”
Diz Raphael: “Somente o Pai, caso voltem a Ele arrepen- didos; quem assim não agir, Ele não mandará procurar e admitir à volta, mas os deixará na miséria até que esta os obrigue ao retorno.
Fazeis parte dos que se deixam despertar e enxotar do leito em pleno dia, com muito esforço, por parte do Pai e com recla- mações vossas. Estando, pois, fora do leito, não volteis para lá e continuai em campo aberto no Dia do Senhor, que Ele vos amará e ajudará na obra do aperfeiçoamento de vossa vida. Retornando ao antigo estado, sereis entregues a carrascos inclementes, como sejam: pobreza, dificuldades, miséria, cegueira, abandono, dor e desespero! O homem abriga os Sete Espíritos de Deus que lhe preparam a Vida eterna e feliz. Ao mesmo tempo acolhe os sete elementos do inferno, provocando a morte eterna e seus martírios. É Verdade de Deus o que acabo de vos falar. Aceitando-a, vossos pecados serão remidos, alcançando a perfeição da vida de vossa alma.”
DIVERSIDADEDOSDONS ESPIRITUAIS
Em seguida, se expressa o outro fariseu: “Jovem inspirado por Deus como foi Samuel! Caso alcançássemos a perfeição da vida psíquica, chegaríamos igualmente à força interna demonstrada por ti e pelos egípcios?”
Responde Raphael: “Não há perfeição vital sem ligação com a força interna, pois uma deriva da outra. Todavia existe variação nos dons espirituais dados por Deus, à medida da peculiaridade interior, a fim de que os espíritos felizes se possam servir uns aos outros, de acordo com o seu amor a Deus e ao próximo.
Por isto, um recebe no aperfeiçoamento da alma o dom da previsão; outro, da sabedoria expressa; outro, da invenção e pro- jeção; outro, a força de vontade; outro, a força do amor; outro, o poder do rigor; outro, da paciência; um outro, o especial dom da misericórdia e outro, o da humildade — até o Infinito prevalecem os dons de modo diverso, para socorro recíproco; em caso de necessida- de, cada um possui todas as qualidades, podendo agir dentro delas.
Se, porém, não alcançardes, digamos, o meu dom, no final do aperfeiçoamento da vida psíquica, podereis atingir um outro qualquer para servirdes ao próximo como acabo de fazer. Quem ti- ver conquistado Graça ou dom especial num grau mais elevado não ficará isento dos demais.
Isto podeis perceber nos talentos, capacidades e qualidades das criaturas desta Terra. Existe o bom orador, o pintor, cantor, ma- temático, mecânico, construtor, alfaiate, tecelão, químico etc., cada qual dotado de qualidade especial. Além dessa, é ele aquinhoado de outras capacidades, muito embora em grau menor, podendo desen- volvê-las até à perfeição.
Sendo tal variedade tão visível no mundo, é de se supor ser ela muito mais incisiva nos dons espirituais dados aos psiquicamente aperfeiçoados, pois sem ela não haveria possibilidade de bem-aven- turança verdadeira e viva.
O caminho até a perfeição é igual para todos, e semelhante à irradiação da luz solar e da queda da chuva. Analisa, porém, os efei- tos infinitamente variados de ambos nos minerais, vegetais e animais. Havendo variabilidade infinita no campo físico, tanto maior é ela no Reino perfeito dos anjos felizes. Assim foi determinado pela Sabedoria e o Amor de Deus, a fim de aumentar a felicidade dos espíritos.
Por isso, não indagueis se ides receber os meus dotes pelo aperfeiçoamento da alma, e sim caminhai com humildade e amor na estrada luminosa, que percebereis nitidamente quais os dons al- cançados do Espírito de Deus!
O corpo humano possui igualmente partes e membros va- riados, todos ativos dentro de sua função especial; acaso já ouvistes
alguma queixa entre eles, a ponto de a mão esquerda reclamar por não ser a direita, ou o pé preferindo ser a cabeça, os olhos preferindo ser os ouvidos, e vice-versa?!
Quando inteiramente sadio o corpo, todas as partes e mem- bros estão satisfeitos com sua posição, finalidade, qualidade e não desejam trocar de espécie alguma.
O mesmo se dá nas criaturas e espíritos que, no todo, per- fazem um homem! Uma parte faz papel de olhos — são os videntes; outra, os ouvidos — são os auditivos; uma outra as mãos — os ativos; outra, o coração — os poderosos no amor; outra, o estôma- go, os aceitadores do Bem e da Verdade de Deus, alimentando a sociedade; outra, igual ao cérebro, os sábios que organizam a socie- dade — e assim, do ínfimo ao mais elevado, até ao Infinito. Cada membro, por mais simples, e cada fibra individual da sociedade são, a seu modo, perfeitamente poderosos, felizes e participantes das ca- pacidades e qualidades da comunidade total; assim como teus pés participam da luz dos teus olhos, e estes, da capacidade dos pés. Teus olhos se alegram em serem transportados com o corpo para lá onde vislumbram novos milagres e coisas, passando tal satisfação ao intelecto e ao coração. Tal alegria é transmitida ao pé como se fora ele mesmo a visão, a audição, o pensamento e o sentir. Meditando a respeito, certamente estarás satisfeito com os dons do Espírito de Deus casualmente alcançados. Tereis todos compreendido?”
Atônitos com a sabedoria de Raphael, os fariseus respon- dem: “Celeste Samuel! Compreendemos perfeitamente! Terias rece- bido tal conhecimento do grande e sábio Galileu?”
Responde o arcanjo: “Tudo, somente por Ele!” Concluem eles: “Temos enorme desejo de vê-lo! Não somos adversários, mas amigos arrependidos. Aponta-nos seu paradeiro, para externarmos nossa gratidão. Deixaremos o Templo para segui-lo.”
Em vez de responder aos fariseus, Raphael chama Lázaro e Nicodemus e só então se vira para os primeiros: “Conheceis este ho- mem especialmente perseguido por vós, porque não se prontificava às vossas exigências?”
Respondem eles: “Oh, conhecemos muito bem o rico Láza- ro; indenizaremos seu prejuízo de nosso próprio bolso, à medida do possível. Sobrecarregamos o seu albergue no Monte das Oliveiras com uma maldição, registrada no Templo; só poderá ser paga por grande resgate, para ser riscada do Livro negro. Daremos a Láza- ro a importância de nossa fortuna particular e ele poderá apagar a maldição!”
Vira-se Raphael para Lázaro: “Concordas com a proposta?”
Responde ele: “Pois não, muito embora aceite a boa vonta- de como obra realizada, portanto sou vosso amigo. Além do mais, confesso ter sido vossa maldição antes benefício que prejuízo, pois todos os forasteiros me procuravam quando informados pelos pu- blicanos estar o meu albergue em mau conceito no Templo. Diziam o seguinte: Os demais hospedeiros da cidade, invejosos da melhor e mais vantajosa hospedaria no Monte, certamente fizeram intrigas no Templo, pagando até mesmo alguns tributos. Este será o motivo por que lhe daremos preferência.
Assim, vossa maldição foi benéfica e não tenho motivo para aborrecer-me; igualmente não é preciso apagar a maldição do Livro, porquanto me prestou grande serviço.
De mais a mais, convém considerar que pode acontecer o que aconteceu a vários: resgataram a maldição; um ano mais tarde, e às vezes antes, o Templo descobria motivo para proferir outra, e o prejudicado tinha que pagar dobradamente. Pois vosso regulamento reza: Quando a maldição estiver apagada, e o Templo impuser ou- tra por determinado motivo, esta revigora a primeira, havendo duas maldições a resgatar. Deste modo, a questão pode ser levada até à décima maldição.
A fim de fugir de tais despesas inúteis, deixa-se constar a pri- meira, mormente não trazendo prejuízo, e torna-se cidadão romano
— e o Templo pode, vez por outra, somar a importância no Livro Negro, imaginando-a dentro do armário de oferendas!
Pelo fato de me quererdes dar o dinheiro de vosso bolso, fa- zeis caridade a pobres, anônimos, porque a maldição me é utilitária. O mesmo podeis fazer com a importância que pretendeis pagar-me pelo dano praticado; pois, Graças ao Senhor, fui mil vezes recom- pensado. Se assim é, podemos continuar os melhores amigos!”
Diz um dos fariseus: “Ótimo, pois aqui já assistimos a coisas estupendas e puramente verdadeiras, ao passo que todo sacerdócio é demoníaco. Abandonaremos sua instituição — como o fizeram outros — para vivermos dentro de nossa convicção íntima.
Este jovem e divino amigo poderá atestar nossa firme von- tade; desejamos apenas conhecer e falar ao célebre Galileu para recebermos alguma orientação, a fim de apressarmos nosso aper- feiçoamento.”
Diz Lázaro: “O jovem amigo, fiel mensageiro do Senhor, já vos disse e demonstrou o necessário para tal fim; nem Deus Mesmo poderia acrescentar algo mais!”
Diz um templário: “Amigo, tens razão porque só pode ha- ver uma verdade; mas ver apenas esse grande Homem de Deus, no qual se começa a crer, deve despertar confiança maior do que uma palestra com seu servo e discípulo. Não é simples curiosidade de nossa parte, pois sentimos despertar um amor forte para com ele. O jovem deve saber onde se encontra o Santo de Deus; ainda que estivesse na Galileia, para lá seguiríamos no seu encalço.”
Obsta Lázaro: “Ele já doutrinou no Templo; nunca O vistes?”
Respondem eles: “Bem sabes que o Alto Conselho não apa- rece no átrio destinado ao povo; por isto, somente soubemos de sua presença e dos milagres.”
Insiste Lázaro: “Sei perfeitamente terem muitos fariseus, es- cribas e decanos falado com Ele, revoltando-se porque lhes apontava suas injustiças e mistificações na frente do povo. Estranho, portanto,
a determinação do Alto Conselho de prendê-Lo e imediatamente matá-Lo! E vós, os primeiros chefes depois do sumo sacerdote, não O teríeis visto e falado?!”
Diz o fariseu: “Exatamente, e digo mais: caso o Salvador aqui se encontrasse, não o reconheceríamos, a não ser ele se apre- sentando. No íntimo, tomávamos esse jovem Samuel por ele; entre- tanto, duvidávamos por ouvir dizer estar ele com trinta anos. Temos realmente grande desejo de conhecê-lo!” Lázaro silencia, pois vê que Eu venho saindo da cabana.
OSENHOREOS FARISEUS
Como Lázaro não lhes dê atenção, os fariseus se viram no- vamente para Raphael e dizem: “Por que não podemos saber do paradeiro do Salvador?”
Nisto Me aproximo deles e digo: “Aqui estou, o Bom Pastor de Minhas ovelhas, e não fujo quando lobos se aproximam de Meu Rebanho; pois essas ovelhas são Minhas. Não sou empregado a fugir quando vê o lobo entre o seu rebanho, pois aquele foge por não se- rem suas as ovelhas. Que lhe importam as posses do patrão?!
Eu sou o Próprio Senhor, amo as Minhas ovelhas por serem Minhas, e elas Me conhecem e ouvem a Minha Voz.
Sois igualmente pastores; mas as ovelhas não são vossa pro- priedade. Bastas terdes sua lã, que não vos interessa se as ovelhas tosquiadas forem estraçalhadas por lobos ou ursos; pois a carne das ovelhas não é vossa.
Infiltraste-vos como lobos vorazes entre este Meu Reba- nho; mas como Bom Pastor, não fugi abandonando Meu Rebanho. Antes que isso fizesse, daria Minha Vida por ele. Faríeis o mesmo com o vosso?”
Responde o fariseu: “Senhor e Mestre, até então não o tería- mos feito; agora, após termos usufruído a Graça imensa de te conhe- cer em pessoa, daríamos a nossa vida pela segurança de tuas ovelhas! Até hoje fomos lobos em pele de cordeiro. Aqui recebemos grande
esclarecimento, modificando nossa índole, com desejo de nos tor- narmos teus discípulos. Em nossas diretrizes templárias regem mor- te e julgamento; em tua doutrina, luz, vida e força invencível, do que temos provas inconfundíveis.
Por isto, tomamos a firme resolução de abandonar o Templo e adotar os teus ensinos para alcançarmos, talvez, o mínimo grau de aperfeiçoamento. Para tanto, desejávamos conhecer-te pessoalmen- te. Perdoa os nossos inúmeros e grandes pecados, mormente os que jamais poderíamos reparar. Quanto aos outros, tudo faremos para resgatá-los!”
Digo Eu: “Estaria tudo bem, se não tivésseis pecado tão ines- crupulosamente! Tais crimes constantes contra Deus, o próximo e até mesmo contra a própria Natureza enfraqueceram vossa alma a ponto de torná-la tão disforme, que muito esforço vos custará até conseguir aparência humana.
Realmente ignoráveis, em vossa cegueira orgulhosa, o que fa- zíeis, merecendo alguma atenuante; nunca vos faltaram advertências insufladas em vosso coração, que diziam: Teme a Deus e não faças injustiças aos homens! — Nada disto foi considerado e cada um ensinava ao outro: É mais prudente agir com rigor dentro das nor- mas estabelecidas, do que entregar-se a sentimentos de misericórdia, sendo alvo de deboche dos maiorais!”
Acabrunhados, os dois fariseus respondem: “Senhor e Mes- tre, penetrando o nosso âmago, certamente analisaste nosso estado verdadeiro; justamente por isto desejamos conselho teu, pois sabemos te ser possível tudo. Nossa confiança é plena em tua ajuda, e estamos prontos a fazer o que recomendares para melhorar a nossa alma!”
OSTRÊSGRAUSDAEVOLUÇÃO ESPIRITUAL
Digo Eu: “É muito mais fácil fazer-se promessas do que cum- pri-las! Ainda estais muito presos ao mundo e aos seus tesouros, nos quais se prende o sangue de viúvas e órfãos, o que consiste num abismo quase intransponível!
Todavia, sendo tudo possível para Deus, há igualmente pro- babilidade para as criaturas mundanas e pecadoras renitentes mo- dificarem-se em breve e de modo eficaz, quando fizerem, cheias de fé e confiança em Deus, o que aconselha a Sabedoria Divina. O homem tem que operar verdadeiro milagre em si mesmo por uma súbita transformação de sua vontade, isto é, na abnegação total de si mesmo, referente às suas antigas fraquezas, hábitos, desejos e paixões maldosas, que se infiltram na alma pelos espíritos impuros e não fermentados da Natureza, tornando-a poluída e desfigurada.
Enumerei vossas paixões variadas; enchei-vos de firme von- tade de abandoná-las e segui-Me! Se fordes capazes disto, em breve chegareis a um aperfeiçoamento interno; a não ser desse modo, será muito difícil!”
Dizem os fariseus: “Quanto à vontade rigorosa, não haverá dificuldade, pois se tínhamos vontade para o mal, por que não no cumprimento do Bem?”
Digo Eu: “Falastes certo! Acontece encontrar a vontade para o pecado auxílio na tentação e paixão carnal, enquanto o homem não encontra assistência para o Bem dentro do seu físico, e sim so- mente pela fé em Deus Verdadeiro, mormente no amor para com Ele e na esperança do cumprimento total de Suas Promessas.
Quem, portanto, conseguir lutar e vencer todas as paixões de seu corpo, pelo amor a Deus e ao próximo e a firme esperança em Deus, ter-se-á tornado soberano da Natureza em si, pois pelo domínio do próprio eu, já se encontra no primeiro grau do aperfeiçoamento real e interior, conquanto não esteja isento de tentações variadas.
Se conseguir firmar uma forte união com o espírito através de todos os sentidos físicos, que destarte se dirigem unicamente àquela força, prova isto que o espírito de Deus penetrou totalmente a alma, encontrando-se a criatura no segundo grau do aperfeiçoa- mento interno.
Neste, ela conquistou força e independência vital do poder, apenas agindo dentro da Vontade Divina, sem cometer jamais peca- do algum; pois, tornando-se pura, tudo lhe é puro.
Não obstante, porém, ser soberano perfeito da Natureza total e ter a convicção lúcida de jamais poder errar, porquanto todas as suas ações são guiadas pela verdadeira Sabedoria de Deus — o ho- mem continua somente no segundo grau de aperfeiçoamento.
Existe um terceiro, ou seja, máximo. Em que consiste e como alcançá-lo?! Do modo seguinte: sabendo o homem perfeito poder fazer tudo sem pecar, como poderoso senhor da Natureza, manterá sua força e poder de vontade com humildade e meiguice, e por amor a Deus, nada fará até que tenha recebido Ordem direta por parte Dele. Isto, no entanto, não deixa de ser tarefa difícil, porquan- to reconhece, em sua sabedoria plena, poder fazer apenas o Bem.
Um espírito mais penetrante percebe haver grande diferen- ça entre sua vontade divina, porém isolada dentro de si, e a libérri- ma, infinita e total Vontade de Deus, razão por que submete a sua à Vontade de Jehovah, agindo de próprio esforço somente quando recebe ordem Dele. Quem isto fizer terá alcançado o terceiro grau, ou seja, o mais elevado do aperfeiçoamento da vida. Neste estado estará plenamente unido a Deus; possuirá força e poder máximos, no Céu e na Terra, que jamais lhe poderão ser tirados.
Ninguém, todavia, atingirá o mais elevado grau — onde se encontram os arcanjos — antes que tenha alcançado o primeiro e o segundo.
Cada arcanjo tem o poder de efetuar, de momento, tudo que Deus Mesmo fez; ainda assim, nenhum fará algo por si, a não ser que tenha recebido incumbência por parte de Deus. Por isto, os mais elevados arcanjos pedem constantemente que Deus os mande agir quando deparam com certas dificuldades, mormente nas cria- turas desta Terra.
Vede este jovem! Acha-se no terceiro grau da perfeição da vida e sua vontade é tanto quanto ação efetuada! Todavia, nada faz por ele, e sim somente o que Eu quero. Se lhe disser: Faze por ti e para ti!, ele obedecerá, demonstrando o que pode.”
Dizem os fariseus: “Senhor e Mestre, ouvimos tanto as difi- culdades quanto as vantagens da conquista do aperfeiçoamento da vida, e nada nos deterá para o seu cumprimento. Caso for necessária a mutilação física e dolorosa, estamos prontos a aceitá-la!”
Digo Eu: “Tal seria a maior das tolices; pois quem quiser ven- cer um inimigo terá de enfrentá-lo em campo aberto, e não entrin- cheirar-se atrás de baluartes. O adversário percebendo as fortalezas, desiste por certo tempo do ataque aberto, pois reconhece não estar à altura do defensor; entretanto, ele o sitia e chama a si reforços de todos os lados. Quando bastante forte, ataca o adversário e o vence com facilidade.
Suponhamos o inimigo nada conseguir enquanto o outro fi- car dentro de sua fortaleza, o que, com o tempo, se torna impraticá- vel, sendo obrigado a pisar o terreno aberto. Qual será sua sorte num ataque direto do inimigo oculto? Digo-vos: será muito mais difícil enfrentá-lo do que se o tivesse feito pela primeira vez e abertamente.
Bem pode o homem se afastar do mundo e viver como os eremitas de Carmel e Sion, que não olham mulheres e se alimentam de raízes, frutos, mel silvestres e alfarrobas. Não possuem bens, nem pais, mulheres e filhos, nem vida sexual. Habitam em cavernas para não serem tentados pela beleza dos campos floridos; não conversam, a fim de evitar o pronunciamento de algo que pudesse causar abor- recimentos ao próximo.
Sob tais condições de vida, tolas e abstratas, e na preservação da possibilidade do pecado, cumprem eles as leis de Moysés; mas em favor de quem? Respondo: não é útil para eles, tampouco para o seme- lhante! Deus deu ao homem força, disposição e capacidades variadas, não para abafá-las numa ermitagem qualquer, e sim para se tornar ativo dentro da Vontade Divina revelada, servindo a si e ao próximo.
Jamais Deus falou: Deves mutilar-te e castrar-te, a fim de não seres tentado pela mulher e te abstenhas da impudicícia e adul-
tério! Mas disse a Adam, quando lhe entregou Eva: Multiplicai-vos e povoai a Terra! E no livro de Moysés consta: Não deves praticar obscenidade, nem impudicícia; não deves desejar a mulher do pró- ximo, nem adulterar!
É, portanto, necessário ao homem agir dentro do mundo e resistir às suas tentações de livre e espontânea vontade. Com isto fortifica a sua alma, e o poder do Espírito de Deus a penetrará. Agindo como um animal preguiçoso, jamais chegará à vida eterna e verdadeira, em si a atividade máxima e mais perfeita em todas as camadas e esferas.
Criaturas reclusas pecam tanto quanto uma pedra; acaso há mérito nisto?! A alma terá que despojar-se de seu corpo mutilado; que fará no Além em sua fraqueza e inação totais?
Aparecerão provações de toda espécie para animá-la à vida ativa e real, e tais provações serão as mesmas que as terrenas, porém mais fortes, porquanto tudo que a alma pensa e quer se apresenta como realidade!
Aqui, ela só lida com pensamentos e ideias invisíveis, mais fáceis de serem vencidos e desfeitos; quando se tornam realidade efetiva — como vencerá a alma o seu mundo autocriado? Se aqui o simples pensamento na mulher do próximo desperta paixões arden- tes no homem, como será sua situação se o pensamento faz surgir aquela criatura, embora aparentemente?!
Por isto, serão as tentações no Além muito mais fortes que aqui. E qual será o meio pelo qual a alma consegue livrar-se da prisão tenaz de sua própria paixão?! Ainda assim, ela terá que se emancipar, a fim de se libertar do labirinto de pensamentos, ideias e imaginações; pois enquanto não puser mãos à obra, não receberá ajuda através da Misericórdia de Deus ou de algum espírito, como acontece na Terra.
Porque aquele que não procura Deus com rigor, mas segue os prazeres do mundo, perderá Deus sem receber Dele qualquer pro- va, pela qual saberia o quanto se afastou do Pai. Somente depois de ter começado a procurá-Lo por livre iniciativa e necessidade Deus Se
aproximará à medida do rigor aplicado pela criatura. Por isto, certa inatividade beatífica não terá valor para Mim!”
ARREPENDIMENTOECONTRIÇÃO VERDADEIROS
(O Senhor): “Quem Me disser: Senhor, Senhor! — estará longe do Reino de Deus. Quem, no entanto, crer em Mim e fizer o que ensinei alcançará o que lhe foi prometido e demonstrado, per- cebendo somente pela ação que as Palavras por Mim proferidas não são humanas, mas realmente divinas, pois são a expressão do Amor, da Luz, da Força e da Vida. Expressam igualmente a Minha Von- tade. Quem a aceitar e a praticar terá a vida eterna em si, vivendo eternamente, mesmo se morresse centenas de vezes.
Se já sentirdes rigor tão forte em querer, o mais breve possí- vel, atingir ao menos o primeiro grau do aperfeiçoamento interno, voltai aos lares, distribuí vossos tesouros supérfluos entre os pobres, e em seguida acompanhai-Me, que encontrareis o caminho — to- davia mui longo — para o Reino de Deus! Como Meus seguidores, deveis andar tão simplesmente vestidos como Eu e Meus verdadeiros discípulos. Não necessitais de bordão, nem bolso, nem manto e tú- nica, mas unicamente um coração bondoso e franco; do resto, o Pai no Céu cuidará!”
A este conselho, os fariseus e os levitas expressam perplexi- dade e um deles diz: “Senhor e Mestre, admito teres falado com verdade e justiça; considera, porém, nossas mulheres e filhos, neces- sitados de certos cuidados. Tão logo tivermos resolvido esse assunto, distribuiremos o supérfluo para seguir-te com prazer.”
Digo Eu: “Acaso são eles melhores que as viúvas e órfãos, aos quais açambarcastes tudo, atirando-os na pior miséria?! Se hoje se veem obrigados a trabalhar duramente para o seu sustento, enquanto vossas mulheres e filhos nadam no injusto supérfluo e tão orgulhosas são, que cospem onde aqueles procuram trabalhar honestamente — não haverá injustiça se vossos familiares, ao menos uma vez na vida, sentirem necessidades e assim chegarem ao conhecimento útil para
suas almas daquilo que fizeram aos outros, cognominados de genta- lha que não merece receber os raios do Sol!
De maneira alguma vos quero influenciar para tanto, pois vossa vontade é tão livre quanto a Minha. Pedindo conselho quanto ao mais breve aperfeiçoamento de vossa alma — foi este o mais justo e verdadeiro.
Já vos avisei antecipadamente ser mais fácil fazer promes- sas do que cumpri-las. Digo mais: quem não abandonar, em Meu Nome, casa, campo, mulher e filhos longe está de merecer-Me; e quem puser a mão no arado do Reino de Deus e, entretanto, ainda se virar para as coisas do mundo não se presta para tal Reino! Estais informados; fazei o que vos agrade!”
Diz o fariseu: “Mas, Senhor e Mestre, teus amigos Lázaro, Nicodemus e José de Arimatheia são muito mais ricos do que nós! Por que não lhes fazes as mesmas exigências?”
Digo Eu: “Entre os bens deles e os vossos há uma diferen- ça enorme! Seus bens são rigorosamente justos e de família, e os tesouros, realmente régios, são produto do zelo desinteressado e da Bênção dos Céus de Deus; além disto, são os referidos amigos sustentadores quase únicos de muitos milhares atirados à pobreza e mendicância por vossa culpa. São, portanto, administradores verda- deiros de Deus na Terra e dos bens confiados, por eles considerados dádiva do Alto, pela qual estão incumbidos de zelar.
Porventura dá-se o mesmo convosco?! Eles deveriam ser mui- to mais ricos, e também o seriam de modo justo e agradável para Deus caso não lhes tivésseis tirado a metade pela astúcia, traição e violência. Assim engordastes, enquanto eles se viram obrigados a fa- vorecer os pobres mais parcamente. Teria sido esta ação do agrado de Deus e poderia Ele abençoar vossos bens?! Acumulastes a bênção do inferno, pois se a divina estivesse convosco, Eu vos poderia informar!
Por isto não vos compareis a eles, nem aos três romanos, igualmente riquíssimos; sua riqueza é justa! São benfeitores de mui- tos milhares e recebem a Bênção plena, não obstante serem pagãos; como tais, acham-se muito mais próximos de Deus que vós.
De ricos como vós digo, de Meu Poder e Força divinos, como já disse a um vosso semelhante: Mais fácil um camelo passar pelo fundo de uma agulha, que tal rico entrar no Reino de Deus! Compreendestes?”
Respondem os fariseus: “Reconhecemos perfeitamente a veracidade de Tuas Palavras e resolvemos seguir o teu conselho; pedimos-te, porém, a necessária força e justa coragem! Só agora per- cebemos quão difícil é para a alma livrar-se do poder do inferno. Se Tu, Senhor e Mestre poderoso, não ajudares ao prisioneiro, ele o será para toda Eternidade!”
Digo Eu: “Falastes certo; por isto, tereis que restituir todo níquel injustamente conquistado! Se não o fizerdes, não podereis ingressar no Reino de Deus, como nenhum outro nas mesmas condições!
Sendo impossível reparardes o dano aos prejudicados, dividi tudo de boa vontade e coração entre os pobres e sem receio do mun- do, que todos os pecados vos serão perdoados, podendo seguir-Me! Será fácil vos informardes do Meu paradeiro. Custar-vos-á luta fer- renha; mas quem luta com justiça e prudência vencerá, e uma vitória certa merece o esforço. Disse-vos tudo e não vos podeis desculpar de ignorância. Tudo dependerá de vossa vontade e prudência.”
PRUDÊNCIAEPRECAUÇÃO JUSTAS
Diz um fariseu: “Segundo tuas palavras, devemos usar pre- caução e cuidado na distribuição de nossas riquezas?”
Digo Eu: “O que disse vale por toda Eternidade; pois este Céu e esta Terra desaparecerão, Minhas Palavras — jamais!
Alguém executando a melhor das ações, porém tolamente, não terá valor porquanto não atingirá o Bem. Quem quiser fazer o Bem ao próximo não o faça diante dos olhos do mundo e não se deixe elogiar em público, e sim aja ocultamente, de tal forma que a destra quase não perceba a ação da sinistra, pois Deus, que vê o mais oculto, compensará tais obras com Sua Bênção!
Acaso seria prudente entregardes vossos bens ao Templo, a fim de que os distribuísse entre os necessitados? Se bem que vos elogiasse perante o mundo, os pobres não teriam benefício!
Procurai um intermediário consciencioso e tereis agido da melhor maneira; vosso nome será desconhecido, preservar-vos-eis do louvor mundano e os pobres terão o que precisam! É melhor fundar com pessoa honesta uma instituição caritativa dentro de me- dida, finalidade e necessidade justas, do que dar grande importância a um ou outro; tal poderia provocar orgulho no homem já humilde, fazendo com que sua alma se perdesse.
Fácil será encontrar tal intermediário. Posso apontar-vos cin- co, aqui mesmo: Nicodemus, José de Arimatheia, o amigo Lázaro, o hospedeiro do Vale de Bethânia e o tavoleiro da grande hospedaria na estrada principal, perto de Bethlehem.
Deste modo, demonstrei-vos igualmente este caminho; caso os vossos familiares passarem privações, serão prontamente atendi- dos pelos acima mencionados, encontrando abrigo de Meu Agrado para corpo e alma.”
Dizem os fariseus: “Senhor e Mestre, agradecemos-te por este conselho! Ainda hoje será aproveitado em parte, e o resto no pri- meiro dia após o sábado. Tiraste-nos um grande peso do coração. Que achas se dividíssemos entre os cinco nossas riquezas, a fim de facilitar a partilha?”
Digo Eu: “Depende de vós, pois ambas as ideias se justifi- cam.” Satisfeitos, os fariseus se põem em contato com os homens por Mim mencionados.
Os dois escribas se aproximam de Mim e dizem: “Senhor e Mestre, que faremos? Nossa fortuna é pequena herança; entretanto, desejamos imitar os chefes, caso permitas acompanhar-te.”
Digo Eu: “Agi à vontade. Vede, porém, Meus velhos discí- pulos: têm bens e família — ainda assim, abandonaram tudo por causa do Reino de Deus e Me seguem! Podeis fazer o mesmo.
Acrescento mais: os pássaros têm ninhos, as raposas seus covis; Eu, fisicamente, um filho do homem desta Terra, não te-
nho posse particular que Me desse o meio de repousar a Mi- nha Cabeça.”
Dizem eles: “Todavia é o Céu o Teu Reino, e esta Terra o escabelo para Teus Pés!”
Aduzo: “Isto vos foi insuflado pelo espírito e não pela men- te! Continuai nesse conhecimento e enchei-vos de paciência, que facilmente chegareis à perfeição interna da vida! Procurai falar par- ticularmente a Lázaro!”
VISÃOESPIRITUALDOS EGÍPCIOS
Nisto se aproxima Nicodemus e diz: “Senhor, eu Te agrade- ço! Através da conversão plena desses dois chefes, vejo-me livre de grande pavor!”
Digo Eu: “Deixemos esse assunto. Repousarei um pouco e, em seguida, darei nova prova aos dois, com que se firmarão na fé integral em Minha Pessoa!”
Em seguida, entro na cabana e descanso meia hora; convi- do, porém, Pedro, Jacob e João a procurarem os sete egípcios e lhes transmitirem os princípios do Evangelho, preparando-se para um milagre que por Mim seria operado.
Os três apóstolos são bem recebidos; Pedro, todavia, se admira muito por estar o primeiro egípcio informado de todos os Meus Ensi- namentos e até mesmo conhecer muito de Minha Adolescência; Jacob e João, que cresceram junto Comigo, têm que fazer jus ao núbio.
Intimamente, Pedro conjectura: “Bela peça nos pregou o Se- nhor! Devemos passar-lhes o Evangelho, quando o conhecem mais a fundo que nós três. Por que fez Ele isso?”
Diz o egípcio, que percebe o pensamento de Pedro: “Caros irmãos, o Senhor sabia que muita coisa tinha caído em esquecimen- to de vossa parte; por isto, aqui vos mandou para uma ligeira pales- tra, a fim de que vos fosse restituído o conhecimento.
Lê-se em vossos livros o seguinte: Os que estão com o Senhor perderam certas coisas. Eis que vieram estranhos de terras longín-
quas e devolveram aos filhos as pérolas e pedras preciosas de inesti- mável valor. Por isso, o Senhor é muito amável igualmente para com os estranhos e os recebe nos lares de Seus filhos.
Queridos irmãos, esse incidente que vos parece sem impor- tância fora previsto há muito pelo Senhor; e como tudo que os pro- fetas Dele disseram, do mais insignificante ao mais elevado, se deve cumprir, essa pequena profecia não podia deixar de aparecer.”
Diz Pedro: “Caro amigo, dize-me como te inteiraste de tudo isso!”
Responde ele: “Quando teu espírito e tua alma se tiverem unido — o que vós todos, como Seus escolhidos, podereis aguardar em breve — percebê-lo-eis claramente; a alma ainda muito presa ao corpo não o assimila nem compreende.
Não só conheço o que consta em vossos livros, mas igual- mente os antigos escritos dos egípcios, persas, hindus, chineses e do velho Meduhed, junto aos japoneses. Em suma, o que existe na Terra, do Polo Norte ao Sul, me é tão familiar como tua cabana de pescador perto de Capernaum, onde o Senhor já efetuou tantos milagres e, ainda assim, só uma minoria acredita Nele, por serem comerciantes, agiotas, e usurários. Sei, portanto, o que se relaciona à Terra; acima dela, minha visão é algo fraca.
Diferencio estrelas fixas e planetas e sei calcular seus trâmi- tes, pois desde menino estudei a antiga geometria egípcia, e tenho dentro de mim a certeza de serem os planetas idênticos à nossa Ter- ra; não consegui até hoje penetrar espiritualmente até lá. O Senhor certamente me dará tal capacidade, fazendo-me mui feliz.
Vós já recebestes Dele a mais perfeita explicação e ensino. Também são do meu conhecimento, de sorte a nada me faltar quan- to às noções do Céu estelar; desejava poder ver tudo isso com os próprios olhos, como vejo a Terra. E aqui, eu e meus colegas rece- beremos tal Graça; só então serei perfeito pela compreensão mais apurada da eterna Grandiosidade do Senhor.”
Diz Pedro: “Amigo, se sabes o mesmo que nós, para que de- sejas mais? Crer firme e indubitavelmente não é o mesmo que ver em espírito?”
Responde ele: “Em parte tens razão, mas não inteiramente. A fé firme e inabalável da alma desperta na criatura aspiração total, ligada à esperança de poder ver realmente o que crê. No crescimento da força e firmeza da fé aumenta a ânsia e o desejo de ver o que se crê, podendo gozar o maior prazer na vida. Vê, amigo, por isso a visão está acima da fé pura, pois ela é a coroa eterna da crença!”
Diz Pedro: “Tens razão; mas o Senhor não é mui generoso com o dom da visão. Proporcionou-nos certos momentos visioná- rios, nunca, porém, se concretizaram em estado permanente.”
Diz o egípcio: “Todavia, prometeu-vos por diversas vezes, e essa capacidade vos será dada quando renascidos em espírito. Além de tudo, não devemos conceber o assunto como se nada mais tivés- semos que fazer, a não ser fitar constantemente as maravilhas de Sua Criação. Temos que cumprir determinadas obrigações por amor a Ele e ao próximo, não sendo de utilidade a visão espiritual. De longe em longe deve a criatura entregar-se ao descanso, e então lhe será concedida a visão, quando ao menos poderá praticá-la. Tal estado constante só lhe será dado após a morte. Concordas?”
Responde Pedro: “Plenamente, apenas estou perplexo como chegaste a tal sabedoria profunda em vossa terra selvagem. Quem foi teu professor?”
Diz o egípcio: “Na maior parte, eu mesmo, pela constan- te procura e pesquisa! Além disso, foi meu pai matemático em Memphis, Thebas e Diathira, e dele aprendi tal ciência. Mais tarde, iniciou-me nos grandes segredos do Templo ‘Ja bu sim bil’; ele fale- ceu sem terminar a minha graduação completa.
Sua morte foi para mim a perda de cem vidas. Por isso me di- rigi com meus companheiros Nilo acima, onde encontramos várias grutas que nos protegeram da inclemência dos raios do Sol. Acha-
vam-se perto das cataratas do Nilo e à sua beira não era possível prosseguirmos, a não ser que tivéssemos dobrado à direita, mais em- baixo, o grande deserto, seguindo caminho da Núbia. Nós e nossas cabras teríamos perecido sem água. Por fim, perto das grutas, desco- brimos pequeno pouso coberto de grama, onde os animais encon- traram alimento. Resolvemos ali ficar.
Quando na primeira noite me entregava à proteção de Deus, apareceu-me em sonho o meu pai ensinando-me a maneira de viver naquela zona, a fim de poder subsistir. Demonstrou-me a existên- cia de quantidade de feras: leões, panteras e gigantescos condores, e me mostrou como poderia me tornar senhor de todos, sem recurso de armas, apenas pela confiança em Deus e pela vontade firme e destemida.
Quando de manhã saí da gruta, um enorme leão se aproxi- mava dela, por certo sua morada. Percebendo minha presença, ele parou e começou a chicotear no ar a sua cauda. Enfrentando-o com a minha vontade firme e olhar fixo, mandei que deixasse a zona para sempre. Ele deu meia volta e perdeu-se no deserto! O mesmo acon- teceu com duas panteras e um condor enorme, ávido pelas cabras.
Já nesse dia me convenci do poder do homem pela confian- ça verdadeira em Deus e pela firme vontade. À noite me postei dian- te da gruta, entreguei tudo à proteção divina e mandei à Natureza sossego absoluto. E assim foi.”
REVELAÇÃOFEITAAO EGÍPCIO
(O núbio): “Durante o sono novamente meu pai apareceu, dizendo eu haver agido bem; ao mesmo tempo me informou a Von- tade de Deus, incitando-me a segui-la em tudo, fazendo com que se tornasse minha. Deste modo, me transformaria em senhor absoluto da Natureza e seus elementos, assim como o foram as primeiras cria- turas da Terra, muito mais hostil.
Ao acordar, relatei a todos o sonho e os convidei a agradece- rem a Deus pela proteção havida, mas igualmente pedindo jamais
tirar-nos Sua Proteção. Transmiti-lhes a vontade revelada de meu pai, instigando-os a cumpri-la com amor, respeito e gratidão.
Todos o prometeram e no mesmo instante nossa gruta, ante- riormente escura, iluminou-se e descobrimos várias galerias. Investi- gando-as corajosamente, achamos outras grutas que, mais acima do rio, tinham saídas mais cômodas. Essa descoberta nos proporcionou grande número de boas moradias, posteriormente habitadas pelos companheiros. Encontramos igualmente algumas fontes de nafta, servindo de iluminação. Tal descoberta foi para nós uma especial Gra- ça do Alto, pela qual rendemos louvor ao Senhor com toda gratidão.
Ao terminarmos a prece, ouvimos uma voz clara, dizendo: Cumpri Minha Vontade revelada, que todos os animais vos servirão! Deveis apenas exigir-lhes o necessário para o sustento, razão por que não deveis acumular provisões.
Na gruta central achareis sal em quantidade; salgai os peixes trazidos do Nilo pelos condores. Depositai-os nas rochas aqueci- das pelo Sol, para poderdes saboreá-los. Na saída da primeira gruta acha-se uma fonte fresca, debaixo duma pedra de granito; perfurai-a e obtereis água potável em quantidade. Não persigais os animais dessa zona, que vos servirão, caso necessiteis de seus serviços!
Com isso a voz silenciou. Emocionados, agradecemos a Deus, pois reconhecemos a Sua Vontade de habitarmos aquelas grutas. Tudo isso agiu poderosamente sobre minha alma, pois se confirma- va o que tinha sido revelado. Procurei meditar e ouvi a voz interna, obedecendo-lhe sem receio. Realizava quase tudo; somente quando, vez por outra, surgia pequena dúvida sobre o resultado eu fracassava, portanto devia livrar-me da menor dúvida. Com isto, meu êxito foi completo e dentro de alguns anos percebi, em mim, o que o espíri- to de Henoch havia falado aos fariseus. Pois onde quer que eu me transportasse em pensamento, estava inteiramente presente.
Meus companheiros, com exceção de um, ainda não atin- giram este ponto; estão no melhor caminho para lá, razão por que os trouxe comigo para ouvirem o que há de mais sublime e conhe- cerem o grande Deus, para o Qual os conduzi em espírito. Assim
estás sabendo como eu e meus colegas chegamos à perfeição da vida interna. Como verdadeiros filhos do Senhor, vossa situação é mais privilegiada; nós somos estrangeiros e temos que fazer mais para ser- mos adotados por Ele.”
Diz Pedro: “Sinto imensa alegria por ter o Senhor Se revela- do às criaturas em terras longínquas, quando O procuram, amam e Nele confiam. Eis que Ele vem saindo da cabana a fim de operar um milagre por causa dos fariseus convertidos!”
Nisto Me aproximo de Pedro e digo: “Então, Simon Judá, cumpriste Minha recomendação junto desses estrangeiros?”
Responde ele: “Senhor, bem sabias serem eles a nos en- sinar o Evangelho, porquanto muita coisa havíamos esquecido. Agradecemos-Te, pois grande foi o benefício para nós!”
Digo Eu: “Muito bem; vamos então operar um milagre para reforçar a fé dos quatro templários. Manda-os vir aqui!”
ABRAHAMAPARECEDIANTEDOS TEMPLÁRIOS
Pedro executa Minha Ordem e os referidos templários se apressam a Me dizer: “Senhor, já nos deste tantas provas, que não mais alimentamos dúvidas a teu respeito; se, todavia, assim preten- deres, ser-te-emos profundamente gratos.”
Digo Eu: “Aceitastes ser Eu o Messias Prometido, não ha- vendo possibilidade de surgir um outro; entretanto, não concebeis ser Ele justamente o Mesmo Jehovah que deu a Moysés as Leis do Sinai, podendo por isso dizer de Si no último dia da Festa do Tem- plo: Antes que fosse Abraham, Eu fui! — razão por que quisestes apedrejar-Me. A fim de que possais compreender e acreditar, quero vos dar uma prova especial. Prestai atenção!
Como Senhor igualmente do mundo dos espíritos, quero que Abraham apareça e dê testemunho de Mim; podeis falar-lhe diretamente!”
Uma nuvem luminosa desce sobre a colina e Abraham dela surge, curva-se diante de Mim e diz: “Quão intensamente e há
quanto tempo me alegrei do Dia de Tua Descida à Terra; minha ale- gria ultrapassa todos os limites, por ter visto tal Dia! Muito embora exulte sobre Ti, Senhor Jehovah Zebaoth, não posso testemunhar o mesmo dos meus seguidores! Realmente, os descendentes de Hagar são, a seu modo, muito melhores que os de Sara!
Senhor, Teu Amor para com esta geração ultrapassa todos os limites das Criações infinitas! Quando outrora Te pedi poupares as dez cidades e Sodoma e Gomorra em virtude de alguns justos, Tua Resposta foi: Assim farei, caso em todas encontrar dez e no final ape- nas dois ou três inteiramente justos. Como tal não era o caso, haven- do somente Lot com mérito, Tu o salvaste, e o fogo dizimou o resto.
Considerando esses meus descendentes, calculo um justo por três vezes mais o número dos habitantes das dez cidades — entretanto, poupas essa geração impudica e adúltera! Pagam Teu Amor ilimitado e Paciência infinita com a perseguição e a volúpia de matar-Te!
Senhor, desiste de Tua Paciência! Muito tempo esperei por Isaac, e foi Tua Força que o gerou em Sara. Quando forte adolescen- te, exigiste que eu o sacrificasse para provar minha fé e obediência. Submeti-me à Tua Vontade; Tu Mesmo, porém, me detiveste na exe- cução de Tua Ordem, dando-me um bode para ser sacrificado. Que alegria imensa me proporcionaste!
Todavia, teria sido melhor o sacrifício de Isaac, a fim de im- pedir surgisse uma geração que, já no deserto, debaixo do Sinai, começara a adorar um bezerro de ouro, e agora se tornou pior que os pagãos mais atrasados e outros filhos do mundo, gerados pela serpente, por intermédio da prostituição de Babel. Senhor, estende a Tua Mão e aniquila os Teus inimigos!” Tais palavras são pronuncia- das com tremendo rigor.
Digo-lhe Eu: “Sabes que, a partir de agora, não condenarei as criaturas pelo Meu Zelo, mas elas próprias o farão, e assim protege- rei os poucos justos ainda não dominados pelo dinheiro. Deixemos, portanto, o mundo cego e surdo por índole caminhar em seus trâ- mites e decidir sua condenação definitiva.
Meus filhos verdadeiros serão guiados por Mim Mesmo nos Caminhos da Luz e nas veredas da Vida. Será salvo quem quiser; os que não se quiserem livrar de julgamento e morte autocriados con- tinuarão no sofrimento.
Receberá liberdade e Vida Eterna quem as desejar! Prefe- rindo julgamento e morte, desfrutá-los-ão! Não haverá judeu que, a partir de então, possa afirmar: Teria igualmente palmilhado as ve- redas da Luz caso me tivessem informado! — Eu Mesmo ensinei e agi por toda parte e ainda hoje enviarei setenta discípulos para dis- seminarem a Minha Doutrina por todos os cantos do reino judaico, entre pagãos e judeus; dentro de um ano Meus apóstolos a levarão ao mundo inteiro. Feliz quem aceitá-la, adaptando sua vida de acor- do!” Em seguida, o espírito de Abraham se curva profundamente, louva-Me e desaparece.
Dizem os dois fariseus: “Senhor e Mestre desde eternidades, essa prova foi forte. Se todos os nossos colegas a tivessem assistido, tornar-se-iam crentes como nós. Por que não o fazes?”
Respondo: “Porque sei muito bem como receberiam uma aparição! Vós fostes os últimos a serem salvos do Templo; com os restantes, nada se conseguirá! Contudo, ainda doutrinarei algumas vezes no Templo e darei provas do Meu Poder; vós mesmos pode- reis vos convencer da impressão sobre os templários. Muitos do povo começarão a acreditar em Mim, mas os graduados do Templo
— jamais!”
MOYSÉS E ELIAS ADVERTEM OS FARISEUS RECÉM- CONVERTIDOS
(O Senhor): “Prestai atenção! Para vossa inteira compreensão, virão ainda outras testemunhas do Além, testificando ser justamente Eu o Messias Prometido dos judeus e, por eles, de todas as criaturas da Terra! Determinai vós mesmos quem desejais ver e falar!”
Dizem ambos: “Senhor, sendo de Tua Vontade, permite ver- mos Moysés e Elias; por certo foram Teus maiores profetas!”
Digo Eu: “Não resta dúvida! Quero que apareçam, porque os escolhestes!” No mesmo instante se vê um enorme clarão e ambas as testemunhas se encontram com expressão severa diante dos fariseus; curvam-se perante Mim e em seguida Moysés, apontando com olhar penetrante Elias, diz com entonação severa: “Conheceis a este?”
Assustados, os fariseus não respondem, pois descobrem em Elias João Baptista, por cuja prisão e morte tinham dado o maior apoio.
Elias, entretanto, diz: “Reconheceis vosso julgamento por ter sido deitado o machado inclemente em vossa raiz. Converteste-vos à última hora, e em virtude de ter sido o Senhor Poderoso tão Be- nigno, perdoo-vos o crime praticado em minha pessoa. Ai, porém, se puserdes vossas mãos criminosas no Corpo Dele. Os que assim fizerem levarão o julgamento e a condenação gravados na fronte.”
Um dos fariseus se encoraja e diz: “Ó grande profeta, quem poderia supor que ocultavas o espírito de Elias?!”
Responde ele: “Não consta que viria ele preparar os Cami- nhos do Senhor?! Acaso não lestes: Ouvi a voz dum clamador no de- serto! Preparai os caminhos ao Senhor! Envio Meu anjo para aplai- nar Tuas Pegadas! — Se isso soubestes, por que não destes crédito? Por que me perseguistes, fazendo até hoje o mesmo ao Senhor?”
Apavorados, os fariseus respondem: “Grande profeta, tem paciência com nossa cegueira tremenda, pois unicamente ela é cul- pada de nossos erros!”
Diz Elias: “Perdoarei o que o Senhor vos perdoou! Cuidai, porém, que não sejais novamente cegados por uma tentação; pois, de outro abismo, dificilmente ressuscitaríeis à Luz!”
Ambos os profetas desaparecem e os fariseus Me supli- cam desistir de provas semelhantes, pois essas os fizeram transi- dos de medo.
Digo Eu: “Se assim é, como será vossa situação quando vos apresentar o grande número dos exterminados em virtude de vossa tendência vingativa e perseguidora?!”
Exclamam eles: “Senhor, não faças isto! Seria nossa morte!”
Prossigo: “Isso não, enquanto estou convosco por causa de vossa fé; considerai o encontro certo com todas aquelas almas no Além! Qual será vossa resposta quando reclamarem justiça diante do Trono de Deus?”
Dizem eles: “Senhor e Mestre Eterno, faremos neste mun- do tudo que exigires; não permitas sermos chamados à responsa- bilidade! Por Misericórdia, aconselha-nos, para evitarmos tamanho suplício!”
Respondo: “Já vos disse o que fazer para chegardes à Luz e à Vida; todavia, repito ser benéfico examinardes vossa consciência a fim de compenetrar-vos da enormidade de vossos crimes!
Isso feito, tereis externado os pecados, enchendo-vos de repugnância e arrependimento; em seguida, será fácil tomar a firme resolução de jamais pecar, incentivando o desejo de repa- ração de todo e qualquer prejuízo. Não será possível fazê-lo em toda extensão, mormente aos que já se encontram no Além; em tal caso, aceitarei vossa boa vontade como obra, reparando vos- sos crimes.
Enchei-vos do necessário rigor, do contrário acontecerá o que disse o profeta Elias; pois tereis que vencer várias tentações! Um físico velho não se desfaz tão facilmente de seus hábitos, conforme julga o homem. Ireis Comigo; mas, a Meu lado, caireis em sérias tentações como os demais discípulos, e então se verá a fraqueza car- nal, quando o espírito tiver chegado a determinada força. Por isto, é preciso todo empenho para libertar a alma da prisão da carne, fazendo o que vos disse; pois o pecado abandona a alma à proporção que ela reconhece o pecado como tal, arrependendo-se e não mais caindo no erro. Compreendestes?”
UMMILAGREDE RAPHAEL
Dizem os fariseus: “Agradecemos-Te, Senhor, por ensina- mento tão puro e real, muito mais agradável que as provas horren- das que encheram nossa alma de pavor. Tudo faremos para pôr em
prática o Teu conselho. Ainda havendo tempo, iremos à cidade a fim de organizar nossa situação; amanhã estaremos de volta.”
Digo Eu: “Se esta é vossa firme resolução, podeis ficar e a questão terá outro desfecho! Darei ordem ao Meu jovem servo para resolver vossos negócios, trazendo os tesouros aqui e as famílias serão levadas à casa de Lázaro. Concordais?”
Respondem eles: “Se tal fosse possível, ficaríamos mui contentes!”
Digo Eu: “Para Deus tudo é possível! E Meu Servo já de- monstrou o seu poder. Dirigi-vos a ele para tanto!”
Opõe o templário: “Senhor e Mestre, seria melhor se Tu o fizesses por nós!”
Digo Eu: “Muito bem, sendo essa vossa convicção e desejo, fá-lo-ei.” Chamo, pois, Raphael e intimamente lhe dou ordens. Ele pergunta aos fariseus de quanto tempo poderia dispor, e eles dizem: “Depende de ti! Se fosse realizável antes do anoitecer, nosso conten- tamento seria grande, porquanto amanhã não é permitido fechar qualquer negócio.”
Diz Raphael: “Que diríeis se já executei tudo da melhor ma- neira possível?”
Dizem eles: “Mas, como? Não te ausentaste! Além disto, a caminhada a Bethânia leva mais de uma hora — portanto, é intei- ramente impossível!”
Obsta Raphael: “Há algumas horas atrás sabia de vossa in- tenção, por isto já encaminhei vossas famílias à Bethânia, onde se encontram há cerca de meia hora. Vossa fortuna já está em mãos das pessoas por vós determinadas a Conselho do Senhor, portanto está tudo resolvido. Vinde comigo à cabana e podeis vos certificar da parte que coube a Nicodemus!” Dito e feito. Os fariseus e levi- tas acompanham o arcanjo e encontram tudo arrumado em cima de uma mesa. Estupefatos, eles exclamam: “Eis o Poder Divino em ação! Dize-nos, jovem servo de Deus, de que maneira agiste?”
Responde Raphael: “Pela já demonstrada! Pois o meu pen- samento unido à vontade, idêntica à de Deus, é tanto quanto eu
mesmo. Através dela, posso agir pessoalmente e em toda parte. Quem isto conseguir é perfeito como Deus.
De igual modo, é Deus — como Entidade individual — Um Só e atualmente Presente aqui, e em parte alguma do Infinito. Através de Sua Vontade e de Seus Pensamentos nítidos, está todavia ativo em Todo o Infinito. Se assim não fora, não haveria Terra, Lua, Sol, estrelas e criaturas correspondentes. Todos os corpos cósmicos e seus seres são, do Alpha ao Ômega, Pensamentos e Ideias fixados pela Sua Vontade Imutável, que nas criaturas são por Ele transformados em indivíduos independentes, de tal forma a se tornarem idênticos a Ele em tudo — Obra do Seu Amor e Sabedoria eternos. Dei-vos explicações precisas e podemos voltar para junto dos outros.”
Em seguida, um fariseu esclarece Nicodemus a respeito da parte que lhe cabe dos tesouros na cabana, e o último lhe diz: “Ami- go, já o sabia, e tudo se dará como o Senhor determinou. Silencie- mos, pois Ele resolverá outro assunto.”
OSENHORDESPEDEHIBRAM,TRAFICANTEDE ESCRAVOS
Nisto chamo a Hibram e seus colegas e lhes digo: “Em pou- cos dias, grandes foram vossas experiências. Sabeis, como Meus dis- cípulos, o que cabe a cada um para alcançar a vida eterna da alma. Se viverdes de acordo, atingireis a Minha Promessa.
Há, entretanto, muita coisa a ser reparada aos pagãos de vos- sa pátria. Remediai as injustiças praticadas ao próximo, que fareis jus a uma verdadeira Graça espiritual! Em seguida, procurai passar adiante a Minha Doutrina no sentido prático. Afastai ouvido e co- ração dos adivinhos que procuram influenciar os habitantes, e tor- nai-vos seus sacerdotes verdadeiros, que recebereis em paga grande tesouro de dotes espirituais, em breve tempo!
Não Me denuncieis a caminho para a pátria, pois onde for preciso e Eu sabendo quais as criaturas preparadas para Minha Dou- trina, já as procurei com Palavras e Ações. Em tempo oportuno, espargirei o Meu Espírito Santo que as levará à plena Verdade. Entre
o povo não vos baseeis nos Meus Milagres e não percais de vista, unicamente, a Minha Doutrina! Dela depende a Salvação das cria- turas, mormente do cumprimento efetivo da mesma.
Não vos preocupeis com as palavras ao doutrinardes em Meu Nome, pois o Meu Espírito vos insuflará coração e boca! Isto serve para todos que depois de vós doutrinarão o povo.
De maneira alguma edificai templos nem determineis certos dias como sagrados, conforme agem os gentios. Fixai um dia da se- mana para doutrinação e deixai vir quem quiser à vossa casa! Dividi
o pão com os pobres e não aceiteis elogios, remuneração ou sacrifí- cios; foi-vos dado de graça e deve ser transmitido do mesmo modo. A recompensa tereis que esperar de Mim.
Se um abastado vos fizer doação por gratidão, podeis aceitá-
-la e dividi-la entre os pobres! Aquela criatura não deve ser conside- rada mais que o pobre, a fim de que não se envaideça, mas aumente no amor para com ele. Só assim considerarei sua oferta, recompen- sando-o com Minha Graça e Bênção! Pois quem vos favorecer, e aos Meus trabalhadores contratados, terá feito sacrifício para Mim e seu prêmio será certo.
Tendo, deste modo, ensinado o povo em Meu Nome, envia- rei um apóstolo maior, que batizará os crentes em Meu Nome, no Amor, Sabedoria e Poder, e eles receberão o Espírito Santo e, por ele, o pleno renascimento de seu espírito com a alma, ou seja, a vida eterna e sua força.
Sabeis, em poucas palavras, o que fazer no futuro; portanto, recebei a Minha Bênção e parti ainda hoje. Amanhã, Sábado judai- co, seria difícil encetardes a viagem.
Ide pela estrada que dá para Galileia e à noite tereis alcançado pequeno lugarejo; ficai aí, pois sereis bem recebidos. De manhã, vos inspirarei qual o trajeto que vos levará incólumes à pátria. Ide, pois, com Minha Bênção protetora!”
Hibram agradece por tudo e se afasta com os companhei- ros. Lázaro estranha que esses traficantes não se despeçam dos escra- vos. Digo Eu: “Assim o quis por motivos mui sábios. Os jovens se
distraem no declive da montanha e seria imprudente perturbá-los. Aqueles homens foram despedidos em Meu Nome e disseminarão a Luz em suas terras. Manda trazer mais pão e vinho, que determina- rei outros discípulos, fortalecendo-os para sua missão!”
EXPEDIÇÃO DE SETENTA MENSAGEIROS DO SALVADOR (EV.LUCAS 10)
Após ter Nicodemus executado Minha Ordem, Eu chamo os setenta trabalhadores ainda presentes e lhes digo: “Eis pão e vinho! Fortalecei-vos, pois vos enviarei a cidades, aldeias e vilas para pregar- des às criaturas a Minha Vinda!”
Após se terem saciado, eles agradecem e um deles diz: “Se- nhor e Mestre, estamos prontos para receber Tuas diretrizes! Tua Vontade Se faça, pois será nossa futura força!”
Digo Eu: “Pois bem! A colheita é grande; o campo com fru- tos maduros se estende sobre a Terra toda; todavia, são poucos os trabalhadores! Pedi ao Senhor da colheita para enviar muitos traba- lhadores ao campo!”
Diz o orador: “Sim, Senhor, eis nosso pedido; pois somente Tu és o Senhor da colheita!”
Prossigo: “Ide de dois em dois a todos os lugares da Judeia, inclusive à Samaria! Envio-vos quais ovelhas entre os lobos que, en- tretanto, não precisais temer; pois Minha Força vos dará coragem. Por isto, não leveis sacola, alforges, bordões, nem sapatos nos pés, nem duas túnicas! Sede rigorosos, porém meigos! Não cumprimen- teis alguém na estrada, nem exijais que vos saúdem; sois todos filhos de Um Só Pai no Céu! Um somente é vosso Senhor e Mestre; vós, sois todos irmãos. Vossa saudação seja o verdadeiro amor ao próxi- mo; o que passa daí é prejudicial. Dareis prova de verdadeiros discí- pulos Meus amando-vos como Eu vos amo.
Ao entrardes numa casa, dizei: A paz seja convosco! E se ali houver um filho de paz, repousará sobre ele a vossa paz; do contrá- rio, ela voltará para vós. Onde encontrardes paz, ficai comendo e
bebendo, sem receio nem escrúpulos! Pois, como obreiros para o Reino de Deus, mereceis salário.
Se, porventura, dois de vós forem acolhidos em algum lar, fi- cai e não caminheis de casa em casa, por causa do sustento. Não seria educado de vossa parte, porquanto não sois quaisquer mendigos pre- guiçosos, mas transmissores do Meu Verbo, ricamente aquinhoados, portadores do verdadeiro Reino de Deus e de Sua Bênção eterna.
Acaso sendo bem acolhidos num lar pagão, ficai e comei o que vos oferecerem. Não polui o que entra pela boca, mas sim o que dela se projeta, como já vos expliquei no Monte das Oliveiras.
Se numa cidade ou vila não houver casa acolhedora, não in- sistais mas ide às ruas, dizendo: O próprio pó que se agarrou aos nossos pés sacudimos sobre vós! Todavia, sabei ter estado próximo de vós o Reino de Deus!
Além disto, vos afirmo haver maior tolerância com Sodo- ma, que para a cidade que não vos acolher! Ai de ti, Chorazim, ai de ti Bethsaída! Se em Tyro e Sidon se tivessem dado os prodígios feitos em vós, teriam feito penitência com saco e cinza; por isto, o julgamento para elas será mais suportável! E tu, Capernaum, que foste elevada até ao Céu, serás expulsa ao inferno!”
Nisto, alguns apóstolos comentam: “Por que se altera Ele contra as cidades já ameaçadas em Kis?! É bem verdade ter Ele encontrado lá a fé mais fraca; ainda assim, alguns O aceitaram e reconheceram como verdadeiro Filho de Deus e Messias do povo escolhido! Nós mesmos pertencemos a Capernaum e é estranha Sua alteração!”
Digo Eu aos apóstolos surpresos: “Por que andais amuados? Qual foi a atitude de Chorazim, Bethsaída e Capernaum? Precisa- mente elas não queriam aceitar Minha Doutrina e não creem ser Eu o Messias Prometido, não obstante todas as provas! Já não vos enviei a cidades e vilas — e como fostes recebidos em algumas?! Vós mesmos implorastes o fogo do Céu sobre elas! Por que então vos admirais se, no momento em que mando outros discípulos ao mundo dos horrores, repito aquela sentença, a fim de que saibam
como se portar com criaturas por Mim apontadas como cidades que vos receberam mal?
Por isto digo a todos, e não somente aos setenta: quem vos ouve a Mim ouve; quem vos despreza igualmente a Mim despreza. E quem Me desprezar fará o mesmo com Aquele que Me enviou a este mundo; pois Eu e Ele somos Um.”
Em seguida, estendo as mãos sobre eles e digo: “Recebei o Poder de Minha Vontade! Ao encontrardes enfermos, aponde-lhes as mãos em Meu Nome, que melhorarão! E se os demônios domina- rem as criaturas, ordenai que se afastem em Meu Nome, dirigindo-se para onde determinardes!
De igual modo vos dou o poder sobre os maus espíritos do ar, da água e das cavernas. Faculto-vos o poder de pisar em es- corpiões e caminhar por cima de serpentes, bem como afugentar qualquer inimigo — e nada vos sucederá.
Não temais de caminhar durante a noite e não receies tempestade, raio e trovão; obedecer-vos-ão e os animais ferozes de matas e desertos fugirão de vós. Assim dotados, podeis seguir con- forme estais.
Gravai bem: tudo vos dei de graça e de graça deveis passá-lo às criaturas dignas; às imundas não deveis atirar essas pérolas! Ide, pois, onde o espírito vos guiar!” Os setenta obreiros Me agradecem por tamanhas dádivas e se encaminham, de dois em dois, para todas as direções.
MISSÃODOSSETENTA MENSAGEIROS
Quando os fariseus e os greco-judeus os veem se afastar, apro- ximam-se de Mim, dizendo: “Senhor, cremos tão firmemente em Ti como os que enviaste para missionários, e também estamos infor- mados de Tua Doutrina! Não poderias conferir-nos tarefa idêntica?”
Digo Eu: “Vossa vez ainda virá; mas, por ora, bastam aqueles setenta. Quando Eu for elevado ao Céu, vós e muitos outros serão escalonados para revelar o Evangelho do Reino de Deus a todas as
criaturas; por enquanto, ficai Comigo, como testemunhas fiéis de Minhas Palavras e Ações, tão indispensáveis quanto aqueles.
Houve muitos que assistiram às provas da noite retrasada, aflitos por não saberem interpretar o significado. Ao lá chegar o gru- po expedido, levar-lhes-á consolo justo. Eis o motivo principal de os ter enviado hoje! Compreendeis as intenções profundas e sábias do Pai do Céu?!”
Aproxima-se Lázaro e diz: “Grande e caríssimo Amigo, Mes- tre e Senhor de todas as criaturas, o Sol está prestes a desaparecer no ocaso! Desejas voltar para o Monte das Oliveiras? Se assim for, enviarei alguém para determinar os devidos preparativos.”
Respondo: “Voltaremos, porém à noite, a fim de não des- pertarmos a atenção dos templários. Quanto às acomodações, nada nos faltará, pois Nicodemus possui vasto albergue e residência. Par- tiremos pela meia-noite, sem fazer alarde!” Entrementes ordeno a Raphael cuidar dos jovens ex-escravos, certamente algo famintos.
CONSELHOSDOSENHORPARA AGRÍCOLA.
FORTALECIMENTODEFÉECONFIANÇAPELOTREINO.AMADURECIMENTOÀRECEPTIVIDADEDAS DÁDIVAS
Nisto, dirige-se Agrícola para Mim: “Senhor e Mestre, como todos comecem a partir, nós, romanos, também pensamos na volta para Roma. Nada querendo fazer sem Teu Conselho, peço-Te orien- tação a respeito.”
Digo Eu: “Amigo, para ti não há pressa, porquanto o Im- perador permitiu tua licença por mais de um ano. Não havendo incumbência governamental na Judeia e na Ásia, julgo nada per- deres com a partida para depois de amanhã. Só dentro de um ano receberás missão para a Britânia, na qual teu filho mais velho, com o teu nome, te acompanhará, e lá receberás posto elevado por longo tempo. Portanto, não importa voltares a Roma um mês mais tarde; chegarás cedo de qualquer maneira.
Além disto, quero aconselhar-te uma rota segura para os teus grandes navios. Dentro em breve surgirão as tempestades do equi- nócio, prejudiciais aos navios que vêm de Oeste a Leste. Nesse caso, não irias bem pelo Mediterrâneo. É preferível seguires por terra pela Ásia Menor, deixando teus barcos navegarem até o primeiro estreito, no que Cirenius te dará boa oportunidade. Lá já sabes o caminho para Roma. Os navios poderás mandar levar alguns meses mais tarde para um porto ao Sul de Roma. Digo-te isso para não teres prejuízo material.”
Diz Agrícola: “Senhor, agradeço-Te o conselho, que apro- veitarei. Não posso deixar de afirmar que, não obstante os ventos contrários do Mediterrâneo, poderia chegar a Roma com a firme confiança e fé inabalável na Tua Ajuda poderosa; pois todas as coisas te são possíveis! Por que não no meu caso? Por que não é do Teu Agrado? De qualquer maneira, seguirei o conselho dado e fiz a per- gunta para simples orientação.”
Digo Eu: “Fizeste bem em perguntar-Me, pois dei-te o con- selho para experimentar tua fé e confiança no Meu Amor, Sabedo- ria, Força e Poder! Se tua fé e confiança forem tão firmes, a ponto de não seres acometido da menor dúvida no maior dos perigos — poderás arriscar-te a dirigir teus navios contra as tempestades mais violentas. Pois se as mandasses serenar em Meu Nome, obedeceriam instantaneamente. Para tanto, Meu amigo, tua fé e confiança ainda são fracas, não obstante tua boa vontade!
Por certo não duvidarás ser-Me possível tudo que quiser; en- tretanto, duvidarias Eu sempre atender-te e tal modesta dúvida te atiraria num pavor tremendo, ainda que te socorresse. Por isto, é melhor seguires o Meu Conselho.
Fé e confiança têm que ser exercitadas, até chegarem ao pon- to de unir a vontade individual à Minha, de tal forma que o desejo se realiza de fato. Pois somente pela fé plena e viva e por uma confiança idêntica pode o homem se transportar para onde quiser, ativamente, em Espírito e em Meu Nome.
Com o tempo, alcançarás aquela destreza na fé e confiança, pela qual tua vontade se torna plenamente ativa, podendo mandar nos próprios elementos em Meu Nome. Durante a tua travessia pas- sarás por pequenos perigos; não te prejudicarão, porque te prote- gerei. Dentro de um ano, quando em missão na Espanha, Gália e Britânia, terás alcançado grau de fé e vontade invulneráveis para enfrentar qualquer inimigo.”
Prossegue Agrícola: “Os setenta trabalhadores há pouco ex- pedidos ao mundo certamente não estão mais firmes na fé que eu e meus companheiros! As dádivas recebidas, naturalmente, são-lhes mais úteis que a nós; todavia, não pode a necessidade ser condição única para tanto! A meu ver, é preciso estar-se aparelhado pela fé e confiança.”
Digo Eu: “Eles já estavam preparados como criaturas sim- ples e de fé segura, desde a infância. Nunca indagavam da possibi- lidade de Minhas Provas, mas acreditavam que nada Me fosse im- possível, e por isto assistia-lhes o mesmo poder em Meu Nome. Em virtude disso, pude conferir-lhes os dons, como todos ouviram!
Neles existia fé antes do saber; convosco precedia o saber à fé, no que consiste grande diferença na entrega dos dons espirituais! Não importa; vossa fé não vacilando, recebereis as mesmas capaci- dades. Compreendeste?”
Responde Agrícola: “Inteiramente, Senhor; e Te agradeço pelo ensino importante! Eis que vejo uma caravana aproximar-se da- qui! Se aqui pernoitar, não ficará muito espaço para nós. Quem são?”
Respondo: “Não Me preocupo com comerciantes. Como te interessas, digo-te tratar-se duma caravana de Damasco que depois de amanhã seguirá para Sidon, levando artefatos de metal ao mer- cado. São judeus e gregos. Se desejas comprar algum objeto, deves fazê-lo hoje.”
Responde o romano: “Meus navios estão abarrotados de tais utensílios, portanto de nada necessito. Que faremos? O Sol está no horizonte!” Digo Eu: “Deixa o Sol. Repousaremos um pouco, pois trabalhamos bastante. Depois veremos o que a noite nos promete!”
Em seguida Me dirijo para a figueira a fim de saborear alguns frutos, e depois visito a juventude entretida com o alimento de pão e frutos especiais. Quando Me avistam, os jovens se levantam e ex- ternam sua gratidão por tudo que lhes fora conferido.
Alguns começam a mencionar ensinos e fatos Meus por eles gravados, e os sete, que no Monte das Oliveiras às vezes Me rode- avam e aos quais dei a capacidade de entendimento do idioma he- braico, expressam de viva voz ser Eu Senhor de Céus e Terra, tendo passado tal conhecimento aos companheiros.
Externo Minha Satisfação e lhes recomendo conservarem tal fé no coração, precavendo-se das tentações da grande Roma, na qual em breve haveriam de se encontrar; conviria seguir os conselhos e ensinos do romano que, qual justo pai, os levaria para lá. Antes de tudo, deveriam manter-se castos e puros, alcançando o Meu Agrado e vários dons.
Deveriam ter em mira ser Eu Onisciente e Onipresente, Co- nhecedor, portanto, de todos os pensamentos. Essa certeza deveria impedi-los de cometerem algo contra as Leis da Ordem Vital; pois se distribuo toda sorte de Graças celestes aos puros de coração, cada infrator teria que temer o Meu açoite.
Prossigo: “Até então fostes puros como os Meus anjos no Céu e este foi o motivo por que eu Mesmo vos libertei das algemas da escravidão. Continuai castos, que Meus anjos caminharão convosco, protegendo-vos de qualquer desgraça e conduzindo-vos pelas vere- das da vida que levam aos Meus Céus! Tereis compreendido isto, Meus filhinhos?”
Respondem todos, principalmente os sete: “Querido Pai e Se- nhor, gravamos tudo e seguiremos fielmente as Tuas Palavras. Como, porém, se apresentam os Teus anjos e onde se acham os Teus Céus?”
Digo Eu: “Aquele jovem que vos supriu em Meu Nome é um dos Meus arcanjos! Aqui, dispõe de físico por causa das criaturas;
mas vive como puro espírito idêntico a Mim, agindo eternamente. Iguais a ele existem inúmeros nos Meus Céus.
Quanto à localização destes, digo-vos: Meus Céus estão em toda parte onde há criaturas e espíritos bons, puros e devotos. Todo o Espaço Infinito é o Céu sem começo nem fim, para homens e espíritos bons. Quanto aos maus, acham-se eles no inferno, ou seja, no julgamento e na morte eterna, representados pela matéria!
Quem, portanto, anseia pelos tesouros deste mundo — ma- téria, julgamento, inferno e morte — dirige-se para a morte com sua própria alma. Por isto, todos os maus espíritos se mantêm, na maior parte, na matéria telúrica; os bons e puros habitam para sempre as camadas luminosas e puras do Espaço livre do éter.
A fim de que vós, Meus filhinhos amados e puros, tenhais ideia permanente, abrirei por momentos vossa visão interna, para a qual já tendes especial inclinação, podendo ver daqui os Meus Céus!”
Indaga um garoto: “Querido Pai e Senhor, que vem a ser a visão interna?”
Respondo: “Quando adormecidos, vossa visão física é cer- rada, entretanto vedes em sonho zonas estranhas, criaturas, animais e florestas, estrelas etc. de modo muito mais nítido que as coisas terrenas! Tudo isso é espiritual; mas tal visão interna continua cer- rada quando despertos, e não pode ser aberta qual olho físico, por motivos de Minha Sabedoria!
Posso, quando quero, abrir a visão interna a todos e a qual- quer tempo, facultando à criatura a visão natural e espiritual, a um só tempo. Eis o que quero, para facilitar-vos conhecimento mais profundo, que deve se impregnar para sempre em vossa alma. Que assim seja!”
Nem bem termino, todos se veem rodeados por incontáveis anjos que a eles se dirigem com amabilidade, instigando-os ao Bem. Ao mesmo tempo percebem — como que penetrando a matéria telúrica — um sem número de seres chocantes e infelizes, cuja ten- dência se inclina à maior integração na matéria. No alto vislumbram zonas maravilhosas e edificações deslumbrantes, e os próprios anjos
os guiam e explicam tais regiões. Após certo tempo, Eu os chamo à realidade e pergunto se foi agradável a visão.
Os jovens não acham palavras para descrever o deslumbra- mento das visões e o grupo feminino Me pede prolongamento das mesmas. Eu, porém, respondo: “O que acabastes de ver é o sufi- ciente enquanto viverdes na Terra, em virtude do livre arbítrio, para poderdes vos tornar espíritos livres e independentes; pois este fato despertará grande ânsia de viverdes dentro de Minha Doutrina e Meus Mandamentos. Tão logo tiverdes chegado à perfeição, pelo cumprimento da Minha Vontade, alcançareis, em vida, a capacidade da visão e audição internas.
Já tendes alguma noção no que consiste a Minha Doutri- na e Vontade, e em Roma vos integrareis do restante. Quando o romano vos tiver ensinado tudo, podereis passar os vossos conheci- mentos aos que perguntarem qual vossa crença e religião, e o por- quê da mesma.
Podeis, portanto, aprontar-vos para a partida, que o Meu anjo vos levará ao albergue da vila e poderá explicar muita coisa, ainda não assimilada pelo vosso intelecto!”
Novamente eles Me agradecem e Eu volto ao grupo da coli- na. Em lá chegando, Lázaro pergunta qual o programa com referência aos jovens. Respondo: “Caro amigo, já dei Minhas Ordens e não ne- cessitas preocupar-te! Se bem que criaturas boas cuidem do próximo, Eu já previ suas necessidades. E se assim não fizesse, o mundo cairia em frangalhos. Deixemos esse assunto, pois surgirá outro problema.”
ACARAVANADE DAMASCO
Mal termino de falar, Hélias corre para junto de Mim, dizen- do apavorada: “Senhor, Senhor, que vem a ser aquilo? Vejo a carava- na se movimentar em nossa direção — mas atrás dela surge outra de aspecto horrendo! Em vez de camelos e cavalos, vêm-se dragões de fogo e no lugar de criaturas — figuras diabólicas, envoltas de serpen- tes de fogo e o peito ornado de caveira! Que significa isso, Senhor?”
A esse relato ofegante de Hélias, todos correm à beira da coli- na e percebem a mesma visão, dando motivo para outras indagações apavorantes.
Digo Eu: “Compreendei bem! Por certo sabeis consistir a pri- meira caravana de comerciantes mundanos e gananciosos, pois um comerciante de Damasco não é melhor que um ladrão e salteador. Tais homens se desdobram em gentilezas para que o comprador se anime a adquirir seus objetos por preço fabuloso. Tão logo tenham fechado negócio, os vendedores o matariam, caso não temessem as Leis, a fim de tirar-lhes a mercadoria e o dinheiro restante, inclusive seus haveres. Não obstante tal índole, são homens considerados e respeitados pelo mundo, recebendo homenagens do próximo.
A fim de que todos vós, Meus discípulos e irmãos, pudésseis conhecer mais de perto essa camarilha, Eu abri vossa visão interna, de sorte a poderdes ver ambas as caravanas, material e espiritual.
Os incandescentes dragões apontam a volúpia ardente de açambarcar todos os tesouros da Terra. Os demônios a montarem os dragões indicam precisamente os comerciantes humanos. O surgir de serpentes traduz sua astúcia, inteligência e prudência comerciais. As caveiras, a imensa tendência assassina de tais verdadeiros demô- nios. Pois se fosse possível, matariam todos os ricos, para apossarem-
-se de tudo da maneira mais simples. Sabedor de vossa temporária consideração para com tais homens, vi-Me obrigado a desvendá-los diante de vossa visão psíquica! Isto tendo sido feito, voltareis à visão normal! Que Me dizeis a respeito?”
Diz Nicodemus: “Senhor, já enviei alguns empregados ao al- bergue com ordem de não darem acolhida e estadia àquela corja. Faria boa confusão em recebê-la! Como delegado, tomarei todas as providências para que procurem boa hospedagem longe daqui. Tais homens empestariam nosso local tão aprazível, de tal forma que nin- guém poderia respirar! Não é assim, Senhor?”
Digo Eu: “Fazes bem em não aceitar a caravana em teu alber- gue; mas afastá-la do lugarejo seria imprudente! Está sob proteção da lei de livre tráfego para todos os comerciantes, e além disso exis-
tem muitos nessa zona de índole semelhante àqueles, portanto não correm perigo de piorarem. De mais a mais poder-se-ia fazer uma tentativa de conversão. Neste mundo ainda é mais fácil uma me- lhoria de criaturas, por mais maldosas que sejam, do que no Além, numa alma desnuda.
Por isso, desiste da segunda intenção; com a primeira con- cordo, pois não haveríamos de nos dar bem sob o mesmo teto! Céu e inferno devem ser separados. Estás satisfeito com Meu Conselho?”
Responde Nicodemus: “Certamente, Senhor; entretanto, me revolto morarem, neste local de minha preferência, criaturas da mes- ma índole dos comerciantes de Damasco!”
Observo: “Vê, lá atrás se acham os sete que salvei da morte na cabana de Barabe. Os velhos mandavam os filhos desnudos aos que moravam na vila, para que um ou outro deles se compadecessem; mas encontravam apenas corações de pedra. Se assim é, como te ad- miras Eu não poder dar-lhes certificado diferente?! Se te mostrasse os altos funcionários de Jerusalém sob a visão interna — que Me dirias?!
Por isso afirmo: este mundo é semelhante ao inferno em tudo; apenas se acha velado diante dos olhos das criaturas, assim como é oculto o Céu, em palavra e ação. Por este motivo pode aqui o Céu influenciar beneficamente sobre o inferno. Onde ambos estão revelados, a influência é difícil ou quase impossível.
Quando aqui chegaram os dois fariseus, trouxeram dentro deles o pleno inferno, sem suporem entrar no verdadeiro Céu. O Céu contém três graus, bem como o inferno.
Os sete egípcios representam o primeiro grau do Céu da pura Sabedoria, e somente neste podiam penetrar os espíritos infer- nais de Jerusalém. Então começou a se lhes fazer a Luz do segundo grau celeste, na pessoa de Raphael, sentindo eles a necessidade de deixar o mal e se voltarem para a Luz. Quando se analisaram na luz ofuscante da sabedoria e do amor, penetrou-os o verdadeiro arre- pendimento e o desejo de Minha Presença, como máximo grau dos Céus. Quando Eu Mesmo deles Me aproximei, foram prontamente convertidos, tornando-se candidatos ao primeiro grau celeste.
Se os tivéssemos enxotado com o nosso Poder por ocasião de sua chegada, não estariam agora nessa situação feliz! O mesmo sucede com os comerciantes de Damasco, aproximando-se, sem o saberem, do Reino de Deus! Em breve teremos oportunidade de deixá-los perceber algo da Verdade, e então veremos o resultado. Como a caravana já encontrou abrigo, deixaremos nossa colina, para ficarmos em tua casa durante uma hora e só depois tomaremos a ceia no teu albergue!”
Obtempera Agrícola: “Senhor, não vejo mais os jovens! Já teriam descido?” Digo Eu: “Meu amigo, não ouviste o que disse a Lázaro?! Como podes perguntar? A mocidade já está no albergue, na fiel companhia de Raphael. Podes estar certo de que nada lhes faltará. Vamos agora, e que ninguém Me faça perguntas!”
OSENHOREXPLICAOSEGUNDOCAPÍTULODE ISAÍAS
Todos se levantam e rápido descemos ao vale à casa de Nicodemus, para abençoá-la segundo seu íntimo desejo. Mal entra- mos, faz-se ouvir grande alvoroço na praça do mercado, e Agrícola, impetuoso, pergunta o que há.
Digo Eu: “Meu amigo, enquanto Eu estiver em tua companhia, não deverias fazer indagações! Desconheces o Poder que Me assiste?! Além disto, por certo sei de tudo que acontece no Infinito, portanto não te preocupes com tais assuntos, ao menos em Minha Presença!”
Diz Agrícola: “Oh, Senhor, agradeço-Te por essa reprimen- da! Sempre foi a impetuosidade meu maior defeito. Seguidamente penso na paciência tão recomendada por Ti, com o firme propósito de adquiri-la. Tão logo vem a tentação, meu defeito se apresenta; mas agora será despedido definitivamente!”
Digo Eu: “Muito bem! A intenção é boa; não obstante, cairás no mesmo erro por várias vezes. Agora trazei-Me o Livro de Isaías; quero elucidar-vos uma passagem importante.”
De posse do Livro, começo a ler: “Eis a visão de Isaías, filho de Amós, referente a Judá e Jerusalém: No final dos tempos, o mon-
te em que se encontra a Casa do Senhor se exalçará acima de todos os outeiros, e todos os pagãos ali acorrerão.”
Nicodemus e os dois fariseus interrompem: “Senhor e Mes- tre, onde está o Monte do Senhor no qual se acha a Casa Dele?”
Respondo: “Como ainda sois mundanos e materialistas! Acaso não sou Eu o Monte de todos os montes, no qual se acha a verdadeira Morada de Deus? Que vem a ser a confortável Casa? O Meu Verbo dirigido aos judeus, através de todos os profetas durante vários séculos e ora pronunciado por Mim Mesmo. Portanto, sou Eu o Monte, e o Meu Verbo a Casa confortável; e aqui nos rodeiam os pagãos de todas as partes do mundo, a fim de investigarem o Monte e se acomodarem na espaçosa Casa. Para os judeus atuais é chegada a época final, porque fogem do Monte e da Casa e os maiorais até procuram destruí-La. Compreendestes?”
Respondem todos: “Senhor, compreendemos; mas existem outros versículos não esclarecidos.”
Digo Eu: “Tende paciência; não é possível partir uma árvo- re com um só golpe! Prossegue Isaías: Futuramente muitos povos dirão: Vinde, subamos o Monte do Senhor, à Casa de Deus, para que nos ensine Seus Caminhos e andemos nas Suas Veredas, pois de Zion sairá a Lei, e de Jerusalém, a Palavra do Senhor!
Por certo não haverá dúvida ser Zion (Z’e on = Ele quer) igualmente o Monte, ou seja, o Senhor ou Eu, e Jerusalém a Casa de Deus no Monte, quer dizer, o Meu Verbo e Minha Doutrina para hoje e todo sempre.
Os povos são aqueles que se converterão para Mim, acei- tando o Meu Verbo e fazendo a Minha Vontade. Pois o Meu Verbo indica os Caminhos para a Vida, e as Veredas são a Minha Vonta- de transmitida aos homens, cujo cumprimento fiel é muito mais incômodo que o simples ouvir de Meu Verbo, assim como é mais agradável caminhar-se em estrada plana e larga, do que em trilhas estreitas e íngremes.
Quem quiser, por si mesmo, atingir o mais alto Monte e a Casa de Deus, que é Meu Verbo Vivo, não pode estacionar na meta
indicada, mas deve igualmente subir as trilhas estreitas e íngremes, pois somente por elas chega ao pico e à Casa de Deus.
Já vos expliquei o sentido de Zion e Jerusalém. Quem, por- tanto, ouve, aceita e aplica o Meu Verbo, que sempre proferi pelos profetas, chegará a Mim, ao Verbo Vivo e Sua Força; pois Eu Mesmo sou o Verbo Vivo e Sua Força, e tudo que abarca o Espaço Infinito é igualmente Meu Verbo Vivo, Sua Força e Poder eternos. Com- preendestes?”
Obtempera um escriba, que no Monte das Oliveiras tinha aderido a Mim: “Senhor e Mestre, Tua Explicação foi claríssima. No quarto versículo se lê: E o Senhor julgará os pagãos e punirá os povos; e eles farão das espadas, arados, e de suas lanças, foices. Pois nenhum povo levantará sua arma contra outrem, nem aprenderá a guerrear.
Quem são os pagãos e os povos que, após castigados, não mais guerrearão? Deve tratar-se de raças futuras; pois as atuais ge- rações, com seus chefes orgulhosos e ambiciosos, farão guerra até o fim do mundo.”
Digo Eu: “És escriba, por teres na memória leis e profetas; mas longe estás de entenderes o sentido espiritual. Puseste o pé na estrada larga e plana, mas nunca na trilha estreita que leva ao Monte do verdadeiro conhecimento.
Quem não atingir o topo do Monte do Senhor pela ação dentro da Lei e não penetrar na Casa de Deus, ou seja, o Verbo Vivo de Deus, não descobre o espírito verdadeiro, interno e vivo da Lei e dos profetas.”
ASVISÕESFUTURASDE ISAÍAS
Diz o escriba: “Por que todos os profetas falavam e escre- viam tão veladamente? Deveriam estar interessados que fossem entendidos!”
Respondo: “Há dias foram feitas tais objeções no Monte das Oliveiras, e Eu vos demonstrei o motivo; portanto, não é preciso
repeti-lo. Qual seria a Palavra de Deus isenta de sentido oculto?! Acaso podes imaginar uma criatura sem vísceras, ou alguém tão transparente qual gota d’água, de sorte a se poder ver sua organi- zação interna, que não obstante artística, repugnar-te-ia? É preciso aprenderdes a pensar sabiamente! Dar-vos-ei o sentido palpável do quarto versículo de Isaías! Prestai atenção!
O Senhor, que sou Eu no Verbo, julgará entre pagãos e cas- tigará muitos povos. Quem são os pagãos, e quem os povos?! Os pagãos são todos os que desconhecem o Deus Único e Verdadeiro, adorando ídolos e o dinheiro desse mundo. O judaísmo é rodeado por eles e se caminhardes a Oeste, Leste, Norte e Sul, encontrareis apenas pagãos de todas as espécies! Estais informados como vieram a Mim os gentios de todas as partes do mundo e de todas as classes. Ouviram o Meu Verbo, assistiram às Minhas Provas, encheram-se de fé, aceitaram a Minha Doutrina, e o Meu Verbo agora os julga e organiza, pelo que deixaram de ser pagãos, ingressando no número dos ungidos de Deus e do verdadeiro Povo de Deus.
Todavia, não continuarão como ora foram ensinados e orga- nizados, pois em breve surgirão falsos ungidos, operarão milagres e seduzirão reis e príncipes. Não levará tempo e terão atingido grande poder mundano, perseguindo as criaturas com fogo e espada quan- do não se converterem, e no final se dividirão em muitas seitas e partidos. São precisamente os muitos povos castigados por Mim, em virtude do desamor, falsidade, egoísmo, orgulho, teimosia, domí- nio, altercações, perseguições e guerras. Essa época ainda demorará, como o tempo de Noé até hoje.
A situação será a mesma que a de Noé, em que as criaturas se casavam, davam festas e recepções, faziam-se honrar e guerreavam os povos insubmissos aos seus ídolos, até que o Dilúvio os afogou. Então, o Próprio Senhor virá com o fogo de Seu Zelo e Ira e varrerá todos os malfeitores da Terra.
Eis que virá a época em que os bons e puros, que foram pou- pados, e os verdadeiros amigos da Verdade e da Luz de Deus farão arados de suas espadas e das lanças, foices, desistindo da arte bélica;
não haverá povo verdadeiramente ungido que levante armas contra outro, a não ser nos restantes pagãos nos desertos da Terra; todavia, serão advertidos e, em seguida, varridos da face terrestre.
O globo será novamente abençoado. Seu solo produzirá fru- to centuplicado e aos anciãos será dado poder sobre todos os ele- mentos. Eis o sentido do quarto versículo, tão incompreendido por ti, escriba!
No fundo deste sentido natural e espiritual, se oculta um mais profundo e celeste, que não podereis assimilar pelo intelecto e também não pode ser traduzido em palavras. Quando tiverdes in- gressado na Casa de Deus em cima do Seu Monte, e de lá, à Casa de Jacob, como diz o profeta — então caminhareis na verdadeira Luz do Espírito de Deus. Dize-Me se tua compreensão se apurou!”
ASAPARENTESINJUSTIÇASNAVIDADO HOMEM
Responde o escriba: “Sim, Senhor e Mestre, deste modo é fácil compreender-se o profeta, se bem que se poderia perguntar: por que permitirás que as criaturas daqui a dois mil anos se tornem tão maldosas como o foram na época de Noé? E qual o motivo de geralmente o pobre sofrer mais, especialmente quando leva vida agradável a Deus?
Eu mesmo assisti um caso em que uma família fiel aos Man- damentos de Deus era possuidora de pequena área. Não longe daí uma outra, rica e conceituada, era proprietária de vastas terras. Esta era egoísta e nunca dava esmola, enquanto a outra dividia o pouco entre os pobres. Em um dia de trovoada, um raio caiu no casebre dos pobres, que se achavam no campo a colher a cevada. Como era de se esperar, tudo ficou reduzido a cinzas: roupas, víveres e utensí- lios caseiros. O mesmo temporal passou pela vivenda do rico, sem prejudicá-lo. Por quê?
Tais fatos são comuns e as criaturas chegam a duvidar de Deus e de Sua Misericórdia. Estou inclinado a ver nisto o maior mo- tivo da queda da fé. Todo homem possui senso de justiça, ligado a
um Deus sumamente Bom e Justo; esse sentimento sendo ferido, às vezes até brutalmente, a fé enfraquece e a Humanidade cai na noite da incredulidade ou superstição, procurando conforto e socorro até mesmo no paganismo.
Se, desse modo, em vários séculos os homens retrogradam, são acometidos de punições; julgo serem desnecessárias caso não te- nham passado por provas tão duras. Que me dizes, Senhor?”
Respondo: “Aquela família continuou infeliz, padecendo grandes misérias?”
Diz o escriba: “Isso não; sua desdita sensibilizou os vizinhos, fazendo doações tão generosas, a ponto de a família se sentir mais amparada que dantes. Entretanto, há os casos mais frequentes dos quais surge a descrença. Terei julgado erradamente?”
Digo Eu: “Muito embora raros, têm eles seu justo motivo. No exemplo dado por ti, a causa era a seguinte: o casebre já estava muito avariado e teria facilmente soterrado seus moradores. Por isto eles, por diversas vezes, haviam pedido aos ricos os meios para uma nova choupana. Seus rogos não foram atendidos. Eis que um dia o raio finalizou aquele perigo. Isso sensibilizou os corações alheios; fez-se pequena coleta e, em pouco tempo, a família não só tinha morada sólida, mas recebeu grande quantidade de mantimentos, de sorte que a aparente desgraça foi uma felicidade especial, prevista e permitida por Mim.
Quanto a outras provações que se agarram às criaturas, são nada mais que a consequência de culpas. Quando, em sua pobreza, são atingidas por golpes mais fortes, a fim de despertá-las do ócio habitual, tornam-se culpadas se nele persistem, prolongando sua desdita. Julgam Deus não atender suas súplicas, enquanto elas ape- nas são preguiçosas. Não têm o necessário rigor nos trabalhos, nem no cumprimento dos Mandamentos e em suas preces, dirigidas sem fé a Deus; eis os motivos por que continuam na atribulação até que no final resolvam trabalhar, e assim se tornam mais felizes.
Houve no Oriente um rei de um grande povo. Como o país fosse fértil, todos se entregavam à preguiça, e de ano para ano, a
pobreza se acentuava. O soberano começou a estudar os meios de sustar essa infelicidade. Veio-lhe a boa ideia de aumentar os impos- tos e fazê-los extorquir pela milícia, com rigor inclemente, até que o povo se tornasse mais ativo.
Dito e feito! No começo, as queixas e lamúrias contra o soberano mau foram gerais e facilmente a nação se teria rebelado, caso não fosse tão ociosa. No entanto, a necessidade amarga a forçou a uma maior atividade. Dentro em pouco, todos chegavam a certa abastança, pagando ao chefe os grandes impostos com maior facili- dade que anteriormente os pequenos.
Decorridos alguns anos, o rei mandou arautos por todas as zonas de seu país, divulgando importante redução de tributos. Os anciãos agradeceram ao rei a graça recebida, pedindo ao mes- mo tempo deixar a situação como estava, a bem do povo; pois, no momento em que fosse aliviado de suas obrigações, cairia no antigo ócio, dificultando o pagamento de impostos reduzidos!
O soberano elogiou a atitude dos ministros e viu que real- mente a nação se tornara mais laboriosa, abastada e feliz. Quando se soube ter sido este o motivo do aumento dos tributos, o povo lou- vou a sabedoria dele, pagando espontaneamente muito mais do que fora previsto. Do mesmo modo Eu ajo com criaturas preguiçosas e inativas. Teria feito injustiça?”
Responde o escriba: “Senhor, agradeço-Te do fundo do meu coração por teres iluminado o meu intelecto! Peço-Te prosse- guires na explicação de Isaías. O sexto versículo é mais oculto que os anteriores.”
EXPLICAÇÃODEISAÍAS2, 6–22.
ASGRAÇASDANOVA REVELAÇÃO
Digo Eu: “Pois bem! Constam as palavras do profeta: Permi- tiste, Senhor, que o Teu povo abandonasse a casa de Jacob; pois Teus povos são piores que os do Oriente! São agoureiros como os filisteus e aceitam os filhos estranhos. Seu país é cheio de ouro e prata, e
seus tesouros não têm fim; além disto, está repleto de cavalos e seus carros são incontáveis. A Terra está cheia de ídolos, e os homens ado- ram a obra de suas mãos. O povo se curva e os nobres se humilham. Certamente não lhes perdoarás, Senhor. Vai, povo infiel, às rochas das montanhas e esconde-te na terra, de medo do Senhor e de Sua Gloriosa Majestade!
Esses cinco versículos fazem parte de um conjunto, pois in- dicam o estado infeliz da Igreja, ou seja, a Casa de Deus na Terra, e isto nos judeus antes desta época, bem como nas futuras.
O ócio na prática dos Mandamentos de Deus é o motivo por que permito que Meu povo deixe a Casa de Jacob, no Monte do Senhor, imitando fielmente o proceder dos povos mais rudes e preguiçosos, que no Oriente vivem quais feras.
O que ora fazem fariseus e judeus, farão nossos descenden- tes. Instituirão quantidade de dias, aos quais atribuirão certo poder e efeito, perseguindo com fogo e espada quem falar contra. Serão igualmente vaticinadores, anunciando, por dinheiro, felicidade e desdita, conseguindo grande fama. Pois tal trabalho fútil dá maior resultado do que arado e foice.
A fim de que aumentem seus lucros, enviarão — como fazem os fariseus — seus missionários para todo o mundo, aceitando estra- nhos para filhos. Já não serviam como pagãos ignorantes; quando se tornarem filisteus mundanos, serão ainda piores! Por esse meio seu país se encherá de ouro e prata, sua ganância pelos tesouros terrenos não terá fim, inclusive seu domínio e fúria bélica, o que o profeta expressa por inúmeros cavalos e carros. Seu território dominador es- tará pleno de ídolos e templos, como fez Salomon, o sábio, mandan- do erigir templos pagãos em virtude de suas mulheres estrangeiras, não obstante a advertência Pessoal de Deus. Diante de tais ídolos, os cegos ignorantes se curvarão, adorando a obra de suas mãos, supon- do agradar a Deus. Quem assim não fizer será perseguido com fúria. Pois muitos regentes considerarão a tolice dos filisteus mundanos, em virtude da pompa externa de seus tronos, acossando com fogo e espada os poucos amigos da Luz e da Verdadeira Vida. Eis que virá
o Senhor para castigar tais povos que, em Seu Nome, seduziram tantas criaturas!
Então surgirá, de repente, a Luz verdadeira e viva por todos os lados, e os amigos da noite serão abatidos para sempre. Os gran- des e poderosos da Terra fugirão para as rochas e se ocultarão no solo estéril, de medo da Verdade e da Majestade do Senhor. Isso pouco lhes adiantará.
O profeta prossegue, dizendo: Todos os olhos altivos serão humilhados e os maiorais terão de se curvar; pois somente o Se- nhor será exaltado naquele dia e para todo o sempre. O Dia do Senhor, Zebaoth, passará por cima de todos os altivos e soberbos, e sobre os dignitários do mundo, para que sejam rebaixados. Passará por todos os cedros do Líbano (sacerdotes) e todos os carvalhos em Basan (principais esteios do sacerdócio pagão de todos os tempos); por todos os montes (regentes) e outeiros (cortesões); por todas as torres altas (generais) e todos os muros firmes (exércitos). Passará sobre navios e mares (que se acham no leme do Governo) e todos os trabalhos aprazíveis (a indústria). Isto acontecerá a fim de que todos se curvem e se humilhem, e somente o Senhor será exaltado naquele tempo. Não mais haverá ídolos. Haverá os que procurarão as cavernas rochosas e as fendas terrestres (esconderijos do dinheiro), de medo do Senhor e de Sua Majestade gloriosa (a Luz da eterna Verdade), quando Se aprontar para punir a Terra. Naquele tempo, cada um atirará seus ídolos prateados e dourados nos buracos das toupeiras e morcegos — objetos de sua adoração — a fim de que se possa ocultar mais facilmente nas fendas, de pavor do Senhor e Sua Majestade Gloriosa. Isto de nada adiantará. Por isto, deixai as criaturas orgulhosas, pois não sabeis qual seu conceito no mundo.
Aí tendes toda a explicação do segundo capítulo do profeta Isaías. Os restantes se explicam automaticamente pela compreensão dos primeiros.
Afirmo-vos que assim sucederá dentro em breve e novamente em sua totalidade após aproximadamente mil e novecentos anos; pois, até mesmo no Meu Critério, não há outro meio em virtude
do respeito ao livre arbítrio, a não ser uma chamada de tempos em tempos para enfrentar-se o ócio de maneira frutífera. É ele a raiz de todos os pecados e vícios.
Naturalmente, não sentis alegria por isto; muito maior, po- rém, será o contentamento de futuros povos quando receberem esta Mensagem em sua grande tribulação, numa época em que um povo se levantará contra o outro para exterminá-lo. Sobre este ponto, o próximo capítulo vos dará maior esclarecimento!
Dizei-Me primeiro como assimilastes este assunto de suma importância. Digo ‘de suma importância’ porque desejo vossa pre- servação, Meus futuros seguidores, e de vossos adeptos, do ócio. Fa- lai, pois, do sentido espiritual encontrado nas palavras de Isaías. Em seguida, passaremos ao terceiro capítulo.”
Concordam todos em uníssono: “Senhor, tudo que organi- zas, queres e permites é bom, sábio e justo. Fossem ouro, prata, pé- rolas e pedras preciosas apenas prejuízo para os homens, certamente não os terias criado!
Quem, além de Ti, poderá saber se eles, sem tais seduções, não se teriam tornado mais preguiçosos do que são?! Se muitos, pela grande atração de tais seduções, se transformam em verdadeiros de- mônios, terás recursos de sobejo para curá-los e concluímos que, no Final dos Tempos, tudo será solucionado dentro de Teus Desígnios ocultos e eternos.
Como apóstolos escolhidos, tudo empenharemos para en- tusiasmar e conservar ativos os Teus filhos. Se eles assim continuarão em épocas futuras — eis uma questão duvidosa. Todavia, permitirás o que for melhor para sua salvação, como sejam: guerras, pestes, carestia e fome, ou paz, saúde e vida abençoada e frutífera! Deste modo expressamos nossa opinião.”
Digo Eu: “Desta vez estou plenamente satisfeito convosco. Ouvi-Me, pois!”
(O Senhor): “Também este capítulo terá seu sentido profé- tico para agora e para a época avisada. Eis o primeiro versículo: O Senhor Zebaoth tirará de Jerusalém e de Judá todo provimento de pão e água.
Na expressão ‘Jerusalém’ deveis entender o judaísmo de hoje e de antanho; em ‘Judá’ se entende as futuras gerações que, pela aceitação de Minha Doutrina, serão anexadas ao tronco Judá. Terão de enfrentar a mesma sorte que os judeus atuais, em virtude de sua enorme preguiça.
Na supressão do estoque de pão, deveis compreender a ces- sação de amor e misericórdia, e a da água, a extinção da verdadeira Sabedoria de Deus; a consequência será que todos caminharão em graves erros e obscurecimento da alma e ninguém terá conselho para o próximo. E caso o faça, o necessitado de luz e conselho não con- fiará nele, dizendo: Como podes falar da luz, encontrando-te na mesma cegueira que eu?!
O fato de estarem as criaturas completamente desamparadas em virtude de seu ócio é fielmente traduzido pelo profeta quando diz: Ser-lhes-ão tirados valentes e soldados, juízes, profetas, adivi- nhos e anciãos; conselheiros e sábios artesãos, prudentes oradores e capitães acima de cinquenta, bem como pessoas honestas.
Menciono capitães e honestos no final, em vez de no iní- cio do terceiro versículo, e tenho Minhas razões para tanto. Ouvi a explicação! Quem são os valentes e soldados? São aqueles, como David, cheios de fé e confiança em Mim; e os soldados são os que se entusiasmam com a fé e a confiança, a fim de que vençam sempre todos os inimigos do Bem e da Verdade de Deus.
Quando nos homens se tiver apresentado a completa carên- cia da Água viva dos Céus e toda carne, inclusive a alma, se en- contrar na treva mais densa — quem poderia ser juiz bom e justo? Quem teria o dom da predição? E ainda que alguém o tivesse, quem
lhe daria crédito?! Quem poderá profetizar aos cegos e surdos em espírito?! A quem a Humanidade ignorante poderia escolher para verdadeiro ancião e pastor, em virtude de sua sabedoria excelente? Compreendei a situação!
A quem foram tirados pão e água, tudo terá sido tirado; pois quem Deus castiga com cegueira espiritual terá sido mais fortemen- te castigado. Tudo lhe foi tirado, achando-se completamente inde- ciso e desamparado. Eis o recurso extremo, pelo qual se consegue enfrentar a preguiça excessiva e todos os seus vícios.
A evidente miséria das criaturas desprovidas de pão e água e o que mais perderam com isto é apontada pelo profeta quando diz: Ser-
-lhes-ão tirados conselheiros e sábios artífices em todos os ramos das necessidades humanas, inclusive prudentes oradores, que sempre fa- ziam o bem com sua inteligência. O pior de tudo é o afastamento dos cinquenta capitães! Quem são e o que significa o número cinquenta?
Ao imaginarmos uma comunidade grande e perfeitamente equilibrada, ela terá que organizar, de modo geral, cinquenta ramos principais para suas necessidades de vida, desde eras remotas. Todo excedente faz parte do orgulho, e abaixo desse número, demonstra fraqueza, carência e pobreza. A fim de poder cada ramo das necessi- dades enumeradas ser provido e manobrado com eficiência, neces- sita de um chefe competente como reitor e guia entendido do me- canismo de sua empresa, do começo ao fim; este faltando ou sendo inexperiente, seu ramo trará péssimos ou até mesmo nenhum fruto.
Como poderia subsistir uma grande comunidade se, pela preguiça e indolência, vê-se destituída de todos os cinquenta ca- pitães? Digo-vos: do mesmo modo como agora se acha a grande comunidade dos judeus, em que somente certos ladrões e assaltan- tes possuem algo, nutrindo-se à custa dos pobres, cuidando apenas de si, enquanto milhares padecem na mais profunda miséria. Pois onde estaria o sábio chefe que por eles zelasse e lhes desse emprego e pão, em uma ou outra profissão? Como ele falte em vários ramos, falta o equivalente! Se bem que haja certos capitães dirigindo de- terminados ramos, fazem-no para si e não para o povo; por isto são
apenas ladrões e assaltantes e não justos chefes, como na época dos Meus Juízes.
Compreendestes o bem interno e externo de uma grande comunidade depender dos chefes dos diversos ramos de necessida- des; mas de quem depende a justa organização dos mencionados chefes num país orientado por qualquer Governo? De um sábio rei!
Que disse o profeta referindo-se àquilo que o Senhor faria a uma Comunidade indolente e esquecida de Deus? Foram estas as suas palavras: Eu, o Senhor, dar-lhe-ei jovens para príncipes, e crian- ças a dominarão! Os homens se esfolarão mutuamente, um será con- tra o outro, o jovem contra o ancião, e o trapaceiro contra o honesto!
As palavras do profeta são tão claras e verdadeiras, dispen- sando esclarecimento; posso chamar vossa atenção apenas para as consequências gerais e nocivas, conquanto se subentendam. Se cair tal confusão em todas as condições de vida de um país, provocando a maior desordem e miséria, atirando as criaturas duma comunidade no pior descontentamento, surgirão revoltas impiedosas. O povo desperto se levanta, enxota os regentes e capitães egoístas, ou talvez os massacre. Isto quer dizer: um povo agirá contra o outro.
Pois o homem, em sua constituição indolente, suporta toda opressão enquanto consegue encher o estômago ainda que com ali- mento péssimo; este terminando e nada mais se lhe deparando senão a morte pela fome, ele desperta e se torna hiena feroz. É preciso a Humanidade chegar a tal ponto a fim de despertá-la.”
RUÍNA DAS FALSAS CONSTRUÇÕES RELIGIOSASAPONTADASEMISAÍAS3, 6–27
(O Senhor): “Deste modo tudo é arrasado e exterminado. Havendo possibilidade de atribuir-se culpa a alguém na colaboração da desgraça popular, é atingido como vítima da ira geral. Que será então? Ficaram os homens sem guia algum, bom ou mau. Reina completa anarquia, na qual cada um faz o que quer e o mais forte terá oportunidade de vingança!
Eis que os mais ponderados se reúnem e conjecturam: Isso não pode continuar! Façamos uma Liga, insuflando o povo à eleição de um chefe competente. E haverá Assembleia constituída de dois membros para cada experiência aprovada! — Qual será o resultado? Deixemos que o profeta se expresse!
Um irmão procurará outro em seu lar, dizendo-lhe: Tu tens vestes (conhecimentos e experiências); sê nosso príncipe e ajuda nes- sa ruína! O outro jurará em tal dia: Não sou médico, e não há pão (o bem surgido da verdade) nem roupa (a verdade surgida da fé) em minha casa. Não me ponhais para regente do povo! Jerusalém está madura e cai em ruína, e Judá (a época posterior) igualmente ruirá; pois sua língua e ação são contra o Senhor, porquanto reagem aos Olhos de Sua Majestade (à Luz de Sua Sabedoria). Isso tudo é do conhecimento do mundo. Seus feitos não enganam; pois se vanglo- riam de seus pecados como em Sodoma e Gomorra; são atrevidos e não se ocultam. Ai de suas almas, pois se atiram à própria desgraça!
O príncipe eleito, que talvez seja Eu Mesmo, prosseguirá: Ide pregar primeiro aos justos, para que se tornem bons, podendo comer o fruto de suas obras! Ai dos indolentes e ateístas; sempre são maus e receberão o galardão de seus feitos como mereceram! Por isso, são crianças regentes do Meu povo, e mulheres o dominarão. Meu povo, teus (falsos) consoladores te seduzem (viva Roma!) e des- troem o caminho que devias palmilhar!
E o Senhor Se apresenta para pleitear e julgar os povos. Ele vem ao julgamento com os anciãos do Seu povo (a Escritura) e Seus príncipes (os inspirados da época atual), pois vós (fariseus e roma- nos) vilipendiastes a vinha e o despojo dos pobres está em vossa casa.
Por que pisais o Meu povo e moeis ainda mais os aflitos? Assim fala agora o Senhor dos Exércitos, tomado do máximo rigor.
Diz Ele mais: Pelo fato de as filhas de Zion serem orgulho- sas (as falsas doutrinas da prostituta de Babel), andaram de pescoço erguido, faces pintadas e de passos provocadores com sapatos enfei- tados — o Senhor fará calvas as cabeças (destituí-las-á da razão), e lhes tirará sua única joia.
Em tal época, o Senhor também lhes tirará o enfeite dos ricos calçados (os de fé cega), as presilhas (fiéis prosélitos), fivelas (con- decorações várias), correntes, pulseiras e toucas (hábitos supersti- ciosos), lantejoulas, guarnições, todos os enfeites dourados, maçãs almiscaradas, brincos, anéis e fitas, vestes de festa, mantos, véus, alforges, espelhos, coletes, galões e capinhas (tudo isso, cerimônia ofuscante da prostituta de Babel). No lugar do perfume haverá mau cheiro; por cinto uma corda, e calvície em vez de cabelos encrespados (prudência da serpente de Babel), e no lugar dum manto amplo, re- ceberá um saco; tudo isso será posto em lugar de sua pretensa beleza.
Teu populacho cairá pela espada e teus guerreiros na peleja. E suas portas gemerão e prantearão (pois não haverá quem passe por elas), e ela sentará no chão, desolada. Em tal época, as guer- ras farão raros os homens, a ponto de sete mulheres agarrarem um homem (dos sete Sacramentos se fará um), dizendo: Nós mesmas nos alimentaremos e vestiremos, permita sejamos chamadas pelo teu nome, a fim de que se tire o nosso próprio.
Vede, Meus amigos, tudo que o profeta disse se cumprirá, tão certo como Eu vos expliquei. Pois os homens não suportam a Verdade por longo tempo, cansam-se e recaem sempre no ócio anti- go do julgamento e da morte; não haverá outro meio senão desper- tá-los drasticamente, reconduzindo-os à atividade pelos caminhos e veredas da Luz e da Vida.
Por isso, repito: adverti as criaturas, antes de mais nada, da indolência espiritual, pois com ela se apresentam todos os males mencionados pelo profeta, e Eu Me vejo obrigado a permiti-los! Meditai a respeito, e no albergue poderemos estender o assunto. Vamos, pois nesta noite ainda teremos trabalho!”
AAMBIÇÃO.ORGULHOE HUMILDADE
Ao chegarmos ao albergue de Nicodemus, já nos esperava boa ceia. Como entre os Meus discípulos se encontre grande núme- ro de templários intimamente presos à antiga ambição, estabelece-se
pequena contenda quanto à organização dos lugares. Em virtude disto, o mencionado escriba e os fariseus recém-convertidos ocupam os primeiros assentos, sem perceberem que Eu Mesmo, os romanos, os três magos e os egípcios não havíamos feito menção para tanto, o que de modo algum agrada a Nicodemus e a Lázaro.
Por isto, Me aproximo e digo: “Ouvi! Em Meu Reino não existe ambição, pois quem se enaltece será humilhado; quem se hu- milha com modéstia será enaltecido!
Quando convidados para uma ceia, não vos deveis dirigir aos primeiros lugares, talvez destinados a hóspedes distintos. Se tal ho- mem viesse e o dono do banquete te dissesse: Amigo, senta-te mais embaixo, pois esses lugares são reservados a pessoas mais eminentes!, não seria tal vergonha mui desagradável?!
Se, porém, procurares um lugar no fim da mesa e o anfitrião disser: Senta-te no primeiro lugar, pois esses são para hóspedes mais simples! — certamente te alegrarás. Deve constituir para todos um ensinamento básico e de princípio vital: quem se enaltecer será di- minuído; quem se humilhar será enaltecido!
Assim será no Meu Reino: o menor e mais simples será o maior. Pois no Céu, tudo é contrário à ordem mundana; o que dian- te do mundo é grande e pomposo, no Céu é pequenino, sem valor, brilho e pompa. Este ensinamento deve ser anotado, e onde se pre- gar o Meu Evangelho, não deve ser omitido!
Eu sou o Próprio Senhor — de todo coração meigo e hu- milde! Sede todos assim, provando que sois Meus discípulos ver- dadeiros!” Os templários se levantam, visivelmente envergonhados, fazendo menção de mudar de lugar.
Digo-lhes, porém: “Podeis ficar! Entre nós não vem ao caso qual o lugar ocupado, pois a distinção do assento depende da pessoa que o ocupa. Eu sendo o Senhor, o sou em todos os lugares, e para um outro não haverá assento que o glorifique.
De que te adiantaria se, por exemplo, fosses a Roma e te sentasses no trono do imperador, e ele tolerasse a brincadeira, sen- tando-se num simples banco? Com isto jamais serias imperador, e
ele o será no banco de pau. O valor do lugar depende, portanto, não do mesmo, mas de quem o ocupa; ficai, pois, onde estais!”
Em seguida, vou a outra ponta da mesa com Meus apóstolos, Raphael, Lázaro e Nicodemus, enquanto Agrícola diz: “Senhor e Mestre, agora compreendo onde, para cada um, se encontra o pri- meiro lugar propriamente dito! Oculta-se na verdadeira profundeza da humildade! Os romanos usam um bom provérbio: lauspropria sordet!(o elogio próprio cheira mal), e estou satisfeito de termos chegado a tal compreensão através de raciocínio e análise daquilo que na Luz de Tua Sabedoria tem aspecto muito mais agradável que determinadas instituições do Templo, construído pelo mais sábio rei da Terra!”
Digo Eu: “Por isto a Luz será tirada aos judeus e entregue a vós, pagãos, como predisse o profeta!”
Obsta um dos fariseus: “Que acontecerá então aos judeus?”
Respondo: “Já vos demonstrei e descrevi, e pelos sinais no- turnos pudestes fazer a leitura! Tornaste-vos mil vezes piores que quaisquer pagãos! Por isso, os judeus serão dispersos como palha pela tempestade, entre todos os povos da Terra, sem jamais possuí- rem país e rei!”
Insiste o escriba: “Mas o Senhor prometeu a David o tro- no eterno!”
Digo Eu: “Sim, e assim será; todavia, não materialmente como julgais, mas em espírito. Cada um se transformará num David no Meu Reino através do Meu Verbo — enquanto neste mundo vos submetereis à autoridade terrena, boa ou má; pois o poder lhe foi dado do Alto!
Nenhum de vós deve almejar posto de soberano na Terra; pois quem tiver de sê-lo ouvirá a chamada de cima e sentirá no cora- ção como reger os seus povos. Criaturas orgulhosas e altivas devem ser dominadas por soberano orgulhoso e altivo; boas e humildes receberão regente que as fará felizes. Portanto, dependerá dos ho- mens, no futuro, a categoria de seus regentes! Gravai-o bem! Agora, passaremos à ceia!” Faz-se silêncio, pois todos se alimentam.
Nisto, surge grande tumulto e alvoroço na rua, e um grupo invade o refeitório, chamando por Nicodemus. Este se levanta e per- gunta, aborrecido, qual seu desejo a essa hora.
Um damasceno se adianta e diz: “Fomos informados seres tu delegado do local e vimos para fazer reclamação pelo maior abu- so aqui praticado! Pagaremos nossa despesa dentro do justo — de modo algum concordamos que se nos tire a pele!”
Indaga Nicodemus: “Qual foi a injustiça?”
Responde o orador: “Senhor, organizamos carros e animais numa grande praça e nos acomodamos em diversas hospedarias, por- quanto aqui não havia lugar. Satisfizemo-nos com um péssimo jan- tar e estávamos prontos a pagá-lo, porém os tavoleiros apresentaram uma conta que não ousaríamos apresentar em Damasco, ainda que o hóspede tivesse passado um ano em nossa casa! Isto nunca se deu!”
Diz Nicodemus: “Em que consistia a refeição?”
Responde o damasceno: “Recebemos um peixe regular, um pedaço de pão fermentado e um copo de vinho comum. E por isto cada um deveria pagar cem moedas, importância suficiente para uma viagem de ida e volta à Índia! Que dizes a isto?”
Responde Nicodemus: “Já pagastes?” Diz ele: “Senhor, o tu- multo surgiu em virtude de nossa recusa! Querem tirar-nos nossa mercadoria, como se fôssemos salteadores, razão por que procura- mos proteção contra tamanha violência! Se assim for, hão de conhe- cer os damascenos!”
Diz Nicodemus: “Ouvi vossa queixa e, caso se justifique, ser-
-vos-á feita justiça; tenho que ouvir a parte contrária para ser justo. Que se apresente um dos hospedeiros exigentes!”
Havia três tavoleiros no meio dos queixosos, que se exter- nam: “Não negamos termos exigido um excesso pelo jantar; acon- tece que também já estivemos em Damasco, onde ficamos somente três dias, e fomos esfolados da mesma forma. Se, portanto, cobra- mos dez vezes mais que de costume, apenas reavemos o que há mui-
to nos tiraram. Agimos pela Lei de Moysés que diz: Olho por olho, dente por dente!”
Diz Nicodemus: “Será difícil fazer justiça a ambas as partes! Vós, damascenos, agistes sem escrúpulos com os emauenses, e estes pagam na mesma moeda! Indenizai-vos reciprocamente e a conten- da terá fim diante de Deus e dos homens justos!”
Insiste o orador: “Senhor, conhecemos apenas uma justiça, que se chama ‘retidão’. Se os emauenses pretendem equilibrar sua despesa, que o façam com o tavoleiro e não conosco, que nunca exageramos os preços de nossa mercadoria!”
Retrucam os outros: “De maneira alguma! Juramos jamais pisar em Damasco! Que estes nos paguem o que exigimos, podendo eles pedir indenização a seus conterrâneos!”
Indeciso, Nicodemus Me pergunta o que fazer. E Eu digo: “Os damascenos têm razão e os emauenses são usurários! Devem pe- dir o que de justiça, quer dizer: cada comerciante pague duas moe- das — e nada mais! Se os emauenses foram explorados em Damasco, a culpa era evidentemente deles; queriam mostrar-se como viajantes abastados, banqueteando-se com licenciosidade, e foi justo terem pago de acordo. Se acharam a conta elevada, deveriam ter reclama- do com os juízes daquela cidade! Se naquela ocasião sua jactância permitia as despesas elevadas, têm que se submeter à reclamação dos outros! Querendo usar de violência contra os damascenos, receberão a mesma paga! Poderão agir à vontade; nós faremos o mesmo!”
Minhas Palavras são ouvidas pelos dois partidos; o orador damasceno se adianta e diz: “Amigo desconhecido! Falaste a pura verdade! Esses homens nos desconsideram totalmente, porque vi- vem nas proximidades da grande Jerusalém; por isto, exigiam o que havia de melhor e nada lhes parecia caro demais. Agora parecem arrependidos de sua fanfarronice e querem ressarcir-se em nós, ino- centes. Tu, porém, proferiste uma sentença justa, de sorte que acres- centamos o pedido de sua execução!”
Adiantam-se os atrevidos emauenses: “Saberemos impedi-la! Quem és tu, para tomares a defesa desses damascenos fraudulentos?”
Digo Eu: “À minha Direita estão os dignitários de Roma, vindos expressamente por Minha Causa! Caso não vos submetais à Minha Sentença, eles dirão Quem Sou! Ai de vós, almas usurárias! Fica estabelecido o que disse! Fazei o que vos agrade!”
Os três se afastam rápidos e resolvem atacar a caravana com a ajuda de seus empregados, amigos e partidários. Tal plano é por Mim transmitido a Nicodemus e Agrícola. Este, de modo algum simpatizante dos emauenses, pergunta a Nicodemus se há destaca- mento romano na aldeia. E o delegado lhe assegura haver sempre cem soldados no quartel. Agrícola manda que o comandante se apresente.
Intervenho, porém: “Amigo, o perigo sendo iminente, tua ordem chegaria atrasada! Por isto já organizei tudo por Raphael, e os soldados executam sua tarefa. Dentro em pouco trarão aqui os tavoleiros renitentes, pois no momento em que se aproximavam das carroças e animais, foram cercados e presos. Aqui virão e o coman- dante entrará perguntando a Nicodemus pela solução do caso.”
Agrícola está todo satisfeito e Nicodemus indaga qual Meu parecer. E Eu digo: “Ouviste Minhas Palavras aos damascenos! Caso os tavoleiros não concordem, recebe tu a importância que Eu estipu- lei e distribui-a, oportunamente, entre os pobres! Os maus tavoleiros ficarão três dias no cárcere e, quando soltos, deverão ser adverti- dos e ameaçados. Isto será suficiente para torná-los mais benévo- los e comedidos em casos futuros.” E tudo aconteceu conforme Eu havia dito.
UMPEQUENOEVANGELHOPARAOS DAMASCENOS
O orador damasceno em seguida Me pergunta especialmente como poderia gratificar-Me por ter proferido sentença tão eficaz, pois Me considera juiz da comarca.
Digo-lhe, portanto: “Não aceito recompensa por Minha Doutrina e sentença. Todavia, digo — não obstante a justiça de vos- sa causa — sede futuramente criteriosos e justos com todos. A injus-
tiça é o maior mal entre os homens, criando inimizades e disputas. Essas se infiltrando, não haverá mais salvação entre os homens, mas apenas inveja, ódio, assaltos, crimes e guerras.
Em futuro breve, Meus discípulos irão à vossa pátria; acei- tai e aplicai o que ensinarem. E o que lhes fizerdes será o mesmo como feito a Mim. Eis a recompensa que exijo pela Minha Sentença. Compreendestes?”
Diz o orador: “Sim, venerável juiz! Como comerciantes e fa- bricantes privamos com quase todos os povos da Terra e entendemos seus idiomas, conquanto consideremos somente o sentido de tuas palavras. Desejamos ainda saber como reconhecer os teus discípulos quando procurarem por nós em Damasco!”
Digo Eu, apontando todos: “Ei-los! Um ou outro vos trans- mitirá a Doutrina da Salvação para vossas almas. E dentro de alguns anos será por Mim despertado um apóstolo em vossa cidade, que vos demonstrará a Verdade plena. Antes disto, será ele inimigo da Minha Luz; porém, após a inspiração, passará a ser o maior divulga- dor da mesma. Antes dele, outros vos procurarão, por ele persegui- dos; acolhei-os bem, que vossa recompensa não será pequena!
Quem aceita fielmente um profeta em Meu Nome terá o prêmio de um profeta. Meus discípulos e apóstolos serão verdadei- ros profetas, portanto servos de Deus, o Senhor, pelo Qual também Eu fui enviado a este mundo, para salvação de todas as criaturas que creem em Mim e vivem dentro de Minha Doutrina. Tereis compre- endido isto?”
Responde o orador: “Perfeitamente! Segundo as tuas pala- vras, não somente és juiz sábio e bom, mas também profeta verda- deiro dos judeus, razão por que te lastimamos, pois os judeus de hoje são os maiores inimigos dos profetas antigos e muito mais dos recentes. Os pastores (fariseus), anciãos (sacerdotes), e os escribas nada podem considerar como sua posse e têm de viver do dízimo e oferendas reduzidas; entretanto, querem considerar o país todo pos- se deles, usufruindo seus produtos e o povo deve trabalhar para eles sofrendo as piores privações, em Nome de Deus.
Nós, damascenos, fomos e em parte ainda somos bons judeus; mas de Jerusalém não aceitamos missionário para nos converter em benefício dessa metrópole fraudulenta! Profetas e juízes como tu serão bem recebidos, muito embora sejamos gregos, assírios e babilônios!”
Digo Eu: “Não tendo pressa, ficai mais um pouco para apre- ciardes certos acontecimentos! Ainda há pão e vinho; sentai-vos, pois neste albergue ninguém vos cobrará cem moedas!” Os comerciantes não se fazem de rogados, entregando-se com prazer a essa refeição.
OSENHORRESSUSCITAUMA VIÚVA
Entrementes, invade a sala grande número de mulheres e crianças chorando copiosamente e pedem a Nicodemus a liberdade de seus maridos e empregados, presos pelos soldados romanos.
Nicodemus, porém, diz: “Todos serão libertados dentro de três dias! Foi-lhes aconselhada a condescendência; como não a acei- taram, pagarão pela teimosia!”
Adianta-se uma moça e diz: “Senhor, minha mãe está à mor- te! É viúva e tem um empregado mui fiel. Quando houve o grande tumulto na rua, casualmente expressou-se a favor dos emauenses. Por isto, foi preso com os outros. Por causa de minha mãe, vos peço a liberdade dele, que é inocente!”
Diz Nicodemus: “Não duvido ser a culpa dele menor do que dos tavoleiros; todavia, compartilhou dos partidários e mereceu a prisão. Se tua mãe, porém, está à morte, perguntarei ao nosso Juiz Supremo se permite a liberdade do empregado. Espera um pouco!”
Inquirido a respeito, respondo a Nicodemus: “O menciona- do empregado não pode ser solto, porque não se encontra na pri- são. Percebendo a situação perigosa, fugiu e se escondeu no albergue onde, pela manhã, encontramos a família pobre. Enviarei Raphael para trazê-lo aqui; depois trataremos do assunto!”
Em poucos minutos o arcanjo está de volta com o rapaz, que prontamente pede perdão por ter tomado parte na contenda, por simples curiosidade.
Digo Eu: “Sê mais prudente no futuro e não compartilhes de tumultos, do contrário passarás mal! Acompanha essa moça, em cuja casa trabalhas, e traze a sua mãe enferma para que Eu veja se posso socorrê-la!”
Ambos se afastam depressa, voltando em breve, e o emprega- do exclama: “Bom juiz, a mãe dessa moça, minha patroa, faleceu! E não haverá quem a socorra!”
Digo Eu: “Se tivésseis fé, poderíeis ver a Imensa Glória do Poder de Deus no homem!”
Respondem ambos: “Senhor, o Poder Divino é grandioso, mas até hoje não criou recurso contra a morte! Acreditamos que a alma continue viva após a morte física; mas que o corpo possa vol- tar à vida — dificilmente. Fala-se dum Dia do Juízo Final, no qual todos que apodrecem nas tumbas ressuscitarão. Julgamos ser isto um consolo fútil, para que as criaturas não tenham tanto pavor da morte. Para nós, jamais alguém voltará à vida após a morte.
Quanto ao destino da alma, só Deus sabe; pois nunca al- guém voltou de lá para relatar a vida do Além. Agradecemos-te a boa vontade; uma vez que não houve possibilidade de cura, seria importuno trazer a morta!”
Obsto: “Ela talvez esteja aparentemente morta e poderia ser chamada à vida!”
Protesta a moça: “Bom homem, minha mãe faleceu de consumação, da qual padeceu durante cinco anos! Portanto, não há possibilidade de engano. Só Deus poderia ressuscitá-la, mas nunca a ciência humana!”
Digo Eu: “Do teu ponto de vista tens razão e, além dis- to, não Me conheces. De qualquer maneira, deveríeis estranhar Eu saber do esconderijo de vosso empregado, muito embora não Me tivesse afastado daqui durante o tumulto. Se disto fui capaz, por que não faria outras coisas, caso tivésseis fé e vos désseis ao trabalho de trazer a defunta?”
Dizem ambos: “Se não fosse muito desagradável a ti e aos demais hóspedes, poderíamos trazê-la!”
Digo Eu: “Veremos se a situação será desagradável ou não! Mandai trazer o corpo!”
Dentro em pouco eles transportam o cadáver ainda no leito e todos os presentes, comovidos, olham ora para Mim, ora para o corpo.
Levanto-me e digo: “Quem tiver conhecimento, analise se ela está realmente morta!”
Exclamam quase todos: “Senhor e Mestre, não é preciso, vê-se de longe que morreu!”
Digo Eu: “Pois bem, então quero que viva e se levante com saúde, alcançando assim idade avançada!”
Quando termino, a ressuscitada salta do leito, olha para to- dos e indaga da filha assustada: “Que aconteceu comigo?” Responde ela: “Minha mãe, há uma hora acabaste de falecer! Mas este Salvador te despertou com plena saúde e prometeu vida longa!”
Exclama a genitora: “Realmente me sinto perfeitamente sa- dia! Mas como recompensarei este bom homem, pois sou apenas pobre viúva?”
Digo Eu: “Dividindo o pouco que tens, terás feito o Bem a Mim! Sempre foste caridosa, dividindo teus fracos recursos com os pobres, portanto mereces misericórdia. Agora senta-te à mesa, para nutrires o teu físico!”
A viúva, a filha e os servos se servem de tudo e agradecem pelo benefício recebido. Em seguida, os empregados levam o leito, enquanto mãe e filha continuam expressando sua gratidão.
Digo à moça: “Então, Minha filha, é possível despertar os mortos?” Diz ela, comovida: “Somente a ti, Senhor e Mestre! Por isto todas as gerações te louvarão até o fim do mundo; pois tais feitos não podem ficar ocultos!”
Respondo Eu: “Concordo contigo — mas, por ora, não Me denuncies em vossa comunidade! Agora podeis ir!” Elas se despedem e são levadas a casa por Nicodemus e José de Arimatheia, que lhes prometem ajuda financeira. Ao voltarem, o primeiro Me transmite sua ação, indagando se agira bem.
Digo Eu: “Quando teria alguém pecado ao praticar obra de caridade? O que fizerdes, fazei em silêncio e não admitais elogio do mundo; basta Deus sabê-lo. Quem se deixa elogiar e honrar pelo Bem praticado receberá paga do mundo, e sua recompensa no Meu Reino será pequena. Por isto, tua mão direita não deve saber o que fez a esquerda. Gravai-o em vossos corações e agi de acordo, que vivereis encontrando o prêmio nos Céus!”
Ambos silenciam, pois percebem não ser do Meu Agrado externarem seus planos caritativos perante os outros.
Os comerciantes de Damasco estão perplexos e o orador diz com grande respeito: “Senhor e Mestre, és mais que simples homem! Podes nos enviar os Teus discípulos, que seguiremos seus ensina- mentos! Agradecemos por tudo e voltaremos ao nosso albergue, a fim de transmitir aos colegas o que assistimos.” Com isso os comer- ciantes nos deixam.
RETORNOAOMONTEDAS OLIVEIRAS
Viro-Me então para Nicodemus: “Ontem prometi dar elu- cidação completa acerca do Dilúvio; Raphael o fará por Mim, en- quanto descansarei um pouco.” O arcanjo explica aquele aconteci- mento conforme consta na obra A Criação de Deus, e todos estão admirados.
O relato dura uma hora e Eu, em seguida, digo: “Aproximou-se a meia-noite e temos de partir! Vamos ao Monte das Oliveiras, en- quanto os olhos de nossos inimigos estão cerrados! Ainda assim, não iremos juntos nem conversaremos; o Templo enviou espiões, em parte por Minha Causa e em parte pelos dois fariseus e dois levitas. Os espiões têm grande pavor de qualquer perigo à noite; por isto não falarão com pessoa alguma. Ouvindo qualquer palestra, saberiam de quem se trata, exigindo sua identidade. Conservemos, portanto, essa prudência!”
Diz o egípcio: “Senhor e Mestre, se permitires nossa com- panhia, poderemos ir na vanguarda, que os espiões fugiriam quais
lebres dos cães. Poderíamos assustá-los, porque nossa pele escura dá impressão de sermos verdadeiros demônios! Se, por acaso, nos qui- sessem atacar, aplicaríamos a mesma medida feita a Agrippa e Laius: fixá-los-íamos num determinado ponto, o tempo que quisesses!”
Digo Eu: “Meus caros, o que pretendeis fazer, Eu também o poderia caso fosse necessário, como já aconteceu em outras ocasiões; no momento, não seria necessário nem oportuno, portanto segui- remos como determinado. Os dois romanos moradores em Emaús nos acompanhando, também podereis ficar conosco até amanhã, considerado feriado judeu. Irei doutrinar amanhã no Templo. De- pois, podereis seguir para a pátria com os romanos!”
Em seguida, Me levanto dizendo: “Quem quiser, Me acom- panhe!” Todos se erguem, com exceção da mulher e dos filhos de Nicodemus, pois foram avisados para ficarem. Chegando à praça, Agrícola indaga pelos jovens. E Eu respondo: “Fica quieto, encon- trarás todos no Monte das Oliveiras.”
Dentro de meia hora estamos nas proximidades de Jerusa- lém, onde encontramos alguns vigias. Deixam-nos passar, porque éramos muitos e nos tomaram por romanos e gregos, com os quais não queriam entrar em conflito.
Assim, chegamos em breve ao Monte, onde o refeitório nos aguarda iluminado. O tavoleiro de Lázaro pergunta se desejamos tomar qualquer alimento. Eu respondo: “A esta hora não convém ao homem alimentar-se, pois os intestinos também necessitam de repouso. Amanhã cedo podes tratar disto.”
Ele se dirige ao anfitrião e lhe entrega soma vultosa, ganha neste dia, dizendo ter sido a maior parte paga pelos traficantes. Diz Lázaro: “Não devias ter aceito dinheiro deles!”
Responde o tavoleiro: “Foi essa a minha intenção, sabendo serem teus amigos. Eles, porém, afirmaram terem aqui recebido os maiores tesouros da vida, impossíveis de pagamento com todo o ouro do mundo. Como poderiam permitir que fossem, com seus empregados, tratados gratuitamente?! Portanto, deveríamos aceitar essa bagatela para o meu patrão e para mim!
Assim, depositaram sete sacolas cheias de moedas de ouro em cima da mesa e se retiraram rápidos. Nada pude fazer senão guardá-las para ti. As cem moedas restantes, cobrei de outros; pois vieram muitos hóspedes, principalmente forasteiros, comeram e pa- garam bem. Alguns queriam pernoitar; desculpei-me com a alegação de aguardar algumas centenas de pessoas que voltariam após excur- são de Emaús. Aceitei somente um velho peregrino, acomodando-o no meu quarto.
Entre outros, esteve aqui aquela pessoa que havia trazido os dignitários romanos. Comeu e bebeu e se informou principalmente do Senhor e Mestre, e pagou essas dez moedas. Não confiei nela, porque podia ser espiã do Templo, motivo pelo qual não lhe disse o paradeiro do Senhor. Ficou tão decepcionada que começou a chorar.
Por isto lhe disse: Se tua saudade do Senhor que te curou é tão grande, procura viver dentro dos Seus Ensinamentos e Ele, ciente dos pensamentos mais ocultos, permitirá que O vejas oportu- namente. — Concordando, ela se afastou. Eis tudo que aconteceu na tua ausência. Desejo saber se agi certo!”
Responde Lázaro: “Amigo, como sempre, agiste certo, e creio o Senhor também estar satisfeito contigo! Essa importância poderás guardar como pagamento do teu trabalho!”
Diz o tavoleiro: “Aceito-a, não para mim, mas sei de muitos necessitados!”
Nisto Me aproximo e, apondo-lhes as Minhas Mãos, digo: “Assim está certo, Meus caros! Digo-vos: tu, Jordão, e o irmão Láza- ro valem mais que cem países cheios de injustiça e amor-próprio!
Em verdade, se aqui não tivesse encontrado alguns homens como vós, não teria ficado neste local! Continuai nos Meus Cami- nhos, que serei não somente vosso Senhor e Mestre, mas verdadeiro Irmão, e o que Me pertence desde eternidades também será vosso para sempre!
Outro seria o mundo caso todas as criaturas fossem seme- lhantes a vós! Mas a preguiça é o antigo laço de Satanás, pelo qual se deixam amarrar para seu próprio extermínio. Não era possível
criá-las mais perfeitas do que são! Possuem raciocínio, inteligência, livre vontade e consciência, que as adverte constantemente, e sábios doutrinadores inspirados por Mim quais anjos; a indolência volup- tuosa as afasta da justiça, verdade e bem, sucumbindo no reino da perdição, havendo apenas o recurso de julgamentos e castigos cons- tantes. E até isto só adianta à minoria.
A Terra toda não sofreria más colheitas se os homens fossem aproximadamente como vós; mas assim, em toda a Judeia não há mil como deveriam ser. Por causa deles não castigarei o país com praga total. Os bons serão poupados à medida de sua bondade; basta acompanharem o mundo, para participar da praga geral.
Podeis acreditar não sentir Eu satisfação com os múltiplos castigos enviados aos indolentes! Não existe outro recurso; pois se um lavrador não despertasse, diariamente, seus empregados pregui- çosos para o trabalho, sua colheita e lucro seriam escassos. Somente o zelo e o despertar oportuno de seus empregados e trabalhadores trazem benefício a todos. Os que se escondem para prosseguir no sono e na indolência são culpados de sua ruína.
Fazei, portanto, que todos os vossos auxiliares estejam sem- pre ativos no Bem e na Verdade, que tereis deitado boa semente para Mim, que vos trará colheita centuplicada, da qual a maior parte vos pertencerá eternamente! Como já seja tarde, vamos dormir até cedo, pois o sábado requisitará todas as nossas forças!”
AAURORA ESPETACULAR
Pouco antes da aurora, Me levanto da espreguiçadeira e Me dirijo para fora, no que Me acompanham Pedro, Jacob e João. Subi- mos ao pico do monte, mas não demora a aparecerem os sete egíp- cios e o primeiro diz: “Senhor, perdoa nossa presença. Nesta Terra, certamente jamais poderemos seguir-Te em corpo, e o próprio orbe também não mais terá a suprema felicidade de receber os Passos do Criador! Nós somos aquinhoados da Graça indizível de assistirmos Tua Presença e seria pecado perder-Te de vista.”
Digo Eu: “Nunca erra quem Me segue e feliz quem pensa como vós; todavia, existem muitos ainda adormecidos, enquanto o Sol está despertando. Deixemo-los — despertarão em tempo opor- tuno. Muitos o farão somente na velhice e tal despertar na noite da vida lhes trará consolo fraco.
Assim sendo, felizes os que despertam na clara noite estelar! Ao passo que não serão tão favorecidos os que o forem em noite nublada, pois terão que vigiar durante uma noite longa, escura e triste. E, mesmo querendo adormecer de novo, o sono lhes fugirá. Será uma temporada horrível nesta Terra. Mas quem permanecer em vigília durante a noite trevosa até o fim da vida será feliz!”
Indaga Pedro: “Senhor, será penoso para os que dormem até tarde, ou outros que estendem o sono até a noite. Não seria possível socorrê-los a tempo?”
Digo Eu: “Mas, Simon Judá, quanto tempo terei que aturar a tua ignorância? Acaso falei do sono físico?! Vê esses sete pagãos! Quantas vezes te farão passar vergonha como arquijudeu?! Eles Me entenderam — porque não se dá o mesmo contigo, há tanto tempo em Minha Companhia?”
Diz Pedro: “Senhor, tem paciência com minha grande in- compreensão em determinados assuntos!”
Respondo: “Bem que a tenho; entretanto, continuarás o Pe- dro de sempre. Somente o Meu Espírito te elevará ao conhecimento mais profundo — e não a tua carne — quando Eu tiver ascendido!
Agora prestai atenção à aurora de hoje, toda peculiar para esta zona do orbe! Que cada um procure encontrar o sentido espiri- tual da mesma! Pois tudo que ocorre na Terra só pode suceder pela insuflação dos Céus Divinos, ou seja, de Minha Origem. Atenção, que a Natureza testemunhará de Mim!”
Ao terminar, surge o Sol no horizonte e, quando se acha em certa altura, aparece outro, um grau para o Norte, perfeitamente idêntico ao primeiro, real; trata-se de um parélio, fenômeno raro.
Os egípcios estão a par do mesmo e o primeiro diz: “Se- nhor, com tal nitidez, essas aparições são incomuns em nossa pátria.
Eu mesmo vi apenas um, após a época de chuva, faz quarenta anos. Poderia facilmente interpretar o sentido espiritual, a meu modo.”
Digo Eu: “Bem o sei, pois ainda vos encontrais incólumes na antiga Igreja de Noé, na qual as criaturas permaneciam em fir- me ligação com os anjos até épocas de Abraham — com exceção dos descendentes de Nemrod, os primeiros a se ligarem ao mundo, razão de sua queda — de sorte a possuirdes a justa revelação e o entendimento desse fenômeno. O mesmo não acontece com Meus discípulos! Cheios de fé e boa vontade, somente receberão a plena luz quando os sete Espíritos de Deus neles se tiverem equilibrado.
Por isto, sou obrigado a conduzi-los como Doutrinador ex- terno, a bem de todos os povos, para poderem efetuar suas ações de acordo com a Minha Ordem, mas de livre e espontânea vontade. Eis o motivo por que desejo apenas deles a explicação do fenômeno. Fala tu, Simon Judá!”
Responde este: “Não tenho capacidade para tanto! Vejo dois sóis perfeitos e não sei qual é o genuíno! Lá embaixo nas ruas estão muitas pessoas a fitarem o mesmo, e certamente sabem menos do que eu. Como pretenso sábio, nada sei — que impressão terão eles desse fenômeno?!”
Deste modo Pedro procura esquivar-se. Entretanto, lhe digo: “Eles nada têm a ver conosco! Interessam-me vossas pessoas e vejo não entenderes a aparição. Por isto, indagarei de Jacob!”
Responde este: “Meu Senhor e Mestre, minha situação em nada é melhor que a de Pedro. Também não descubro qual o Sol verdadeiro, pois são idênticos. Até os pássaros parecem estranhar o caso, porquanto silenciam, como pensando: Qual será o astro real, pois não queremos saudar o falso com nosso canto!”
Digo-lhe Eu: “Tua observação foi boa, conquanto não a en- tendeste. Faltando-vos o entendimento para esse fenômeno — que direis se mais para o Sul surgir um terceiro Sol? Já se está formando uma massa vaporosa, e vede: o terceiro astro irradia sua luz!”
Muitos nas ruas começam a se atemorizar, procurando refú- gio nas casas próximas, enquanto os mais corajosos não arredam pé
diante de fenômeno tão peculiar. As aves se inquietam e percebe-se grande número de condores cortarem o ar, uns perseguindo os ou- tros. Quando pombos e outras aves pequenas notam seus inimigos, fogem e se escondem o melhor possível.
Nisto, o egípcio faz a seguinte observação: “Estranho, quando, há quarenta anos, vi um parélio na minha zona, também se dava o mesmo fato raro entre aves de rapina. Hoje certamente leões e panteras se guerrearão. Não entendo bem o terceiro fenômeno, conquanto tenha uma ideia.”
CAUSADOS PARÉLIOS
Nisto, se juntam a nós os outros discípulos, Nicodemus, Lázaro e Jordão, com exceção de Judas, e perguntam qual a signifi- cação do fenômeno. Lázaro ainda acrescenta: “Estranho, Senhor, há três sóis a iluminarem com grande fulgor, todavia nota-se certo peso funesto no ar e muito mais sobre o solo, enquanto os picos dos mon- tes estão escuros e a temperatura é bastante fria. Três sóis deveriam produzir mais claridade e calor do que um!”
Diz o núbio: “Amigo, tua observação é justa e também eu a fiz naquela ocasião; poderia dar-te a razão natural, mas não a espiri- tual, mormente dos dois parélios!”
Pede Lázaro: “Explica-me o motivo natural!”
Prossegue o egípcio: “Amigo, nas mais altas camadas de ar, que se estendem a dez alturas do Monte Líbano, se acumula um tênue vapor em determinadas épocas. Através de sua consistência mais densa, a camada de ar sobre a Terra chega à calmaria total, con- forme se observa em cima do mar, onde determinada região fica lisa qual espelho, enquanto as ondas a circundam. Em tais momentos de calmaria atmosférica, nela se reflete a imagem do Sol tão claramente como num espelho marítimo, no que se explica a razão natural dum parélio. Havendo vários pontos de calmaria, tantos serão os paré- lios, na hipótese que sua posição esteja em linha reta com o astro. A situação mudando, ele desaparece ou então apenas se vê certo
reflexo. Tão logo as ondas invadam a zona de calmaria, o parélio terá desaparecido.
Atrás de tais aparições nas camadas mais elevadas do ar te- lúrico, que motivam a diminuição de luz e calor, aparecem nuvens mais densas, trazendo a chuva. Eis o sentido natural do parélio; a explicação verdadeira e espiritual só é do Conhecimento do Senhor e daquele a quem quiser revelar. Tenho pressentimentos, mas não percebo clareza quanto ao futuro.”
Diz Lázaro: “Compreendo bem, todavia faço a observação que, entre judeus, nunca houve esclarecimento dos fenômenos da Natureza. Alguns poucos descobriam certos fatos, sem contudo transmiti-los. Tais segredos lhes traziam bom lucro, mormente entre pagãos espertos, e além disto temiam aqueles a perseguição dos fari- seus, caso revelassem suas descobertas.
Opino o seguinte: conhecimento e critério justos dos múlti- plos fenômenos naturais afastariam os homens da superstição e de seus efeitos nocivos, e seria útil recebermos instruções básicas neste sentido. Não concordas, Senhor?”
Respondo: “Ninguém mais do que Eu, pois nenhum homem consegue compreender e assimilar as verdades transcendentais em sua profundeza caso não conheça o solo que pisa como criatura, razão por que vos dei já tantas explicações no campo dos fenômenos da Natureza. Fiz uma demonstração do corpo telúrico, o surgir de dia e noite, a causa dos eclipses solares e lunares, as estrelas cadentes, Sol, Lua e todos os planetas.
Expliquei igualmente poder o homem amar a Deus somente quando tiver penetrado em Suas Obras. Sendo isto recomendado por Mim Mesmo, subentende-se Eu concordar com teu critério. E Moysés não teria escrito o sexto e o sétimo Livros, concernentes às coisas e fenômenos da Natureza, inclusive o apêndice profético, com a antiga orientação interpretadora entre o mundo natural e espiritual, caso não o tivesse considerado tão necessário à educação real e pura dos judeus.
Na época dos Reis foi esse importante ramo de educação preparatória negligenciado pelos sacerdotes, cada vez mais ganancio-
sos e maldosos, e em parte pelos próprios soberanos. E quando com os primeiros descendentes de Salomon o Reino foi dividido, esse co- nhecimento perdeu-se a ponto de ignorardes ter sido tão divulgado desde Moysés até Samuel.
Muita coisa vos expliquei, despertando vosso entendimen- to; a causa principal é, e será, o constante zelo pelo pleno renasci- mento do espírito na alma; somente por meio dele é o homem leva- do à verdade e sabedoria totais, possuindo então um conhecimento completo e coerente da matéria ao puramente celeste e, com essa luz, igualmente a vida eterna, o que tem mais valor do que todas as ciências naturais.
De que adiantaria ao homem o conhecimento e a noção mais apurada de todos os fenômenos naturais, desde o ínfimo ao máximo, caso seu renascimento espiritual estivesse tão distante quanto está a Terra distante do Céu?! Poderiam as ciências variadas proporcionar-lhe a vida eterna?! Externa a tua opinião!”
Diz Lázaro: “Senhor, seria melhor nunca haver nascido! Pois uma existência racional e realizadora, e à qual Tuas Obras constante- mente extasiam, seria, sem a segurança duma continuação eterna e perfeita, mil vezes pior do que a vida dum miserável verme na poça mais imunda da Terra.
E quem procurasse desenvolver o intelecto do filho, desde que nascesse, cometeria o maior dos crimes, porquanto provocaria sua morte psíquica, reduzindo-o ao ser mais miserável.
O irracional não deixa de viver; todavia, é sua existência in- consciente, desconhece a morte, portanto não sabe dar valor à vida, sentindo-se até mesmo feliz.
Quão diversa é a situação do homem apreciador de sua exis- tência! Se percebesse o término de tudo com a morte física, certamen- te cairia em desespero, amaldiçoando sua vida, e o maior benfeitor da Humanidade seria aquele capaz de exterminar o Gênero Humano.
Sem a esperança de uma vida eterna, seria obrigado a profe- rir imprecações contra a Divindade, inclusive aos profetas, e o maior tolo seria quem cumprisse uma vírgula da Lei! Tenho razão?”
Digo Eu: “Claro; entretanto, há inúmeros descrentes de Deus, o Criador, e da vida eterna da alma, levando vida de prazer, cantando e dançando e, além disto, cheios de orgulho e ganância. Deixam que outros trabalhem para eles e, caso alguém os lembras- se de uma vida além-túmulo, haveriam de ridicularizá-lo, dizendo: Tolo, quando tiveres morrido, venha prová-lo, que acreditaremos. Enquanto aguardas a morte como nós, não nos interessam tuas fan- tasias! — Que dirias tu a tal objeção?”
Responde Lázaro: “Senhor, eu, por mim, pouco teria a con- trapor! Difícil é levar-se alguém à fé verdadeira, e muito menos con- vencê-lo da vida espiritual quando enterrado na morte da matéria. Por isto, prefiro Tua Explicação dos três parélios ainda visíveis!”
Digo Eu: “Não resta dúvida; todavia, tenho que demonstrar-
-te haver criaturas que, não obstante sem perspectiva da vida eterna, sentem-se bem felizes. Portanto, serão poucas nesta época — e nun- ca haverá muitas nesta Terra — que, como tu, têm plena certeza da imortalidade da alma. O aparecimento dos dois parélios demonstra tal situação.
Todos vós sabeis resplandecer apenas um Sol no Firmamen- to, no entanto vedes três. De igual modo, sabeis existir somente Um Só Deus e Criador, todavia os tolos Dele farão três deuses, em virtude de falsas interpretações.
Eis que a Luz da Vida enfraquecerá entre todos, e o amor a Deus e ao próximo esfriará. Os poucos verdadeiros crentes sentirão grande pavor, como esses passarinhos, e os soberanos se tornarão idênticos às feras selvagens, guerreando-se constantemente, e os se- guidores do dogma dos três deuses não serão atendidos por Deus.
O primeiro parélio que surgiu mais para Norte, quase ao mesmo tempo que o Sol verdadeiro — ou seja, Eu Mesmo — indica o profeta ou ungido, oposto, que se levantará para dizer: ‘Vede, eu sou o verdadeiro ungido de Deus! Ouvi-me, caso queirais vos tor- nar felizes!’ Advirto-vos para não vos deixardes persuadir, pois ele
será mensageiro do inferno e efetuará suas artes mistificadoras com expressão beatífica, orando e fazendo sacrifícios. Seu coração estará pleno de ódio feroz contra a verdade total, que perseguirá com fogo e espada, amaldiçoando quem não se adaptar à sua doutrina. Será ele o inventor dos três deuses que deverão ser adorados. Eu estarei no meio deles como Salvador do mundo, porém dividido em três personagens. Propor-se-á Um só Deus, entretanto se adorarão três, cada qual Deus perfeito e individualmente venerado.
Não levará tempo e surgirá um segundo parélio, ou seja um outro ungido oposto, que desmerecerá o primeiro, sendo dez vezes pior. O primeiro não se oporá ao Meu Verbo; o outro proibirá Mi- nha Palavra e Doutrina, delas tirando apenas o que se aproveita em seu objetivo. Fará erigir e adorar o Meu Sinal em todas as esquinas; ao lado dele, porém, se ostentarão milhares de outros, na maioria do seu agrado.
Em tal época, orgulho, desavença e ódio atingirão o grau máximo. Um povo desafiará outro, guerras se sucederão e surgirão terremotos, más colheitas, carestia, fome e peste. Então destruirei o ungido oposto, que secará qual árvore da qual foram decepadas as raízes. Haverá muita maldição, desespero, clamor e choro, e aos dois parélios, maus e fúteis — embora tivessem usurpado de Mim seu falso brilho — sucederá o mesmo que a esses. Ficarão embaçados e sua forma solar se transformará num vapor de fraca iluminação; em compensação, surge mais glorioso, brilhante e aquecedor, o Sol ver- dadeiro. Já vedes os pássaros saírem de seus esconderijos, saudando o astro-rei com seu canto melodioso, enquanto as aves de rapina se dispersam nas florestas negras.
O mesmo sucederá naquele tempo. Todas as elevações se- rão niveladas. Os picos das montanhas terão que se transformar em férteis planícies. Não poderá ser feita a pergunta: Quem é rei deste país? e sim: Quem é o primeiro e maior benfeitor desse feliz povo? Vamos procurá-lo para conhecermos sua sabedoria dentro da Or- dem Divina! Em tal época feliz, lobos, ursos, cordeiros e lebres be- berão pacificamente na mesma fonte. Tereis compreendido tudo?”
Faz-se ouvir Nicodemus: “Sim, todavia não foi agradável a Tua Profecia e poderíamos perguntar: é preciso que tal aconteça até que Tua Luz da Verdade possa iluminar livremente a Terra toda? Transmiti-la-emos como foi recebida e seus efeitos maravilhosos provarão sua genuinidade. Não vejo por que haveria quem se opu- sesse com uma falsa religião.”
Digo Eu: “É muito mais fácil falar bem do que agir bem, e na ação está a semente do joio que, imperceptivelmente, é deitada com a semeadura do puro trigo no solo do coração humano. Criará raízes e vicejará com vigor no meio do trigo, chegando até a abafá-lo. Por isto, não deveis ser apenas ouvintes, mas praticantes do Meu Verbo! Até vós usareis de reserva nas ações, por causa do mundo poderoso, a ponto de Me confessardes no íntimo, sem coragem de falar e agir em Meu Nome. Pois o mundo poderia percebê-lo e vos chamaria à responsabilidade. E em tal situação, não haverá comen- tários sobre o porquê de Minhas Profecias, e sim dependerá de vós se temeis mais ao mundo do que a Mim.
Por vosso temor do mundo, a má semente será lançada com o trigo, dando origem aos parélios. Fiz com que tal sucedesse e in- cluí a predição a fim de que vos lembreis — aqui e no Além — de Minhas Palavras.
Por isto, repito: não temais os que podem matar vosso físico, sem prejudicar a alma; temei, sim, Aquele que tem o Poder da vida e da morte da mesma! Muitos, mas nem todos, demonstrarão a justa coragem, e até mesmo entre vós, alguns se aborrecerão Comigo.
O Pastor será atado e fustigado, as ovelhas se dispersarão, sentindo receio, pavor e tristeza. Todavia, procurá-las-ei, reunin- do-as e dando-lhes coragem e força contra os inimigos da Luz e dos Céus. Agora basta; demonstrei-o apenas para recordação e ação oportuna a fim de que não se aplique a vós o velho ditado: Longe dos olhos, longe do coração! — Chegou a hora do desjejum, va- mos entrar!”
Nicodemus, José de Arimatheia e o velho Pedro se veem algo indecisos em compartilhar da ceia, num sábado após o surgir da aurora. Por isto, lhes digo: “Se aqui titubeais por causa do sábado — sabendo ser Eu o Senhor, inclusive de Moysés — qual vossa situação no colégio de fariseus e anciãos de Jerusalém?” Minhas Palavras os animam a participarem do desjejum.
E o velho rabi diz: “Ó Senhor e Mestre, tens razão em tudo! Um hábito antigo é qual veste cheia de ferrugem; impossível clareá-
-la, não obstante todo zelo!”
Digo Eu: “Boa é tua observação, por isto despe-te do homem velho para vestires um novo, porquanto o primeiro não serve mais! Terminai a refeição, a fim de seguirmos para o Templo!”
Diz Nicodemus: “Terias coragem de enfrentar aquelas fúrias?”
Respondo: “Irei por causa do povo, aqui atraído por Mim! Vamos!” A esta observação ninguém faz objeções, pois cada um pen- sa no Meu Poder no Céu e no inferno; portanto, não há motivos de temor. Os romanos e discípulos Me perguntam se também devem descer e o que sucederia com os jovens.
Digo Eu: “A nenhum de vós se poderá impedir a entrada no Templo; a juventude permanecerá aqui e o Meu servo sabe o que fazer. Ide na Minha frente para escolherdes bons lugares; seguirei com Meus apóstolos, para serdes testemunhas dos acontecimentos!”
Diz Agrícola: “Desejava fazer parte deles, entretanto subme- to-me à Tua Vontade!”
Digo Eu: “Querendo aparecer como testemunha, poderás jun- tar-te a eles; pois, antes de abrir a Boca perante os judeus, farei um milagre. Um cego de nascença recuperará a visão — justamente num sábado! Podeis seguir; vós quatro, desde ontem Meus adeptos, fareis melhor em ficar; pois no Templo sereis descobertos e perseguidos!”
Receoso, Nicodemus procura saber como poderia descer o Monte sem ser percebido, em companhia dos dois amigos. Aconse- lho seguirem com os egípcios, pois os levariam despercebidamente.
Este grupo se encaminha e os outros o seguem pouco mais tarde; somente os três magos não se afastam, procurando unir-se a Mim. Pedro pergunta: “Senhor, acaso queres a companhia deles?”
Respondo: “Que te importa? Não os excluí da companhia dos outros. No entanto, não lhes imponho coação alguma; podem agir dentro do desejo do coração. O que Me agrada não deve pre- ocupar-te, pois quem nos segue por certo não andará por atalhos.” Finalmente, Jordão ainda se aproxima para receber ordens referentes ao almoço.
Digo-lhe: “Amigo Jordão, trata-se agora de suprirmos es- piritualmente famintos e sedentos, que vale mais do que cuidar do corpo! Não penses no almoço; na Minha volta haverá tempo para tudo!”
Com tal informação, o hospedeiro chama todos os serven- tes, em número de trinta, e lhes dá bons conselhos, de sorte a todos acreditarem em Mim. Deste modo, Jordão também nutriu famintos e sedentos, em Meu Nome. Entrementes, chegamos à cidade, onde todas as ruas estão cheias de povo.
O SENHOR E SEUS ADVERSÁRIOS. CURA DO CEGO ÀS PORTASDOTEMPLO(EV.JOÃO9, 1–34)
Ao atingirmos a grande praça diante do Templo, vimos um jovem mendigo duns vinte anos, cego desde nascença, sentado numa pedra.
Lembrando-se de Minhas Palavras, os apóstolos perguntam: “Senhor e Mestre, quem teria pecado: ele mesmo ou os pais — por- quanto nasceu cego?”
Respondo: “Que pergunta absurda! Como poderia ele pecar no ventre materno, para receber tal castigo?! Afirmo: nem ele nem seus pais pecaram; mas tal foi permitido a fim de que as Obras de Deus nele fossem reveladas perante os homens. Tenho que realizar, enquanto é Dia, as Obras Daquele que Me enviou. Também virá a noite de que vos falei e não haverá quem faça algo. Enquanto Eu es-
tiver neste mundo, sou evidentemente a Luz do mundo. Após Mim, virá a noite.”
Admirados, os apóstolos se entreolham e dizem: “De que adianta aos homens o dia espiritual de hoje se, após a Volta Dele à Pátria, a treva será pior?”
Digo Eu: “Acaso quero que se faça noite? É o ócio dos homens a querê-la, e o livre arbítrio será respeitado, ainda que se tornem de- mônios. Pois, sem a livre vontade, o homem deixa de ser homem, passando a simples máquina, como vos expliquei por várias vezes!”
Em seguida, apanho um pouco de barro, umedeço-o com sali- va e passo-o nos olhos do cego. Isto feito lhe digo: “Deixa-te levar ao lago Siloah para te lavares!” Assim fazendo, ele volta com a visão plena.
Os vizinhos, que o conheciam como cego, indagam: “Não é o mesmo cego que mendigava sentado na pedra?” Respondem al- guns: “Sim, é ele!” Outros conjecturam: “Nunca se viu tal coisa, entretanto é parecido com ele!”
O curado, então, diz: “Por que discutis a meu respeito? Fui cego e agora vejo!” Perguntam eles: “Quem fez isso?”
Responde ele: “O homem que me disse em surdina ser ele Jesus; fez um pouco de barro, esfregou com ele os meus olhos e mandou que eu os lavasse no lago Siloah. E assim adquiri a visão.”
Prosseguem os outros: “Onde está o tal Jesus?” Diz ele: “Que pergunta! Vistes quando passou a lama nos meus olhos e não o percebestes — como poderia eu, cego, vê-lo? Bem que desejava saber onde está para externar-lhe a minha gratidão.”
Exclama o grupo: “Eis um milagre e aquele homem deve ser profeta! É preciso que os fariseus venham a saber disto! Vamos até lá, que todos seremos testemunhas!” O ex-cego concorda e se deixa levar ao Templo. (É indispensável mencionar não ser apenas sábado, mas o dia que se segue ao sábado, muito mais rigorosamente con- siderado pelos judeus; portanto, é crime efetuar-se qualquer ato).
Quando diante dos fariseus, os que trouxeram o curado re- latam o maravilhoso milagre. Muito embora assim informados, eles perguntam como sucedera tudo.
E ele repete: “Aplicou lodo nos meus olhos, em seguida os lavei a conselho dele no lago Siloah — e eis que vejo perfeitamente!”
Retrucam alguns fariseus: “O homem que te curou não po- dia ser inspirado por Deus, porquanto não respeitou nem venerou sábado tão sacro!”
Obstam as testemunhas, uns judeus e outros fariseus: “Como poderia ser pecador e realizar tal feito?!” E rapidamente se abre contenda entre eles. Não conseguindo entrar em acordo, Meus adversários novamente se dirigem ao moço: “Qual a tua opinião a respeito dele?”
Responde ele: “A mesma dos que me trouxeram: Ele é profeta!”
Insistem eles: “Não cremos que foste cego; tudo foi combi- nado para nos confundir!”
Intervêm as testemunhas com ênfase: “Os pais dele estão vivos e sabem se ele algum dia teve visão!” Mandaram, pois, chamá-
-los, desconhecendo esses o milagre operado no filho.
As perguntas são capciosas, porquanto dizem os fariseus: “É este vosso filho, que dizeis cego de nascença? Se assim é, como pôde enxergar?”
Singelamente, eles respondem: “Sabemos ser esse nosso fi- lho que nasceu cego, entretanto ignoramos quem lhe abriu os olhos! Mas já tem idade e poderá falar por si!” Desconfiando ter sido Eu o Autor do milagre, porquanto Me conheciam, sua resposta é esquiva, pois temiam os fariseus que, de há muito, haviam combinado expul- sar quem confessasse ser Eu o Ungido de Deus.
Novamente os fariseus se dirigem ao antigo cego: “Dá honra somente a Deus, pois sabemos ser pecador o homem que te curou!”
Responde ele: “Não sei se é pecador, mas uma coisa é certa: eu era cego e agora vejo!” Prosseguem eles: “Dize-nos a verdade: que fez ele e como te abriu os olhos?” Responde o curado, visivelmente irritado: “Já vos disse — acaso não me ouvistes? Porventura desejais vos tornar seus discípulos? De modo algum seria vosso prejuízo!”
Enraivecidos, os fariseus e templários amaldiçoam o curado e dizem: “Talvez sejas tu discípulo dele — nós somos de Moysés!
Sabemos ter Deus falado a este profeta; desse homem que te fez ver, nada sabemos!”
Fitando-os bem, o ex-cego diz: “Estranho ignorardes de onde é o homem milagroso! Contudo, tornou-se evidente ter ele me dado a luz dos olhos. Já operou muitas provas semelhantes, e ainda ignorais sua procedência?”
Retrucam os fariseus com voz alterada: “Sabemos Deus não ouvir os pecadores! Ele atende somente a quem O teme, sem peca- do, e em tudo fazendo a Vontade Dele!”
Prossegue o moço: “Desde que existe o mundo, nunca se ouviu dizer que alguém abrisse a visão a um cego de nascen- ça! Se este não fosse dotado de tamanho Poder e Força de Deus, nada disto faria, como vós, conquanto sois discípulos de Moysés; pois, se assim fosse, o mundo estaria informado e vossas casas cheias de ouro!”
Gritam eles de revolta: “O quê? Nasceste em pecado e pre- tendes ensinar-nos?” Agarram-no e expulsam do Templo, inclusive seus pais e as testemunhas. Do lado de fora o curado responde: “Que Deus vos recompense e ilumine vossa cegueira psíquica!” Eles batem a porta e não ligam ao curado que lhes havia dito a Verdade.
PALESTRA DO SENHOR COM O CURADO(EV.JOÃO9, 35–41)
O ex-cego se dirige com todos os acompanhantes ao grande átrio, onde o povo costuma reunir-se e cada um quer saber o que sucedera no Conselho do Sinédrio. O moço faz um relato completo, causando revolta a dureza dos arquifariseus e em pouco tempo o acontecimento chega até nós.
E Eu digo aos discípulos: “Vamos procurá-lo, para que o coi- tado conheça Quem lhe deu a luz dos olhos!” Dentro em pouco encontramo-lo entre a multidão. Havia alguns fariseus não intei- ramente contra o moço, ávidos para ouvirem qual sua reação pe- rante o povo.
Encaminhando-Me para ele, digo: “Ouve-Me: já que fos- te expulso do Templo pelos seus representantes — crês no Fi- lho de Deus?”
Responde ele: “Senhor, quem é? Está no Templo? Aponta-me para poder acreditar!”
Digo Eu: “Já O viste, embora não O reconhecendo; é Ele quem fala contigo!”
Exclama o curado: “Creio, Senhor! Tu O és! Não Te reco- nheci quando voltei do Lago! Se não fosses Filho de Deus, Cristo, o Prometido, jamais poderias me ter dado a visão!” Em seguida, ele se ajoelha e Me adora; todavia, mando levantar-se.
Conquanto fossem do partido mais moderado, os fariseus começam a torcer o nariz, revoltando-se no íntimo. Percebendo-o, digo em voz alta: “Eu vim para julgar este mundo, a fim de que os cegos vejam, e os que veem se tornem cegos.”
Descontrolados, os templários se dirigem a Mim: “Acaso já somos cegos ou o seremos, porquanto ainda enxergamos?”
Respondo: “Se fôsseis cegos de alma, não teríeis pecado; ates- tando vossa visão, o pecado subsiste e, com ele, o julgamento e a morte eterna. Fui por Deus enviado ao mundo como a Verdade, a Luz e a Vida. Quem crê em Mim e age dentro de Minhas Palavras terá a Vida Eterna, não sentindo a morte!”
Nota — O que se segue no Templo foi anotado por outros compiladores do Evangelho, entretanto sem respeitarem a sequência dos fatos, razão por que são heterogêneos. João deixou de anotar as ocorrências, porquanto se repetiam Meus Ensinamentos.
O décimo capítulo ocorre três meses mais tarde, no inverno e no Templo, por ocasião da comemoração do mesmo. Esta observa- ção torna-se necessária para saberdes como se deram as controvérsias com os templários. Prosseguirei no relato.
Dizem, em seguida, os templários: “Aceitamos possuíres for- ça excepcional na cura de moléstias graves e incuráveis. Até mesmo se fala do teu poder em ressuscitar pessoas recentemente falecidas. Além disto, consta teres caráter bondoso e sóbrio, e nunca pediste algo por tuas curas.
O fato de te proclamares filho de Deus, o Unigênito, sem consideração para com as Leis de Moysés, tua amizade com pagãos, publicanos e pecadores — tudo isto te desabona e jamais será aceito pelo Templo!
Por que te ressaltas em virtude de tuas qualidades excep- cionais, quando és simplesmente humano? Quem de nós poderia respeitar-te, exigindo crermos que sejas filho de Deus, condenando a quem não o fizesse por certas razões? Alegas ser a Verdade, a Luz e a Vida! Prova-o e nos convence disto, que acreditaremos!”
Respondo: “Vede essas pedras no solo! Serão mais facilmente convertidas do que vós acreditardes ser Eu Aquele anunciado por Moysés e os profetas!
Se opero milagres jamais efetuados nem mesmo pelo maior dos profetas, tal fato deveria abrir vossa visão, para reconhecerdes os sinais desta época de salvação! Entretanto, sois cegos, surdos e obtu- sos de coração, nada vedes, nem ouvis, nem sentis! Nisto se baseia o julgamento dentro de vós e, com ele, a morte certa de vossa alma. De ano a ano caiais os sepulcros dos patriarcas e profetas; todavia, representais os próprios túmulos: externamente vos revestis da or- dem de Moysés e Aaron, cujos assentos ocupais — no íntimo, estais cheios de podridão e mau cheiro!
Acabastes de afirmar o Meu erro porque privo com pagãos, publicanos e pecadores e ser Eu vilipendiador do sábado, não respei- tando as Leis mosaicas. Como são elas mantidas por vós? Afirmo-vos: nem aparentemente são respeitadas, pois instituístes quantidade de outros estatutos fúteis em benefício próprio, oprimindo e sugando o povo. Teria Moysés dado ordem para tal? Sendo permitido e até
ordenado dar forragem aos animais, levá-los ao bebedouro e salvar o burro que caísse numa vala ou num poço, acaso não seria justo socor- rer-se a um prejudicado em tal dia? Cegos, surdos e tolos de coração e intelecto — teria um homem menos valor que um irracional?!
Não ordenou Moysés dizendo: Honra pai e mãe, a fim de que se prolonguem os teus dias na Terra?! Por que então aconselhais aos filhos: Trazei uma oferenda; isto vos será mais útil! — Assim ensinando, agis pela Lei de Moysés?
Não mandou solenemente que ninguém oprimisse viúvas e órfãos? Qual vossa atitude? Pretextais longas orações de efeito eficaz, enquanto vos apossais de seus bens, e quando os lesados reclamam o insucesso, são expulsos e classificados de pecadores, aos quais Deus não atende às preces mais fortes! Teria Moysés dado tal Mandamen- to? Afirmais Eu agir contra suas leis, enquanto vós não as respeitais!
Em virtude de vosso desprezo a Moysés, tornaste-vos cegos, não percebendo o Dia mais claro diante de vossos olhos, e tal fato é vosso julgamento, morte e condenação! Alimentais insetos com orações ocas e caríssimas e engolis camelos; todavia, vos dizeis discí- pulos de Moysés! Por isto vos será tirada a Luz e entregue aos pagãos.
Vim a este mundo para conduzir-vos com amor e carinho às trilhas justas da Vida por meio de Ensinos e Ações; em com- pensação, Me perseguis em todos os caminhos e veredas, procu- rais capturar-Me e matar-Me, alegando Eu ser sedutor e rebelar o povo. Tenho, todavia, testemunhas, inclusive Deus Mesmo que está em Mim como Eu Nele, de serdes mentirosos diante de Deus e da multidão.
Os romanos, atuais donos do país dos pretensos filhos de Deus, acostumados a observar tudo que possa pôr em perigo sua soberania, de há muito Me teriam chamado perante a Justiça. Até hoje nada descobrindo, acolhem-Me sempre com amabilidade, demonstrando-se como homens cheios de fé, amor e respeito para Comigo, Minha Doutrina e Ações. Por isto, serão aceitos em Minha Luz e Vida; vós sereis expulsos à pior treva, como consta, onde ha- verá clamor e ranger de dentes!”
12. A estas Minhas Palavras os judeus mais moderados se en- raivecem, dizendo: “Que absurdo! Quem te persegue e procura te matar? Ninguém fará isto se ensinas e fazes o Bem; alegando seres filho de Deus, o Ungido, segundo os profetas, Jehovah em Pessoa
— deves compreender considerarmos isto a pior blasfêmia, enquan- to não provares a verdade para crermos em ti, ou então terás que abjurar diante de nós e do povo! Não assumindo tal atitude, terás de suportar a perseguição do Templo! Acaso somos injustos?”
Retruco: “Falastes como o cego julga e fala sobre as cores da luz e, assim sendo, pronunciais vosso próprio julgamento. Não serei Eu, mas o Verbo, tão inutilmente proferido, a vos condenar.
Se lestes e assimilastes apenas um pouco o profeta Isaí- as, deveis entender as palavras: Uma virgem dará à luz um filho, chamado Emanuel, quer dizer, ‘Deus está conosco’! Acaso não se cumpriu isto e todo o resto em Mim?! E se assim é — não seria Eu mentiroso como vós se participasse de vossa opinião nefasta de Eu não ser Aquele que sou perante Deus, todos os Céus e criaturas terrenas?!
Exigis prova convincente de ser Eu o Prometido Messias de Deus. Dizei-Me como agir, considerando vossa cegueira completa! Operando diante de vós milagres jamais vistos, pela cura de coxos e entrevados, a ponto de saltarem quais veados, restituindo igual- mente a saúde a artríticos e leprosos, devolvendo audição e fala aos surdos e mudos, aos cegos a visão, libertando os obsedados de seus espíritos martirizantes, ressuscito mortos pelo Poder de Minha Pala- vra e oportunamente realizarei feitos somente possíveis a Deus; além disto, transmito aos pobres de espírito o Evangelho da Vinda Real do Reino de Deus na Terra, não havendo quem possa Me acusar dum pecado; vós, porém, alegais Eu agir com a ajuda de Beelzebub, chefe dos demônios — pergunto, quais seriam as provas que vos levariam à fé em Mim?
Ainda que fizesse milhões de outros milagres, vossa opinião seria a mesma! Qual, pois, sua utilidade? A mesma de um cego ao qual se pretende ensinar a noção de uma cor qualquer!
Precisamente tal cegueira maldosa de vossa alma é vosso ex- termínio, julgamento próprio e morte real! Pois unicamente Eu sou o Caminho, a Luz, a Verdade e a Vida Eterna. Quem crer em Mim e agir dentro de Meus Ensinos receberá de Mim o espírito da Vida Eterna e Eu o despertarei à Vida no primeiro dia no Meu Reino. Quem fugir, desprezar e perseguir-Me terá feito tudo isto à sua vida, não podendo recebê-las senão por Mim.
Quem, portanto, não quiser receber de Mim a Vida Eterna de sua alma, reagindo contra tudo que de Mim emane, continuará morto para toda a Eternidade. Quem quiser a Vida terá que aceitá-la Daquele que é a Própria Vida, podendo dá-la a quem quiser.
O Meu Verbo e Minha Doutrina são justamente a Vida ofertada a todos. Aceitando-os ativamente, terá aceito de Mim a vida da alma. Esta sendo a realidade quanto à Vida Eterna — onde quereis vos suprir em benefício de vossa alma?!”
UMFARISEUDESENVOLVESUA FILOSOFIA
Diz um fariseu, pretenso intelectual: “De tuas palavras de- duzi claramente seres louco, portanto destituído de qualquer noção da Natureza de Deus, Sua Sabedoria Infinita, Poder e Força, e das condições deste mundo e de suas criaturas. Pois se a vida eterna da alma depende da fé em ti e em tuas palavras, toda aquela que isto não fizer, porquanto desconhece tua pessoa, terá que aguardar a morte eterna.
Que culpa têm os que viveram há milênios e os que viverão em futuro longínquo, sem conhecimento de tua religião?! Deveriam ser considerados mortos para sempre?!
Em tal caso, teria Deus prazer na destruição de Suas criaturas! Para que fim vieram Moysés e os outros profetas? Que finalidade ti- veram seus Mandamentos e as provações que Deus mandava para Seu povo e outras raças quando não viviam de acordo com Sua Vontade?
Segundo minha opinião, a vida de um cão seria propícia para alcançar a vida eterna, pois basta a ele saciar suas necessidades!
Para que ensiná-lo a pensar e julgar?! Seria preferível os mais inte- ligentes matarem os recém-nascidos, para evitar fossem mais tarde martirizados com a expectativa de perderem sua vida agradável para todo o sempre.
Deduzo de tuas palavras eu não dever a mínima gratidão a Deus por ti recomendado, pois nunca trabalhou para minha felici- dade e, quanto antes exterminar-me, tanto mais feliz serei!
Prefiro a completa nulidade do meu ser, a uma existência consciente da desgraça de milhares, inocentes!
Concluirás de minha exposição prestar-se tua doutrina mui- to menos à felicidade humana, que a dos saduceus; adotaram-na do sábio Diógenes e é muito mais consoladora que a tua. Não há quem te agradeça, e quero que todos, dentro e fora do Templo, opinem se falei com injustiça!”
AVIDAETERNADA ALMA
Digo Eu, com rigor: “Ousas proferir injustiças e inverdades perante o povo! Se fosse movido como vós pela tendência raivosa, receberias de Mim uma recompensa que faria estarrecer a multidão, porquanto rapidamente concluiria Eu possuir todo Poder e Força no Céu e na Terra; todavia, sou de coração meigo, cheio de humildade e te castigarei apenas com Minhas Palavras!
Acusaste-Me de louco, porque garanto a Vida Eterna àquele que crer em Mim e adotar a Minha Doutrina, enquanto estará em julgamento e na morte eterna quem isto não fizer.
Fariseu tolo e cego! Que vem a ser, no teu conceito material, a vida eterna da alma no Meu Reino — que não é deste mundo — e qual o sentido do julgamento e da morte?
Outro seria teu critério caso entendesses tal segredo; cego de alma e mau de coração, julgas assuntos espirituais como um cego de nascença acerca do brilho das cores.
Seriam a morte eterna da alma e sua impossível destruição total e eterna uma só coisa? Vê, tu e teu grêmio sois de há muito
completamente mortos! Sereis por isso exterminados? Jamais sereis exterminados, mas permanecereis o que sois, em vossos pecados, ou seja, na morte perene da alma. Em tal estado, jamais conseguireis elevar-vos a um conhecimento mais puro e superior, e sim tereis que ficar na treva e nas dúvidas mundanas de que estão repletas vossas almas.
Neste mundo elas pouco vos perturbam, porque vos conso- lais com coisas fúteis; mas que será quando em breve se acharem no mundo espiritual, autocriado, sem amor e luz?!
Eu bem o sei, e que vos afastastes inteiramente das Palavras de Deus, razão pela qual Eu Mesmo — em Espírito, Aquele que no Sinai deu as Leis a Moysés, anteriormente a Adam e, após o Dilúvio, a Abraham, Isaac e Jacob, aos muitos profetas — vim para libertar-
-vos, pela Doutrina e Ação, de julgamento e morte.
Se isto faço em Pessoa, pelo fato de Meus mensageiros nada conseguirem — acaso sou louco?! Raça de víboras e serpentes; quan- to tempo terei que vos suportar em vosso julgamento e morte?!
Presumes que as criaturas antes do Meu tempo, portanto desconhecendo a Minha Doutrina, não podiam crer em Mim nem alcançar a Vida Eterna, assim como as que vivem em países distan- tes, geralmente pagãs? Fariseu ignorante! Vê esses sete homens do Egito setentrional! Conhecem-Me, aplicam a Minha Vontade e suas almas de há muito conquistaram a Vida Eterna, sua força e poder inesgotáveis! Dar-te-ão uma prova disto!”
Adianta-se o primeiro egípcio e diz: “Miserável impudico e adúltero! Dez de teus ascendentes surgirão para provarem sua infeli- cidade no Além; todavia, não são exterminados.”
Súbito, aparecem os mencionados infelizes, e o pai do fari- seu lhe diz: “Por ter sido como tu, encontro-me neste estado miserá- vel, no qual por certo também estarás, como todos nossos antepas- sados, porquanto não nos iluminavam fé e esperança!”
Estupefato, o fariseu indaga: “Jamais podereis ser socorridos?”
Retruca o espírito: “ Sim, caso quiséssemos; falta-nos a von- tade para tanto, assim como também não a tens e persegues Aquele
que te poderia socorrer — e nós fazemos o mesmo!” Terminando, os espíritos desaparecem, e Eu digo: “Qual tua opinião?”
Protesta o fariseu: “Sois todos feiticeiros e magos, produ- zindo essa aparição! Retirar-me-ei!” E o povo exclama: “Oh, sua sa- piência se evaporou, pois quer fugir cheio de vergonha!” Os fariseus protestam, conseguindo apenas maior reação por parte da multidão alterada, preferindo afastar-se.
O povo expressa o pedido de Minha Orientação; Eu o acal- mo e, em seguida, inicio Minha Pregação acerca do Amor a Deus e ao próximo, advertindo-o dos falsos conceitos farisaicos.
NOVOPLANODECAPTURADO SENHOR
Por meio de espiões entre a multidão, os fariseus chegam a saber de Minha Ação doutrinária, motivo por que confabulam Meu extermínio. Os mais ponderados, porém, objetam: “Podeis agir à vontade, todavia vos asseguramos nada conseguirdes contra ele. Pri- meiro, conta com o povo; segundo, é dotado de poder mágico, pelo qual todas as forças da Natureza e do mundo espiritual parecem obedecer-lhe; terceiro, é tão versado nas Escrituras, não havendo quem suporte seu desafio; e, finalmente, tem os dignitários romanos a seu favor. Os próprios egípcios peculiares, persas, árabes, hindus e outros orientais o rodeiam e será difícil realizar qualquer manobra contra ele.
Porventura não foram ontem dois astuciosos fariseus, em companhia de dois levitas espertos, para Emaús?! Onde estão? Igno- ramo-lo! Anteontem expedimos espiões e carrascos ao seu encalço, com ordem severa de notícias até à noite — entretanto, nenhum voltou até este momento!
Hoje, três sóis provocaram a maior confusão entre nós e o povo. Parece ter sido obra dele, confirmando-se o que se divulga por toda parte! Se tivesse o mesmo receio de nossa parte, não se apre- sentaria abertamente no Templo. Segundo nosso parecer imparcial, concluímos: se a missão dele foi ordenada secretamente por Deus,
não poderemos impedi-la; sendo simples planejamento humano, cairá por si só!”
Apresenta-se um fariseu do partido de Caifás: “Se assim é, apresentai vosso projeto; impossível deixarmos correr o barco para nossa destruição!”
Diz o outro: “Se não conseguirmos desmascará-lo e torná-lo suspeito perante o povo e os romanos, através de perguntas cap- ciosas, estaremos liquidados. Por meio de ações, jamais poderemos prejudicá-lo!”
Concorda o arquifariseu: “Teu conselho é aceitável e poderia ser executado; nunca nos faltaram bons oradores, muito embora ul- timamente importante número dos melhores tenham sumido, o que na certa agradecemos ao Nazareno. Quem de nós teria coragem de assumir essa tarefa, mediante grande recompensa?”
Adiantam-se um escriba e um fariseu pedindo tal incumbên- cia. O Conselho concorda e Caifás aduz em tom grave: “Disfarçai-
-vos e passai pela porta comum, do átrio, e desempenhai vosso papel a contento, que o agrado meu e de Deus serão vossos!”
Deste modo eles se imiscuem no Templo, onde Eu ainda Me acho doutrinando o povo; os sumos sacerdotes, fariseus e alguns escribas não confiam inteiramente nos dois e também se disfarçam para testemunharem o seu sucesso.
OSFARISEUSTENTAMCAPTURARO SENHOR
Enquanto descanso um pouco, os dois se dirigem a Mim e indagam, atrevidos: “Mestre, sabemos de teus feitos milagrosos e desejávamos ouvir de ti quais os meios empregados para tal fim!”
Digo Eu: “Pois não! Antes, porém, farei uma pergunta; se responderdes certo, Eu vos transmitirei qual o Poder empregado nos Milagres! Dizei-Me sinceramente e diante do povo: de onde se originava o batismo de João, filho de Zacharias, por vós es- trangulado neste Templo? Foi um batismo do Céu ou da Terra? Cabe-vos afirmação positiva. Viestes disfarçados, entrando como
simples peregrinos no átrio, entretanto fostes logo descobertos. Respondei bem, do contrário não recebereis a recompensa prome- tida pelo sucesso!”
Os fariseus cochicham entre si: “Que pergunta capciosa! Se dissermos ter sido o batismo do Alto, perguntarão por que não acre- ditávamos, perseguindo a João e convencendo a Herodes para pôr término à sua vida. Alegando o batismo mundano, o povo se revol- tará, pois considerava João verdadeiro profeta! É, portanto, difícil dar solução à pergunta!”
Opina um deles: “Devemos dar impressão de não nos ter preocupado com tais absurdos do judaísmo pervertido, porquanto está abaixo de nossa dignidade. Digamos simplesmente ignorarmos o caso em si!”
Virando-se para Mim, eles dizem: “Mestre, não podemos res- ponder-te, por não estarmos informados quanto ao batismo de João, pois pouca importância lhe demos!”
Digo Eu: “Muito bem, assim não fazendo, também não vos digo a Origem do Meu Poder! Que vos parece do seguinte: um ho- mem tinha dois filhos e disse ao primeiro: Vai trabalhar hoje na minha videira! O filho respondeu: De maneira alguma; tenho aver- são ao trabalho pesado! — Mas, quando o pai se afastou, o filho se arrependeu e foi trabalhar o dia todo, com grande dedicação.
O genitor procurou o outro filho e repetiu a ordem dada, e este respondeu: Agora mesmo irei trabalhar! — sem todavia cumprir sua promessa. Qual dos dois teria feito a vontade do pai?”
Dizem os interpelados: “Que pergunta infantil! Evidente- mente, o primeiro filho queria apenas fazer uma surpresa ao pai pela resposta negativa; a palavra não tem valor, mas a ação! Que querias insinuar por tal conto?”
Digo Eu: “Explicá-lo-ei, já que sois tão ignorantes em não compreendê-lo! O Pai é Deus de Abraham, Isaac e Jacob. O pri- meiro filho, os verdadeiros profetas inspirados por Deus, no início insatisfeitos pela convocação, como demonstrou Moysés, alegando sua dificuldade de expressão, motivo pelo qual pediu a Deus lhe
desse Aaron como intérprete. O segundo filho dirigiu a palavra, entretanto apenas Moysés trabalhou. E assim foi numa decadên- cia até hoje.
Como os outros apenas prometiam trabalhar na Vinha do Senhor sem algo fazerem, Deus se viu obrigado a voltar aos de difícil expressão. Estes nada prometeram, mas trabalharam; tomados de ciúmes, os outros os atacavam e perseguiam, querendo impedir a boa obra e consideração por parte do Pai da Vinha.
Desse modo foram ultimamente Zacharias e seu filho João bons lavradores na Vinha do Senhor, conquanto ambos se tivessem negado no início de sua convocação interna a assumirem a mis- são, conhecendo a grande indolência e o ciúme atroz dos que da- vam a promessa, mas orgulhosamente cruzavam os braços, não só nada fazendo, mas impedindo com fogo e espada o cumprimento do trabalho.
Por isto, vos digo: em verdade, mais facilmente entrarão no Céu publicanos e adúlteros, do que vós! João vos ensinou o justo caminho e não lhe destes crédito, assim como vossos antepassados não acreditaram nos antigos profetas; publicanos e adúlteros creram em João, fizeram penitência e se regeneraram. Bem sentistes a vossa injustiça; ainda assim, não imitastes os publicanos, para não se di- vulgar que tínheis dado fé a ele. Este é o motivo por que publicanos e adúlteros entrarão mais facilmente no Céu que vós, orgulhosos de vossa profissão, vangloriando-vos perante o mundo como se tivésseis ajudado a Deus na criação de Céu e Terra.
Afirmo-vos: precisamente por isto sois os últimos para Deus! Pois tudo que no mundo é considerado e distinguido, é para Ele um horror! Não quereis entrar no Céu, e ainda obstruís o cami- nho dos que o desejam. Por isto vossa futura condenação será pior.
Afirmo-o porque tenho Direito e Poder para tal, e não ali- mento medo das criaturas deste mundo, como vós; conheço a Deus e o Poder de sua Vontade, que está em Mim, quer e age. Vós O des- conheceis, e Sua Vontade não está convosco! Por tal motivo, temeis o mundo, fazendo o que ele prescreve no coração; assim preparais
o próprio julgamento, condenação e a morte eterna e real. Esta faz com que continueis constantes escravos da crescente indolência e sensualidade, colhendo seus frutos maus e repugnantes.”
Retruca um deles: “Falas abertamente e qual simples ho- mem, como nós. Se aprouve a Deus Poderoso criar-nos para o in- ferno, poderia ter poupado o trabalho, não havendo alma que O louve. Julgamos ter Ele feito a Criação para algo melhor, por isto esperamos Ele — o Ser Sábio e Perfeito — não nos martirizar com suplícios infernais só porque somos obrigados a agir de certo modo.
Compreensível é o motivo por que não manifestamos cren- ça absoluta em determinados homens que se dizem profetas; se o Templo assim o fizesse, de há muito deixaria de ser ponto de con- centração de judeus crentes em Moysés. Por que um profeta pleno do Poder Divino se deixa prender e até mesmo matar pelos judeus? Tal acontecendo, seus adeptos o abandonam, voltando ao estado anterior. Por que Deus permite isso?
Se os profetas são Seus obreiros especialmente inspirados e convocados, e nós representando o filho preguiçoso, não cumpridor da promessa de trabalhar na Vinha — por que Deus Se deixa vencer pela parte mais fraca?”
APARÁBOLADA VINHA
Digo Eu: “Deus deu a todos vontade inteiramente livre, inte- lecto e uma consciência constantemente alerta e pronta para adver- tências; isento de tais faculdades, seria o homem um animal.
Para experimentar seu livre arbítrio, ócio e amor-próprio, que lhe são inatos, proporcionaram-lhe o maior bem estar.
Compete-lhe descobrir tais tendências como prejudiciais à alma e combatê-las com os meios dados por Deus, até que se tenha tornado soberano perfeito sobre todas as fraquezas carnais. Natural- mente é tal luta incômoda e desagradável; prefere deixar-se enroscar por suas crescentes paixões sensuais, atraindo milhares de outros em situação idêntica.
Qual a consequência nociva? A alma, em vez de se livrar dos laços da matéria no caminho demonstrado por Deus, através da atividade justa, espiritualizando e vivificando seu corpo, afunda-se cada vez mais na morte de sua matéria.
Esse estado se generalizando, Deus Se apieda das criaturas e lhes manda despertadores à hora certa. Nem bem esses iniciam seu trabalho, os indolentes se enraivecem, atacam-nos, maltratando-os e até mesmo estrangulando-os em sua ira cega, a fim de poderem prosseguir em sua ociosidade reconfortante.
Deus tendo criado os homens para a Vida Eterna e não para a morte sem fim, Ele não cansa em mandar toda sorte de despertadores para obrigá-los à atividade verdadeira e vivificado- ra da alma.
Os profetas não sendo atendidos, mas perseguidos, Deus en- via outros despertadores, mais fortes, como: más colheitas, carestia, guerra, fome, pestes e outras pragas.
Basta as criaturas se converterem e se tornarem ativas dentro do Plano Divino, e Deus lhes tira em breve as pragas; não se mo- dificando, elas terão revezes maiores, semelhantes ao Dilúvio e a destruição de Sodoma e Gomorra!
Se continuardes com vossos pecados até se encher a medida estipulada, tereis que aguardar os últimos e horríveis despertadores para futuro breve. Avisei-vos apenas para vos lembrardes de Minhas Palavras quando chegar tal momento.”
Dizem ambos: “Que mal fazemos para atrair tal desgraça?”
Respondo: “O que fazeis e sempre fizestes; explicarei com uma parábola. Ouvi! Houve um pai de família que plantara uma vinha, cercando-a com uma sebe; além disto, cavou um lagar e em cima edificou uma torre sólida, na qual muitos poderiam ser aco- lhidos. Isto feito, entregou tudo aos vinhateiros, após lhe terem prometido fidelidade, sinceridade e zelo, e ele estipulado forma de pagamento, aceita pelos primeiros.
Estando próxima a época da colheita, ele enviou seus ser- vos (profetas e doutrinadores) para colherem os frutos. Quando os
vinhateiros os avistaram, conjecturaram seu extermínio a fim de di- vidirem a colheita entre si. O primeiro foi fustigado; o segundo, morto, e o terceiro, apedrejado.
Informado do crime, o pai de família aborreceu-se e en- viou outros lavradores, em maior número. E os vinhateiros lhes fi- zeram o mesmo!
Entristecido, o pai refletiu se devia fazer julgamento ou — devido à sua grande bondade e paciência — persuadi-los mais uma vez à entrega voluntária dos frutos. Finalmente, resolveu mandar o único filho, ao qual deveriam respeitar e cumprir sua justa exigência.
Quando, pois, esse apareceu, os vinhateiros confabularam: Eis o herdeiro! Vamos matá-lo para nos apossarmos de sua heran- ça! — Assim prenderam-no, expulsaram-no da vinha e o mata- ram. Que fará o senhor da vinha quando chegar acompanhado de grande poder?”
Respondem ambos: “Certamente fará matar os maus e ar- rendará a vinha a outros, que em justo tempo lhe darão os frutos!”
Digo Eu: “Julgastes acertadamente; acaso sabeis ser a vinha a Igreja fundada por Deus através de Moysés; vós, sacerdotes, os maldosos vinhateiros; os lavradores, os muitos profetas enviados por Jehovah — e Eu, o Herdeiro do Pai, sobre o Qual conjecturais dia e noite prendê-lo e expulsá-lo, a fim de que possais reger incólumes no seu trono e dividir os frutos de sua vinha?”
Respondem ambos: “Onde estão os que procuram aniqui- lar-te, se realmente és o herdeiro? Nós aqui não viemos para tal fim, mas para examinar-te com rigor se és o prometido. Temos que vigiar as portas da antiga Igreja para impedir a infiltração de um falso Cris- to a seduzir o povo ignorante nesta época em que essênios e outros magos vivem à custa alheia. Quem, pois, não passou pela prova de fogo é intruso e mistificador, dando-nos direito para expulsá-lo.
Se és o verdadeiro Cristo — por que te aborreces com nossa arguição perante o povo? Nada te desabonando, nós te apresenta- remos como verdadeiro; descobrindo tua autocriação — talvez por conta de tua magia secreta — cabe-nos o dever dado por Deus de
expulsar-te como herege e traidor, castigando-te dentro da Lei. Se agimos dentro de tais princípios, como podes comparar-nos aos maldosos vinhateiros, lançando suspeitas contra o Templo?”
Respondo: “Porque tenho motivos para tanto e não alimen- to receio de vós! O motivo é o seguinte: sois e agis como sempre aconteceu, pois vossos predecessores se julgavam igualmente vigias e obreiros justificados da Vinha de Deus. Ainda que trabalhassem — e onde o fizessem, sempre guardavam os frutos para si — deturpa- vam a Lei Divina e até mesmo a trocavam por estatutos mundanos, em seu próprio benefício.
Deus então lhes mandava profetas, por eles perseguidos com fogo e espada, declarando-os de falsos, e todo aquele que aceitasse a doutrina transmitida era classificado de vilipendiador e herege.
Somente cem anos mais tarde eram os perseguidos decla- rados verdadeiros profetas, erigindo-se-lhes monumentos até hoje caiados por vós, em aparente veneração. Acreditais tanto na palavra deles quanto fizeram os sacerdotes contemporâneos. Assim como eles, também perseguis os de hoje, declarando-os falsos, expulsan- do-os e matando-os!
Impossível negardes Minhas Palavras. Não Me assiste direi- to para declarar-vos vinhateiros maus, que a vosso critério o Senhor da Vinha deveria exterminar?! Vigias sois — mas daquela categoria que cuida de uma caverna de ladrões!
Que vos importa o Agrado de Deus, no Qual jamais acredi- tastes? Interessa-vos apenas vossa doutrina mundana, porque rende muito ouro, prata, pedras preciosas e, além disto, os melhores pro- dutos do país. Se acreditásseis em Deus, cumpriríeis Suas Leis, quer dizer: Não deves cobiçar os bens do próximo, tampouco deves ma- tar! — Vós exigis e tomais do semelhante o que ele conseguiu pelo próprio suor. Não se submetendo às vossas exigências, é perseguido qual cordeiro por uma alcateia de lobos vorazes, e quem vos advertir de tal injustiça é preso e morto.
Vossa ação maldosa não só é do Meu conhecimento, mas de todos, provocando queixas e choros em virtude de vossa inclemente
dureza. Sobrecarregais os pobres com pesos insuportáveis, enquanto não mexeis um dedo sequer!
Declarai ao povo se, para atitude tão atrevida e inescrupu- losa, recebestes Lei de Moysés ou de outros profetas! Onde está es- crita a permissão de açambarcar os bens de viúvas e órfãos mediante prometidas preces prolongadas? Quando teria Moysés ordenado a declarar os profetas verdadeiros como falsos, a persegui-los e matá-
-los? Se fazeis tudo isto — o que não podeis negar — justifica-se Eu vos comparar aos maldosos vinhateiros!”
O povo exclama: “É isto mesmo! Ele falou a verdade pura!” Mas os dois fariseus, irados, protestam: “Quem és tu para lançar-nos em rosto tamanha injúria?! Desconheces nosso direito e poderes? Até quando queres experimentar nossa paciência?!”
Retruco: “Sou Aquele Quem vos fala; pois não tenho o menor receio de vosso poder, por ser vosso suposto direito a maior injustiça perante Deus e todos os homens honestos. Quan- to à paciência, conviria perguntardes até quando Eu deva mantê-
-la para convosco, pois Me é dado todo Poder e Onipotência, no Céu e na Terra. Minha Vontade poderia exterminar-vos e atirar-
-vos ao fogo de Minha Ira; todavia, nada poderíeis fazer contra Mim, porque, antes de Me tocardes, Eu vos aniquilaria. Tão logo permitir que ponhais vossas mãos criminosas em Minha Pessoa, em virtude de vossa maldade, o dia de vosso julgamento e ruína terá chegado!”
OSFARISEUSPERGUNTAMPELOREINODE DEUS
Retruca um deles: “Que amontoado de tolices heréticas! Por- ventura não somos os construtores da Casa de Deus na Terra, con- vocados por Moysés e Aaron?!”
Digo Eu: “Assim consta; tendo feito menção aos construto- res, prosseguirei naquilo que reza a Escritura: A pedra rejeitada pelos edificadores tornou-se pedra de escândalo. Tal sucedeu ao Senhor e se apresenta maravilhosamente diante de vossos olhos! Por isto,
digo: ser-vos-á tirado o Reino de Deus e dado aos pagãos, produzin- do neles seus frutos.”
Indagam os fariseus: “Que será da pedra que pretendes re- presentar?”
Digo Eu: “A situação da pedra, por vós relegada, tornando-se pedra de escândalo, será a seguinte: quem nela tropeçar, como vós, será dizimado; mas quem for atingido por ela — o que vos aguarda
— será pulverizado! Entendestes?”
A esta Minha Explicação, os demais sumos sacerdotes e fari- seus começam a perceber tratar-se deles a serem dizimados. Suma- mente revoltados, conjecturam meios para Meu extermínio.
Os mais calmos desaconselham tal projeto, apontando-lhes a simpatia do povo, que Me aceitava como profeta, pois Eu ha- via exposto por várias vezes a sua ação maldosa contra os enviados de Deus. Seria preferível pegar-Me em incoerência para poderem declarar-Me mentiroso e traidor, e só então entregar-Me à Justiça.
Concordando com o plano, viram-se amavelmente para Mim, dizendo: “Mestre, tão entendido nas Escrituras, desejamos saber no que consiste o Reino de Deus. Acaso é ele o Céu onde esperam ingressar todos os crentes após a morte, ou existe na Terra, porquanto será entregue aos pagãos — pois nunca se leu que eles também serão aceitos no Céu! Teu discurso é algo enigmático e pe- dimos explicação!”
Antegozando Minha pretensa dificuldade, presumem ter Eu caído numa contradição, e o próprio povo espera ansioso como Me sairei da cilada.
Levanto-Me qual herói destemido e digo: “Estando cheios de ócio, sensualidade e orgulho mais atroz, impossível compreen- derdes o Segredo e a Verdade do Reino de Deus! Imaginais o Céu qual localidade imensa acima das estrelas, onde almas beatas, após milênios, serão recebidas no Dia do Juízo Final, vivendo na eterna bem-aventurança. E de tal Céu, existente apenas em vossa tola fan- tasia, deveriam ser excluídos os pagãos! Realmente serão excluídos de tal Céu, porquanto não existe!
10. A fim de que ninguém venha a se desculpar da falta de conhecimento, explicarei em quadros, por causa do povo, no que consiste o Céu verdadeiro em todo o Infinito, aqui na Terra e sobre todas as estrelas. Ouvi-Me!”
APARÁBOLADOREIEDESUACEIA MATRIMONIAL
(O Senhor): “O Reino do Céu ou de Deus é semelhante a um rei que preparou as núpcias de seu filho. Enviou seus servos e empregados a convidarem muitos convivas distintos. Estes, porém, pensaram: Para que necessitamos de um ceia régia? Temos de tudo e do melhor e não precisamos agradecer a alguém! — E nenhum dos convidados se apresentou.
Assim informado, o rei chamou outros servos e lhes disse: Explicai aos convivas: Preparei as núpcias! Touros e animais cevados já estão mortos; tudo está preparado. Vinde às núpcias!
Os empregados deram o recado aos convivas. Eles não to- maram conhecimento, mas desprezaram o convite; um se dirigiu ao campo, outro aos negócios; outros, porém, prenderam, ultrajaram e até mesmo mataram alguns serventes.
Quando o rei soube disto, enviou, em sua ira justa, seus exér- citos, exterminou os homicidas e pôs fogo à cidade deles, destruin- do-a completamente.
Em seguida, ele novamente falou aos empregados: As núpcias estão bem preparadas, entretanto os convidados não mereceram o ban- quete; ide a todas as ruas e encruzilhadas e convidai a quantos achardes.
E eles trouxeram a quantos encontraram, bons e maus, e to- das as mesas foram ocupadas!
Eis que entrou o rei no grande salão para ver os convidados e descobriu um que, nem de longe, tinha posto veste nupcial, enquan- to todos os demais haviam vestido a melhor roupa.
E o rei perguntou aos servos: Por que aquele homem não se preparou a fim de que meus olhos se alegrassem e ele evitasse abor- recimentos aos outros?
Responderam eles: Ó poderoso rei! É um dos primeiros con- vivas que não quiseram comparecer. Encontramo-lo na terceira vez, repetimos o convite e aconselhamos-lhe a usar roupa nupcial. Ele respondeu: Qual nada! Não quero incomodar-me por isso; irei con- forme estou! Deste modo ele entrou com os outros e não o impedi- mos, não nos achando com direito para tanto!
Dirigindo-se para o mencionado conviva, o rei disse: Como ousaste entrar sem veste nupcial? Vê, as mesas estão repletas de po- bres, dos quais a maior parte foi má, havendo poucos bons; todos se enfeitaram de tal modo, a alegrarem o Meu Coração! Já foste convidado pela primeira vez, não querendo comparecer; na terceira, geral, te deixaste mover e entrar, sem paramentos nupciais; entre- tanto, tens meios de sobra! Por que me fizeste tamanha vergonha?
O interpelado se aborreceu e nem se desculpou perante o rei, silenciando como se aquele não merecesse resposta alguma, mui- to embora o soberano o tivesse tratado como amigo.
Com essa maldosa obstinação ele se irritou, a ponto de dizer aos lacaios: Pagando minha enorme afabilidade e lhaneza com revol- ta, raiva e desprezo, atai-lhe pés e mãos (vontade amorosa e sabedo- ria) e expulsai-o às trevas mais afastadas (puro intelecto). Lá haverá choro e ranger de dentes (discussões sobre Justiça, Verdade e Vida).
Agora vos digo terem sido muitos de vós considerados e chamados para o verdadeiro Reino de Deus através de Seus servos inspirados; poucos, porém, escolhidos. Primeiro, não quiseram comparecer à cerimônia; em seguida, se opuseram — conforme acontece agora — e quando na terceira vez foram convidados to- dos os pagãos, comparecendo devidamente vestidos, o primeiro se apresentou sem roupa nupcial; tal quadro representa vossa teimosia, que vos expulsará à pior obscuridade mundana e miséria. Por isto se encontrarão mui poucos escolhidos entre os muitos chamados desde o início, e o verdadeiro Reino de Deus vos será tirado e entregue aos gentios. Vós procurareis no mais afastado obscurecimento do mun- do, nas vossas contendas e discussões, jamais encontrando o Reino de Deus até o fim dos tempos.
O Reino de Deus, verdadeiro e vivo, não consiste nem se achega com pompa externa, pois se acha no íntimo do homem; para quem não o possuir, ele não existe nem em todo o Infinito.
O Reino de Deus consiste no cumprimento das Leis Divi- nas e na Fé Naquele que em Mim vos foi enviado.
Em verdade vos digo: quem crê em Mim e age pela Minha Doutrina tem a Vida Eterna, portanto o Verdadeiro Reino de Deus; pois Eu Mesmo sou a Verdade, a Luz, o Caminho e a Vida Eterna!
Quem isto ouvir de Minha Boca ou por aqueles que en- vio como testemunhas justas e válidas, porém não acreditando, não entrará no Reino de Deus, mas continuará na treva do seu pró- prio julgamento mundano. Acabo de vos falar, e feliz aquele que se modificar!”
AQUESTÃODO TRIBUTO
Com Minha Parábola, os templários nada mais sabem que alegar, e o povo Me apoia por Eu ter dito a pura Verdade. Os mais ponderados os criticam: “Avisamo-vos não ser possível atingi-lo com dúvidas da Escritura, que parece conhecer melhor do que nós! De- veríeis perguntar sua opinião quanto às leis romanas, as quais não pode tolerar como pretenso profeta!” Concordando com tal ideia, eles resolvem prometer indenização aos servos de Herodes entendi- dos no assunto, caso fossem capazes de lançar suspeitas contra Mi- nha Pessoa.
Com expressão disfarçada, os mencionados Me dizem: “Mes- tre, sabemos seres verdadeiro e ensinares o Caminho de Deus, sem cogitar se tal conselho é agradável ou não! Somos peritos na lei e estranhamos que, sendo judeus, portanto livres pela Lei de Moysés, tenhamos de pagar o tributo ao Imperador de Roma. Que dizes a respeito?”
Havia percebido sua falsidade quando entraram; por isto, fitei-os com severidade e disse: “Hipócritas, por que Me tentais? Mostrai-Me a moeda do tributo! De quem são efígie e inscrição?”
Respondem eles: “De César.” Digo Eu: “Então dai a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus.”
Quando ouviram isto, admiraram-se de Minha Sabedoria, dizendo aos sacerdotes: “Este sábio podeis arguir vós mesmos; não estamos à altura!” E assim se afastam.
Novamente palestro com o povo acerca da imortalidade da alma, o que atrai alguns saduceus, com os quais mais tarde entro em contato. Entrementes, havia chegado a hora do almoço e alguns discípulos perguntam se é propício sairmos do Templo, porquanto havia Eu vencido os fariseus e conquistado o povo.
Respondo-lhes: “Para isto ainda há tempo de sobra; pois o homem não vive somente de pão, mas de cada palavra saída da Boca de Deus. Tenho que trabalhar enquanto é dia; à noite não é bom tratar-se e trabalhar-se com esse povo. Os fariseus conjecturam novo plano de extermínio de Minha Pessoa e aqui voltarão. Lá se acha um grupo de saduceus, ávidos por uma contenda. Em tal ocasião, não faltarão os templários, por isto aqui ficaremos com o povo. Al- guém de vós querendo cuidar do corpo, poderá fazê-lo; prefiro que fiqueis!” Ouvindo tal conselho, os discípulos não se afastam.
JESUSEOSSADUCEUS.OMATRIMÔNIONO CÉU
Neste instante, os saduceus, cínicos e descrentes na ressur- reição e imortalidade da alma, se aproximam e dizem: “Mestre, disse Moysés, conquanto não ordenasse: Se morrer um homem sem deixar filhos, seu irmão poderá se casar com a viúva, para dar sucessão àquele. Entre nós houve sete irmãos. O primeiro casou e morreu sem deixar prole. Deste modo, a viúva passou a viver com o segundo, ao qual sucedeu o mesmo. Assim ela chegou ao sétimo sem que tivesse filhos, e finalmente morreu. Se existe realmente a ressurreição — a quem pertencerá aquela criatura? Pois aqui era casada com todos!”
Digo Eu: “Oh, errais e desconheceis a Escritura e muito me- nos o Poder de Deus! Na ressurreição por vós incompreendida, as
criaturas serão idênticas aos anjos de Deus, pois não haverá casa- mento. O matrimônio no Céu é outro que na Terra!
Assim como na Terra se unem um homem e uma mulher justos, no Céu estão unidos amor e sabedoria.
Tendo conhecimento da Escritura, certamente lestes ter Deus dito: Sou Deus de Abraham, Isaac e Jacob! Ora, Ele não é Deus dos mortos, mas dos vivos. Assim sendo, Abraham, Isaac e Jacob ainda vivem e de há muito ressuscitaram para a Vida Eterna e verdadeira.
Quando Abraham em vida recebeu a profecia — que ora se cumpre — de que Eu Mesmo viria à Terra como Filho do homem, inclusive a promessa de poder assistir o Meu Dia e Minha Época neste planeta, sua alegria foi imensa.
Asseguro-vos na plena Verdade ter ele visto Meu Dia e Mi- nha Época e ainda os vê, alegrando-se sobremaneira. Acaso poderia fazê-lo se não tivesse ressuscitado há muito tempo, ou estivesse mor- to e, como pensais, inexistente para sempre?”
Os saduceus, inteiramente vencidos, respondem: “Demons- tra-nos o patriarca Abraham e daremos crédito às Tuas palavras!”
Digo Eu: “Não crendo no que digo, também não acredita- ríeis à fácil aparição do patriarca, alegando: Esse homem é mago e quer nos enganar. — Entretanto, afirmo: Eu Mesmo sou a Vida e a Ressurreição; quem crê em Mim terá a Vida e a Ressurreição!
Aqui vedes muitos ainda na carne! Em espírito já ressuscita- ram e não sentirão nem provarão a morte, mas viverão eternamente. Já viram e falaram a Abraham, Isaac e Jacob e conhecem sua situa- ção; vós ainda estais longe de conhecer a vossa, não obstante vivos, pensando e querendo. Entendestes?” Com esta lição, os saduceus se retiram.
O povo se assusta com Minha grande Sabedoria, alegando: “Ele é mais que profeta, pois fala como poderoso Senhor. Somente Deus poderia afirmar ser Ele a Vida e a Ressurreição! Certamente é o Messias Prometido aos judeus, cujo Nome, Emanuel, isto é, Deus está conosco, é Grande!”
Assim confabula o povo. Os templários, entrementes de vol- ta, nada ouvem a respeito, mas sim que Eu havia tapado a boca aos saduceus, o que muito lhes agrada, pois não suportam aquela seita. Enchendo-se de coragem, um escriba Me tenta novamente, dizen- do: “Mestre, estou convencido de tua erudição na Escritura. Por isso, dize-me: qual o Mandamento mais importante na Lei?”
Respondo: “O Mandamento mais sagrado e completo cons- ta: Deves amar a Deus, teu Senhor, de todo coração, de toda tua alma e com todo entendimento! O seguinte, semelhante a este, soa: Amarás o teu próximo como a ti mesmo, isto é, deves fazer-lhe com alegria o que desejas te faça, caso o necessites e ele estiver em tais condições! Desses dois Mandamentos dependem toda a Lei e os pro- fetas. Porventura conheceis outro, mais sublime?”
Responde o escriba: “Não, respondeste com justiça!” Os ou- tros templários, porém, não desistem de experimentar-Me. Por isso lhes digo: “Todos os presentes percebem vossa intenção em querer confundir-Me. Respondi a diversas perguntas e demonstrei não ser presa fácil; por isso, Eu vos farei uma pergunta. Caso respondais, podereis fazer outra!”
Concordam eles: “Está bem, não te ficaremos devendo resposta!”
Digo Eu: “Então dizei-Me: o que pensais do Cristo? De Quem é Ele filho?”
Dizem os fariseus: “Como consta: é Filho de David.”
Prossigo: “Estranho; se assim é, como David O chama, em espírito, Senhor, quando diz: O Senhor disse ao Meu Senhor, senta-
-Te à Minha Direita até que Eu reduza os Teus inimigos para esca- belo de Teus Pés?! Se, pois, David O chama de Senhor, como é Ele o Seu filho?”
Diz um dos fariseus: “Sabemos ter David falado desse modo, em espírito, do Cristo, mas quem entende a expressão ‘Senhor que
falara ao Senhor’?! Se tu o entendes, dá-nos explicação, que acredi- taremos teres falado pelo Espírito de Deus!”
Digo Eu: “Se, como pretensos escribas, não compreendeis a antiga linguagem dos hebreus, como pretendeis entender o seu sentido espiritual?!
O Senhor, Jehovah, certamente foi Senhor de David? E Da- vid não errou quando disse: Meu Senhor falou a meu Senhor! Claro é serem os dois Senhores um Só! Acaso não dizeis: Meu espírito fa- lou ao entendimento de minha alma? Não habita o espírito a alma, tornando-se uno com ela, conquanto, como força da vida em si, é mais nobre e perfeito que a alma substancial?!
Em Deus existem duas Manifestações Individuais, muito embora perfaçam Seu Ser Intrínseco e Indivisível. Uma é perceptível
— o Amor como Chama Eterna da Vida em Deus; outra, igualmen- te distinta, é a consequência da primeira, a Luz ou a Sabedoria em Deus. Se assim é, indiscutivelmente — acaso não é o Amor a mesma Glória que a Sua Sabedoria?!
Se disse David: O Senhor falou ao meu Senhor, afirmou apenas ter penetrado no Amor Misericordioso de Deus, Sua Sabe- doria total, dizendo-Lhe: Senta-te à Minha Direita, torna-Te Verbo e Vida, unifica-te com todo o Meu Poder de Vida, e tudo que for inimigo da Luz terá que se curvar diante do Poder da Vida do Amor, em Sua Luz!
O que naquele tempo David proferiu, em espírito se encon- tra incorporado maravilhosamente diante de vós! Por que cerrais os olhos, não querendo perceber o cumprimento da grande Promessa, que ora vos fala e ensina os Caminhos da verdadeira Vida em Deus?”
Tomados de pavor diante de Minha Sabedoria, os fari- seus não se atrevem a prosseguir na arguição. E os mais pondera- dos dizem em surdina aos outros, raivosos: “Já vos avisamos não ser possível reagir contra esse homem! Primeiro, dispõe dum poder milagroso provindo de sua vontade, pelo qual consegue remover e destruir montanhas; segundo, tem o povo e os romanos a seu favor e, finalmente, é tão incrivelmente sábio, que se torna difícil até mes-
mo lançar suspeitas entre a multidão. Quanto mais perguntarmos, tanto mais inspiraremos desconfianças de nós mesmos. Qual foi nosso lucro? Teria sido melhor não tivéssemos iniciado a discussão. Caso tudo isto for Desígnio de Deus, inútil será nossa reação; não o sendo, passará de tal modo a não ficar a menor recordação!”
Diz um sumo sacerdote: “Sim, tens razão; mas deveríamos tolerar nossa depreciação perante o povo, que nos supre de tudo?”
Opina um outro: “Inventa um meio para modificar a situa- ção, que nossa ajuda será certa!”
Diz outro templário: “E se pedíssemos a ele apresentar-nos diante do povo como, por Moysés, somos na realidade?”
Respondeu o primeiro: “Talvez fosse de algum proveito! Segundo parece, não é mau nem vingativo e consta ter feito muita caridade entre os pobres.”
Deste modo, eles destacam um fariseu para dirigir-se a Mim. Não o deixo falar, dizendo francamente: “Sei muito bem qual teu propósito; não necessitas, portanto, perder palavra. Também sei o que tenho a dizer, a favor ou contra vós, ao povo e aos Meus dis- cípulos, de sorte que podes te afastar ou ouvir o que direi!” Dando meia-volta, ele se junta ao grupo de seus afins, onde todos se pres- tam a ouvir o Meu Discurso.
OSENHORSEDIRIGEAOS ESCRIBAS
Prontamente começo a falar: “Ocupados estão os assentos de Moysés por escribas e fariseus. Tudo que vos disseram baseado em Moysés e os profetas deve por vós ser respeitado e praticado. Toda- via, não sigais as suas obras!
De modo geral, divulgam o Bem e a Verdade; entretanto, não fazem o que ensinam. Obrigam-vos a pesos insuportáveis, en- quanto não pretendem mexer um dedo apenas.
Todas as obras aparentemente boas, eles as praticam somente para serem considerados servos de Deus! Por isso, usam lembretes grandes (apontamentos para os que haviam pago somas vultosas por
orações e oferendas, como garantia de sua felicidade) e bainhas largas em suas vestes, demonstrando rigoroso serviço de prece e sacrifícios.
Têm por hábito ocupar a ponta da mesa das escolas, apreciam os cumprimentos em praça pública e que se lhes chame de ‘rabi’.
Os que são e desejam tornar-se Meus adeptos não devem acei- tar esse título! Há somente Um Mestre Verdadeiro e Eterno, no Céu!
Novamente repito: não vos deixeis cumprimentar e intitular como mestre dentro de Minha Doutrina, pois já sabeis Quem é vosso Mestre!
Entre vós não deve haver regulamento de posto, como se vê no Templo e na sociedade; o maior e mais elevado seja servo e empregado do próximo! Quem se elevar será humilhado, quem se humilhar por amor de seus irmãos será exaltado!”
Percebendo as feições raivosas dos fariseus, o povo exclama: “Ó Mestre, somente Tu és Verdadeiro; assim deveria ser entre todas as criaturas, e a Terra seria um Céu! Um querendo ser mais do que o outro, é ela verdadeiro inferno. Em sua pretensão orgulhosa, o ho- mem oprime e persegue seu semelhante. Pobre Humanidade! Para muitos, melhor seria jamais terem nascido!
Mestre, reconhecemos ser divina Tua Palavra; muitos ouvin- tes, porém, se acham até a raiz dos cabelos no inferno. Por isso, de nada lhes adianta o que disseste, pois rangem os dentes quais lobos e hienas vorazes!”
LAMENTODO SENHOR
Tais manifestações por parte do povo irritam os templários, de sorte que alguns oradores começam a acalmá-los; entretanto, não deixam de lançar suspeitas contra Mim e Minha Doutrina; acusam-
-Me de pretensões ilícitas, de ter sustado a Lei de Moysés, exigindo dos filhos a supressão de título de pai e mãe, quando o profeta jus- tamente mandara honrar os genitores.
O povo cai em dúvidas e alguns opinam: “Não se pode acu- sar os fariseus de injustos! Ele parece ter-se excedido em seu zelo!”
Eis que se aproxima um templário mais suscetível e diz: “Ou- ves o que dizem? Lançaste dúvidas contra nós. Agora o povo reco- nhece o seu erro, e te pergunto que pretendes fazer?”
Digo Eu: “Certamente não procurarei conselhos em vosso meio! Quando João ensinou e advertiu o povo à penitência, agistes da mesma forma: não fizestes penitência e impedistes a multidão de fazê-la. Por tal motivo, acumulareis maior condenação. Isto diz Aquele que tem Poder de conservar ou exterminar-vos, de acordo com vossas ações.
Tolos de sentimento e intelecto! Se vós mesmos chamais Deus de Pai, dizendo não se dever pronunciar o Seu Nome em vão
— como pretendeis igualar a criatura a Deus?! Não existe diferença se chamais Deus de vosso Pai e aquele que vos gerou fisicamente?!
Quereis ser escribas e já não mais conheceis a diferença das palavras arqui-hebraicas ‘Jeoua’ e ‘Jeoutza’! A primeira se chama ‘pai’, a outra, ‘gerador’. Se assim é — quem teria levado o povo a erro tão grande?!
Ai de vós, escribas e fariseus, desvairados mistificadores, cer- rando as portas do verdadeiro Reino do Céu aos que desejam in- gressar, através de vosso ócio, tolice e maldade! Realmente, lá não penetrareis e nenhum que seguir vosso exemplo!
Vós mesmos não entrareis no Reino de Deus, da Verdade e da Vida, obstruindo a penetração dos que se esforçam para tanto, perseguindo, condenando e cerrando todos os caminhos para a Luz e a Vida Eterna. Vossa condenação será tanto pior!
Ai de vós, escribas e fariseus, bajuladores maldosos! Açam- barcais os bens de viúvas e órfãos, apresentando-lhes, em compensa- ção, orações longas e ineficazes!
Ai de vós, escribas e fariseus, perversos hipócritas! Viajais por terras e mares para converter alguns pagãos; tão logo o sejam, são transformados por vós em filhos do inferno, piores do que vós. Por isto igualmente tereis a recompensa no inferno!
Repito Minha lamentação sobre vós, guias ofuscados que dizeis: Não vale um juramento feito ao Templo; quem fizer fal-
so juramento ao ouro do Templo será culpado e punido! — To- los e cegos!
Que vale mais: o Templo, pelo qual o ouro é abençoado, ou o metal em si?! Além disso, afirmais: Alguém jurando junto ao Altar, nada representa; fazendo falso juramento ao lado do sacrifício no Altar, será culpado e castigado. — Cegos e tolos! Que seria maior: o sacrifício ou o Altar que santifica aquele?!
Acaso não é real e justo que aquele que jurar no Altar terá feito àquilo que nele se encontra, assim também acontecendo com o que está no Templo?! E quem jura pelo Céu, fá-lo-á pelo Trono de Deus, portanto por Aquele que nele rege.
Novamente ai de vós, escribas e fariseus, grandes fingidos, que dizimais, pela Lei remota, endro e cominho em vosso benefício, desconsiderando o mais importante e maior, quer dizer, um critério justo e verdadeiro, a fé e a misericórdia, a fim de proporcionar a todos plenos direitos. Não afirmo que deveis desconsiderar a pri- meira; todavia, não pode continuar a segunda parte como é por vós mantida!
Orientadores completamente cegos que sois! Peneirais mos- quitos, engolindo camelos! Mantendes limpos, externamente, os utensílios santificados do Templo, sem ter escrúpulos de seu conteú- do de roubo e gula! Purificai primeiro o interior, para que o exterior se torne puro pela Verdade!
Novamente exclamo: ai de vós, escribas e fariseus, todos si- muladores! Sois idênticos aos sepulcros caiados: externamente de aspecto agradável, no interior, porém, cheios de podridão e mau cheiro! Tais túmulos correspondem à vossa imagem: simulais bea- titude; intimamente sois mistificadores e cheios de vícios variados.
Erigis monumentos aos antigos profetas e enfeitais os tú- mulos dos justos, clamando: Oh, se tivéssemos vivido na época dos patriarcas, não teríamos parte na culpa dos nossos pais, no sangue inocentemente derramado! — Precisamente por isto testemunhais vossa filiação com os assassinos dos profetas! Pois bem, cumpri em Mim a maldosa medida de vossos pais, como fizestes a Zacharias e
a João! Víboras e serpentes, como imaginais escapar da condenação infernal com tal procedimento?”
OSENHORAPAZIGUAO POVO
A esse Meu Discurso impiedoso, o povo começa a rejubilar-
-se, dizendo: “Se esse homem não fosse o Cristo verdadeiro, possui- dor da Força Divina, jamais teria coragem de lançar tais verdades no rosto dessas feras! A qualquer outro já teriam estraçalhado; diante Dele se portam quais criminosos! Essa corja templária merece ape- nas ser atirada ao Jordão, para afogar-se como verdadeiros bodes expiatórios da grande Judeia!”
Digo Eu: “Não julgueis como se fora vossa a incumbência do julgamento e a determinação de castigos, mas tende paciência com os pecadores! Deus Mesmo falou: Ira e vingança são Minhas! Por isto, considerai ser Deus, o Senhor, o Juiz justíssimo que, em tempo, sabe recompensar o Bem e castigar o mal! Compete-vos ter paciên- cia com os pecadores! Seria injusto querer punir-se um enfermo, geralmente culpado de seus males. Um bom médico aconselhando tratamento especial, porquanto há esperança de cura, mas o doente não querendo submeter-se ao mesmo, tornar-se-á responsável pela sua desgraça final.
O mesmo acontece com esses ignorantes fariseus e escribas! Como verdadeiro Médico, demonstrei-lhes os grandes males psíqui- cos e os remédios apropriados; se os desprezarem, jamais querendo empregá-los, não serei Eu a julgá-los por isto, mas os efeitos da tei- mosia os condenarão e atirarão à perdição e miséria.
Deus deu ao homem os Mandamentos para a salvação de sua alma. Cumprindo-os, ele viverá e será eternamente feliz; não os seguindo, ele mesmo se prejudicará. Pois Deus firmou uma Ordem sólida e imutável, sem a qual impossível imaginar-se a existência de uma criatura. Tal Ordem foi demonstrada por muitas revelações; o homem deve se adaptar, guiar e educar-se, dentro do livre arbítrio. Assim fazendo, ele se aperfeiçoará pela Vontade de Deus, tornan-
do-se um indivíduo livre, independente e semelhante ao Criador, dotado de Amor, Sabedoria, Poder e Força divinas, conquistando a verdadeira Filiação Divina. Esta só lhe pode advir pelos caminhos demonstrados em todas as épocas.
Tudo depende da verdadeira fé e da vontade própria. Crendo e agindo em tais princípios, será a criatura mais feliz em todo o In- finito; se não agir desse modo, responsável se torna se sua alma cair na mais profunda miséria, ignorância e morte.
Por esse motivo, Eu Mesmo vim qual homem, a fim de de- monstrar-vos os justos caminhos, porque nunca destes crédito aos Meus mensageiros, nem adaptastes suas advertências.
Se agora também não acreditais em mim e não quereis aceitar a Minha Doutrina — quem deveria procurar-vos para tal fim?! Não crendo no Mestre da Vida, a quem ireis dar fé, para agir dentro de tais princípios e vos tornar felizes?! Disso tudo, vós templários, dais testemunho real!”
LIVREARBÍTRIODO HOMEM
Diz um popular igualmente versado nas Escrituras: “Senhor e Mestre, entre nós muitos há que assistiram a Teus Ensinos e Mi- lagres, admirando-os profundamente, chegando a perguntar se o Messias seria capaz de Ações mais extasiantes! Pois quem cura pela simples palavra as moléstias mais pertinazes, restitui membros, res- suscita mortos, ordena aos elementos etc. — só pode ser Deus!
Eis nossa fé! Conquanto tenhas físico igual ao nosso, ele oculta a Plenitude de Deus, o que provam Tuas Ações. Com esta convicção, não mais nos deixaremos enganar pelos Templários! Te- mos um pedido a fazer: susta a Tua Paciência e atira aos Teus Pés os inimigos incorrigíveis!”
Digo Eu: “Se realmente credes em Mim, não deveis anteci- par-vos na Sabedoria que tudo rege e apazigua no mundo, mas unir vossa paciência à Minha e concluir: neste mundo de experiência para o livre arbítrio, a Ordem permite ação plena do homem; pois
somente pelo livre desempenho de sua vontade pode ele conquistar a Vida Eterna da alma. Além disto, é ele detentor de razão e intelecto individuais, pelos quais julga o Bem e o Mal e pode aplicá-los pelas forças conferidas.
Conhecedor do Bem e da Verdade, agindo, porém, em contrário, provoca o julgamento e o próprio inferno, tornando-
-se demônio perfeito, já em vida. Eis o castigo imposto sem Mi- nha Vontade!
Por isto, não vos preocupem Minha grande Paciência e Amor para com as criaturas, boas ou más! Apenas as advirto quando se perdem em atalhos por própria culpa; todavia, não posso impedi-las com a Minha Onipotência e reconduzi-las aos justos caminhos da Vida, porquanto lhes tiraria a livre vontade, ou seja, a vida da alma e do espírito.
Cada qual faça o que quiser! Basta conhecer os caminhos e as consequências, boas ou más. Todo homem sabe, quando senhor da razão e do intelecto, o que é Bom e Justo, através das Revelações dos Céus. A escolha depende de seu livre arbítrio.
Assim sendo, não podeis reclamar da Minha Paciência e In- dulgência; tem de ser assim neste mundo, Escola para futuros filhos verdadeiros de Deus.
Sendo destinados a se tornarem espíritos e seres perfeitamen- te idênticos a Deus, seu livre arbítrio tem de ter campo de ação até o Infinito, podendo tornar-se verdadeiros demônios, responsáveis pelo próprio sofrimento.
Por isto, não julgarei nem punirei pela Onipotência em vir- tude das más ações, porém o próprio homem fará isto; é a Lei imu- tável de Minha Ordem Eterna, transmitida a todos pelo Caminho luminoso das Revelações, desde que surgiu a existência nesta Terra.
Se isto compreendestes, exercitai-vos na paciência e tende verdadeira compaixão não só dos físicos doentios, porém muito mais das almas enfermas e cegas, que chegareis mais fácil e rapida- mente à Perfeição de Deus, real e plena, tornando-vos idênticos aos anjos no Céu!”
Manifesta-se novamente um dos fariseus mais ponderados: “Mestre, eu e muitos confessamos seres tu doutrinador eloquente, sem consideração ao conceito humano, e além disto é bem verdade ter sido revelado o justo caminho através dos profetas! Tais revela- ções seriam suficientes para os homens. Por que é permitida a exis- tência de regentes mundanos que prejudicam a humanidade pobre e fraca através de leis maldosas?”
Digo Eu: “Tal não foi determinado por Deus por qualquer Revelação, pois Ele deu aos homens guias e juízes leais e justos, in- suflados pelo espírito; quando, no decorrer do tempo, o povo se viu amparado pelo conforto e abastança de tudo que a Terra produz de bom e rico, não mais se satisfez com os guias e juízes simples e modestos. Reclamou e exigiu um rei sob o regime do fiel Samuel, devendo ostentar a mesma pompa dos regentes pagãos, que com ele praticavam idolatria.
Quando o profeta expôs a Deus a exigência insustentável do povo, Jehovah disse em Sua Ira: Essa raça já cometeu mais pecados da pior espécie do que existe erva em toda a Terra e areia no mar, e pretende acrescentar o maior, não concordando com Meu Regime, mas exigindo um rei como os pagãos. Receberá um rei com açoite e flagelo, podendo então clamar e chorar! Deus proferiu ao povo esta e outras advertências para dissuadi-lo de sua louca exigência.
O efeito sendo nulo e o povo insistindo na reclamação, Deus mandou que Samuel ungisse Saul para rei dos judeus. Deste modo se criaram reis onde os povos não andavam satisfeitos com o suave Regime de Deus, querendo com obstinação um soberano humano!
Porventura não foi a má vontade aquele demônio que tantas vezes atraiu os homens a uma infelicidade incomportável?! Em mui- tas partes do mundo, Deus advertiu as criaturas à eleição de um rei humano, dotado de todos os poderes terrenos, demonstrando-lhes as consequências nocivas; eles tapavam coração e ouvidos diante da Voz de Deus, semeando sua própria desgraça, que terão de suportar!
Se um povo pedisse a Deus para guiá-lo e regê-lo como no início, em verdade Ele não deixaria de atender tal súplica sincera! Havendo muitos favoritos a rodearem os soberanos, não dando li- berdade ao povo, fazendo-o educar desde o berço em favor deles, tal opressão é registrada pela massa sem orientação, para seu lenitivo; pois desde o início de seu regime, os potentados percebem que um povo inspirado por Deus em breve se libertaria.
Por isto procuram, com a ajuda de falsos profetas — como sois alguns dos míseros remanescentes — seduzir a multidão, ce- gando-a à Luz do Deus Único e Verdadeiro. Assim sendo, ela não consegue descobrir o justo Caminho para Deus sem criaturas por Ele inspiradas, continuando a viver em sua idolatria habitual e à cata de vantagens materiais por parte do rei ou de um favorito, através de meios perniciosos. Aparecendo um justo profeta, não é aceito como tal, mas perseguido como herege e, às vezes, morto — fato comum entre vós.
Como poderia ajudar Deus a um povo tão decadente se, en- quanto afundado na miséria, rejeita o Auxílio Divino?! Esta sendo a situação entre vós, fútil é a pergunta: Por que Deus admite regentes mundanos que prejudicam as criaturas ao lado de Revelações?
Acaso desejam elas coisa diferente, ou vós?! Se tal fosse vosso desejo, ouviríeis as Minhas Palavras e as praticaríeis, pois Eu vim para salvar-vos como Próprio Senhor. Qual vossa atitude? Conjectu- rais constantemente o Meu extermínio! Se nisto sois secundados por muitos, dizei-Me quem, além de Mim, vos poderia ajudar e salvar!”
Diz o fariseu: “Mestre, sempre nos acusas como se tivésse- mos manchado as mãos com o sangue dos profetas! Que culpa nos cabe nas ações dos nossos pais ignorantes?! Se tivessem vivido em tal época com a compreensão de hoje, não os teriam apedrejado! Tampouco reclamamos um rei em tempos de Samuel; merecendo um, por castigo, preferimos um judeu a um pagão. Desejava apenas esclarecimentos por que somos obrigados a suportar leis pagãs.”
Respondo: “O motivo se prende à apostasia das Leis de Moysés e dos profetas, suplantando-as com vossos estatutos, maus e
absurdos. Destes preferência às leis e Deus permitiu se cumprisse o que desejastes e ainda quereis; se assim não fosse, daríeis ouvidos a Mim, convertendo-vos e agindo pela Minha Doutrina. Prego nada mais que o antigo Verbo de Deus, do qual tanto vos afastastes, que não O reconheceis partindo de Mim. Em compensação, Me odiais e perseguis qual reles pecador e criminoso, merecendo o açoite e a espada pagãos.
Além disto, consta: Envio-vos profetas, sábios e verdadeiros escribas! Alguns serão assassinados por vós e até mesmo crucificados como fazem os pagãos; outros serão fustigados nas sinagogas, sendo perseguidos de cidade em cidade, cabendo-vos responsabilidade do sangue dos sacrificados desde Abel morto por Caim, até o sangue de Zacharias, filho do devoto Barachias, abatido entre o reposteiro e o Altar. Em verdade vos digo: tendo sido e sendo ainda esta vossa atitude, a consequência vos atingiu e podeis aguardar coisas piores; assim o quereis, e assim será!
Jerusalém, Jerusalém, matas os profetas e apedrejas os men- sageiros que te procuram! Quantas vezes tentei reunir os teus filhos, como acolhe a galinha os seus pintinhos debaixo das asas, e vós não vos deixais acolher sob Minhas Asas protetoras! Por isto, vossa Casa será abandonada, vazia e deserta, a ponto que nem corujas e grous habitarão em suas muralhas! Gravai-o bem, a fim de vos lembrardes quando tal suceder a vós e a vossos filhos, pois vos demonstrei o quadro pela imagem noturna no Céu!”
Nisto o fariseu pergunta como poderia Eu sabê-lo e quando Eu posteriormente voltaria a Jerusalém, pois pretende interceder por Mim junto dos sumos sacerdotes.
Digo Eu: “Deixarei agora o Templo com todos os Meus e não voltarei até exclamardes: Salve Aquele Que vem em Nome do Senhor!”
Voltando ao grupo, o fariseu diz: “Inútil lutar-se com ele, como já disse! Durante cinco horas estendeu-se o debate e nada con- seguimos, a não ser instigar o povo contra nós. Resta saber como con- quistar sua simpatia.” Ninguém fez objeções e todos deixam o Templo.
Novamente advirto e conforto o povo; em seguida, volta- mos ao Monte das Oliveiras, onde nos espera bom repasto.
OSENHOREOSSEUSNOMONTEDAS OLIVEIRAS
Nem bem chegamos, somos abordados por Nicodemus, José de Arimatheia e o velho rabi. O primeiro diz: “Senhor, Amor de todos os corações, hoje disseste a Verdade nua e crua àquelas fúrias! Foi milagre não terem feito menção de apedrejar-Te! O melhor de tudo foi a aceitação quase total de Tua Doutrina de Vida pela popu- lação, e além disto os templários se traíram pelas próprias perguntas capciosas, perdendo a última fagulha de fé e confiança populares.
Foi bem feito para aqueles bajuladores pretensiosos que se julgam superiores a Deus e a Moysés, afirmando que Jehovah aten- dia somente por eles. Hoje foram esclarecidos quanto ao seu concei- to diante de Deus, e agora poderão reunir-se para outros conchavos, piores que os passados!
O mais interessante é a divergência entre si, pois os mais ponderados ao menos confessam sua fraqueza diante de Ti; quanto aos fanáticos, devem sentir sua impotência, conquanto não a confes- sem. Estou tão feliz pela Tua vitória, que tinha vontade de exclamar: Salve Aquele Que veio em Nome do Senhor!”
Digo Eu: “Sentiste e falaste bem; para Mim, teria preferido que todos os fariseus tivessem percebido a Verdade e modificado a sua índole. Assim, são os mesmos obtusos que dantes.
Seus espiões perceberam a nossa vinda aqui e em menos de duas horas nos procurarão os esbirros; Meu Tempo ainda não che- gou, por isto receberão bom corretivo pelos egípcios e Raphael, dan- do-nos algum descanso!”
Nisto, chega o arcanjo com os jovens ex-escravos já orienta- dos por Agrícola, por ter ele lhes ensinado os idiomas romano, grego e hebraico, e portanto aptos à viagem para Roma.
O romano está muito contente, porquanto se vê livre de uma grande preocupação e tarefa. Os jovens Me cumprimentam em he-
braico e, à Minha Ordem, vão às tendas, onde também encontram as mesas postas. Incontinenti, entramos no refeitório e, na ordem habitual, tomamos a refeição.
PASSAGEMDAMOCIDADEDO SENHOR.
JOSÉNEGASEUSPRÉSTIMOSAUM GREGO
Após uma hora, o vinho solta os recalques e Eu Mesmo relato certos acontecimentos de Minha Mocidade, para alegria de todos. Os fariseus convertidos tudo confirmam e um deles conta ligeira- mente a ocorrência no Templo, quando aos doze anos estonteei os doutores com Minha Sabedoria, acrescentando que já naquela épo- ca muitos alimentavam a hipótese de ser Eu o Messias Prometido. Todavia, nada mais se soubera a Meu respeito, pensando em Minha morte prematura, ou que os essênios Me tivessem levado aos seus institutos, em combinação com Meus pais. Deste modo, o assunto caiu em esquecimento e só voltou à baila através de Meu Apareci- mento recente.
Terminado o relato, os demais apóstolos se referem a fatos extraordinários e Jacob menciona a gravidez milagrosa de Maria, Meu Nascimento e fuga para o Egito, onde fiquei três anos, e todos os acontecimentos daquela época. Todos invejam Jacob pela felici- dade de ter estado sempre a Meu lado.
Em seguida diz Lázaro: “Senhor e Mestre, estou indescritivel- mente feliz em ser Teu amigo; muito mais seria se fosse Jacob, que Te viu descer de certo modo dos Céus!”
Digo Eu: “Realmente é Jacob plenamente feliz e foi até mes- mo invejado pelos anjos celestes; entretanto, não tem privilégios pe- rante outros. Seu valor reside única e exclusivamente no ouvir e crer em Meu Verbo, aplicando-o por amor a Mim; quem isto fizer terá a mesma vantagem que Jacob.
Relatarei especial ocorrência após os Meus doze anos, época em que nada de maior se soube a Meu respeito. Sempre ajudei José,
meu pai de criação, com toda dedicação e zelo, de sorte que os ser- viços se realizavam a contento.
Certo dia, chegou um grego pagão para combinar com José a construção duma casa e duma pocilga. Como judeu puro e severo, José disse ao rico grego: ‘Nossa Lei nos proíbe a convivência e tra- balhos prestados a pagãos! Fosses tu judeu, fácil seria entrarmos em acordo; sendo tu pagão ignorante, não posso atender-te por todos os tesouros do mundo, e muito menos construir uma pocilga, ainda que fosses judeu!’
Sumamente irritado, o grego respondeu: ‘Que homem estra- nho és! Sou grego, mas de há muito tenho, com todos os meus, ati- rado os deuses no mar e acreditamos em teu Deus, Dele recebendo visíveis Graças. O fato de não aceitarmos a circuncisão se prende ao seguinte: não queremos ser sujeitos ao insaciável Templo, mas uni- camente ao Deus Verdadeiro, que irradia o Seu Sol também sobre nós. — Por que nos desprezais?’
Disse José: ‘Enganas-te com tal suposição; respeitamos ape- nas a Lei de Moysés que proíbe o intercâmbio com pagãos. O judeu que isso fizer se macula por muito tempo. Sou judeu respeitador desde infância e não pretendo mudar na velhice!’
Disse o outro: ‘Muito bem, não quero seduzir-te; pois tam- bém sou velho como tu e te conheço melhor do que pensas. Sendo tão rigoroso nesta época, por que assim não fizeste quando fugiste para o Egito pagão em companhia de tua família, quando partiste em virtude da perseguição de teus irmãos de fé?
Vossas leis são boas, mas deveriam ser compreendidas no sentido espiritual da Verdade, para serem praticadas! Quem se pren- de à letra, longe está do Reino da Verdade. No Egito, trabalhaste para os pagãos, continuando judeu íntegro. Por que deverias macu- lar-te agora?!
Naquela época tinhas um filhinho milagroso, por nós quase venerado qual Deus, em virtude de suas capacidades excepcionais. Que foi feito dele? Se não morreu, deve ser moço feito!’
Algo encabulado, porque reconheceu o grego, José respon- deu: ‘Meu amigo, muitos favores me prestaste em Ostrazina e seria injusto eu não te atender; contudo, terei uma conversa com os anci- ãos da cidade e farei o que aconselharem.’
Disse o grego: Se não me engano, recorreste sempre ao con- selho de teu filhinho em Ostrazina! Se ele ainda for vivo, será mais sábio que naquela época! Não o consultas mais?”
RELAÇÕESDOSENHORCOMOS SACERDOTES
(O Senhor): “Apontando para Mim, a alguns passos ocupa- do na oficina onde serrava uma tábua, José respondeu: ‘Lá está ele trabalhando! É estranho: até os doze anos, eu e a mãe dele, no mo- mento atarefada na cozinha, estávamos convictos de ser ele o Mes- sias Prometido; completando tal idade, a impressão divina perdeu-se inteiramente. É devoto, bondoso e trabalhador, faz tudo o que lhe damos para resolver, sem queixas. Se quiseres, podes pessoalmente certificar-te de minhas palavras.’
O grego se aproximou de Mim e disse: ‘Jovem amigo, já te conheço há dezoito anos e admirava tuas faculdades divinas que, como também tuas palavras, me levaram a aceitar vossa crença, com exceção da circuncisão. Foste o motivo principal pelo qual deixei o Egito, para aqui penetrar mais profundamente na vossa sábia Dou- trina. Agora vim a saber que tua ação, excepcionalmente divina, per- deu-se, e desejava saber o porquê.’
Fixando o Meu Olhar no grego, Eu disse: ‘Orientado de nossa Doutrina, certamente não desconheces os sábios ditos de Salomon. Entre eles consta um dizendo que tudo neste mundo tem o seu tem- po! Naquela época não era rapaz, e hoje não sou mais garoto, e traba- lho como qualquer adulto, com dedicação e zelo, porque o Meu Pai no Céu assim o quer. Conheço-O, percebo sempre a Sua Vontade e faço somente o que Ele quer! E isto é do Agrado do Pai Celeste!
Realmente, dei grandes provas quando Pequenino, para de- monstrar às criaturas ter Eu vindo dos Céus como Senhor; elas pou-
co ligaram a isto e até mesmo se aborreceram com Meus Milagres. Todavia, sou o Mesmo e darei outras provas, a fim de testemunhar a Chegada do Reino de Deus. A época para tal será determinada por Mim Mesmo. Feliz quem crer em Mim e não se escandalizar!
Desejas que meu pai de criação construa uma casa e um cur- ral para porcos. Ele o fará! Pois o que diante de Mim é justo não é pecado para Deus. Nunca foi proibido aos judeus certo intercâmbio comercial com pagãos honestos; apenas lhes é vedada a aceitação de idolatria, doutrinas nocivas, hábitos, costumes e ações. Quando o pagão tiver aceito a crença dos judeus, estará circuncidado no co- ração e na alma, pela fé no Deus Único e Verdadeiro, admitindo-se assim seu convívio!’
Disse José: ‘De há muito não falaste tanto e tão sabiamente e reconheço tua razão; todavia, não se deve provocar os sacerdotes, convindo consultá-los para não ser classificado de herege! Por isto, irei procurar nosso chefe.’
Disse Eu: ‘Que farás, ele te proibindo a aceitação da obra, não obstante a oferenda?’
Respondeu José: ‘Em tal caso, teria que obedecer!’
Acrescentei Eu: ‘Vê, quando Eu iniciar a Minha grande Obra, não pedirei licença aos sacerdotes, muito embora seja ela contrária a seus tolos estatutos, mas empreenderei a grande e pesada tarefa pelo próprio Poder e Força! Pois o que é justo perante Deus justifica-se para todos, queiram ou não!’
Insistiu José: ‘Meu filho, agindo desse modo, poucos ami- gos terás no mundo!’
Retruquei: ‘Realmente, quem, aflito, procura a amizade mundana facilmente perde a de Deus! Dou-te o seguinte conselho: prestemos este ato de amizade ao grego sem indagarmos pela concor- dância dos sacerdotes, dominadores e cobiçosos; pois ele nos prestou muitos favores e não se admite negar-se-lhe a amizade por causa dos templários. Se não tiveres coragem, Eu sozinho farei a construção!’
Exclamou José: ‘Mas, que tens hoje?! De há muito não te vejo tão teimoso! Quando me procuram judeus e anciãos e às vezes
se dirigem a ti, mal abres a boca; agora aparece um pagão, e logo te prontificas a tudo! Que se passa? Sou levado a crer que pretendes iniciar teus milagres para esse grego!’
Disse Eu: Não te alteres, Meu amigo velho e justiceiro! Se Me retraio diante dos judeus, tenho Meus sábios motivos! Acaso existe aqui alguém com fé plena e verdadeira, com exceção de ti?! Quando garoto operava alguns milagres, afirmavam Minha obsessão e a conivência com o demônio, fazendo coisas impossíveis.
Tu mesmo chegaste a perguntar a um ancião acerca da pos- sibilidade de ocultar-se em Mim o espírito de um grande profeta, pois grandes provas tinham sido dadas no Meu Nascimento. Um fariseu ignorante, porém, disse: Consta jamais surgir profeta da Ga- lileia! — Tal pergunta é condenável! Se sacerdotes e demais judeus são dessa opinião, perante quem e por que deveria dar provas?!
Esse grego cheio de boa fé e amigo da Luz interna da Vida não se aborreceria com Minhas Ações; portanto, compreende-se Eu Me portar de modo diferente com ele.
Digo-te: sendo essa a atitude dos judeus, a Luz da Vida lhes será tirada e entregue aos pagãos! A Salvação de todas as pessoas pro- vém dos judeus, e tal Salvação sou Eu; eles não querendo Me aceitar e Me reconhecer, a Salvação passará aos pagãos!”
OSENHORDÁPROVADESEUPODERQUANDO MOÇO
(O Senhor): “Em seguida, o grego disse a José: ‘Agora reco- nheço teu filho milagroso e me sinto feliz por ele não nos considerar como outros judeus; julgam-se filhos de Deus, todavia estão enterra- dos no pior orgulho, perseguindo-se uns aos outros. Quando ainda pequenino, teu filho muitas vezes se queixava do judaísmo; agora, como adulto, expressou claramente a situação desse povo. Seu crité- rio me satisfaz, porque traduz o que sinto.
Que maneira estranha do povo eleito, de condenar todo pa- gão, ainda que tivesse prestado grandes favores! Por que não despre- za nosso ouro e prata?! Se um de nós pisar o limiar da casa de um
judeu, alega ter sido ultrajado, inclusive o seu lar! Não encontro palavras para tamanha heresia! E isto foi comprovado pelo teu filho milagroso!
Tendo sido o assunto bem esclarecido entre nós e, além disto, ser do conhecimento de todos o que diz respeito à tua índole sincera, podemos entrar num acordo quanto à edificação de que te falei. O teu filho saberá como agir para não teres aborrecimentos. Que dizes?’
Respondeu José: ‘Tu e ele tendes razão; a questão se tornando pública, serei eu chamado à responsabilidade. Quanto ao preço, não há dúvida!’
Disse Eu: ‘Ouve, José! Depende unicamente de Minha Von- tade alguém te trair em tua boa obra; pois, ainda que de há muito não tenha dado provas pelos motivos acima, sou O Mesmo que fui desde o início; portanto, tudo Me é possível! Sol, Lua, estrelas e planetas, todo o Céu e todo o inferno têm que Me obedecer e agir dentro de Minha Vontade — e ainda deveria ter receio dos sacerdo- tes ignorantes de nossa sinagoga?!
Combina as condições da construção com esse homem ho- nesto e deixa o resto Comigo! Quem soube criar Céus e Terra por certo poderá edificar uma casa boa e um curral para um grego de índole judaica! Realmente, não pode ser considerada honrosa ao es- pírito humano a construção de uma pocilga; entretanto, dou pre- ferência a uma pocilga, por mais imunda, do que ao Templo de Jerusalém e a certas sinagogas na grande Judeia!’
Respondeu José: ‘Meu filho! Que linguagem atrevida! Se al- guém da cidade te houvesse escutado e fizesse queixa — que seria? Responsabilizar-me-iam da pior blasfêmia, castigando-nos com o apedrejamento!’
Disse Eu: ‘Cuida de outra coisa! Quem poderia ouvir-nos Eu não o querendo, e apedrejar-nos como Senhor de todas as pedras?! Vê esta aqui! Quero que se desintegre para os sentidos físicos! E assim é! Se um tolo judeu nos atirasse pedras tais, poderiam prejudi- car-nos?! Vê o Sol, como irradia sua forte luz! Sendo Eu igualmente Senhor do Sol, quero que deixe de iluminar por alguns minutos!
Percebes a escuridão noturna?!’ José e o grego se assustaram e as pes- soas que estavam na casa saíram correndo, perguntando apavoradas o que acontecera.
Respondi: ‘Há tanto tempo estou convosco e ainda não Me conheceis! Tal foi a Minha Vontade! E agora quero novamente luz
— e eis o Sol em pleno deslumbramento! Deveis, com isto, apenas saber estar Eu convosco!’
Responderam todos: ‘Graças ao Senhor, Jesus recebeu o Po- der de Deus!’
Aparteei: ‘Nada disto, pois todo Poder e Força são posse Minha! Eu e Aquele que está em Mim somos Um, e não dois. José, dize-Me se ainda tens receio dos judeus e anciãos da sinagoga!’
Retrucou José: ‘Querido filho, meu Senhor, diante de tais argumentos, nada mais temo; pois agora acabo de ver a minha sal- vação. Sem mais delongas, iremos estudar o local onde esse velho amigo deseja sua construção!’
Disse o grego: ‘Desde já agradeço, e o pagamento será satis- fatório. O terreno não dista muito e podemos usar meus animais de carga para lá chegarmos antes da noite.’
Em seguida, José orientou os demais filhos acerca do plano e opinou um deles ficar em casa para qualquer emergência, e além disto não chamaria a atenção dos vigias da sinagoga.
Acrescentei: ‘Também tens razão, porém não inteiramente! Determino que somente Jacob nos acompanhe, havendo necessi- dade apenas de instrumentos para três, e isto, a fim de saberem de nosso afastamento de casa como carpinteiros. Jacob, apronta-te!’
Quando já estávamos de saída, Maria se aproximou per- guntando quanto tempo ficaríamos ausentes. E José respondeu: ‘É difícil prever, diante da grande obra!’
Eu interrompi: ‘Os homens não o podem; a Mim, porém, é possível! Nós nos ausentaremos por três dias: hoje, amanhã e depois; no Sábado, antes do surgir do Sol, estaremos de volta!’
Todos reagiram: ‘Como irás construir em dois dias uma grande casa e um curral?’
Respondi: ‘Será nossa incumbência; tratai que aqui tudo continue em ordem!’
Voltou-se Maria para Mim: ‘Meu filho, que atitude estra- nha! Estás tão altivo hoje! Que se passa?’
Respondi: Tenho que sê-lo para vossa salvação! Não nos detenhas; com tais conversas ninguém lucra. O tempo é precioso!”
AHOSPEDARIADO GREGO
(O Senhor): “Incontinenti, nos encaminhamos para o alber- gue, onde os animais do grego nos esperavam. Grande número de curiosos começou a nos importunar com perguntas, e o tavoleiro, velho amigo de José, lhe disse: ‘Hoje não faria viagem, pois hou- ve um eclipse solar, sempre considerado pelos velhos como mau presságio!’
Eu interrompi: ‘Como sois inteligentes! A tais mitos sem fundamento ligais grande importância, enquanto atirais ao lodo tudo que é puro e verdadeiro! Não nos detenhas com coisas fúteis!’
Respondeu o hospedeiro: ‘Meu amigo, os velhos também eram entendidos; por isto, os jovens deviam respeitar as experiên- cias, para evitar certos contratempos!’
Retruquei: ‘Convém seguires os ensinos de Moysés e dos profetas; será mais proveitoso do que considerar a Lua nova e tais dias felizes e desditosos! Quem cumpre os Mandamentos de Deus, amando-O acima de tudo e ao próximo como a si mesmo, não tem necessidade de temer dias infelizes; serão todos os dias infelizes para quem isto não fizer!’
Disse o tavoleiro: ‘Isto também sei; todavia, pode-se ter al- guma consideração para com as crendices dos velhos!’ Em seguida, montamos os animais e rapidamente cavalgamos a Leste de Tyro.
Na metade do caminho, alcançamos outro albergue, igual- mente grego, onde queríamos tomar uma refeição qualquer, e José indagou do tavoleiro se havia alimentação apropriada para judeus. Quando soube reduzir-se a refeição à carne de porco defumada, pão
fermentado, sal e vinho, José observou: ‘Está difícil tomarmos esse alimento proibido aos judeus. Não tens peixes, galinhas e ovos?’
E o tavoleiro respondeu: ‘Onde iria buscar peixes em cima da montanha? Quanto a galinhas, aqui não se criam pela falta de forragem e pelo grande número de aves de rapina, que até mesmo dificultam a criação de ovelhas.’
Disse Eu: ‘Manda trazer o que tiveres, que servirá para nós!’ Respondeu José: ‘Mas que dirá a Lei de Moysés?’ Disse Eu: ‘Já es- queceste Quem sou? Está em Mim Quem deu as Leis ao profeta e ora te diz: come o que vier, pois ao puro tudo é puro!
Proibiu Moysés a carne de animais impuros para impedir se tornassem os judeus mais impuros do que já eram, desde nascença; em caso de necessidade, podiam usá-la. Nós mesmos nunca fomos e jamais seremos impuros, portanto não há alimento, bem prepara- do, que nos prejudique.’ E assim nos fartamos daquilo que o grego mandara servir, contente por nos ter satisfeito.
Quando terminamos, Eu lhe disse: ‘Grande Graça sucedeu ao teu albergue! A partir de hoje, poderás criar aves e ovelhas à von- tade; pois quero que essa zona seja livre de qualquer animal selva- gem enquanto tu e teus descendentes aqui viverem. Tão logo outros hospedeiros se tornarem proprietários, a antiga praga os perseguirá!’
Disse ele: ‘Meu jovem, como provas as tuas palavras?’
Retruquei: ‘Isto acontecerá tão certo como é real o tesouro oculto em tua casa, desconhecido de ti e de teus ascendentes! Cava a terra que pisas, uns três palmos, e verás o tesouro, com o qual po- derás agir a gosto!’
Aflito, o tavoleiro pegou numa pá e, com a ajuda do em- pregado, descobriu vários vasilhames de ouro de aproximadamen- te duzentas libras de peso. Naturalmente, ele queria saber de sua procedência.
Respondi: ‘És o sétimo proprietário deste albergue, desde que esses objetos, roubados de uma caravana, aqui foram enterrados. Mais não necessitas saber. Aqueles homens cipriotas e ladrões, conquanto não fossem assaltantes, não eram de tua raça, pois vens de Athenas.’
Respondi: ‘Assim como cada pensamento teu Me é conhe- cido, sei igualmente desse fato. Para te dar uma prova, direi o que pensaste hoje cedo. Foi o seguinte: Meu albergue é às vezes bem procurado e me dá algum lucro; se encontrasse um comprador que me desse a importância necessária à compra de um melhor em Tyro, seria o que mais desejo neste mundo!
Esse foi o primeiro pensamento; em seguida, refletiste se convinha expô-lo à tua mulher. Concluíste não ser oportuno, pois ela poderia impacientar-se, exigindo pronta realização do teu plano. Não foi isto?’
Exaltado de admiração, o tavoleiro respondeu: ‘Mas, isto nunca aconteceu! Agora creio ser esta zona saneada das feras! Fizes- te-me um grande favor — como poderei recompensar-te?’
Disse Eu: ‘És pagão, mas não crês nos deuses, informando-
-te de nossa religião, no que agiste bem! Aconselho-te crer no Deus Único dos judeus, amá-Lo acima de tudo e ao teu próximo como a ti mesmo; faze-lhe o que razoavelmente possas dele exigir e terás feito tudo. Não necessito de pagamento material!’
Perplexo com a Minha Atitude desinteressada, o hospe- deiro não queria aceitar dinheiro pelo nosso gasto. Nosso ami- go grego, porém, insistiu dizendo: ‘Distribui o supérfluo entre os pobres, que serás agradável ao Deus Único e aos homens!’ Em seguida partimos, e uma hora antes do pôr-do-sol chegávamos ao nosso destino.”
OENSINAMENTONOCUMEDA MONTANHA
(O Senhor): “Tratava-se de um lugarejo antigo, numa con- siderável montanha, de onde se podia ver o mar, em dia claro. Ali estavam as construções bastante avariadas.
Após José ter inspecionado tudo, ele Me disse: ‘Meu filho, se pretendermos demolir e construir tudo isto, de modo natural tere- mos trabalho para um ano!’
Retruquei: ‘Não alimentes preocupações! Dar-se-á o que dis- se! Mas não hoje nem amanhã; depois de amanhã estará tudo pronto.’
Nisto, o grego se manifestou: ‘Era do meu desejo servir-vos uma refeição de peixe, alimento preferido dos judeus. Minha situa- ção é, porém, a mesma do colega lá embaixo, de sorte que só posso oferecer galinha, ovos, ovelha e carne de boi. Depende de vosso gos- to e tudo estará pronto a tempo.’
Disse José: ‘Manda preparar um carneiro, o resto estará de acordo.’
Aduzi: ‘Subamos até o pico para apreciar o panorama, pois poderá surgir qualquer fato digno de meditação e esclarecimento!’ Dito e feito, subimos a montanha até o pico e, como era dia de ve- rão, a visão era maravilhosa!
Todo comovido, José exclamou: ‘A Terra, escola para educação dos filhos de Deus, sendo tão bela, que esperar do Céu após a morte e da ressurreição no Dia Final! Entre essa existência tão parcamente iluminada e aquela gloriosa ressurreição, reside uma noite longa, sem vida e luz. Encaro a situação da seguinte forma: alguém precisando fi- car de vigília durante a noite toda, daria impressão de sem fim! Passan- do-a dormindo, torna-se curta. Assim presumo que, no Dia Final, a noite precedente não dê impressão de tão longa, pois Deus organizou tudo tão bem, de sorte a proporcionar o maior benefício àqueles que cumprem os Seus Mandamentos e confiam Nele!’ O grego concordou com o velho José, entretanto desejou saber qual Minha Opinião.
E Eu expliquei: ‘São palavras belas e sábias, interpretando um bom quadro; seu único defeito é não corresponder à Verdade! Se ora estou convosco, por que não Me perguntais da situação da vida da alma após a morte? Certamente o saberia melhor do que vós! Portanto, desconheço uma noite de morte eterna da alma, pois no momento em que te vires livre da matéria, encontrar-te-ás na ressurreição, vivendo e agindo eternamente, isto é, caso deixares a Terra como homem justo perante Deus.
Morrendo como injusto, seguir-se-á uma noite prolongada entre o desprendimento e a verdadeira ressurreição — somente cons-
ciente à tua alma — apresentando-se como morte real e infinda. Pois uma morte inconsciente para a alma não seria morte. A morte cons- ciente no reino dos espíritos impuros ser-lhe-á sofrimentos e martírios cruéis. Assim andam as coisas! Deste modo orientados, pensai e falai futuramente com maior clareza e realidade; indagai o que desconhe- ceis, para não pronunciardes toda sorte de superstição! Gravai-o bem!’
Disse em seguida o grego: ‘Certamente é como explicaste! Apreciando aqui panorama tão extasiante, percebido apenas pela alma viva e sensível através dos olhos carnais, como se fossem uma janela de sua morada temporal, resta saber se ela, após a morte física, também poderá ver e apreciar o mundo e suas maravilhas!’
Respondi: ‘A alma justa e perfeita não só abarcará esta Terra em todas as suas minúcias, porém infinitamente mais; pois o planeta não é o único no Espaço Infinito, onde existe inúmeros e maiores e, correspondentemente, no Reino dos espíritos puros.
Disto o homem só consegue visão clara quando ouvi-lo no coração de sua alma, transmitido pelo Espírito Divino, passando a uma concepção dilatada.
Em suma, a alma perfeita tudo pode; somente a imperfeita e espiritualmente cega nada mais verá que as aberrações fúteis e iner- tes de sua imaginação tola. Acaso se arrependendo e se regenerando no Além, conseguirá visão mais clara e real — porém num caminho mais longo e difícil. Sabeis o necessário nesse plano; crede que assim é e cumpri os Mandamentos, que aperfeiçoareis a vossa alma!’
Disse o grego: ‘Estou convencido da veracidade; aos gregos falta uma concepção certa e real da constituição da alma. Poderias esclarecer esse ponto?’
Disse Eu: ‘Como não, sendo de vossa utilidade! A alma tem a mesma forma do corpo, apenas mais perfeita. Falo de uma alma perfeita. Possui tudo o que era do corpo, mas subentende-se para fi- nalidades diferentes. Seu corpo não é matéria, mas pura substância.
Tal substância é semelhante à luz solar, aparentemente sem efeito para a matéria, entretanto é seu estofo básico, sem ser a mes- ma coisa; pois todo elemento original é livre e independente.
17. A fim de poderdes ter uma ideia mais concreta, chamo a atenção para a visão de pessoas falecidas, com as quais até mesmo já falastes. Acaso eram diferentes do que em vida?’
Respondeu o grego: ‘Agora reconheço teres falado a pura verdade! Por diversas vezes tive tais aparições e fui até mesmo ins- truído por desencarnados, sempre com o mesmo aspecto humano. Agradeço-te esse esclarecimento.’ José e Jacob Me deram o mesmo testemunho, e o último poderá comprová-lo.
Entrementes, o Sol havia desaparecido, lembrando-nos do bom jantar na casa do grego. Após a refeição nos recolhemos, pois José estava necessitando de descanso.”
AVIAGEMPARA TYRO
(O Senhor): “Antes do surgir do Sol, subimos novamente a montanha; o panorama era mais deslumbrante que ao entardecer; além disto, a Natureza desperta traduzia a alegria de flora e fauna, e assim contemplamos as maravilhas da Criação. Em seguida, José virou-se para o grego, indagando do estoque de madeira para a cons- trução, pois tencionava fazer o plano.
E ele respondeu: ‘Devo ter alguma coisa; verás se é suficiente. Após o desjejum, poderemos averiguar o necessário.’
Disse Eu: ‘Por hoje podeis poupar vosso esforço; pois ama- nhã não necessitaremos nem de material, muito menos de um plano de construção. Podemos ir a Tyro para sondar a existência de algum necessitado.’
O grego concordou e disse: ‘Então, temos que partir, pois até lá leva-se sete horas!’ Assim, tomamos o desjejum e, em seguida, nos encaminhamos àquela cidade, onde chegamos em cinco horas. O grego confessou jamais ter feito o trajeto em tão curto tempo, e dava-lhe a impressão de pequeno milagre.
Entramos num bom albergue, fizemos uma refeição farta e, em seguida, descansamos um pouco. Mais tarde, demos um passeio ao porto de grande movimento. Passado algum tempo, disse José:
‘Como já vimos o mais importante da cidade, podemos encetar o caminho de volta.’
Retruquei: ‘Ó José, há tempo para isso; nossa presença será indispensável aqui. Observai aquele grande navio entregue à incle- mência da tempestade crescente! Nele viaja Cirenius; não podemos deixá-lo perecer! Está de volta da Ásia Menor, mas não consegue aportar. Há tempos nos prestou grandes favores e chegou a nossa vez de ajudá-lo, motivo por que quis estar hoje em Tyro.’
Disse José: ‘Como podemos alcançá-lo com o mar revolto?’
Respondi: ‘Acaso não viste como Minha Vontade alcançou o próprio Sol?! Se fui capaz de mandar no Sol, certamente não Me faltará Poder para com o mar! Poderia ter agido à distância; entre- tanto, foi melhor nos encontrarmos no local — e disto tereis prova posterior. Agora trata-se de socorrê-lo, depois falaremos!’ Em segui- da, estendi Minhas Mãos em direção ao mar e disse em voz alta: ‘Acalma-te, monstro furioso! Eu o quero — e assim será!’
Perfeita calmaria dominou o mar e a nave de Cirenius foi rapidamente trazida à praia por força invisível, salvando-se com seus passageiros. Algumas pessoas assistiram ao milagre e começa- ram a perguntar quem era Eu, para mandar nos elementos. Uns opinavam ser Eu mago; outros, homem muito devoto, estando na Graça dos deuses, que Me atendiam quando lhes fazia pedidos. Ainda outros observavam ser Eu profeta dos judeus ou dos essê- nios. Deu-se um debate agitado na praça, entretanto nenhum se atreveu a perguntar-Me diretamente. Entrementes, o navio estava sendo atracado e o povo acorreu para saudar o Prefeito. Nós ficamos observando.”
ENCONTROCOM CIRENIUS
(O Senhor): “Descendo à praia, Cirenius dirigiu-se aos repre- sentantes da cidade, dizendo: ‘Agradeço vossa amizade; quanto ao desastre do qual escapei, não deixa de ser estranho como a tempesta- de se acalmou tão repentinamente. Recordou-nos um fato idêntico
em Ostrazina. Havia uma criança milagrosa de um casal judeu que lá se refugiara. Aquele menino abafou igualmente um temporal, mas também podia provocar tal fenômeno. Deve fazer uns vinte anos; desde então, tudo fiz para descobrir tal família, mas sem êxito.
É realmente curioso! Essas tempestades costumam durar vá- rios dias até que o mar se acalme, permitindo então a saída do navio; e vede — ele está sereno como um espelho! Também me surpreen- deu como o navio se dirigia velozmente para a praia! Parece milagre!’
Disse um nobre cidadão: ‘Observa aqueles homens na praça. Um deles estendeu as mãos mandando a tempestade serenar e ela obedeceu. Julgamos ser profeta dos judeus, em virtude de sua veste judaica. Valia a pena sondar-se quem é!’
Disse Cirenius: ‘Tenho uma ideia! É bem possível tratar-se da mesma pessoa! Tenho que falar-lhe!’ Incontinenti, ele se dirigiu à praça onde observávamos o mar e seus variados espécimens de pei- xes que, através de Minha Vontade, aí se apresentavam.
Lembrando-se de José, Cirenius lhe disse: ‘Amigo, acaso não és aquele judeu que há mais ou menos vinte anos refugiou-se em Ostrazina por nosso intermédio? Se o fores, dize-me o que aconte- ceu ao menino prodígio, para mim verdadeiro Deus!’
Curvando-se com respeito, José respondeu: ‘Nobre senhor, constitui grande honra tua recordação de minha família. Aproveito a oportunidade para agradecer pelo Bem que nos fizeste naquele tempo, confirmando ser esse jovem a criança mencionada!’
Radiante de alegria, Cirenius abraça José e, em seguida, se vira para Mim: ‘Senhor, permites a um grande pecador beijar-Te e abraçar-Te?’
Disse Eu: ‘Felizes sois vós, pagãos, por Me terdes reconheci- do em vossos pecados, antes que os judeus em seu conhecimento! Por isto, a Luz da Vida ser-lhes-á tirada e passada para vós! Vem e beija-Me! Alguém Me procurando com amor, ainda que tivesse tantos pecados em sua alma como existe erva sobre a Terra e areia no mar, Eu não o expulsarei, mas o aceitarei qual Pai aceita o seu filho perdido, de volta à casa paterna!’
Chorando de emoção, Cirenius Me abraçou e beijou com enternecimento; em seguida, Me agradeceu o milagroso socorro e nos convidou para a sua residência, pois desejava saber o que ocor- rera em todo esse tempo.
Respondi-lhe: ‘Bom Cirenius, aceitamos teu convite para esta noite; amanhã cedo temos que estar na casa deste grego, a sete horas de distância, onde devemos fazer uma grande construção.’
Disse o Prefeito: ‘Muito bem, meu amigo divino; eu vos acompanharei para gozar de vossa companhia!’ Acrescentei: ‘Está combinado. Desejamos apenas permanecer aqui mais algum tempo, pois quero demonstrar ao Meu irmão Jacob e ao grego Anastokles os diversos espécimens do mar, e isto levará algumas horas.’
Disse Cirenius: ‘Ó Senhor, queria tomar parte e chamar aquelas pessoas que me esperam no porto!’
Respondi: ‘Deixa-as vir aqui, é o melhor local para tanto!’ O grupo, cerca de setenta pessoas, se postou à borda da sacada ro- chosa e dentro em pouco começou a se extasiar com o surgimento de raros animais marinhos.
Cirenius exclamou: ‘Oh, fantasia infinita de um Deus Ver- dadeiro! Plenitude de Pensamentos de Deus incorporados! Que colossos de monstros marinhos surgem atraídos pelo Poder Cria- dor! Há mais de uma hora dura o espetáculo e não se prevê o fim! Nós nem os conhecemos de nome, por Ti certamente pronuncia- do, obedecendo à Tua Chamada! Vede, vede, o que jamais foi visto por mortal!’
Nisto, um cidadão de Tyro perguntou a Cirenius se era Eu o Causador desse fenômeno. E o Prefeito respondeu: ‘Claro! Quem mais?’ Disse o outro: ‘Neste caso é ele um deus e merece veneração divina por parte de nossos sacerdotes.’
Disse Cirenius: ‘Deixa disso. Conheço-O de há muito e sei o que quer e o que Lhe agrada! A presença de um sacerdote O afastaria.’
Nisto, começaram a passar em fila diversas espécies de crus- táceos e Cirenius expressou o desejo de guardar algumas conchas para recordação desse dia milagroso.
Disse-lhe Eu: ‘Manda descer um empregado num bote, que Eu lhe apontarei quais as peças já maduras, que podem ser tiradas!’ Assim aconteceu. Em poucos instantes, três barcos passaram pela ro- cha, e os hábeis pescadores recolheram as peças por Mim apontadas, enchendo as embarcações.
Em seguida, disse a Cirenius: ‘Manda-as colocar durante a noite em água de cal e, amanhã, devem ser tiradas com cuidado, limpas do conteúdo. Depois devem ser enxutas e untadas interna- mente com óleo. Assim poderão ser anexadas à tua câmara de joias!’ Deste modo, Cirenius conseguiu um tesouro no valor de várias mil libras. Passadas duas horas, terminou a cena e deixamos o local.”
NOPALÁCIODE CIRENIUS
(O Senhor): “Anastokles, o grego, se desculpou por não nos acompanhar, porquanto tinha afazeres na tavolagem. Eu, porém, lhe disse: ‘Deixa a hospedaria, que saberá resolver seus problemas; o que receberás conosco te será mais útil, e tua casa — já que sabes Quem sou — estará pronta antes de voltarmos aqui.
A transformação se dará durante a noite, sem que o teu pes- soal o perceba! De manhã, arregalarão os olhos quando se encon- trarem diante de uma casa nova, idêntica à antiga, apenas maior e mais confortável — o que sucederá também ao curral. Podes estar despreocupado e acompanhar-nos à casa de Cirenius, onde todos passaremos bem.’ Exclamou Anastokles: ‘Com muita alegria aceito o convite! Talvez se lembre também de mim, de Ostrazina!’ Disse Eu: ‘Deixa isso por Minha conta; posso tudo que quero!’
Assim, seguimos para o suntuoso palácio do Prefeito, onde moravam igualmente seus conselheiros, ministros e marechais. Diante de tamanha riqueza e luxo, Anastokles se virou para Mim: ‘Mestre, pleno do Poder Divino, é incrível o acúmulo de tesouros de um, quando milhares passam privações!’
Eu respondi: ‘Assim é melhor; pois se todos tivessem riquezas tais, elas não teriam valor, os homens perderiam em breve o estímulo
ao trabalho e, no final, passariam a viver como animais. Somente fome e sede os levariam à ação; todo o resto perderia atração e zelo. Se riquezas tão fabulosas estivessem em mãos de pessoas não escla- recidas, pouco valor teriam por sua raridade, de sorte a obrigarem as massas a trabalhar com maior dedicação, na esperança de poderem ganhar alguma ninharia daqueles tesouros. E isso é muito benéfico!
Vês um acúmulo de ouro, prata e enorme quantidade de pe- dras preciosas; se o Prefeito te desse apenas uma pérola, a fim de lhe prestares um serviço, empregarias o maior esforço. Se possuísses grande quantidade, por certo não te cansarias, dizendo: Por uma pérola, trabalhe quem quiser! Tenho bastante e passo muito bem! — Por aí vês ser muito bom à Humanidade se tais riquezas e fortunas se achem em mãos de poucos. Compreendeste?!’
Disse o grego: ‘Quem não haveria de compreendê-lo se Tu dás a explicação?! Cirenius é regente severo, mas justo e bom, e se dedica aos pobres, muito embora analise se todos realmente são ne- cessitados ou apenas preguiçosos e não apreciam o trabalho.’
Enquanto Me entretive com o grego, Cirenius e José palestra- vam a Meu respeito e o que fizera até então; Jacob e José faziam uma súmula de tudo, para sua grande alegria. Assim se passaram duas ho- ras, e a maioria dos dignitários participava com grande admiração.”
A VERDADEIRA VENERAÇÃO DE DEUS.JESUS,EXEMPLODOS HOMENS
(O Senhor): “No fim do relato, um conselheiro de Cirenius disse: ‘Se isso tudo se confirma nesse homem, é ele evidentemente um deus; pois nunca uma criatura humana fez tais coisas pela sim- ples vontade. Já vimos muitos magos agirem fantasticamente, mas em breve sabia-se de seus segredos. No Egito setentrional, existem criaturas capazes de domar feras pela vontade e pelo olhar.
Isso nada representa diante do Poder desse homem. Ele ape- nas quer, e os elementos se submetem à sua vontade. Ordena aos animais marinhos qual general aos exércitos, e eles obedecem. Não
necessito de outras provas para confirmação de sua natureza divina. Por isto, deveríamos dar-lhe as honras correspondentes!’
Virei-Me para o conselheiro: ‘De que maneira iríeis agir para tanto?!’
Respondeu ele: ‘Ora, como veneramos o deus Júpiter, ou como vossos sacerdotes a Jehovah, Imenso e sem forma.’
Retruquei: Amigo, nenhuma das duas Me serviria, porquan- to não representam uma veneração real e justa! A verdadeira e válida para Deus consiste, primeiro, na fé inabalável em Deus Verdadeiro, Criador de Céus e Terra; segundo, no amor para com Ele e na apli- cação de Sua Vontade; terceiro, amando-se ao próximo como a si mesmo. Nisto se baseia a verdadeira veneração a Deus; todo o resto é fútil e sem valor para Ele!
Só o que é feito por amor é algo real diante de Deus; o que se faz por um certo temor do Poder de Deus, para levá-Lo à brandura e mansuetude, é um horror para Ele. Sempre houve sacerdotes des- tinados a efetuarem o ofício religioso por toda sorte de cerimônias. Tais homens se achavam muito mais dignos que qualquer outro, deixando-se honrar cheios de orgulho e finalmente se considera- vam deuses a condenarem seus semelhantes muitas vezes de índole melhor que eles mesmos. Achas possível Deus Se alegrar com tais venerações pomposas e luxuosas, efetuadas pelos sacerdotes e pagas pelo povo?
Afirmo-te: se isto Lhe causasse satisfação em Sua máxima Sa- bedoria — não seria Deus, mas, qual sacerdote, um homem igno- rante, tolo e cheio de orgulho e tendência dominadora. Como é pos- sível alguém atribuir isso ao Deus Verdadeiro, que criou tudo através de Seu Amor, Sabedoria e Onipotência Divinas, conservando a Sua Criação para toda a Eternidade?! Onde estaria a criatura capaz de se revoltar e desafiar a Deus para uma contenda?! Tudo que existe no Espaço Infinito são Pensamentos e Vontade de Deus! Se Ele não quisesse tolerar a existência desta Terra, caso O desafiasse, bastaria a simples Vontade Dele! Por isto, Deus não necessita de outra ve- neração das criaturas, as quais deseja educar para verdadeiros filhos,
senão que O amem como Pai Verdadeiro e Santo e façam tudo por amor, de acordo com o que Sua Vontade lhes transmite.
Por isto digo a todos: o que para o mundo é importante, para Deus é um horror! Realmente grande é uma criatura humilde que O ame acima de tudo, ao próximo como a si mesma e não se eleve qual senhor, mas apenas seja amiga benévola.
Vede o Meu Exemplo! Por certo Sou Único no mundo! No Meu Poder e Força repousam Céus e Terra; todavia, sou de todo Cora- ção Meigo e Humilde, e vim para servir a todos, importantes e simples. Fazei o mesmo, que tereis prestado a maior honra a Mim Mesmo!”
OLIVRE ARBÍTRIO
(O Senhor): “Todos se admiraram de Minha Sabedoria, e o próprio Cirenius disse: ‘Essas não foram palavras humanas, mas divinas; pois cada uma reflete a Verdade mais luminosa, inatingível ao intelecto mais aguçado.
Vejamos nossos deuses e sacerdotes! Quanta tolice maldosa! Mas aqui esplandece o mais radioso Sol! Por isto, digo: Senhor, aju- da-nos em nossa grande miséria espiritual!
Existem muitos materialmente necessitados, aos quais pode- mos socorrer com boa vontade; nossa deficiência espiritual é muito pior que a física, porque nenhum está em condições de ajudar o semelhante. Não se pode dar o que não se possui. Tu és riquíssimo em Espírito e podes suprir-nos de Teu Supérfluo.
Antes de tudo, deixa penetrar a Verdade Plena nos corações humanos e nos demonstra como nos livrarmos da pior praga psí- quica! Tal praga consiste no paganismo e sacerdócio. Esses traido- res privilegiados são peritos na magia e feitiço, ou, dizendo melhor, usam toda sorte de artes mistificadoras, com as quais cegam a massa ignorante, exercendo pleno domínio sobre ela, dificultando o escla- recimento do povo. Pois, se o próprio Imperador quisesse construir melhores escolas, em breve os perversos sacerdotes haveriam de ins- tigar o povo contra ele, que estaria perdido, incluindo o exército.
Por isto, os romanos e gregos mais esclarecidos sofrem grande calamidade, impossível de ser resolvida com todos os te- souros do mundo. Dá-nos um meio adequado para fazer-se Luz para milhares!’
Disse Eu: És bem intencionado, e teu desejo se cumprirá! Todavia, o auxílio espiritual não será tão repentino como o domínio da tempestade, na qual enfrentei apenas elementos e forças ainda longe de possuírem livre vontade, portanto tinham de Me obedecer.
Toda criatura tem vontade perfeitamente livre, com a qual pode fazer o que lhe aprouver, sendo sua obediência condicionada. Deus Mesmo não pode coagi-la através da Onipotência, mas levá-la a tais situações, pelas quais pode chegar ao conhecimento mais puro pela própria experiência, guiando sua vontade através do raciocínio.
Caso Deus conduzisse a vontade do homem pelo Poder de Sua Sabedoria, ele nada mais seria que animal; e seria até mesmo inferior a este, porquanto ao irracional é dada pequena liberdade, a ponto de ter compreensão e memória; sente fome, sede e dor, po- dendo, embora um tanto obtuso, pensar, julgar e manifestar suas necessidades pela voz, expressão e movimentos.
Um homem cuja vontade dependesse puramente da Onipo- tência de Deus seria quase qual árvore que crescesse e existisse como Deus o quis. Daí concluirás ser algo diverso a justa educação do homem e o súbito aplacar da fúria marítima. Se fosse possível educar os homens dessa forma, seria tolice de Minha parte doutrinar-vos na Sabedoria e Verdade, pois poderia depositar os pensamentos mais lúcidos em vossa alma e obrigar vossa vontade, pelo Meu Poder, a agir como quero. Acaso alguém levaria benefício Eu o tornando simples máquina de Minha Vontade Poderosa?!
Vossos sacerdotes maus e egoístas têm livre arbítrio e podem fazer o que quiserem, tanto mais quanto vossas leis não lhes impõem repressão e vós os aproveitais para o povo.
Quem quiser livrar-se de seu jugo, procure a Verdade e se ampare nela; pois cada um pode libertar-se apenas pela Verdade des- coberta dentro de si, do jugo da treva, fonte de superstição.
Se o entendestes, agi de acordo, que os sacerdotes não vos prejudicarão e eles mesmos se extinguirão, caso não mais encontrem eco no vosso campo da Verdade luminosa.”
EDUCAÇÃODA HUMANIDADE
(O Senhor): “Prosseguiu o conselheiro: ‘Como podia pre- judicar aos sumos sacerdotes a obrigação provinda do Poder e da Sabedoria de teu Deus em apostatarem o paganismo, para ensinar ao povo a Verdade?! Tão logo fossem livres da Onipotência Divina e voltassem ao politeísmo, a massa esclarecida os admoestaria de tal forma a impossibilitar qualquer erro! Tenho razão?!’
Disse Eu: ‘Se isto fosse viável e benéfico aos homens, Deus não precisaria de sacerdotes, podendo fazer com que falassem árvo- res e pedras com efeito muito mais incisivo. De qualquer maneira, não teria utilidade para o livre arbítrio e apenas prejudicaria a for- mação da vida interna da alma, pois se todos os sacerdotes começas- sem a pregar contra o paganismo ao povo supersticioso e preso aos falsos conceitos, este os consideraria inimigos dos deuses, acabando por matá-los. Se árvores e pedras ensinassem a multidão, ela seria coagida no conhecimento e na vontade, com a mesma reação acima.
Quem teria lucrado com isto? O povo, certo que não; pois en- contrar-se-ia numa fé, conhecimento e vontade forçados, dos quais a alma se libertaria tão pouco quanto pela antiga superstição, que entre muitos já se tornou bastante frágil, através de estudos e pesquisas.
Uma crença outorgada através de milagres de nada adianta, porque seria idêntica à antiga superstição. Poderias, por acaso, pro- var seres realmente sábio pelo fato de responderes às tuas próprias perguntas?!
Que dirias se, por exemplo, Eu fizesse perguntas às colunas deste palácio, de teor mais profundo, e elas Me respondessem tão sa- biamente que nenhum homem ou anjo no Céu pudesse concorrer?’
Respondeu o conselheiro: ‘Seria evidentemente milagroso; as colunas, finalmente, dariam apenas informações surgidas de tua
vontade e conhecimento, e tal seria idêntico a tu fazeres as perguntas e respostas!’
Respondi: ‘Exatamente! O mesmo se daria com o homem ao qual Deus incutisse a Ordem Vital, determinada desde eternidades, pelo Poder de Sua Onipotência! Em tal caso, seria Deus a querer e agir na criatura. Mas, o que seria da emancipação dela?
Deus não criou os homens para bonecos, mas para imagens semelhantes a Ele; projetou-os não como criaturas provindas de Seu Espírito, e sim para filhos verdadeiros de Seu Eterno Amor Paternal e dotados da mesma capacidade criadora, podendo desenvolver-se inteiramente livres, pela vontade independente, até a completa Se- melhança Divina. Eis o motivo pelo qual não é possível embaraçar o livre arbítrio através de um imperativo divino, seja qual for, e sim é necessário deixar-lhe a ação livre, nas piores circunstâncias, ainda que isto Me custasse a vida na cruz!
Tal é o Amor da Sabedoria Divina para com os homens por Ela postos no mundo, para experiência do livre arbítrio! Compreen- dei-o bem e não façais perguntas inúteis; pois Deus criou a Ordem Eterna respeitada para sempre! Mudemos de assunto!’
Retrucou Cirenius: ‘Senhor e Mestre de todas as coisas — não estarás aborrecido? Nossa compreensão é ainda fraca e Te pedi- mos paciência.’
Interveio José: ‘Esta não dura muito com ele! É aconselhá- vel deixá-lo em paz, pois já falou bastante. Até eu, como pai, nada consigo em tais momentos!’
Disse Cirenius a José: ‘Acaso Ele nunca Se contradisse?’
Respondeu José: ‘Jamais! Posso provar que tudo o que pro- feriu é como se fora dito desde Eternidades, até mesmo em se tra- tando de coisas banais.’
Disse Cirenius: Então é melhor fazermos o que deseja; pois Seu Interior é pleno do Espírito de Deus, acontecendo o que quiser. Já me convenci, há vinte anos, não ser possível questionar-se com Ele. Resta saber qual o tema a abordar, porquanto Ele é o Persona- gem mais estranho desta época, do passado e do futuro.”
(O Senhor): “Disse José: ‘Sei de um assunto de grande atração para ele! Que ideia tendes da criação do primitivo casal nesta Terra?’
Respondeu o conselheiro: ‘Amigo, quanto a isso, não existe no mundo assunto mais misterioso! Impossível afirmar-se algo po- sitivo, e quanto mais se pesquisa nos povos desta Terra, tanto maior é o labirinto de incertezas. Melhor situação desfruta quem se atirou nos braços de um mito popular qualquer. Não se podendo chegar à Verdade, aconselhável se torna procurar uma fértil fantasia, portado- ra de alegria maior do que a constante dúvida.
Persas, hindus, judeus, skythos, romanos e gregos, egípcios e germanos, todos sustentam suas próprias fábulas. Não adianta per- der tempo com elas, pois não trariam esclarecimento preciso. Por isso, sugiro deixarmos de lado tal assunto, tão infrutífero quanto a natureza dos astros.
Admito a seguinte hipótese: havendo, após a morte, uma vida mais real e perfeita, ela nos facultará a concepção de verdades mais profundas. É difícil provar-se a sobrevivência da alma, entretanto é mais fácil do que a probabilidade de ter surgido um ou vários casais nesta Terra. Só Deus pode sabê-lo; pois o conhecimento humano deriva justamente de suas experiências. Por isto, não me preocupo com tais problemas!
Se nossa finalidade se concretiza na Filiação Divina, só pode ela ser alcançada pela minoria! Por quê? Qual o motivo de mor- rer quase um terço da Humanidade antes de chegar à maturidade? Como poderia ter conhecimento de sua meta final e elevar-se à Se- melhança Divina pelo justo emprego de livre arbítrio?
Por isto afirmo: mil vezes mais feliz é o tolo ignorante, do que o maior sábio, e faremos bem procurando outro assunto, pois quanto mais o homem adquire conhecimentos, tanto mais se aper- cebe de sua ignorância.’
Retrucou Cirenius: ‘Sim, tens razão no que diz respeito à interpretação intelectual; mas...’
Interrompeu o conselheiro: Não há outro recurso! Acaso existe intelecto diferente do racional? Ele sendo limitado — onde buscarmos um sobrenatural? O homem é o indivíduo mais próxi- mo, entretanto não se conhece a si mesmo; como poderia perceber algo mais superior? A natureza humana é inteiramente corrupta e imprestável, e o homem é quase condenado a sentir sua imperfeição, tornando-se infeliz. Nunca vi um sábio realmente feliz e seu maior amigo é a morte. Capricho estranho de um Deus poderoso e sábio: criar e destruir!”
AINTENÇÃODEDEUSPARACOMOS HOMENS
(O Senhor): “Aparteei: ‘Amigo, estás algo agitado porque vos disse a Verdade quanto ao destino do homem; mas, não importa! Vi tais dúvidas no teu íntimo e quis tua confissão; por isto José teve que abordar um tema que soltasse a tua língua. Falaste bem, expondo tua crítica da natureza humana. Chegou a Minha Vez de dizer-te coisa bem diversa de tua interpretação.
Se Deus tivesse criado os homens somente para esta Terra, seria realmente capricho singular de Sua parte criar e destruir cons- tantemente. A existência se prendendo a uma vida superior e eterna, e Deus deixando as criaturas na Terra até que tenham atingido a indispensável experiência do livre arbítrio na passagem terrestre, tal Pendor verdadeiro e vivo de Deus as conserva no mundo do sofri- mento o tempo indispensável. Deixando o planeta, o homem é leva- do a escolas apropriadas à perfeição máxima e sublime. Então rece- berá esclarecimento real acerca da criação do primeiro casal da Terra.
Alguns chegarão à perfeição em vida, não por causa dos se- melhantes, mas somente pelo caminho da verdadeira veneração a Deus há pouco demonstrada. A fim de tirar-te a dúvida da imorta- lidade da alma, abrirei a tua visão psíquica e poderás transmitir tua percepção. Fá-lo-ei somente tu o querendo.’
Respondeu o conselheiro: ‘Peço que o faças.’ Nisto, José Me chamou de lado, dizendo em surdina: ‘Filho do Altíssimo, não te
excedas com os dignitários romanos; tenho a impressão de não sabe- rem interpretar o teu assunto!’
Redargui: ‘Não te preocupes! A aparição que farei surgir modificará sua índole!’ Em seguida, proporcionei ao conselheiro a dupla visão através da Minha Onipotência silenciosa, e no mesmo instante ele se viu rodeado de seus parentes, amigos e conhecidos, e no final surgiu o próprio Julius Cesar, levando o conselheiro a per- guntar, aflito, se tal era realidade ou ficção.
Respondi: Dirige-te a eles, que te responderão; pois uma fic- ção não pode falar!”
RELATODOS ESPÍRITOS
(O Senhor): “Em seguida, o romano perguntou aos espíritos se eram realidade ou ilusão, e eles responderam: ‘Somos reais, e se não fores capaz de compreendê-lo, enganas a ti mesmo!’
Retrucou o conselheiro: ‘Por que só agora me aparecestes, se tantas vezes manifestei a minha saudade de rever-vos?’
Disseram eles: ‘Poderias ver-nos e falar-nos, não fosse tua alma tão ofuscada pelas sensações do mundo!
Os primitivos habitantes desta Terra possuíam tal dom; quando seus descendentes se enterraram na matéria, perderam essa capacidade de intercâmbio com almas desencarnadas. Com isso, lhes adveio a noite da dúvida, na qual perderam inclusive a fé na sobrevivência da alma, o que muito os martirizava.
Tal estado cheio de dúvidas dos homens materialistas é ver- dadeiro castigo para sua corrupção moral, pois, sem ele, se afunda- riam cada vez mais no julgamento da matéria; assim, são mantidos diante do pavor da morte, pela incerteza de existência posterior.
Nós também sofremos o mesmo castigo provindo das dúvi- das, e somente a definitiva separação do corpo nos trouxe a certeza da imortalidade. No Além, só é feliz quem viveu com justiça e fez obras de caridade; os injustos, caluniadores, inclementes e egoístas sofrem mil vezes mais que os encarcerados na Terra.
Não deixas de ser homem justo, mas és duro e intransigente. Quando aqui chegares com tuas inclinações, encontrarás a justiça inclemente e dura, sem amor e misericórdia. A alma aqui só encon- tra o que trouxe com sua índole, como base de sua existência. Com- preende-me bem e procura modificar-te, pois tens oportunidades melhores do que nós!’
Respondeu o conselheiro: ‘Agora acredito em vossa realidade! Dizei-me quem é o jovem judeu que opera coisas tão milagrosas!’
Disseram eles: ‘Ele é Quem é, Quem foi e será eternamente! Sua Vontade nos impede de maiores esclarecimentos. Ele está con- vosco e podeis Lhe perguntar!’
Virou-se o conselheiro para Julius Cesar: ‘Foste na Terra um herói, prudente e poderoso, e todos tinham de obedecer-te. Como passas no mundo dos espíritos?’
Respondeu Julius Cesar: Ainda no mundo colhi o prêmio por aquilo que fiz para a minha glória; por isso, pouco trouxe de bom; o resultado foi grande penúria e minha glória se assemelhava à noite trevosa, na qual só vislumbrava algumas estrelinhas penetran- do nas nuvens densas e negras.
Por muito tempo fiquei sozinho; chamei, pedi, chorei e procurei — ninguém aparecia. Clamei pelos deuses; não houve res- posta. Após prolongado estado de miséria e desespero, me lembrei do Deus dos judeus. Imediatamente o ambiente se tornou mais cla- ro, inclusive as estrelinhas, que pareciam aproximar-se. Quando o percebi, minha confiança aumentou para com o Deus judaico e Lhe pedi que me socorresse na minha grande penúria e aflição.
A claridade intensificou-se, uma estrela desceu junto a mim e reconheci uma figura humana, um homem, ao qual havia prestado verdadeira caridade. Disse-me: Feliz és tu, por teres encontrado o Verdadeiro Deus dos judeus, em tua noite trevosa. Deves abolir teus ídolos, inclusive o maior: tua própria glória de César; sê inteiramen- te humilde, que te levarei ao meu lar!
Então pedi ao Deus judaico tirasse-me glória e ídolos. Em seguida, as outras estrelinhas se aproximaram como criaturas e dis-
seram: Fomos pobres judeus perseguidos pelos teus sacerdotes; tu nos protegeste, fizeste-nos presentes e nos ajudaste a voltar à pátria. Agora tu és pobre e de teus tesouros terrenos nada te resta senão o que fizeste por nós; com a Permissão Divina, vimos para pagar-te o Bem. Desejando-nos acompanhar sem glória, encontrarás abri- go conosco!
Resolvi segui-los e, pouco mais tarde, chegávamos a um imenso Vale com belíssimo lago. À longa distância, era cercado de montanhas maravilhosas. Na parte anterior, estavam algumas casi- nhas de pescadores. Os campos transbordavam de um verde viçoso. Árvores escassas estavam repletas de frutos.
Entrei na primeira casa, à direita, onde morava o primeiro amigo que me socorreu; deu-me alimentação simples, porém muito mais saborosa do que qualquer ágape terreno.
Mais tarde saímos e percebemos um bote no lago sereno, e um homem remava em nossa direção. Perguntei quem era, e meu amigo respondeu: De quando em quando ele vem aqui e nos ensina o que fazer para o nosso progresso. Trabalhamos com grande alegria e dedicação, recebendo a Bênção do Deus Verdadeiro. Quando aqui vimos, há tempos, essa zona era estéril e vazia; somente pelo árduo trabalho chegou a essa beleza atual. Certamente hás de querer o mesmo, para usufruíres Graça semelhante!”
AVIDADEJULIUSCESARNO ALÉM
(Julius Cesar): “‘Sumamente feliz, dirigi-me à margem com o amigo. O barqueiro soltou o bote e disse: Na outra margem do lago, à direita, existe um terrível brejo cheio de animais infectos a empestarem o ar dessa zona. Secai tal brejo, enchendo-o de boa terra e tereis melhorado o terreno, conquistando mais um pedaço fértil.
Eu e meu amigo agradecemos pelo conselho e nos prontificamos ao trabalho, enquanto o barqueiro partia.
Na casa estavam ferramentas próprias e com grande alegria nos dirigimos ao local. Seu aspecto nos atemorizou, pois havia toda
sorte de aracnídeos e répteis em tamanha quantidade, que disse ao amigo: Até sanearmos esse brejo, passarão, no mínimo, cem anos!
Ele respondeu: Que nos importam cálculos terrenos? Aqui não existe tal contagem de tempo, pois perdura o mesmo dia eterno, e o tempo depende de nossa vontade. Esse brejo é apenas a apresen- tação necessária de tua impureza no coração, cabendo-te livrar-te da mesma pela vontade firme e a paciência que desconhecias na Terra. Ajudar-te-ei e, em pouco tempo, o brejo repugnante se terá trans- formado em solo fértil.
Assim orientado, enchi-me de vontade e comecei a trabalhar com paciência. No começo parecia que o brejo jamais se encheria; pouco a pouco vimos não ter sido infrutífero o esforço, pois os rép- teis iam sendo soterrados para sempre. Conquistamos terreno novo e bom, onde construímos outra casinha para forasteiros que rece- biam a mesma acolhida que eu.
Desde então, o barqueiro nos procurou por várias vezes, dan- do-nos novas tarefas, com as quais transformamos tudo em verda- deiro Éden. Ainda me encontro lá e não peço coisa melhor e mais bela. Renuncia a tudo que tem valor neste mundo, pois no Além só valem as boas obras!’
Perplexo, o conselheiro perguntou ao espírito de Julius Cesar: ‘Onde se acha essa zona por ti tão claramente descrita?’
Respondeu ele: ‘Em parte alguma da Terra, todavia pode es- tar em toda parte, porque, onde estivermos, ela aí estará. Aprendi paulatinamente que a zona e tudo que neste mundo me rodeia como matéria aparentemente inerte surgiu de mim, quer dizer, sou o cria- dor do mundo em que vivo. Eu e meus amigos, da mesma vontade e índole, habitamos a mesma paisagem; entretanto, podem, ao mes- mo tempo, nele habitar inúmeros espíritos, cada qual numa zona di- ferente. Eis a grande diversidade entre espíritos e criaturas terrenas.’
Opôs o conselheiro: ‘Não entendo bem! Como podem, num determinado lugar, existir várias zonas e paisagens?’
Respondeu Julius Cesar: ‘É mui fácil e até mesmo natural. Suponhamos um grupo de cem pessoas do mundo, num só recinto
e todas sonham! Uma se vê em Roma, outra em Athenas, outra em Jerusalém etc., e isso tão nitidamente que podem relatar todas as minúcias. Como é possível estarem cem pessoas num recinto e cada uma em outro plano? E o que sucede se, num campo, se acham mil e cada uma vê algo diferente?
Eis a realidade em nossa esfera. A diferença entre ela e a vossa consiste no seguinte: nós, espíritos, habitamos em nosso pró- prio mundo; vós, no mundo de Deus. Pois o nosso é obra de nossos pensamentos, ideias, desejos e vontade; este é Obra do Amor, dos Pensamentos, das Ideias e da Vontade de Deus.
Por este motivo é o homem a Imagem de Deus, possui ca- pacidade criadora, podendo criar seu mundo espiritual e habitá-lo como proprietário. Certamente me compreendeste?’
Opinou o conselheiro: ‘Nesse caso, são as criaturas a te ro- dearem obra e posse tuas, no mundo surgido de ti qual sonho.’
Respondeu Julius Cesar: Em parte; todavia, não poderia fazer com que surgissem, muito menos, ver, ouvir e falar-lhes. Há grande semelhança com a visão, audição e sentir do próximo. Pois tu não vês o homem real, mas apenas sua imagem dentro de ti; consegues senti-lo somente pelo próprio sentir, e ouves o som de sua palestra em teu ouvido constituído de forma a imitar os sons trazidos pelo ar. Fosses tu cego, surdo e insensível, e não haveria pró- ximo para ti, conquanto se achasse a teu lado. Dotado dos sentidos e ainda que imaginando inúmeras criaturas, nada verás, ouvirás ou sentirás, caso não estejam presentes.
De modo idêntico, o espírito, no Além, com o qual desejas lidar, tem de existir — ao menos em sua vontade, amor e percepção. Sem isso estarás só, ou as criaturas que visses momentaneamente seriam apenas projeção de tua fantasia, sem realidade; portanto, não poderiam entrar em contato contigo.
A diferença infinita entre Deus e os homens semelhantes a Ele se baseia em poder somente Deus criar seres perfeitos, inde- pendentes e livres, enquanto nós apenas podemos imaginar fantas- mas. Por isso, o mundo habitado por um espírito é mais fantasia
que realidade; pois espíritos mais perfeitos me demonstraram o seu mundo no mesmo local que o meu, no entanto tinha outro aspecto. Compreenderás isto inteiramente quando fores igualmente habitan- te do teu mundo interior. Disse-te o suficiente a respeito da vida do além-túmulo; não insistas em indagações!”
FÉEVISÃO ESPIRITUAL
(O Senhor): “Neste momento, cerrei a visão interna do con- selheiro que, assustado, perguntou onde tinham ido os espíritos, pois não os via mais.
Respondi: ‘Ainda estão aí, somente não os podes ver, ouvir nem falar, por estar tua alma mui presa à matéria e longe do Espírito de Deus. Esforçando-te na união com o teu próprio espírito, pode- rás ver a todos que te rodeiam. Compreendeste?’
Disse o romano: ‘Sim, mas tenho a mesma sensação de um bêbedo: ora está mui lúcido, ora abruptamente tolo, e levarei anos para chegar a alguma clareza!’
Disse Eu: ‘Quem procurar zelosamente achará o que dese- ja. Pode o homem entregar-se à destruição do corpo e, muito mais ainda, da alma; de modo inverso, porém, pode dedicar-se ao eterno progresso da alma.
Correndo tanto risco em benefício do corpo sujeito à morte
— por que não o faz para a alma destinada à Vida eterna?! Sê tu, portanto, mais ativo em prol de tua alma que para o corpo, e recebe- rás mais luz no teu coração!’ Satisfeitos com Minhas Palavras, todos Me agradeceram.
Cirenius se virou para Mim: ‘Senhor, por que não pudemos ver e falar aos espíritos há pouco vistos pelo meu conselheiro?’
Respondi: ‘Entre vós não há tanta incredulidade quanto nele, necessitando de prova flagrante. Agora ele acredita, por ter visto o motivo de suas dúvidas; todavia, não lhe serve de mérito, porque não se verá obrigado à procura de provas da imortalida- de da alma.
Quem não teve a visão do conselheiro, crê o que digo, e a fé é mais benéfica à alma que a visão, porquanto se pode manter mais livremente. Conheço tua fé e sabes serem as Obras feitas por Mim testemunho integral da veracidade de Minhas Palavras; assim, seria inútil demonstrar-te desencarnados para confirmarem o que digo.
Quando, pelo próprio esforço, alcançares a fé viva, chegarás à visão independente e não proporcionada. Eis o motivo por que vós todos não vistes o que o amigo presenciou.’
Assim orientados, os presentes Me agradeceram pela expli- cação e se alegraram por não participarem da aparição.
Entrementes, se fizera noite, e Cirenius convidou todos à ceia. Alguns altos funcionários se desculparam, alegando estarem as famílias à espera. Então lhes disse: ‘Aceitai o convite do Prefeito! Vossos familiares já estão informados de vossa presença aqui.’ Retru- cou um deles: ‘Quem teria prestado informação?’
Disse Eu: ‘O Mesmo que serenou a tempestade. Ficai e cre- de que assim seja.’ Fomos, portanto, todos à sala de refeição. Havia uma mesa especial, onde se viam pratos judaicos e vinho excelen- te para Mim, José, Jacob e o grego Anastokles. Admirado com a especial deferência, José disse a Cirenius: ‘Nobre amigo, para que tanta gentileza? Teríamos ficado igualmente satisfeitos com os pra- tos romanos.’
Amavelmente, ele respondeu: Lembro-me de ti em Ostrazina e sei que és fiel cumpridor das Leis mosaicas; foi, portan- to, apenas meu dever receber-vos desse modo, para evitar constran- gimentos. Os romanos se servem, na maioria, de carne não aceita por vós, especialmente à noite.”
ADAMEEVA.OSPRÉ- ADAMITAS
(O Senhor): “Durante a ceia bastante animada, o conselheiro volta a formular a pergunta referente ao primeiro casal, pois os es- píritos não lhe tiraram essa dúvida, e deseja ser esclarecido. Por isso, Cirenius Me transmite tal pedido.
Eu, porém, respondi: Poderia fazê-lo, sem utilidade para qualquer um. O conhecimento indispensável aos homens foi dado por Moysés na Gênesis e em dois Livros, com explicações extensas, que em nossa época são considerados apócrifos. Quem, pois, quiser saber como surgiu o primeiro casal nesta Terra, leia as Escrituras de Moysés e creio que assim irá encontrar a prova se no início houve um ou vários casais.
Acrescento apenas que, para a filiação divina, só se destina- vam Adam e Eva. Por eles iniciou-se a educação espiritual, do Céu, prosseguindo até então.
É claro ter havido, muito antes de Adam, criaturas seme- lhantes ao homem, e ainda existem na Terra; entre elas e os homens propriamente livres há grande diferença.
O homem real pode desenvolver-se até a plena perfeição di- vina; pode reconhecer, comparar, ajuizar e compreender a finalidade das Obras de Deus. O homem animal jamais terá tal capacidade. Todos vós fizestes a experiência de poderem os irracionais aceitar uma espécie de educação superior pelo esforço de criaturas genuí- nas; ainda fariam mais, se estivessem numa união verdadeira e in- tegral com o seu espírito no Além, provindo do Coração de Deus, como eram os patriarcas.
No Egito setentrional existem criaturas tais. São soberanas da Natureza, a serviço de sua vontade. Para consegui-lo, não deve o homem rebaixar-se à mesma com sua alma, mas elevar-se em espí- rito acima da natureza material e física. Pois em a Natureza de toda matéria reside o julgamento, a impotência e a morte. Já vos dei a prova disto durante a tempestade.
Tratai que vossa alma se una ao espírito, que vos levará à sa- bedoria total; sem ela, cambaleareis sempre entre Luz e treva, vida e morte, liberdade e condenação!
O homem consegue a união com o Espírito de Deus através da fé viva em Deus, amando-O e ao próximo como a si mesmo. Quem isso souber e fizer terá a prova de Eu ter dito a Verdade plena!”
(O Senhor): “Ainda sentados à mesa, Cirenius abordou di- versos assuntos caseiros e construtivos, e os demais hóspedes concor- davam Comigo e com José. Finalmente, um marechal se expressou: ‘Com referência à engenharia, deveria se dar atenção a uma resistên- cia maior dos navios contra tempestades. Além disto, desejava evi- tar os remos em naves maiores, pois, sendo colocados muito acima do convés, necessita-se de varas muito compridas. São dificilmente manobráveis e requerem grande número de remadores fortes, entre- tanto produzem força reduzida na água e partem quando há tempo bravio. Os remos em posição mais baixa apresentam o defeito, como acontece em barcos costeiros, que a água penetra pelas aberturas logo que o mar está alto e nada mais resta senão tirar a água. Além disso nossos navios não podem transportar muitos passageiros, de- vido ao acúmulo de remadores.
Bem poderias, jovem poderoso, dar-nos bom conselho nesse assunto. Dizem que os fenícios usavam embarcações com as quais sulcavam o próprio Oceano. Os romanos têm que se dar por satis- feitos com viagens costeiras. Qual é tua opinião?’
Respondi: Meu amigo, será inútil Eu te aconselhar, porquan- to não o porias em prática. Para uma navegação boa e segura, antes de tudo é preciso conhecimento completo do Céu estelar, do glo- bo terrestre e, especialmente, do mar, sua extensão e profundidade. Desconheceis tudo isso devido à influência dos vossos sacerdotes; opor-se-iam a qualquer inovação, tornando-se inócuo um aperfei- çoamento náutico.
Os fenícios tinham embarcações melhores, todavia não mui- to diferentes das vossas. Sabiam manobrar as velas com vento favo- rável, entretanto evitavam o alto mar.
Se quiserdes organizar melhor navegação, tereis que aprender dos hindus, próximos do mar; sabem lidar com velas, se bem que não perfeitamente.
Tratai da unificação da alma com o espírito, que vos demons- trará a maneira pela qual podereis melhorar a navegação.
Vossos descendentes construirão naves verdadeiramente ar- tísticas, podendo, quais pássaros, navegar por todos os mares; isto não aumentará a felicidade humana, nem física nem espiritualmen- te, mas será reduzida. Continuai, pois, com aquilo que tendes por ora; grande progresso em coisas terrenas é sempre um atraso real e duradouro para o espírito, a cujo adiantamento deveria o homem se dedicar exclusivamente.
De que adiantaria a conquista de todos os tesouros do mun- do se a alma levasse o maior prejuízo?! Desconheceis o curto lap- so de vossa vida terrena e o destino final da carne? No Além, não importa se morres como imperador ou como mendigo! Quem for rico passará privações; quem pouco ou nada possuía sofrerá menor carência, podendo mais facilmente chegar aos tesouros do espírito, reais e vivos.
Por terem os patriarcas mantido condições de vida tão sim- ples, eram eles as criaturas mais felizes desta Terra. Tão logo os ha- bitantes das planícies começaram a construir cidades, o orgulho se apossou deles. Tornaram-se indolentes, preguiçosos e caíram em todos os vícios, e com eles na miséria. Perderam Deus da visão psí- quica e toda energia espiritual os abandonou, de sorte a não mais acreditarem — como muitos de vós — na vida após a morte. Não foi essa uma substituição desastrosa, perdendo-se, pelo maior con- forto da vida material, a influência do espírito quase totalmente?
Quem de vós for realmente sábio, procure trocar a facilida- de e comodidade material pela vida interna, espiritual e verdadeira, que seu progresso será muito maior do que a navegação veloz por todos os mares. Um dia tereis de morrer! Que utilidade terão as grandes invenções para a alma?
Continuai com aquilo que tendes e não lhes deis valor; pro- curai, antes de tudo, os meios de trilhar as veredas do espírito; assim tereis feito a maior e melhor invenção para a grande viagem da vida terrena à espiritual!
Empregai todos os esforços e recursos naquilo que dura eternamente; quanto ao sustento material, preocupai-vos apenas razoavelmente! É lógico sentir o homem necessidades físicas; mas quem dedicar mais tempo ao corpo do que à alma e finalmente ape- nas cuidar do primeiro — é, em verdade, tolo e ignorante.
Se fosse admissível alguém proporcionar ao corpo vida eter- na contra a Vontade de Deus, seria justificada sua constante preo- cupação com o mesmo; assim não sendo, deve tratar do que dura eternamente, porque Deus assim o quis!
Se tiverdes compreendido isto, não Me pergunteis pelo aperfeiçoamento de coisas terrenas; pois Eu vim a este mundo so- mente para demonstrar e iniciar os Caminhos à Vida Eterna, a fim de poderdes prosseguir seguros e facilmente.”
CAMINHOPARAAPERFEIÇÃO ESPIRITUAL
(O Senhor): “Após terem ouvido essas Minhas Palavras, os presentes conjecturaram: ‘Ele tem plena razão e não há objeção a fazer; todavia, encontramo-nos enterrados no mundo, desde nas- cença, e será difícil nos libertarmos inteiramente. Segundo Sua Afir- mação bem fundamentada, cada um terá que se elevar de seu estado material ao do espírito, sem poder contar com a ajuda milagrosa por parte de Deus, porquanto sofreria espécie de coação da livre vonta- de. Para agirmos em benefício próprio, faltam-nos força, coragem, vontade e paciência constantes, de sorte a se tornar difícil progre- dir sem cansaço e quedas. Talvez fosse oportuno perguntar-Lhe em quanto tempo se conseguiria um estado perfeito no fiel prossegui- mento dos caminhos evolutivos. Facilita a tarefa, sabendo-se a época de sua final realização; trabalhar numa obra cujo fim não pode ser previsto torna-se mui pesado!’
Dirigiram-se a Mim neste sentido e Eu respondi: ‘Obras e caminhos espirituais não podem ser calculados por horas e distân- cias, mas apenas pela força de vontade, pela fé e pelo amor a Deus e ao próximo.
Quem fosse capaz da abnegação de si próprio, a ponto de renunciar inteiramente ao mundo, passando os seus bens aos pobres na justa medida — por amor a Deus — e não levasse vida sexual, em curto tempo estaria perfeito! Necessitando de prazo mais longo para purificar-se das escórias e tentações terrenas, a perfeição espiritual será muito demorada.
Sois altos funcionários do Governo, obrigados à profissão; esta, porém, não é empecilho, diante de Deus, para caminhardes nas trilhas por Mim demonstradas, dando-vos justamente os meios pelos quais podereis atingir a meta final mais fácil e rapidamente.
Não deveis cair no erro de angariar consideração e honra de vossa profissão. Honra e consideração profissionais representam a lei, e sois apenas seus empregados. Sendo fiéis, bons e justos, encon- trai-vos dentro da honra e na consideração da lei; e o benefício da mesma, pela proteção popular, também vos atinge.
Sois igualmente mui ricos; a grande fortuna, todavia, não é impedimento ao estado espiritual, caso saibais agir com ela em benefício dos necessitados, como pais bons e sábios em relação aos filhos; à medida que fordes empregar o amor ao próximo, Deus vos recompensará espiritualmente e, em caso de necessitardes, também materialmente.
Enganai-vos muito julgando Deus não ajudar ao homem que, com rigor e constância, palmilha o caminho para o Reino do Céu e da Vida do espírito quando, vez por outra, se cansa e enfra- quece. Eu vos afirmo: quem tiver iniciado esse caminho receberá ajuda de Deus sem sabê-lo, a fim de poder chegar ao destino final.
O Pai não forçará a união de alma e espírito através de Sua Onipotência; Ele iluminará cada vez mais o coração humano e o en- cherá com a verdadeira Sabedoria dos Céus, e o homem crescerá e se tornará mais forte espiritualmente, vencendo mais fácil e confiante- mente todos os obstáculos que poderiam surgir para maior provação.
Quanto mais crescer o amor para com Deus e o próximo e sua alma se encher de misericórdia, tanto mais forte e preponde- rante se tornará o espírito dentro da alma. Pois o amor a Deus e ao
semelhante é justamente o Espírito de Deus na alma da criatura. À medida que aumenta o amor, cresce o espírito. Se, no final, a criatu- ra toda se tiver transformado em amor puro e misericórdia, a alma terá conseguido a plena união com o espírito, ou seja, a meta final.
Deus Mesmo é o Amor mais elevado e puro; assim também é o espírito do homem, provindo de Deus.
A alma que se tornar semelhante ao Espírito de Deus atra- vés de seu livre arbítrio ter-se-á unido a Ele e alcançado a perfeição total. Impossível determinar o tempo necessário para tanto; a pró- pria alma o demonstrará.
O amor verdadeiro, puro e vivo é altruísta, humilde, ativo, paciente e misericordioso; não procura pesar ao próximo e suporta tudo com prazer; não se conforma com a miséria do semelhante, procurando justamente ajudar a todos.
O amor puro é casto no mais alto grau e não lhe apraz a satisfação da carne, mas sim a moral do coração.
A alma alcançando esse estado de pureza, com zelo e renún- cia, identificar-se-á com o espírito pela perfeição de Deus.
Sabeis perfeitamente o que fazer para tal fim. Quem se de- dicar a tais virtudes dentro em breve estará perfeito. Podeis estar certos de que recebereis ajuda de Deus na conquista da meta final, caso vos dedicardes a esse Caminho!
Pois se Deus vos ajudou por Mim, quando de longe come- çastes a perceber tal Caminho, quanto mais o não fará ao seguirdes o mesmo pela livre e espontânea vontade! Compreendestes?’
Todos se admiram de Minha Sabedoria e o próprio José disse: ‘Jamais o ouvi falar de tal modo!’ E, virando-se para Mim: ‘Por que nunca doutrinaste os sacerdotes dessa forma? Teria modificado sua índole quem ora te ouvisse!’
Respondi: Antes Me animo a converter os peixes do mar! Por isto, aconselho que nem tu nem Jacob relateis o que aqui su- cedeu; do contrário, tereis grandes conflitos com os rabis. Seus corações são mais duros que pedra, e suas almas mais impuras que um suíno numa poça infecta; prefiro construir mil pocilgas para
gregos e outros pagãos, do que desperdiçar uma palavra com os ra- bis de Nazareth, Capernaum e Chorazim! Ainda assim, virá época em que abrirei Minha Boca entre eles — mas não para confortá-
-los, e sim para o julgamento, quando sua medida maldosa estiver completa!”
CHEGADAEM NAZARETH
(O Senhor): “Todos concordaram, inclusive José; em segui- da, nos recolhemos e de manhã voltamos à casa do grego, acom- panhados de Cirenius e alguns serventes. O trajeto durou poucas horas, e ao chegarmos avistamos de longe a casa e a pocilga novas. Todos estão perplexos, porquanto ignoram como podiam ter surgi- do da noite para o dia. Então obriguei a todos a silenciar a respeito, durante dez anos. O Prefeito entregou a José trinta libras de ouro, e o grego lhe pagou cem libras de prata. Ele as aceitou em benefício dos pobres, sempre bem acolhidos por ele.
Assim partimos e, no dia seguinte, chegamos a Nazareth. Po- deríamos ter feito isto no mesmo dia, porquanto o grego nos fez transportar com bons animais. Eu não o quis por motivos justos. Novamente penetramos no albergue onde nos haviam servido car- ne de porco.
Entrando em nossa casa, todos se atropelaram para saber o resultado de nossa viagem, e Maria opinou não poder o lucro ter sido vantajoso, por dia e meio de serviço.
José interrompeu: ‘Ficai calmos e silenciai, mormente diante do povo, sempre invejoso da felicidade alheia! Por isso, jamais hei de cerrar o meu coração para os verdadeiros necessitados, desejan- do que minha fama de ajudar com o pouco, dificilmente ganho, se justifique. Desta vez, Deus estava conosco! Fizemos milagres e ganhamos ouro e prata!’
Todos concordaram e Maria disse: ‘Tuas recomendações se- rão respeitadas como Mandamento de Deus; a nós três podes contar qual foi o milagre que vos rendeu tanto dinheiro!’
Respondeu José: ‘Querida, já disse ter estado Deus conosco! O que realmente sucedeu saberás em tempo oportuno. Trata de uma refeição, pois até agora nada comemos!’
Quando íamos ocupar a mesa, chegou um velho rabi para se informar do motivo de nossa ausência, qual o trabalho e o lucro, pois pleiteava certo tributo, conforme uso na Galileia.
José se irritou e disse: ‘Sabes ter eu sempre cumprido o meu dever; aborrece-me não poderes esperar que eu te procure. Quem te disse do trabalho feito com Jesus e Jacob?’
Respondeu o rabi: ‘Vim aqui para uma visita amistosa no mo- mento em que havias partido e me informaram de tua viagem. Por isto, voltei para rever-te e saber das novidades! Não foi tua suposição o motivo de minha vinda; pois em dia e meio, o lucro não pode ter sido grande. Caso pretendas fazer oferta à sinagoga, de qualquer maneira não precisas fazê-lo em moeda corrente, porque ainda te de- vemos o último serviço! Não te aborreças de minha visita matutina!’
Disse José: ‘Não estou aborrecido; apenas não compreendo a tua gentil visita, ao saberes de minha tarefa alhures! Pretendeis res- gatar vossa dívida para comigo por meio de tributos por mim pagos ao Templo, por isto vosso interesse nos meus trabalhos!
Conheço muito bem a índole dos meus ‘amigos’, entretanto não lhes pagarei na mesma moeda! Assim te digo ter ganho tanto, que o tributo cobre vossa dívida, podendo ser resgatada!’
Satisfeito, o velho rabi disse: Oh, que bom! Tiraste-me um grande peso do coração! Temos outro serviço para ti e ainda hoje serás informado a respeito. Não quero mais importunar-te! — E, assim, partiu ligeiro.”
MORTEDOVELHO RABI
(O Senhor): “Ao iniciarmos a refeição, Eu comentei: ‘Quão cego é o homem! De que lhe adiantam as poucas moedas? Dentro de uma hora estará morto! Será substituído por um de melhor índole; pagará o serviço, assim como nós não o privaremos do tributo!’
Interrompeu Maria: ‘Meu filho, voltaste a ser vidente?’
Respondi: ‘Nunca deixei de sê-lo! Sou mudo apenas para Nazareth e seus arrabaldes; pois onde não existe fé, não há compreen- são nem inteligência. Não Me denuncieis. Quando, daqui a algumas horas, ouvirdes as carpideiras na cidade, não vos deixeis tentar pela curiosidade e ficai em casa, sabendo do que se trata! Quando trou- xerem a notícia, dizei apenas: Contra a Vontade de Deus, o mortal nada consegue! Ele assim o quis, e não adianta chorar e clamar! — Até nos informarem, poderemos trabalhar; depois de recebermos a notícia, respeitaremos os três dias ordenados para tal hábito e iremos a Capernaum. No Lago encontraremos serviço até sábado!’
Disse José: ‘Está tudo muito bem; mas que dirão os nazare- nos tagarelas?’
Retruquei: ‘O que quiserem; faremos o que disse, e tudo es- tará bem.’ Ninguém fez objeções e, após o repasto, começamos a fazer um depósito de trigo para um vizinho.
Três horas mais tarde, chegou um mensageiro funerário tra- zendo a notícia do falecimento do rabi e a ordem de suspensão de trabalho por três dias!
Opus: ‘Somente dois dias, pois o terceiro é sábado!’ Concordan- do, o mensageiro partiu. Dentro em pouco, nos encaminhamos para Capernaum e, no mesmo dia, encontramos bom serviço na conhecida taverna, que nos rendeu cem moedas. Terminamos no sábado, o qual passamos satisfeitos e alegres. No domingo voltamos; soubemos, en- tão, ter causado grande surpresa a ausência de José no sepultamento do rabi. Perguntei se haviam transmitido as Minhas Palavras e uma serva confirmou, acrescentando a boa acolhida das mesmas.
Observei: ‘Assim foi bom; a Vontade nunca falha seu bom objetivo! Ganhamos em Capernaum o montante da dívida do rabi, de sorte a estarmos quites! Terminemos o depósito para o vizinho!’
Havia algo peculiar com esse depósito: sempre que nos prontificávamos a trabalhar nele, aparecia qualquer assunto, inter- rompendo o serviço por vários dias. José julgava ser motivada a in- terrupção por um espírito mau, e que deveríamos trabalhar até a
conclusão definitiva. Apressamo-nos, pois, e, à tarde, faltava apenas a colocação de algumas ripas. Eis que irrompeu um incêndio na casa de um outro vizinho! Tivemos que largar o serviço para socorrer aquele homem.
Novamente José afirmou: ‘Não disse haver qualquer malefício com o depósito de trigo? Dize-me tu, Jesus, o que pensas a respeito?’
Respondi: ‘Não é bem isto, conquanto algo semelhante! O dono do depósito tem um mau empregado, que prefere o ve- lho depósito, porque dele roubava trigo à vontade para vendê-lo à noite aos intermediários. Muito embora surgissem outros fato- res a nos impedirem a tarefa, era ele culpado. No incêndio daquela casa é igualmente responsável, conquanto seja o mais dedicado na sua extinção.
Pretende desviar à noite vários molhos de trigo, que ama- nhã deveriam ser guardados no depósito novo. Percebeu o bom an- damento do nosso trabalho e que seu patrão iria fazer uso do mes- mo. Eis que meteu fogo na casa do vizinho, quando se achava no campo com os lavradores.
Vê, José, é ele o mau espírito que muitas vezes interrompeu o nosso trabalho; outras ocorrências eram naturais e permitidas por Deus. A morte do rabi estava na Vontade do Senhor, pois suas frau- des ocultas com as pobres viúvas e órfãos clamavam aos Céus. Sabes, pois, o porquê das coisas; guarda-o para ti e não te aborreças!’
Perguntou José: ‘Não convém entregarmos o mau empre- gado à Justiça?’ Respondi: Não será possível, porquanto não há fla- grante; Meu Testemunho de nada valeria e ele nos poderia acusar de caluniadores. Deus, que tudo vê e sabe, fará com que receba o castigo merecido!”
O INCÊNDIO
(O Senhor): “Prosseguiu José em surdina, enquanto ajudáva- mos a apagar o incêndio: ‘Porventura não tens o mesmo Poder sobre esse elemento destruidor, aplicado em tempestades?’
Respondi: ‘Bem sei o que desejas; mas ainda não chegou o tempo! O perverso empregado terá que se esforçar na extinção do fogo até quase enlouquecer! Levará uma queda e será transportado sob fortes dores. Só então abafarei o fogo pela Minha Vontade, que já foi empregada no sentido de não causar grandes danos a casa. Presta atenção aos fatos!’
Da cidade vinham muitas pessoas, mais para satisfazer a curiosidade, do que querendo ajudar na extinção. O empregado co- meçou a convidá-los para atacar o fogo e a invectivar contra os que não obedeciam prontamente. Com raiva, os injuriados agarraram-no e o atiraram com violência sobre um montão de vigas fumegantes.
Nessa queda, quebrou um braço e recebeu várias queimadu- ras no rosto, sendo carregado dali, e Eu disse a José: ‘Vês? Já recebeu a paga, que fará dele homem mais ponderado; agora quero que o incêndio termine!’
Nem bem pronunciara as palavras, ouvidas somente por José, o fogo se apagou, de momento, não havendo uma fagulha na casa que, além do dano no telhado, nada mais sofrera. Desse modo, apresentou-se outro serviço para nós, feito gratuitamente ao inocen- te vizinho, dando-lhe o material necessário.
Entre a multidão surgiu perplexidade pela rápida extinção, não havendo fagulhas nem fumaça nas vigas, completamente frias. Muitos acreditavam ser aquilo milagre. Outros, o efeito da última água atirada. Um terceiro grupo afirmava ter Deus atendido o pedi- do de um justo, que nesse caso só podia ser o empregado, vítima da irritação dos preguiçosos.
O vizinho, para o qual fabricamos o depósito de trigo, virou-
-se para José: ‘A causa da rápida extinção sois vós, principalmente teu filho mais jovem. Muitas vezes observei fatos estranhos, mor- mente quando estava só, pois brincava com os elementos da Natu- reza. Diante do mundo, há mais de oito anos não deu demonstração de suas faculdades, trabalhando qual simples homem.
Certa feita, notei como cortava um enorme carvalho de qui- nhentos a seiscentos anos. Qualquer um de nós necessitaria de al-
guns dias para tamanha tarefa; ele, nem bem deitou o machado no tronco, e o colosso caiu por terra. Com a mesma rapidez o carvalho foi desembaraçado dos galhos grossos, que por si mesmos se deita- vam ao lado, na melhor ordem possível. O tronco foi dividido em quatro, e tudo com ligeireza inédita, inclusive o corte dos galhos me- nores. Em suma, o trabalho completo não durou nem meia hora. Ao voltar em casa, ele mandou que tu verificasses a madeira, sem fazer menção do trabalho invulgar aos demais irmãos. Que dizes a isso?’
Respondeu José: ‘Tens razão e o caso deve ter tal motivo; não fales a respeito, para evitar complicações com os templários. Lembro-me muito bem do caso do carvalho — e de outros fatos ocorridos nesses últimos dias; temos que silenciar, porquanto preju- dicaríamos seus futuros planos.’ Assim voltamos a casa, recolhendo-
-nos cedo por causa do grande movimento havido.
No dia seguinte, segunda-feira, terminamos o depósito de cereais antes do surgir do sol, e após o desjejum fomos à casa do vi- zinho que havia sido danificada pelo fogo. Ele nos pediu o conserto do telhado.
Virei-Me para ele: ‘Se puderes silenciar e afastar da casa tua família e teu pessoal durante uma hora, verás a grande Glória de Deus! Pois tua casa estará reparada!’
Disse o vizinho: ‘Saberei calar qual peixe, e mandarei todos para o campo!’
Acrescentei: ‘Então faze-o, que Eu farei o que Me compete!’ Dentro em pouco estávamos sós, e ele perguntou o que Eu iria fazer.
Respondi: ‘Há anos sabes ter Eu o dom de operar certos milagres pela Minha Vontade. Desde Meus doze anos nada mais fiz nesse sentido, devido à grande maldade e completa descrença dos homens. Tu, porém, fazes parte do pequeno número de justos, crendo o que digo, portanto podes assistir ao poder da Onipotência e Glória de Deus no homem. Vê tua casa avariada! Eu, José e Meus irmãos não usaremos instrumentos, todavia ela será reparada!’
Disse ele: ‘Creio em ti; no entanto, não tenho material de construção, nem o dinheiro para adquiri-lo!’
Respondi: ‘Já te assegurei da ajuda, inclusive do material, portanto não te preocupes. Fita mais uma vez o aspecto desolador de tua casa! Quero que esteja perfeita, num momento! Dize-Me, onde está o menor defeito?’ Admirado, o vizinho exclamou: Eis realmente o Poder e a Glória de Deus! Honra a Ele, nas Alturas, por ter dado tais faculdades ao homem!”
CARIDADEDEALGUNS CIDADÃOS
(O Senhor): “Enquanto o vizinho ainda dava expansão à sua gratidão imensa, alguns cidadãos se apresentavam a fim de lhe pres- tar ajuda. Quando depararam com a casa restaurada, disseram: ‘O velho José antecipou-nos! Certamente trabalhou a noite toda e po- de-se afirmar não haver outro construtor idêntico a ele! Pagaremos o que ele pedir pelo conserto!’
Respondeu José: ‘Nada peço, a não ser que seja dado aos po- bres vosso auxílio e não à sinagoga, como fazeis comumente!’
Disse um deles: ‘Deve-se entregar à Igreja aquilo que não pode ser aceito por outrem!’
Respondeu José: ‘Assim consta nos estatutos novos; Moysés, porém, nos obrigou a darmos o supérfluo aos necessitados, viúvas e órfãos! Nunca se referiu à manutenção de uma casa de oração, mas apenas determinou o dízimo para o tronco de Levi. Não é isto?’
Responderam: ‘Realmente assim é. Os nossos estatutos transpiram grande ganância, nunca ordenada por Deus, porquanto disse a todas as criaturas: Não deveis cobiçar a posse alheia! — Os sacerdotes exigem tudo, alegando haver maior mérito ofertar-se ao Templo do que praticar caridade. Por isso, dividiremos entre os po- bres a importância destinada ao amigo!’
Interrompi: ‘Este sendo vosso desejo, ide a Capernaum. Per- to do lago, encontrareis uma pobre cabana de pescador. O proprie- tário se chama Simon Judá e sofreu um revés. Um homem inescru- puloso roubou-lhe os apetrechos de pescaria e Simon não tem meios para a aquisição de outros, por isto está passando necessidades com
a família. Como homem de ações justas perante Deus e os seme- lhantes — o que é de Meu Conhecimento — fareis obra de caridade levando-lhe ajuda!’
Disseram eles: Conhecemo-lo como justo e honesto; mas ignorávamos sua infelicidade! Imediatamente receberá socorro! — Despediram-se e cumpriram sua palavra, e aqui está o mesmo pes- cador, Meu discípulo, que há dez anos recebeu ajuda através do Meu Conselho!” Pedro então confirmou o caso.
AFLORESTADO VIZINHO
Nesta altura, Eu queria terminar o extenso relato; Agrícola, po- rém, insiste para que Eu transmita mais algum fato de Minha Adoles- cência. Continuei, portanto: “Após a partida dos cidadãos, dissemos ao nosso vizinho: ‘Tudo está em ordem; guarda silêncio sobre o ocor- rido, até chegar a época em que poderás transmiti-lo com utilidade!’
Obstou ele: ‘Que direi ao pessoal quando à noite voltar e perceber a restauração?’
Respondi: ‘Não serás inquirido por aqueles que não têm fé; julgarão termos trabalhado com todo zelo, até concluirmos o reparo. Tua mulher já havia dito ser possível fazerem uma casa em poucos dias, caso os carpinteiros fossem mais dedicados ao trabalho! Assim, ela desta vez terá razão!’
Voltando ao lar, almoçamos e, não havendo serviço, conjec- turamos o programa para a tarde. Joses, filho mais velho de José, sugeriu procurarmos serviço em qualquer parte.
Respondi: Não nos vamos antecipar aos demais carpinteiros dessa zona, com o mesmo direito de sobrevivência que nós. Todos conhecem nosso trabalho e virão quando precisarem de nós. Vamos até a floresta do vizinho, a meia hora distante daqui, que descobri- remos qualquer serviço! — José confirmou tal possibilidade, con- quanto não houvesse recebido encomenda por parte do vizinho.
Eu disse: ‘Deixa isso por Minha conta! O plano de há muito nasceu no coração dele e iremos encontrá-lo na floresta planejando o
corte de dez cedros velhos, para confecção de um celeiro. Pretendia abater as árvores durante essa semana, para depois combinar contigo o seu corte. O principal empregado se encontrando enfermo, teu amigo está preocupado na resolução do problema.
Por várias vezes pensou em Mim, devido ao Meu trabalho com certo carvalho; no entanto, não tem coragem de se dirigir a Mim ou a ti. Será do seu agrado se o socorrermos espontaneamente. Podemos ir até lá!’
Munidos de machado e serrote íamos saindo, quando Maria perguntou por que tão raramente ficávamos em casa. Expliquei não haver o que fazer para nós, enquanto ela andava muito ocupada.
Pouco mais tarde chegávamos ao local, onde o proprietário estudava o meio de cortar os cedros. Quando nos avistou, cumpri- mentou-nos amavelmente e disse a José: ‘Meu amigo, vens a propó- sito! Sabes da minha necessidade de um celeiro e aqui está a melhor madeira para tal fim. Pensei muitas vezes em ti; mas esse serviço não é para um mestre de ofício como tu. Já que aqui vieste — talvez por teres alguma encomenda na Serra — aproveitarei para pedir-te conselho.’
Respondeu José: ‘Enganas-te, supondo alguma incumbên- cia para nós na Serra. Vimos expressamente para fazer o que não te animavas a pedir!’
Muito satisfeito, o vizinho começou a tocar nas condições de pagamento. José o interrompeu, dizendo: ‘Falaremos a respeito quando o celeiro estiver pronto. Mãos à obra, pois ainda nos restam algumas horas.’ Disse ele: ‘Já sei o que fareis em pouco tempo; mor- mente teu filho mais jovem! Nada mais direi a respeito.’
Virando-Me para ele, perguntei: ‘Crês na Minha Força e Onipotência internas?’ Respondeu: ‘Mestre, como poderia duvidar, com tantas provas?’
Prossegui: ‘Muito bem, então cuida de não Me traíres antes do tempo! Oportunamente serás informado de Minha Pessoa. Dá-
-Me o Machado!’ — Com apenas um golpe de machado, deitei por terra os dez cedros, trabalho que comumente levaria um dia.
Algo estonteado, José disse aos outros filhos: ‘Todos vós duvidastes dele, muito embora eu afirmasse Deus não abandonar a quem escolheu desde o berço! Agora vos convencestes Jehovah estar com ele! Não mais duvideis, tampouco o denuncieis; ele bem sabe por que quer ficar oculto!’ Todos concordaram e prometeram sigilo, enquanto Eu o quisesse.”
ACEIADE REGOZIJO
(O Senhor): “Em seguida, Eu disse: ‘Apanhai vós quatro a serra e dividi uma árvore em quatro partes, pelo comprimento!’ Opôs José: ‘Isso levará tempo com nossa força física!’ Respondi: ‘Crede e fazei o que disse!’ Seguindo a Minha Ordem, pegaram da serra e bastava apenas firmá-la e fazer um movimento, que o tronco já estava serrado. Dentro em pouco, as dez árvores estavam reduzidas a quarenta partes.
Isso feito, prossegui: ‘Agora falta apenas cortar, a machado, a coroa e a parte superior dos galhos para que Eu possa prepará-los para o uso adequado!’
Assim, um manobrava o machado, enquanto os outros em- pilhavam os galhos cortados; uns prestavam para o fogo e outros pedaços para cravos. Terminado isto, após uma hora tomei nova- mente o machado e, com um golpe, fiz da parte mais grossa duas a três vigas tão perfeitas e lisas no corte que serviam para o solo e, umas mais finas, para o telhado. Essa tarefa também não levou mais que uma hora e empilhamos tudo; em seguida, Eu disse ao vizinho perplexo: ‘Agora depende do transporte, pois em estrada aberta, não te posso ajudar deste modo, devido à descrença, teimosia e falsidade dos homens. Assim também a construção do celeiro será feita natu- ralmente, conquanto mais rápida. Trata, portanto, de mandar levar a madeira para onde queres o celeiro. Vamos para casa!’
Disse o vizinho: ‘Com muito prazer, pois ficou pronto um trabalho do qual tinha verdadeiro pavor. Hoje à noite sereis meus hóspedes. Mandarei matar um vitelo, e o meu melhor vinho alegrará a mesa até a meia-noite, em Nome de Jehovah!’
Disse Eu: ‘Tua ideia é boa e assim será, de acordo com antigo uso dos carpinteiros; tens, todavia, um empregado mui enfermo e não fica bem apresentarmos grande alegria!’
Concordou ele: ‘Realmente assim é; mas o enfermo está na casa dos empregados, mais afastada; minha vontade jamais terá o teu poder, mas desta vez terás que respeitá-la!’
Já a caminho para casa, Eu disse: ‘Assim farei; pois ninguém no mundo considera tanto o livre arbítrio dos homens quanto Eu, e não terás visto Eu Me opor contra a vontade de alguém, mas contra a tolice de muitas criaturas. Respeitarei a tua vontade; mas terás que fazer o que exijo.
Vê, consideras o teu primeiro empregado como o mais ho- nesto, entretanto é precisamente o mais infiel! No decorrer de um ano, desviou mais que cem molhos de trigo e igual quantidade de cevada, milho e lentilhas. Percebias a falta, mas não descobriste o ladrão em tua casa; desconfiaste de outros, razão por que mandaste fazer novo depósito, com fechadura. Insatisfeito com tua delibera- ção, foi ele o motivo por que sempre íamos sendo interrompidos no trabalho, descobrindo outras encomendas, mais distantes. Ontem à tarde, notou a breve entrega do depósito; por isto incendiou a casa do vizinho, pois querias vender aos gregos boa quantidade de trigo.
Isto encheu a medida de suas maldades e Eu disse para Mim: Homem perverso, até aqui e não mais além! Recebeu seu prêmio, sabendo por que participava na extinção do fogo. Que farás então?’
Consternado, o vizinho respondeu: ‘Por que me ocultaste esses fatos? Se o soubesse, tê-lo-ia entregue às autoridades e lhe teria feito pagar pelo dinheiro ganho com meus cereais.’
Disse Eu: ‘Ainda está em tempo e não perderás um níquel; pois teu empregado é avarento e guardou a importância no armário. Agora depende de ti aceitarmos teu convite para a ceia. Ficarás com ele; Eu o curarei e demonstrarei suas más ações, ameaçando-o com o justo castigo. Isso o levará a devolver-te o dinheiro e terás um empre- gado fiel. Eu sabia de tudo e não te avisei, até que o momento fosse propício para ambos. Estás satisfeito?’
Disse ele: ‘Quem não o estaria?! Agradeço-Te, Mestre e Juiz divino! Por isto sucederá uma festa em regozijo e todos devem estar alegres! Ninguém saberá da ação do empregado.’
Disse Eu: ‘Faze isto que serás feliz, temporária e eternamen- te! Pois quem perdoa ao maior inimigo receberá perdão de todos os pecados. Ninguém, com exceção de nós, nos acompanhará junto do empregado; a fim de que a cura não desperte curiosidade, ficará são dentro de oito dias. Quando chegarmos, dá ordens ao pessoal para a ceia, que entrementes falarei com ele!’
O vizinho deu as ordens e à minha casa também se mandou recado a respeito, aparecendo Maria com algumas servas para ajudar no banquete, pronto em poucas horas.
O empregado tudo confessou, pediu perdão ao patrão e a nós, e devolveu-lhe o dinheiro, com a promessa de reparar tudo quando tivesse saúde. O patrão o perdoou e o conservou como prin- cipal auxiliar. Em seguida, fomos à ceia, que durou até meia-noite.
Eis as Minhas Ações, feitas com vinte anos, das quais pou- cos têm conhecimento. A noite já está se aproximando e, em breve, aqui virão fariseus disfarçados, que serão bem atendidos!”
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